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Cartas-->2. REINALDO -- 21/07/2002 - 06:04 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Estabeleci comigo mesmo que iria ser o máximo de objetivo na transmissão. Coloquei isso no rascunho e José veio em meu socorro, para dizer que poderia tentar, embora não fosse lograr ser totalmente técnico nas apreciações morais. Disse-me mais o orientador paciente, que deveria requerer ao médium que me auxiliasse com a terminologia adequada, para não acabar parecendo, inclusive, bem mais emotivo do que realmente sou.

Feita a introdução, sinto-me bem à vontade para relatar os acontecimentos mais importantes da vida, aqueles que me desviaram do reto caminho da virtude e me fizeram imergir em lodaçal de vícios, desde tenra idade.

Se fui feliz com meus pais e irmãos? Sem dúvida. Por que desbaratei a sorte de família harmoniosa? Por deficiência cármica, talvez. Também porque não me contentei com a pobreza e desejei aumentar as posses minhas e da família.

Precisando tomar coragem para o furto, comecei a fumar maconha. Em lugar de ficar mais rápido de raciocínio (que não era muito forte), passei a depender, miseravelmente, dos orgasmos dos sentidos — no sentido figurado. Como não havia muito que fazer em torno do vício, os meus primeiros furtos se deram dentro de casa mesmo. Vendi o que podia subtrair dos pais e irmãos para manter-me na companhia dos viciados.

Devo dizer que, pelo que tenho observado, os pais agem como verdadeiros bobocas e jamais desconfiam de que os filhinhos estejam alimentando penca de maus elementos.

Um dia, minha mãe foi buscar uns brincos de ouro herdados da avó e, surpresa, não estavam. Não encontrou também um broche, dois colares, vários anéis e outras peças que conservava escondidas, para que os ladrões, caso vasculhassem a casa, não achassem. Ironia do destino. O ladrão sendo eu, entregou o ouro nas mãos do bandido.

Foi um deus-nos-acuda só. Alerta geral. Se tivessem meus pais ficado na deles, na moita, talvez me convencessem, na boa, a lhes declarar que fora o autor das subtrações e talvez lhes pedisse socorro para o descaminho das más ações.

Mas minha mãe botou a boca no mundo e meu pai apertou os filhos. Ora, meus irmãos bem sabiam de minhas investidas soturnas e delataram-me, incontinênti, para que não pagassem o pato.

Revoltei-me, inconsistentemente, com todos e parti de casa. Como diz a canção: “era feliz e não sabia.”

Na rua, desandei de vez, pois o mau hábito não quer saber se o indivíduo tem ou não tem recursos. Simplesmente exige. E como exige!

Profissionalizei-me no furto e passei ao roubo qualificado. Assaltei transeuntes na rua e moradores desprevenidos. Um deles não estava e me acertou um tirombaço no quintal da casa, quando nem havia entrado ainda. Caí de borco, estrebuchei rapidamente e me vi despregado da matéria, pairando por sobre o cadáver, sem poder livrar-me da terrível impressão de que tudo terminara.

Para encurtar o episódico, devo dizer que me obriguei a acompanhar o meu executor, para amenizar-lhe as penas morais. O coitado tinha arma em casa para espantar quem se aventurasse. Nem sabia atirar. Atirou e acertou. Teve de enfrentar tremendo processo, ainda mais que era conhecido de minha família.

Meus pais começaram a contestar que eu estivesse tentando entrar na casa. Iludiam-se. Buscavam motivos para desviar as dores da consciência que começava a dizer-lhes que deveriam ter agido melhor em relação ao filho criminoso. Crentes do protestantismo mais tacanho — que me perdoem os pastores e com razão, pois não entendia muito dos objetivos morais —, mantinham os hábitos grosseiros dos cabelos compridos, do terno e gravata, da televisão expulsa etc. Aí queriam fazer valer a lei do olho e do dente...

Acho que me estendi além do suportável para minha carapaça emocional. Disse o que disse para demonstrar que muita coisa guardo do teor das antigas idéias e, principalmente, dos antigos impulsos.

Vivi vinte e três anos. Ao contrário da maior parte dos colegas, não me considerava e não me acho jovem, pois tinha reações de adulto. Desonesto, imbecil, desprovido de escrúpulos, mas adulto.

Esses acontecimentos distam mais de dez anos. Nesse período de tempo, pude refletir sobre o que fiz de ruim para a minha vida e dos familiares, além dos sustos dos incautos. Tive muita sorte em não ter matado ninguém. Assim fosse, por certo, não estaria junto a esta mesa para expor.

Lições? Sei lá. Bastaria que alguém nas mesmas condições que eu tivesse contato com o texto. O mais viria por si mesmo. Mas quem estará disposto a passar os carões que imagino, se se apresentarem com este libreto na mão para verrumar os vícios na pessoa dos viciados?

Se estou certo, nessas condições, iria pedir um volume para mim, talvez mais, com a desculpa de distribuir entre os colegas, e passaria nos cobres, para obter mais um fuminho. Quem está necessitado de regeneração, só vai se aperceber disso quando é demasiado tarde e seu corpo ou seu espírito estiverem em ruínas.

O meu alerta, pois, é mais para os pais, que devem ser rigorosos quanto a si mesmos, sacrificando-se pelos filhos, além das jóias idiotas que ficam guardadas, como patrimônio da família, esquecidos de que a verdadeira está nos filhos.

Se minha mãe, na minha frente, tivesse vendido as jóias e tivesse comprado, por exemplo, um aparelho de televisão, teria demonstrado que dava mais importância aos filhos. Se meu pai me tivesse abraçado mais vezes, levando-me ao campo de futebol, com uma guaraná na mão de cada um de nós, com certeza nos teria viciado nos bens do amor, do companheirismo e do respeito.

Andar com a Bíblia na mão, olhando o Céu como propriedade particular da seita, pode ser muito bonito aos olhos do pastor, que arrecada seus dízimos, oferecendo um discurso...

Vou parar por aqui, pois a intenção é de despertar e não de aborrecer. Aceitem minha revolta, como disse no início, com a mesma fleuma e boa vontade. Ainda bem que José me preveniu quanto às sutilezas vocabulares e as insidiosas conotações. Sendo assim, digo, com toda a clareza, que estou aprendendo a amar a Jesus e ao Senhor, conforme me ensinaram meus pais, cujas mãos beijo reverente, voltando a pensar em que parti do etéreo para a última jornada necessitado de vencer as tribulações de caráter tremendamente voluntarioso.

Pode ser que tenha sido derrotado e que tenha sofrido as graves conseqüências no horroroso Umbral. Contudo, tenho a grande felicidade de contar com protetor muito digno e companheiros ansiosos por encontrarem comigo o caminho da salvação.

Que esta tardia manifestação de arrependimento possa, um dia, ajudar a alguém! Que seja essa a vontade do Senhor!

Assim seja!

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