Orçamento público é uma estrutura legal, técnica, burocrática, muitíssimo complexa, costumando ser execrada pelos leigos dado o hermetismo de suas disposições normativas. A leitura de textos que falem sobre orçamento parece enfadonha, cansativa, pouco tragável. Mas não é uma coisa insondável para quem tem formação e informação, mesmo geral, sobre a diversidade do conhecimento, ainda mais tendo em vista que o orçamento é a principal viga de um modelo econômico, da gestão do país, portanto, conhecê-lo está no campo e na exigência da cidadania.
Naquela algaravia de siglas, números, códigos, classificações, está escrito o destino de uma nação, porquanto o destino que se dá aos recursos públicos também dá rumo ao futuro do país. Assim, o cidadão deve ligar suas antenas para sintonizar-se com o que os gestores públicos estão fazendo com o nosso orçamento. Mas, cuidado para não agir com açodamento, para não sair deitando falação por aí, às vezes crucificando o administrador público em matéria de decisão orçamentária, porque as circunstâncias podem obrigar uma mudança de rumo na aplicação orçamentária, sem afetar o rumo da coisa pública.
Orçamento significa, essencialmente, previsão, estimativa, normalmente feita com muita antecedência dos fatos concretos, e como tal, sujeita a revisões para adaptação à realidade do momento atual que o momento da previsão não podia alcançar. O grande problema, de raiz econômica, é que, em qualquer país, em qualquer estado federado e em qualquer município, burgo, os recursos são inferiores às demandas da sociedade ou da comunidade local. O orçamento prevê os recursos, um verdadeiro exercício de “advinhação”, de virtualidade, e “fixa” a despesa, aqui uma realidade factual.
Na prática, os recursos podem não se viabilizar, são muitos os fatores agravantes e complicadores da previsão, enquanto a realidade da despesa permanece, pressionando o administrador. O que fazer? Não há milagre. Cortar os gastos, tendo-se o cuidado de começar o corte numa escala de prioridade, reduzindo, inicialmente, aquilo que não prejudicar os interesses da sociedade, adiando o que pode ser adiado, para executar o imprescindível, assegurar o indispensável atendimento aos reclamos sociais.
Então, não é novidade, ao contrário, é fato corriqueiro, comum, o redirecionamento orçamentário, tranferindo-se recursos de uma rubrica orçamentária para outra. Isso é uma permissão expressa no próprio texto constitucional, regulamentado na legislação infraconstitucional, através dos chamados créditos adicionais(suplementares, especiais e extraordinários). Um determinado programa ou projeto pode iniciar o exercício fiscal com cobertura orçamentária e concluir sem os recursos necessários para seu atendimento, porque outra demanda exigiu a transferência.
Ainda mais deve ser esclarecido que o orçamento(hoje chamado de Orçamento-Programa) não contempla necessariamente os itens específicos de despesas, mas a “natureza”(corrente ou capital), “categoria”(custeio, investimento, inversão, etc..), “elemento”(pessoal, material de consumo, serviços, obras, equipamentos), definindo, ainda, a fonte de recurso e a forma de aplicação, se direta ou indireta. O orçamento, hoje, é também plurianualizado(três exercícios), mas de execução anual. Uma despesa só pode ser considerada definitivamente cancelada ou para cobrir crédito adicional ou no fim dos três anos programados. O adiamento, dentro do período trienal de vigência, é absolutamente normal. Quer dizer: adiar-se a execução de um item não significa erro de previsão, nem cancelamento do item, mas remanejamento da dotação de cobertura.
Repito, o orçamento não contempla diretamente um item, mas a natureza, a categoria e o elemento ao qual o item pertence. Vencimentos, gratificações, papéis para expediente, combustíveis, matéria-prima, insumos, materiais para obras e outros milhares e milhares de itens são relacionados como anexo do plano de contas, são normalmente muitas vezes superiores ao valor da “verba” para o elemento a que ele se vincula, de modo que a sua não-execução nada tem de errado, pelo menos do ponto de vista legal. A estratégia pode ser criticável, mas não condenada.
A crítica é livre, mas a condenação exige provas e processo. Devemos, então, para condenar, saber sobre o que e porque condenamos, senão estaremos sendo apenas levianos e não analistas isentos.
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