Jane, todos sabem, é aquela moça que está decidida a ir para a Europa com seu namorado, Herbert. Eles esperam passar um ano viajando e mostrando sua arte. Estátuas de rua. Param em uma pose pelo maior tempo possível. Falando assim, parece simples, mas há toda uma produção. Roupa, pintura do corpo, placa explicativa, Ã s vezes um pequeno cenário. Não é só chegar e ficar parado. Os passantes contribuem na caixinha.
A caixinha é o meio de sobrevivência e também nisto há alguma ciência. Para motivar doações mais graúdas sempre deixam à vista uma nota de dez dólares ou seu equivalente local. Nota falsa, para evitar prejuízos, pois há quem os roube e fica chato uma estátua ficar correndo atrás de ladrões baratos. Combinaram dar apenas um sorriso caso a nota falsa seja roubada. Se roubarem as moedas, uma lágrima solitária, para comover a platéia.
Jane ainda não sabe com vai dizer isto ao seu pai. Ele é cardíaco e ela teme pelas consequências. Por outro lado, não há nada que a demova da idéia. Nem deveria, seu futuro, sua felicidade está em jogo. Ao menos é o que ela pensa. Jovem pensa cada coisa.
Enquanto ela pensa em como contar ao pai, fica criando e ensaiando posições para suas apresentações no velho mundo. Por enquanto, são três. A primeira é o "vóo da galinha". A idéia é ficar em uma única perna, com os braços abertos como se fosse levantar vóo. Poses em uma única perna sempre causam sensação. Melhor seria com as duas pernas no ar, mas ela ainda é iniciante e não se arrisca nas posições mais ousadas. Por enquanto uma perna no ar está ótimo. A segunda, é uma pose de protesto e chama-se "A fome do mundo". Ela fica com roupas rasgadas, chupa o rosto, fazendo-o parecer mais magro, e arregala os olhos fazendo-os praticamente saltar nos passantes. Como preparação, passa cinco dias sem comer antes de iniciar as apresentações, para ficar mais realista. É uma pose muito singela, que comove a todos.
Por último, para os momentos de descanso, "Buda sentado" (alguém já viu um Buda em pé?). Sobre o corpo um manto, uma barriga postiça e uma pintura acobreada. Ela fica sentada na posição característica. Uma beleza!. Nesta ela incha o rosto, fazendo-o mais rechonchudo, como um Buda. No último ensaio ela ficou dois dias sem se mexer.
Voltando ao problema do comunicado ao pai, ela já pensou em tudo. Mas não tem coragem. Teme pelos efeitos. Outro dia ela ficou três horas em frente dele na mesma posição, esperando um comentário que levasse à conversa. Até que ele disse.
- Que está fazendo aí, guria? Parece aqueles doidos que se fingem de estátua na rua.
O pai colocou uma nota de dez embaixo do sovaco dela e foi embora rindo, dizendo que ela podia pedir o dinheiro de forma mais simples.
Ela ia correr atrás e iniciar com um "sua mãe subiu no telhado", mas não póde prosseguir. Fica para outro dia. De qualquer forma ela ainda tem muito que ensaiar e preparar.
Escrito em 20.01.2001
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