EU SOU AQUELE (I)
Eu sou aquele que partiu e não sabe se vai voltar.
Eu sou aquele que partiu para o mundo
E o mundo não o quer.
Eu sou aquele que, por onde passa deixa sua marca.
Eu sou aquele que não quer voltar
Para não ter que partir de novo.
Eu sou aquele que murcha entre quatro paredes.
Eu sou aquele que quer mudar o mundo e,
No entanto, é o mundo que o modifica.
Eu sou aquele que sonha andar descalço,
Maltrapilho e faminto pelas estradas.
Eu quero abraçar meus irmãos
Que mendigam pelas ruas.
Eu quero agasalhar as criancinhas
Que dormem tremendo de frio
Sob as marquises das lojas de luxo.
Liberdade, eu quero liberdade.
Liberdade para sentar na calçada
E ficar vendo as pessoas passarem como formigas.
Liberdade para sorrir, quando estiver alegre.
Liberdade para chorar, quando estiver triste.
Liberdade para andar, correr, pular, dançar,
Sem que ninguém venha me reprimir.
Eu sou aquele que procura
Uma presença amiga ao seu lado e não encontra.
Eu sou aquele que não sabe amar
Porque nunca encontrou o amor.
Eu sou aquele que contempla sua obra
E nunca está satisfeito.
Eu sou aquele que peca por omissão.
Eu sou aquele que emudece, quando deveria falar.
Chora, quando deveria sorrir.
Sorri, quando deveria chorar.
Fecha os olhos, quando deveria olhar.
Fala, quando deveria calar.
Recife, 30 de outubro de 1976.
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