O debate sobre cotas sociais e raciais nas universidades tem suscitado acaloradas discussões.
Sou favorável as cotas sociais. A universidade pública tem que contribuir com a inclusão social. Cotas para os pobres seria um avanço considerável para uma verdadeira universidade pública e transformadora.
Penso, ainda, que os alunos das universidades públicas oriundos de escolas particulares do ensino médio deveriam continuar contribuído o equivalente para as universidades ampliarem a oferta de vagas. Mas isso é outra discussão.
No entanto, com relação às cotas raciais tenho algumas dúvidas e incertezas. Sempre que ouço algum comentário nesse sentido, vem a lembrança do conto No campo de Guy de Maupassant.
Nesse conto, duas famílias pobres, os Tuvaches e os Vallins são vizinhos e recebem várias visitas de um casal bem-sucedido. Após alguns encontros o casal dirige-se aos Tuvaches e pede em adoção um dos filhos. Em troca daria educação para o garoto que seria seu herdeiro e uma pensão mensal para melhoria da condição de vida dos demais. Eles não viveriam mais na miséria. A mãe Tuvaches fica furiosa. Diz que jamais venderia seu filho. Aquilo era uma abominação. Uma afronta. E expulsou o casal de sua casa.
Na outra casa, os Vallins recebem o casal e acham a proposta interessante. E aceitam que um de seus filhos seja adotado. O filho faria algumas visitas e eles teriam uma melhor condição de vida.
A outra mãe dizia de porta em porta que só os desnaturados vendiam seus filhos. Um horror. E isso se repetiu por anos e anos. As grosserias eram vociferadas junto a porta para que a família dos Vallins ouvisse.
Numa certa manhã uma carruagem estacou junto às duas choupanas. Desceu um jovem bem educado e vestido e foi ao encontro dos pais. Junto a porta de sua casa o rapaz, que foi negado para adoção, vê a chegada de seu vizinho e cobra de seus pais. “Aí está o que eu seria agora”.
Não perdoou seus pais e preferiu fazer a vida em outro lugar. À noite abandonou sua família e foi embora.
O que tem a ver as cotas com o conto de Maupassant?
Supondo que tenhamos duas famílias pobres: uma de negros e outra de brancos.
Dois garotos convivem a infância e a adolescência conjuntamente. Uma de cada família. Posteriormente, apenas um deles ingressa na universidade pelo critério das cotas raciais. Como ficaria a cabeça do rapaz pobre ao ver o vizinho universitário e ele sem a mesma oportunidade?
O conto de Maupassant nos coloca em introspecção e as cotas raciais em reflexão.