O violento Isaac chegou de volta da Terra envolto em brumas. Lá estava Samuel a esperar por ele após ter ouvido as preleções dos superiores. Intentara explicar-lhes que Isaac, na realidade, não era a figura do avô querido de Ester, mas o espírito daninho de oficial alemão de mesmo nome, que perseguira os judeus durante a Segunda Grande Guerra. Precisava levá-lo à honra e à glória junto ao povo que afrontara um dia, para provocar-lhe desassossego sadio, a fim de fazê-lo meditar a respeito da vida na face da Terra e da existência no etéreo. Se dera continuidade à realização é porque fora possível, e tal possibilidade só ocorrera sob a influenciação positiva dos planos mais elevados.
Os espíritos guardiães, contudo, não aceitaram a exposição de motivos de Samuel e determinaram que deveria acompanhar Isaac em seu despertar e em preparação para novo encarne. Aguardasse pacientemente que, por longos anos ainda, permaneceria obumbrado pelo ódio, de modo que poderia ir planejando retorno à carne da infeliz criatura de maneira mais consentânea com as necessidades. Não se ativesse a tão-só livrar-se do fardo, mas que procurasse dar cunho realmente altruísta à atividade.
Samuel considerou injustas as observações, tanto trabalho tivera para o efeito, mas calou-se para não complicar ainda mais a situação. Recordava-se da sapataria e do dinheiro que subtraíra à ajuda dos necessitados e amargava intensamente a estultícia.
“Da próxima vez”, prometia de si para consigo, “irei ser bem mais prudente...”
Ao receber o espírito do tutelado, lamentou-lhe profundamente a total falta de percepção do ambiente, não havendo meio para detê-lo junto a si. Isaac comandava fictício exército, dando ordens para atacar, para matar, de modo que, em pouco tempo, realmente, congregou enorme massa de comandados, que partiram com ele para a conquista não se sabe de que invisíveis inimigos.
Samuel buscou a pedra fria da lápide para sentar-se e, com o rosto apoiado nas mãos espalmadas, chorou lágrimas de muita dor e arrependimento. Começava a compreender que a missão a si atribuída iria exigir esforço sobre-humano. Deixou-se descair sobre os joelhos e, pela primeira vez, fez brotar do coração sentida prece, em que solicitava a ajuda de seus maiores e o perdão de Deus para suas faltas.
A partir daquele instante, nunca mais se sentiria sozinho para cumprimento das tarefas. A vibração fluídica ao derredor, qual brando vento a farfalhar as árvores, parecia sussurrar-lhe aos ouvidos que tivesse fé na divina misericórdia. Tal foi o efeito dessa sensação de amparo que, ao levantar, com os olhos convulsionados pelo pranto, sentiu novo ânimo e, corajosamente, pôs-se em marcha para as terras brasileiras.
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