Quando perdera o emprego, fora executado pelo sistema financeiro de habitação, os amigos, a família e as instituições o abandonaram, até mesmo aquelas que haviam sido fruto de sua dedicação, restou a Policarpo um registro sinistro de hospede involuntário do manicômio.
Nas intermináveis tardes de ócio e desligamento, o fardo de restos humanos, é nisso que Policarpo se transformara, vagava por entre conversas com sábios e gênios, numa aprendizagem sem fim.
Se numa tarde discutia a planificação numérica com Descartes, noutra dedicava a análise metodológica mecanicista do universo com Newton e ainda, em outras, relativisava as interações cósmicas com Albert ou materializava a existência com Jean Paul.
Numa destas tardes, ainda deliciando os últimos tragos numa bagana furtada do lixo das salas de espera dos consultórios, deparou-se com um tipo feio, calvo, nariz proeminente e de significativo desleixo no trajar, porém eloqüente e sagas.
Horas e horas foram vistos a rondarem o pátio em conversa animada e praticamente interminável.
Pelas tantas, chegada a hora da medicação inadiável que marcava o tempo de Policarpo, ao interromper aos dialogantes, a enfermeira responsável pela medicação de Policarpo pode ouvir as despedidas e o compromisso que ambos se dirigiram de voltarem a encontrar-se e chamou-lhe a atenção o fato do interlocutor de Policarpo encerrar afirmando.
- Conheça-te a ti mesmo...
Dias depois, quando já deixava o prédio da hospedagem forçada, olhando pra traz com segurança de quem havia vencido mais uma etapa, agora sorridente e seguro, Policarpo com modos de quem agradece reverenciando, lança ao passado, representando, um olhar de pespreze e diz
- Velho e bom Sócrates... tanto te deveremos, tão pouco nos conhecemos.