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cronicas-->cronicas PALMARENSES -- 09/03/2002 - 04:48 (LUIZ ALBERTO MACHADO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Teles Júnior era um artista múltiplo: poeta, artista plástico, entalhador e incentivador cultural. Sua enormidade de gesto não condizia com o seu tope: baixinho, bigodinho meio hitlerista, malcriado e sabichão. Tanto sabia muito bem aplaudir como botar gosto ruim no que julgasse impróprio. Não se continha: quando elogiava, rasgava a seda; quando detestava, arreava a lenha de pocar o tampo.
Sempre respeitei e respeito até hoje a memória de Teles Júnior. Grande figura: polêmico, sarcástico e duma convicção inarredável.
Conheci primeiro o seu texto na antologia "Poetas de Palmares", publicada em 1972. Depois sua pintura, sua talha e todo seu trabalho. O texto poético, principalmente quando recitava suas poesias, inacreditável a potência de sua voz caber num tamaínho daquele: um pouco mais de metro e meio e um vozeirão enfático de mexer com as estruturas. Mas como aprendi que tamanho num é documento e que a verdadeira altura está acima da cabeça, tive, pois que admirá-lo, a ele e ao Grupo Cultural dos Palmares - GRUCALP, que resiste até hoje em Palmares, tendo a frente seu filho, Jaorish Gomes Teles.
Não era ele daqueles casacudos, não. Simples e altivo como jamais vira. Talqualmente personificara Luiz Berto no seu "Romance da Besta Fubana". Uma vez, eu ainda estudante de ginasial, resolvi com alguns amigos, comemorar o dia da poesia, já que a cidade passava por vigência o cognome de "Terra dos Poetas". Fiz o convite e ele foi o primeiro a chegar no ginásio. A meninada de todas as classes estava lá e todos se arrepearam com seu jeito de sapecar interpretação poética na récita emotiva e enfática. Foi uma festa.
Lembro-me bem quando publiquei em 1982, o meu primeiro livro com poesias escritas na adolescência, "Para viver o personagem do homem", lá estava ele prestigiando o lançamento na Biblioteca Pública Fenelon Barreto. Três dias depois, ele me chega com um poema que me emocionou bastante.
A sua talha era um sucesso, não parava de fazer. Gente de muitos outros estados vinha para adquirir sua obra. Os quadros onde exibia um cubismo místico, abusava das cores e figuras geométricas. Quando deram a ele para fazer o símbolo da cidade, um Zumbi, ele caprichou tanto que o afrodescendente saiu um pintudo viril do tamanho da liberdade que se almejava. Mas a negada não via a arte, via a pêia saliente da efígie, isso não poupando alguns aborrecimentos.
A partir daí dividimos uma convivência estreita, tomando umas e outras, até que ao havermos fundado, eu e uns outros amigos conterràneos, as Edições Bagaço, e já havíamos publicado dois títulos e chegara a vez do terceiro. Reunimo-nos no conselho editorial e resolvemos publicar "Assim falou Teles Júnior", um livro hermético, com poemas e textos esfíngicos, como ele próprio o era. Ele nos entregou os originais, tudo bem, tudo certo, fizemos o lançamento, mas ao que parece, o livro era mágico: quanto mais enviávamos para bibliotecas, para escolas, para instituições, mais exemplares aparecia. De trezentos, ou foi quinhentos exemplares impressos, parecia mais que a edição não tinha fim. Ainda hoje, mesmo já ausente da Bagaço há alguns anos, sei que lá ainda tem exemplares aos montes do livro. Eu mesmo me peguei alegando que os livros do Teles haviam dado cria. Possivelmente, alguma magia que ele deva ter deixado por herança. E isso ele sabia fazer bem: do nada, tirava figuras, expressões, versos impresionantes.
Certa feita, encontrei-me com ele em alguma praça da cidade e durante uma conversada longa que não parecia mais ter fim, fiz o convite para tomarmos uma cerveja. Ele aceitou desde que fosse fora da cidade. Havia, à epoca, um bar interessante em Japaranduba, bairro afastado da cidade. Lá nos aboletamos sob uma condição: que o garçom conseguisse para ele somente cerveja quente. Era. Tinha que ser daquela saída da grade na hora. Então, era uma quente para ele e uma geladíssima para mim. Assim, começamos a conversar sobre ocultismo, esoterismo, Gilberto Freire, Nietzschie, Gershwin, cosmogonia, Camus, Murilo Mendes, Palmares. Lá para as tantas, chegaram mais alguns amigos poetas, músicos, artistas plásticos, atores, e a conversa ficou acalorada. Essa é fogo. No meio da madrugada, álcool mandando mais que a razão, a discussão findou girando qual seria o órgão mais importante do corpo humano. E cada um defendia com unhas e dentes o que havia escolhido. Teles só recolhendo as impressões de todos. A roda girando, cerveja enchendo o quengo, a coisa se avolumando, quando deprecaram a posição de Teles. Ele, como sempre, deu um risinho para si, preparou aquela surpresa de que todos estavam errados com um discurso inflamado e sentenciando depois de seiscentos versos tirado de improviso a resposta.
- É o cu!
A coisa pegou fogo. Foi renhenhém para lá e para cá, cada qual reprovando e querendo prova por "a+b" que Teles estava sacaneando com todo mundo. E ele sério:
- Reitero, o mais importante do corpo humano é o cu!
Verdadeiro azáfama fechou o tempo. Isso ele gostava, se deliciava com uma polêmica. Depois de muita zoada deixaram ele explicar melhor na sua doctíloquia sapiência.
- Olhem, meus preclaros amigos, no dia que o cu se revoltar, que o procto, o sigmóide, o ponto crítico de Sudeck, a fita cólica distal, o colo ileopélvico, a cloaca, que o anel anoretal fechar, vamos ver todas as desgraças que o mundo já presenciou, tudo de novo.
Maior zoada no pé do ouvido, desaforos, xingamentos, repulsas, ele lá, tranquilo só esperando a poeira baixar.
- Repito, Nero só tocou fogo em Roma porque estava com prisão de ventre. E por isso, mandava matar gente, esfolar nego, leão devorar presos e, numa dessas aperturas cronicas, a bosta num saía e ele tocou fogo em Roma e, só depois disso, teve uma caganeira de infestar tudo.
As gaitadas eclodiram desbragadamente. E disse mais:
- O homem só faz a guerra quando está com prisão de ventre, com a tripa gaiteira entupida, só. Quando o cu funciona bem excretando as ruindades que sobram no estómago, a paz reina. Porém, quando não, o tempo fecha. Agora, digam-me, o cu é ou não é a parte mais importante do corpo humano?
Palmas para Teles Júnior!!!!

© Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.

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