Temores
maria da graça almeida
Não entendo a morte como natural.
Morbidez? E daí? Poucos têm, perfeita,
a saúde mental.
Não convivo bem com a idéia.
Em muitos de meus escritos, ela.
Mesmo se não intencional,
surge como se brotasse de um dedo ferido.
Às vezes, examino minhas mãos
e não encontro nenhuma lesão,
tampouco, o mínimo corte!
A morte
maria da graça almeida
A morte escondida
na lida contida
amordaça a fala,
que inerte se cala.
Na vida há morte,
a morte é feia,
a morte da vida
de vida é cheia!
A morte tão muda
a vida desnuda,
empreende a viagem
com pouca roupagem!
A roupa da morte
já foi colorida,
hoje é fio jogado,
sem renda, ou babado!
A vida da morte
de morte é cheia,
a morte da vida
é morte bem feia.
Mudando de idéia
maria da graça almeida
De tanta idade, que parem o trem,
já sem vaidade, não sigo além.
E lá na estação, afoita, sem porte,
de foice na mão, aguarda-me a morte.
O medo me invade, rejeito a morte,
que temo tal qual a ruga mais forte.
Os sulcos têm jeito, a morte inda não,
não parem o trem na tal estação.
Que siga o trem, já não desço mais;
que, leve, o trem, a dona em paz;
que fique a morte, sem jeito e ação
e, que, desta vez, aguarde-me em vão.
Dores
maria da graça almeida
Pra nascer não sei se dói.
Não me lembro!
Não senti dor ao crescer.
Não me doeu a adolescência,
a maturidade também não,
mas envelhecer dói!
E eu que nem sabia...
Dói na pele, dói nos ossos,
nos cabelos , olhos, dentes,
dói , bem fundo, na memória,
na saúde e resistência.
Morrer, acho que dói,
dependendo da maneira
e, não sendo previsível,
dói-me a hora de sabê-la.
Maria da Graça Almeida
direitos reservados
A ocasião não é boa.
Em face do momento insano,
a matéria deveria ser mais amena.
Não deu.Considerem-na, então,
uma dramática e patética alusão
ao dia 2 de novembro, finados.
Maria da Graça Almeida
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