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Artigos-->O VERDADEIRO PLACEBO -- 12/04/2007 - 23:03 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O VERDADEIRO PLACEBO



Francisco Miguel de Moura*



O homem adoeceu. Foi ao médico. Diagnóstico: câncer.

– Não pode ser, doutor. Nunca fumei, nunca bebi, nunca forniquei. Sou solteiro. Como foi que apanhei um câncer de próstata? E ainda mais que precise de operação?

Fez novos exames para comprovação, mas não apresentou resultado. Diante da única opção que o médico lhe colocou – “tem que fazer uma cirurgia” – pensou na medicina alternativa. Sua “nega” já fazia umas garrafadas. Sua, sim, porque viviam juntos desde quase meio século. Era, sim, sua companheira, mas sem oficialização. Para quê? Perda de tempo e de papel. Não tinham bens nem filhos. Na verdade, ainda não acreditava nas meizinhas do mato e perdera a fé no médico, que só sabia fazer operação cara. Começou, então, a beber. “Beber para esquecer”, dizia. Também passou a fumar, para tirar o atraso de todos aqueles anos em que se privara. Desde rapaz teve vontade de um cigarro, era elegante, mas o pai não deixava. Depois que ele morreu, ficou a mãe que lhe pedia: “Pelo amor de Deus, Vicente...” Sua “nega” era muito mais velha que ele, suas garrafadas já haviam salvado muita gente da redondeza, curavam tudo: gripe, sezão, dengue, dor na coluna, inchação nas pernas, diabete. Alguns cancerosos procuraram-na, com esperança: “Se Deus quiser podem servir pra nós também.” Logo ele se juntou a essa turma de desenganados, era leite de babosa, casca de pau d’arco, raízes, folhas apanhadas nas roças e nos gerais e vindas de muito longe.

De uma hora pra outra, entre um bate-boca e outro com sua “nega”, que queria que ele voltasse ao médico, Vicente resolve: – “Mas ele tem que me receitar remédio, ora”, pensou. E foi.

– O que é que o senhor pode fazer por mim? – perguntou.

– Ah, tenho aqui um remédio, lançamento novo. Além do mais – puxando os papéis do envelope – sua próstata não está crescendo tanto quanto antes – mentiu. Mas falou a verdade quando disse que o remédio era uma experiência, o laboratório americano estava com muita fé, daria uma ajuda de custo ao paciente que fizesse o tratamento completo.

Vicente pensou: “Negócio bom, ia tomar mais uma droga pra ficar sadio de uma vez”. Com o dinheiro recebido, pagaria ao curandeiro, tudo às escondidas de Madá, e parte ia pra suas garrafadas e beberagens.

Bem alimentado, boa vida com a pensão que o velho lhe deixou, ia ao cinema, assistia a todos os programas de humor da tevê, tinha fins-de-semana alegres com os amigos e algumas “amiguinhas”. E assim foi rolando a vida.

Vai-não-vai, Vicente soube que o médico ia encerrar suas experiências, houve uma confusão nos Estados Unidos, o remédio não era placebo, era o criado no laboratório, e fora aprovado para o câncer de próstata. O placebo tomara rumo ignorado.

Entretanto, as “garrafas” de Madá estavam rendendo muito bem, eles já não precisavam de nada. Não deu oiças para aqueles que diziam que agora o Vicente ia ficar pobre como Jô e só tomar sua cerveja quando a Madá lhe desse. Mas Vicente tinha um coração bom e teve pena da ruína em que caiu o homeopata – leia-se curandeiro – que tinha vivido a vida inteira a custa daquilo: beberagens de maconha, a mesma substância que serviu de base para fabricação do novo remédio da próstata, como lhe disseram lá pelo clube.

Vicente não entendia nada de placebo, medicamento criado em laboratório e outras coisas, mas ficava chateado quando lhe diziam:

– Sua cura espetacular, meu caro Vicente, só pode ter sido “dose dupla”, ou “tripla” da erva, para não se falar nas garrafadas de Madá, feitas com urina e...

E eles talvez tivessem razão.

________________________

*Francisco Miguel de Moura, escritor brasileiro, mora em Teresina, PI. E-mail: franciscomigueldemoura@superig.com.br



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