Policarpo foi afiador de tesouras, carvoeiro, tintureiro, alfaiate, leiteiro, cuteleiro, engraxate, benzedor..., e em todos os ofícios dignou-se sempre. O fracasso nunca foi de Policarpo, por sempre, acabava por vir a força dos modos e costumes das próprias atividades que se extinguiam sem nem mesmo Policarpo perceber.
Um dia, num anuncio de jornal surgiu a luz ao final do túnel, na contramão de seus costumes, agora, Policarpo investiria em uma profissão do futuro, seria técnico em mecânografia, e de sobra, pomposamente, datilógrafo.
Concluiu o curso, recebeu os diplomas, empregou-se, estabilizou-se, comeu, bebeu, vestiu, casou e realizou família, com até uma certa dignidade e sossego.
Enquanto o cotidiano de Policarpo restringia-se a uma dedicação cega e irrepreensível a repartição e as obrigações e tarefas do trabalho, em torno dele a vida corria a passos alados e o mundo e a tecnologia agigantava.
Uma bela manhã chegando a repartição, monitores e impressoras alienígenas haviam invadido o ambiente.
A velocidade de setenta toques por segundo havia perdido a corrida para a praticidade da correção e formatação do trabalho antes de imprimi-lo, bem como, a facilidade de interrelacionar documentos.
Pós-adolecentes e sua roupas espalhafatosas e seus hábitos pouco formais, praticamente expulsavam as tradições da repartição e com elas, o velho Policarpo.
Ultrapassado a linha média da vida, cabelos alvejados pelo tempo e musculação decrépitas a aposentadoria compulsória foi inevitável.
Refletindo sobre a vida enquanto maçava a dor de mais uma vez ter sido pretendido, Policarpo correu ao jornal em busca de uma nova luz ao final do túnel e deparou se com uma manchete ainda mais amarga.
Aposentadoria na País é caminho inevitável para a miséria. Pigarreando triste, Policarpo admite que agora já não haveria mais tempo.