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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->Lund -- 25/11/2002 - 10:52 (Evandro Sada de Faria) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


LAGOA SANTA- PLEISTOCENO

EXT. LAGOA -- DAY

Uma grande floresta se estende a perder de vista.

Por entre colinas, um densa vegetação é intercalada de clareiras.

Mais abaixo seguindo o vale de um grande rio, escondida entre colinas e espremida entre enormes árvores, se descortina uma Lagoa

Em uma de suas margens enormes mastodontes se refrescam com banhos de lama.

Mais ao longe, um grupo de antílopes pasta tranqüilamente.

Em uma praia, de pedras, uma família de homens pré-históricos está reunida.

Flamingos fazem uma revoada em um canto da lagoa

Crianças que brincam na beira da lagoa apontam para os pássaros que iniciam a revoada.

Uma tigresa dentes de sabre percorre a margem seguida de seus filhotes.

Uma flor de cor intensa recebe um estranho inseto.

Em uma enorme árvore, a beira da lagoa, uma Preguiça Gigante escala lentamente, subindo pelo tronco da árvore

Um homem pinta em um paredão de pedra desenhos rudimentares.

Mulheres percorrem a mata catando raízes ou frutos

Os Mastodontes continuam o banho de lama. Um filhote brinca seguro entre as pernas de sua mãe.

Um macaco salta entre duas 1rvores e seu salto parece um vôo.

Formigas fazem uma fila e carregam folhas para o seu formigueiro.

Uma criança dorme no colo de sua mãe.

LAGOA SANTA 2001

INT. SALA DE AULA -- MORNING

Sobre uma folhinha pregada na parede a PROFESSORA marca o dia 14 de maio de 2001.

Ela se vira para os seus alunos, uma dúzia de meninos e meninas, entre 10 e 14 anos. Um burburinho domina um ambiente com as crianças conversando entre si, em pequenos grupos.

Um menino joga game boy sozinho em um canto. A sua frente, dois outros trocam figurinhas.

Do outro lado da sala, meninas comparam entre si os seus cadernos, 3 outras meninas cochicham e riem enquanto uma delas aponta o dedo para VICENTINHO.

Compenetrado, Vicentinho lê um livro no canto da sala.

No fundo, 3 meninos se divertem com um grande besouro na mão. Eles ameaçam as meninas que estão à sua frente. A cada ameaça dos meninos com o besouro, as meninas soltam um grito e recuam.

Vicentinho tira os olhos do livro e faz uma cara contrariada.

A professora intervém e acaba com a algazarra que ameaça se instalar. Ela se dirige aos 3 capetas do besouro

PROFESSORA
O que é que vocês têm na mão ?

Os meninos rapidamente guardam o besouro e se sentam.

A professora faz uma cara de quem jà entendeu tudo e tenta começar a sua aula agora com a turma um pouco mais calma

PROFESSORA
Bom dia meus queridos !!!

ALUNOS
Bom dia !!!

PROFESSORA
Hoje nós vamos trabalhar em grupos...

Já no meio da frase, os meninos começam a se organizar entre si, reiniciando a algazarra. Eles arrastam as mesas e cadeiras para se juntarem em grupos apesar dos pedidos de calma da professora. As meninas que cochichavam se abraçam, os meninos do besouro se juntam e outros grupos se formam. Quando Vicentinho se dá conta e desgruda os olhos do livro, ele é o único que não está em um grupo. Os meninos do besouro começam a zombar de Vicentinho. Na sala, a algazarra continua.

A professora é chamada à porta por alguém.

A professora volta trazendo ANITA pela mão. A sala aos poucos fica em silêncio quando os meninos se dão conta da nova colega. Os capetinhas do besouro param de falar. A professora apresenta a nova aluna:

PROFESSORA
Esta é a nossa nova colega a Anita. Vamos recebê-la com carinho.

Os meninos e meninas se entreolham. Alguns sorriem

PROFESSORA
Quem ainda não tem um grupo ?

Vicentinho olha para os meninos do besouro, dá uma risadinha e levanta mão

VICENTINHO
Eu, profesora

Anita e Vicentinho trocam um olhar.

A professora encaminha Anita até uma carteira perto de Vicentinho. Anita se senta e sorri levemente para Vicentinho que também sorri para ela.

Os meninos do besouro fazem cara de debochado.

A professora continua a falar enquanto retorna para frente da sala.

PROFESSORA
Como eu estava dizendo, hoje vamos formar nossos grupos para fazer uma grande pesquisa sobre o DR. Lund, o homem que deu o nome a nossa escola e que é patrono de nossa cidade de Lagoa Santa. Ele foi um grande sábio e sua obra é muito importante para nossa cidade, para o nosso estado de Minas Gerais, para o Brasil e também para o mundo....

Vicentinho e Anita escutam atentos. Outros já começam a dispersar a atenção. As mesmas meninas voltam a cochichar, e os meninos do besouro voltam a planejar travessuras. De novo um burburinho se instala no ambiente...

COPENHAGEN 1834

INT. ANFITEATRO ACADEMIA DE CIÊNCIAS -- DAY

Dentro de um grande anfiteatro domina um intenso burburinho. Homens paramentados conversam entre si em pequenos grupos. Em uma grande mesa situada acima da plenária, ladeado por outros dois acadêmicos, está sentado PETER LUND.

Lund limpa seus óculos em um lenço enquanto espera a sua vez de falar. Um ACADÊMICO, postado ao seu lado, se levanta e se prepara para iniciar a solenidade. Ele acena pedindo silêncio aos acadêmicos. O silêncio aos poucos se instala.

ACADÊMICO
Muito obrigado senhores. Estamos reunidos no dia de hoje para saudar nosso estimado Professor Peter Wilhelm Lund e para lhe conferir o título de Doutor da prestigiosa Academia Real de Ciências Naturais da Dinamarca pelos seus valorosos trabalhos realizados no Brasil.

Peter Lund põe seus óculos, depois se levanta. Todos se levantam. Um dos acadêmicos lhe condecora e lhe passa um diploma. A plenária irrompe em aplausos e Peter Lund agradece satisfeito esta grande ovação.

INT. TABERNA -- LATER

Uma bandinha toca animada. Vários casais dançam em um ambiente festivo. Enormes copos de cerveja cruzam o recinto. Peter Lund está no centro de uma destas mesas festivas. Sören KIERKEGAARD se levanta vai até onde está tocando a bandinha e pede que os músicos interrompam. Os casais param de falar e, pouco a pouco, diminui barulho e Kierkegaard pode falar.

KIERKEGAARD
Meus amigos, um momento de sua atenção, por favor.

O barulho cessa de vez. Lund lhe olha curioso enquanto limpa os seus óculos.

KIERKEGAARD
Eu proponho um brinde ao nosso querido Professor Doutor P.W.Lund, nosso mais novo acadêmico. Que o seu talento e sua sabedoria continuem sendo motivo de orgulho para a sua família, os seus amigos e o seu país.

Todos levantam as canecas. Lund se levanta e estende seu copo.

INT. CARRUAGEM -- NIGHT

Kierkgaard está embriagado, semi-inconsciente no colo de uma mulher. Lund está acompanhado de CORINE. Todos estão embriagados. Lund sacode Kierkegaard, tentando reanimá-lo

PETER LUND
Sören ! Sören ! Minha festa ainda não acabou, acorde...

Kierkegaard não dá sinal. Lund desiste

PETER LUND
É meninas, parece que o nosso filósofo desistiu de nós.

Kierkegaard dorme tranquilamente.

A paisagem desfila pela janela da carruagem que atravessa o parque da cidade

EXT. CARRUAGEM -- MOMENTS LATER

Kierkegaard desce cambaleante da carruagem apoiado em uma mulher. Lund e Corine observam o casal se dirigir até a porta de casa. Com duas batidas na lateral ele indica ao cocheiro para partir

INT. QUARTO DE LUND -- LATER

Lund se vê com Corine que o observa sentada em um divã. Ele percebe seu olhar e a olha também como se a visse pela primeira vez, ficam assim como que se descobrindo aos poucos, sem pressa. Devagar ele se aproxima, toca seus cabelos loiros , aproxima seu rosto e cheira a pele na altura do pescoço. Ela fecha os olhos, ele aproxima seus lábios de seu pescoço e a beija suavemente, depois o lóbulo de sua orelha o que a faz se contorcer. Ele manipula os laços que prendem seu vestido nas costas. Descobre então uma camisola branca apertada em um espartilho que ele vai soltando bem devagar afrouxando o longo fio. Ela permanece de olhos fechados enquanto ele vai percorrendo sua coluna até a cintura com a ponta dos dedos. Neste momento ela se vira e o olha nos olhos, ele sorri e a beija. Ela desabotoa sua casaca , solta sua gravata , ele a ajuda atirando longe sua casaca. Ele retira a camisa de dentro das calças, ela o toca na altura da cintura e retira sua camisa e beija seu torso. Ele suspende sua camisola e descobre o corpo jovem e bem torneado. Ele a toma em seus braços, ela se deixa envolver, ele a beija com ardor, ela corresponde.

INT. QUARTO DE LUND -- MORNING

O sol penetra no quarto onde Lund e Corine dormem. Uma leve brisa sacode a cortina da janela

LAGOA SANTA 2001

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- MORNING

Anita e Vicentinho estão em bicicletas. Enquanto passeiam na orla da lagoa conversam

ANITA
O que vamos fazer Vicentinho ? Por onde a gente começa ?

VICENTINHO
Não sei Anita. A profesora disse pra gente ir na biblioteca ou no museu. É certo que nestes lugares vamos saber mais sobre esse Lund

ANITA
Todo mundo vai fazer isso... eu sei.... Mas será que não tinha uma outra maneira ?

VICENTINHO
Como assim ?..

ANITA
Não gostaria que nosso trabalho fosse igual ao dos outros. Se todos forem nos mesmos lugares vai ficar tudo igual

VICENTINHO
Mas em que outro lugar a gente pode pesquisar. Temos que ver os livros...

Anita para sua bicicleta. Vicentinho faz o mesmo. Eles estão em uma praça sob uma enorme árvore

ANITA
Já sei. vamos procurar a pessoa mais velha de Lagoa Santa.

VICENTINHO
Boa idéia Anita. Eu sei quem é a pessoa mais velha de Lagoa Santa. É a Maria dos Anjos....mas tem um problema...

ANITA
Qual ?

VICENTINHO
Todo mundo diz na cidade que ela é bruxa... mora sozinha num casebre fora da cidade...dizem que tudo lá é mal assombrado

Anita sorri interessada no que acaba de ouvir.

Vicentinho passa a mão nos braços como quem se arrepia

ANITA
Você não está com medo de ir, não é?

VICENTINHO
Quem ? Eu ?

ANITA
Claro, quem mais ?

Vicentinho sorri amarelo e não responde nada

EXT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- LATER

Vicentinho e Anita estão seguindo por uma pequena estrada de terra cercada de pastagens e campos abertos com escassas árvores. Alguns bois pastam aqui e acolá. A estrada acaba em uma mata fechada de arvores frondosas de um verde intenso. Ultrapassada a primeira barreira de árvores e arbustos, abre-se uma área vazia limpa de vegetação, com o solo de folhas secas. A estrada segue em um túnel sob as árvores até desembocar em um pomar. Depois do pomar a mata ciliar se fecha mais uma vez. O caminho vira uma trilha que vai dar em uma casa colonial. Uma extensa varanda circunda a casinha de barro com algumas plantas estranhas, nada familiares.De um lado da varanda, uma cadeira de balanço e um tear muito antigo. De outro, uma rede de cor crua. A porta principal era cortada no meio podendo ser também uma janela. Um grande banco de madeira acompanhava meia varanda até a porta, onde um gato dorme tranquilo.

Anita e Vicentinho largam a bicicleta e se aproximam furtivamente de uma das janelas. O gato foge.

INT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- CONTINUOUS

No interior da casa eles observam um mobiliário tosco e simples. No primeiro plano, um catre ladeado por um criado mudo antigo, envernizado e muito bem conservado, uma bela antiguidade que contrasta com a simplicidade do lugar. Nas paredes fotos antigas de um casal colorizadas, postas lado a lado, também um poster do Papa, uma flâmula do Atlético Mineiro e um quadro a óleo de uma paisagem.

No segundo plano, iluminado por uma segunda janela, uma mesa e 3 cadeiras. No fundo,na penumbra, uma cozinha e MARIA DOS ANJOS que remexe em um caldeirão.

Anita e Vicentinho se olham. Vicentinho ameaça partir, Anita o segura.

Do teto da cozinha pendem diversos utensílios de cozinha e também ervas secas que formam buquês e que caem por sobre a velha como uma chuva bizarra. Sem fazer barulho eles se entreolham e continuam a observar o interior. Em uma estante enorme ao lado de livros antigos, seguem enfileirados recipientes de vidros contendo em seu interior uma diversidade de coisas. Cobras envoltas em um líquido transparente; ao lado outro vidro com escorpiões, espécies estranhas de conservas, algumas pareciam pimenta, em outros vidros estão cactu ou bolas brancas em líquido multicor, outras contém líquidos simplesmente.

Mas o que impressionava Vicentinho e Anita eram as cobras, sapos e escorpioes a ponto de fixar o olhar dos meninos naquele ponto.

Abaixo das prateleiras, vassouras se perfilam lado a lado. Em uma espécie de tripé, mais adiante, se amontoam diversas bacias, baldes e utensílios de ferro.

Absortos nessa observação minuciosa da casa, eles se fixam na mesa onde descansam diversas facas, de diversoss tamanhos fincadas sobre um suporte em madeira,e nem notam que Maria dos Anjos está atrás deles

MARIA DOS ANJOS
O que os meninos estão espiando ?

Anita e Vicentinho tomam um enorme susto. Vicentinho sai correndo atabalhoado,tropeça em um balde no meio caminho e cai de cara na lama. Maria dos Anjos dá uma gargalhada. Anita também ri.

COPENHAGEN 1834

EXT. CASA DA FAMÍLIA LUND -- DAY

Um CARREGADOR coloca uma valise em uma carruagem onde já estão dispostas outras bagagens. Na maleta que ele deposita pode se ver uma plaqueta P.W. Lund. O carregador empurra o carrinho em direção a carruagem. No caminho ele passa por Lund e Sören Kierkgaard que conversam

KIERKEGAARD
Mal chegaste a Copenhagen, primo, e já estás partindo de volta ao Brasil. Devias ser marinheiro ao invés de cientista

Lund sorri. Ele dá o braço a Kierkegaard. Os dois caminham em direção a carruagem

PETER LUND
Somos realmente bastante diferentes meu jovem primo. Definitivamente, Soren Kierkegaard não é famoso por sua mobilidade. Na sua idade eu já tinha comido muita poeira de estrada

KIERKEGAARD
É verdade, em toda a minha vida, nunca saí de Copenhagen, admiro sua disposição para estas aventuras científicas. Graças ao bom Deus, minhas fontes de pesquisa ficam a algumas quadras daqui, na tranquila e aconchegante Biblioteca Real.

PETER LUND
Tu és um filósofo, um jovem e prodigioso filósofo. Tuas viagens, tuas aventuras são muito mais perigosas que as minhas. Meu destino é apenas longínquo, fica logo do outro lado do mar. Mas o teu, meu primo, o teu destino é incerto. Tu procuras a verdade dos homens

KIERKEGAARD
Sou apenas um jovem acometido do "male de vivre". Fujo do tédio onipresente com um pouco de cerveja e com a filosofia. Neste ponto invejo o cotidiano de surpresas que te preparas para viver

Kierkegaard sorri e abraça Peter Lund

KIERKEGAARD
Vou sentir tua falta querido primo. Sabes que todos nós estamos preocupados com o seu estado de saúde

PETER LUND
Além de minhas pesquisas, também minha saúde me leva ao Brasil. Não posso viver aqui em Copenhagen. A umidade e o frio estão me matando. Meus pulmões clamam pelo calor dos trópicos. Devias me ver em atividade no Rio de Janeiro, lépido, ágil, saudável. Não te preocupes, estou unindo o útil ao agradável.

Eles se abraçam mais uma vez

EXT. CAMPOS DINAMARQUESES -- DAY

A carruagem de Lund atravessa o campo. Paisagens da Dinamarca

EXT. PORTO DE HAMBURGO -- DAY

Uma bandeira alemã tremula em uma grande embarcação. Lund embarca neste navio

LAGOA SANTA 2001

EXT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- DAY

Maria dos Anjos derrama um balde de água na cabeça de Vicentinho que está dentro de uma barrica. Anita está sentada ao lado e ri do desconforto de Vicentinho enquanto Maria dos Anjos derrama mais um balde em Vicentinho. O menino reclama

VICENTINHO
Tá muito frio Dona

Maria dos Anjos derrama mais um balde. Depois entrega a Vicentinho que treme de frio, um sabão, uma toalha e uma muda de roupa

MARIA DOS ANJOS
Curioso sempre arruma confusão. Toma esse sabão e essa toalha. Termina o banho

Ela se dirige a Anita

MARIA DOS ANJOS
Venha comigo minha filha, tenho uns biscoitinhos na cozinha

INT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- CONTINUOUS

Anita se senta à mesa enquanto Maria dos Anjos vai a cozinha. Anita aproveita para dar uma boa olhada nos potes na prateleira. Maria dos Anjos continua a mexer o caldeirão enquanto procura com os olhos os biscoitinhos. Ela para de mexer e começa um abre e fecha de armários. Vicentinho está de volta e também se senta. Ele cochicha

VICENTINHO
Que velha mais estranha

Anita o interrompe e o faz calar

ANITA
Shhiii... lá vem ela

Maria dos Anjos volta com um bule e um prato de biscoitos. Ela os deposita na mesa antes de sentar. Anita ri amarelo. Vicentinho ainda está com os olhos arregalados

MARIA DOS ANJOS
A que devo a honra da visita dos meninos. Faz anos que não recebo a visita de ninguém

Anita toma a palavra enquanto Vicentinho aproveita para dar uma espiada melhor na casa de Maria dos Anjos.

ANITA
A senhora nos desculpe, a gente vir assim sem avisar...

Anita cutuca Vicentinho que está com os olhos fixados nos potes de Maria dos Anjos. O menino confirma com a cabeça. Maria dos Anjos sorri. Anita continua. Vicentinho volta a espiar a casa.

ANITA
Meu nome é Anita e aqui o meu colega Vicentinho. Nós somos alunos da escola Municipal e estamos fazendo um trabalho sobre o Doutor Lund... e a gente pensou que a senhora podia nos ajudar

Maria dos Anjos olha para Vicentinho que não consegue desgrudar os olhos nos potes. Maria dos Anjos percebe e olha fixamente para Vicentinho

MARIA DOS ANJOS
Vocês devem ser realmente muito curiosos para vir até aqui. O povo da cidade já deve ter comentado sobre mim

Vicentinho finalmente desgruda os olhos dos potes e finalmente abre a boca

VICENTINHO
O povo diz que a senhora é bruxa

Tão logo ele diz isto, ele põe a mão na boca como se aquelas palavras tivessem lhe escapado. Agora é Anita que está perplexa. Maria dos anjos dá uma sonora gargalhada

MARIA DOS ANJOS
Esse povo me diverte. Não me surprende o susto de vocês. Uma velha sozinha, em uma casa cheia de coisas estranhas, e ainda por cima um caldeirão

Maria dos Anjos gargalha mais uma vez. Anita sorri. Vicentinho ainda está desconfiado

MARIA DOS ANJOS
Vamos por partes meus filhos. Tomem um cafezinho. Olha aqui uns biscoitinhos

Maria dos Anjos estende o prato para os meninos. Anita prontamente aceita. Vicentinho aceita também, mas antes de comer, cheira o biscoito

RIO DE JANEIRO 1834

INT. CABINE DE LUND NO NAVIO -- NIGHT

Lund tem um acesso de tosse em sua cabine. Ele leva o lenço a boca, mas não consegue impedir o acesso que lhe toma conta. Ele finalmente cospe em uma escarradeira. Lund olha seu lenço, onde existe sangue. Se olha no espelho. Ele é interrompido por uma batida na porta

MARINHEIRO
Profesor Lund. Professor Lund

Sem abrir a porta da cabine

PETER LUND
Pois não

MARINHEIRO
O jantar será servido dentro de quinze minutos, O Capitão faz questão de sua presença

Lund assente contrariado

PETER LUND
Estarei lá, pode avisar. Obrigado.

INT. CABINE DO CAPITÃO -- CONTINUOUS

Peter Lund janta com o Capitão GOREN e alguns oficiais. Trata-se de um jantar de gala e todos estão muito bem vestidos. O serviço é impecável, com taças de cristal, toalhas de linho, porcelana finíssima e faqueiro de prata. Os 6 homens, Lund, o Capitão, 3 oficiais e o Médico de bordo estão sendo servidos por mais dois homens que se revezam no atendimento aos comensais. Entre uma garfada e outra os comensais conversam

CPT.GOREN
Amanhã cedo estaremos no Rio de Janeiro, Professor Lund. Espero que o senhor tenha muita sorte no novo mundo.

PETER LUND
Obrigado, Capitão

Lund faz uma reverência ao Capitão e prossegue

PETER LUND
Desta vez minha estada se prolongará por muitos meses. Preparo uma expedição.

CPT.GOREN
Vocês pesquisadores são os marinheiros da terra.

Lund fica curioso. Todos na mesa observam o capitão

CPT.GOREN
O que o senhor quer dizer Capitão Goren ?

CPT.GOREN
O professor não é o primeiro cientista que trago para estas terras inóspitas do novo mundo. Às vezes a ciência é apenas um pretexto. Uma boa razão para ir atrás do que realmente interessa: o sol e e aventura .

Lund sorri

CPT.GOREN
E quanto a nós...

O Capitão aponta para os seus oficiais na mesas

CPT.GOREN
Não é o comércio e nem a vida de viagens e aventuras que nos fez marinheiros...

Todos fixam a atenção no capitão

CPT.GOREN
São as senhoras de cada porto

Todos caem na gargalhada

Neste momento é servido o prato principal e todos se voltam para reiniciar a refeição

EXT. PORTO DO RIO DE JANEIRO -- MORNING

Da murada do navio Lund observa o Rio de Janeiro.

EXT. CAIS DO PORTO -- LATER

Do alto da rampa do navio, Lund avista a multidão. Lund olha o seu destino que é o prédio do terminal a algumas dezenas de metros. Lund desembarca no meio da maré humana do cais. Um carregador lhe segue com as suas bagagens. A brancura e limpeza de Lund contrastam com a imundice do lugar. Ele é um ponto branco, entre os poucos que existem, na multidão de negros e pardos que circulam no cais.

Lund penetra na massa e começa a travessia da maré humana em direção ao terminal do porto. Ele vai desviando dos estivadores, carregadores, marinheiros, vendedores, mendigos e desocupados. Ele cruza com uma tropa de escravos recém desembarcados do navio negreiro. São dezenas, homens, mulheres e crianças. Passam acorrentados uns aos outros sob a guarda de feitores nervosos de chicote na mão.

Quando Lund sai da multidão, já na escadaria do terminal, ele já está completamente sujo. Seu terno de linho tem manchas escuras e ele está transpirando abundantemente e também descabelado.

O carregador deixa suas bagagens. Lund paga ao carregador que se afasta. Lund bate com as mãos no paletó e tenta se limpar um pouco. Depois ele se senta em cima da bagagens e começa a esperar

INT. TABERNA -- DAY

MULATO HENRIQUE está sozinho sentado à mesa. Ele está diante de uma enorme e farta refeição que ele come rapidamente. Ele dá a última garfada e o último gole de uma caneca. Ele tira umas moedas do bolso de um terno surrado e larga em cima da mesa.

Sempre apressado, Mulato Henrique pega uma derradeira coxa de galinha no prato e se dirige à saída da taberna. Ele acena com a coxa para o proprietário da taberna que sorri.

EXT. RUAS DO RIO -- CONTINUOUS

Mulato Henrique sai correndo pelas ruas do Rio, desviando dos transeuntes. Vez por outra ele esbarra em alguém. Mas não se atarda além de um aceno de desculpas e um largo sorriso.

INT. TERMINAL DO PORTO -- CONTINUOUS

Henrique, de colete e descalço sai de dentro do terminal. Nas escadarias ele cruza ofegante com Lund que está sentado em cima das malas impaciente.

O Mulato Henrique passa correndo por Lund.

Mais a frente, quando "cai a ficha", o mulato volta ofegante, mas sorrindo

MULATO HENRIQUE
Dr Lund ....

Lund está impaciente, ele está se enxugando com um lenço. Ele para, olha de cima a baixo para o Mulato Henrique e fixa os olhos nos pés descalços da figura

PETER LUND
Sim..

MULATO HENRIQUE
Me mandaram buscar o senhor. Benvindo ao Rio de Janeiro

LAGOA SANTA 2001

INT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- DAY

Maria dos Anjos toma o rumo da cozinha, acrescenta mais agua no caldeirão.

MARIA DOS ANJOS
Meninos venham ver a poção mágica de Maria dos Anjos.

Anita e Vicentinho se levantam da mesa e vão até a cozinha. Eles se aproximam do caldeirão e observam

VICENTINHO
Mas é feijão

MARIA DOS ANJOS
Mas o que você queria que fosse. Não diga que voc6e pensou que tivesse asa de morcego, sapo cururu e todas aquelas coisas de bruxa ?

Todos riem. Maria dos Anjos fecha a panela

MARIA DOS ANJOS
Venham comigo

Maria dos Anjos volta a sala onde está a estante e os intrigantes potes e se dirige a um canto da sala onde está um enorme baú. Vicentinho e Anita aproveitam para observar mais de perto aquela estante misteriosa. Maria dos Anjos abre o baú. Quando percebe que os meninos estão olhando os seus potes com insetos, cobras, escorpiões e lagartos, ela comenta.

MARIA DOS ANJOS
Faz um bom tempo que vocês estão intrigados com estes potes. Porque não perguntam do que se trata?

Os meninos se entreolham e não dizem nada

MARIA DOS ANJOS
Isso que voces estão vendo aí é o que sobrou do Pequeno Museu de História Natural do meu saudoso pai. Como ninguém se interessou eu fiquei com pena de jogar fora. Ele adorava esses bichos

Anita e Vicentinho fazem cara de nojo. Maria dos Anjos sorri

MARIA DOS ANJOS
Venham aqui meus meninos

Os meninos se dirigem a pequena alcova onde está o baú Na alcova, uma outra cadeira de balanço. Maria dos Anjos se senta Os meninos se colocam no chão sobre o tapete e o mais próximo possível do baú.

MARIA DOS ANJOS
Vicentinho, abra este baú e procure para mim um livro com capa marrom de couro. Ele está meio velho e sua capa está desbotada

Vicentinho abre a fechadura enferrujada do baú e levanta a sua tampa. Uma nuvem de poeira se forma. Depois que ela se dissipa, vê-se uma multitude de objetos. Viventinho vai retirando um a um e botando sobre o tapete. Um estribo velho, cabo de chicote, Ferro de engomar, Balangandans, Figa, Pulseira de Crioula, Corrente de crioula com pomba e roseta. Instrumento da paixao devoto, Oratório, Par de candelabros, uma imagem de um santo, lamparina, corda com nós, arreio de cavalo, e finalmente um livro amarelado.

VICENTINHO
É este livro

MARIA DOS ANJOS
É esse mesmo meu filho

Maria dos Anjos pega o livro. Lhe acaricia e abre suas páginas. Ela folheia um pouco antes de se dirigir aos meninos

MARIA DOS ANJOS
Vocês querem saber sobre o Dr Lund não é. Pois vocês vieram ao lugar certo. Estão aqui as palavras único amor que o Dr Lund teve nessa vida. Seu nome era Ofélia e isso aqui é o diário que ela escreveu

Os meninos se entreolham. Anita sorri satisfeita

ANITA
E como é que isso veio parar aqui?

Maria dos Anjos aponta para um porta-retrato em cima de uma prateleira. Uma foto de Chica, a mucama de Ofélia, já bem velhinha

MARIA DOS ANJOS
Aquela lá é minha vó. Francisca, ou Chica como o povo chamava

ANITA
Será que a senhora pode nos contar essa história

MARIA DOS ANJOS
Posso sim minha filha. É uma linda história de amor e aventura

RIO DE JANEIRO 1834

EXT. TERMINAL DO PORTO -- DAY

Mulato Henrique e Lund estão no terminal do porto

PETER LUND
Rapaz, para onde vamos?

Mulato Henrique sempre com um largo sorriso

MULATO HENRIQUE
Tenho ordem de levar o professor para o Museu de História Natural.

Mulato Henrique se apressa em pegar a bagagem que está perto de Lund

MULATO HENRIQUE
Vamos senhor ...

Lund estranha a atitude do escravo

PETER LUND
E minhas bagagens ?

MULATO HENRIQUE
Como ?

Lund aponta para uma montanha de caixas e malas no terminal.

EXT. RUAS DO RIO -- CONTINUOUS

Lund dá umas moedas para Mulato Henrique que corre até o outro lado da rua e fala com dois negros que estão encostados no muro. Depois de cochichar, ele volta com um largo sorriso e acompanhado dos dois negros.

MULATO HENRIQUE
Tudo resolvido senhor

EXT. RUAS DO RIO -- MOMENTS LATER

Mulato Henrique guia Lund e os carregadores pelas ruas. Enquanto os outros dois escravos fazem força, ele vai lépido a frente do grupo.

Lund olha para os lados e vê a imundice das ruas do Rio de Janeiro. Uma água escura escorre na sarjeta. Por todo o canto há todo tipo de lixo. No meio da rua excrementos de cavalos. De vez em quando ele cruza com mendigos negros, parecem velhos sempre com suas crianças no colo. Todos com aparência suja.

Enquanto Lund parece penetrar no inferno, Mulato Henrique segue faceiro.Por todo o caminho ele troca acenos com passantes e com conhecidos.

Um senhor branco conversa em uma esquina com uma mulata. Dois guardas passam com um negro acorrentado entre eles.

Um vendedor descalço oferece a Lund peixes secos em um tabuleiro. Lund recusa com um gesto e continua avançando na rua coalhada de gente. Aqui e ali se vê um homem branco, a maioria dos passantes são negros e pardos.

Os carregadores de bagagem tem que ser ajudados por Lund e por Henrique quando eles tem que subir uma ladeira. Henrique e Lund postam-se então ao lado do carreto e ajudam a impulsionar sobre o calçamento irregular e disforme da rua. O rosto de Lund está cada vez mais vermelho e sua roupa cada vez mais suja por conta do sol e do esforço de empurrar o carreto de bagagem.

Lund e Mulato Henrique cruzam com um grupo de negros que levam enormes samburás às costas. Sobre as camisas "brancas" dos negros, a partir do ombro, escorrem filetes escurecidos.

Lund puxa um lenço e o leva ao nariz. Ele acompanha os negros que levam os samburás até um pier onde cada um deposita o conteúdo de seus samburás no mar. Lund olha para Mulato Henrique.

MULATO HENRIQUE
Esses são os tigres

PETER LUND
Tigres ?

Mulato Henrique dá uma gargalhada

MULATO HENRIQUE
Merda senhor, eles levam merda

Lund vê passar correndo os tigres risonhos com os samburás vazios ainda pingando merda. Ele se afasta para os negros passarem correndo. O mesmo acontece por toda a rua, com todos se afastando quando os tigres passam gritando e rindo. Mulato Henrique percebe a perplexidade do Dr Lund.

MULATO HENRIQUE
Fique tranquilo Doutor, é tudo das casa grande. É tudo merda de sinhô e de sinhá.

Mulato Henrique e os dois negros riem, Lund não entende nada.

EXT. RUAS DO RIO -- MOMENTS LATER

Lund, Mulato Henrique e os carregadores finalmente chegam ao prédio do Museu

INT. MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL -- CONTINUOUS

Mulato Henrique guia Lund pelos corredores do Museu. Ele chega a uma sala, bate na porta e entra. Ele chama Lund.

MULATO HENRIQUE
Por aqui senhor

Ao avistar Lund que entra no salão, RIEDEL que está atrás de uma enorme mesa de trabalho se levanta. Ele olha para o estado lamentável em que se encontra Lund.

RIEDEL
Meu caro Professor Doutor Lund. Seja bem vindo. Vejo que teve uma viagem dura.

Riedel vai em direção de Lund. Mulato Hernrique, sempre com o sorriso no rosto, se afasta para o lado.

RIEDEL
Como não tinha informações exatas de sua chegada, enviei Henrique para ficar de prontidão no Porto

PETER LUND
De fato, fiquei esperando um tempo até que o seu escravo apareceu. Depois fui obrigado a alugar dois negros para trazer minha enorme bagagem...

Riedel estranha e olha sério para o Mulato Henrique que já não está mais sorrindo

RIEDEL
O senhor contratou ...?

PETER LUND
Sim, paguei 2 negros para trazer minhas bagagens. Depois chegamos aqui sem problema.

Riedel entende tudo e olha furioso para o mulato Henrique que já está saindo de fininho

RIEDEL
Vem cá negro preguiçoso que eu vou te passar no chicote. Onde é que tu estavas. Gastastes o dinheiro do carreto.. Vem cá...

Mulato Henrique sai correndo quando Riedel ameaça partir para cima dele. Lund não entende nada. Riedel volta e retoma a conversa com um sorriso amarelado

RIEDEL
Me desculpe Doutor Lund. Mas esse traste me tira do sério. Faço questão de reembolsá-lo.

Lund sorri

PETER LUND
Não é necessário. Com certeza o mulato qui ganhar um troco imaginando que minha bagagenm seria a de um viajante normal e a não de um cientista.

Riedel balança a cabeça

RIEDEL
Henrique nos foi deixado em herança por um dos nossos antigos benfeitores. Se ele soubesse os problemas advindos de sua generosidade....

Riedel indica a cadeira para que Lund se sente

PETER LUND
Como estão os preparativos para a nossa expedição ?

Riedel retira um charuto de uma caixa e oferece a Lund que põe a mão no peito e recusa. Riedel ascende o charuto.

RIEDEL
Dr Lund, estamos quase prontos. Já está tudo acertado com os equipamentos que o senhor me pediu, além da parelha de burros, mais 6 escravos carregadores e 1 cozinheira.

PETER LUND
e um mulato indolente.

Lund e Riedel riem.

RIEDEL
Segundo as especificações que recebi do senhor na última carta, não deveria gastar mais do que 5 mil coroas.

PETER LUND
Infelizmente vamos ter que começar com isso meu caro Riedel. O Museu da Dinamarca também não pode me oferecer muito mais. No entanto recebi promessas de sua alteza real de me enviar mais recursos dentro de 1 ano.

RIEDEL
De qualquer forma creio que temos o necessário para uma expedição profícua.

Riedel pisca para Lund

RIEDEL
Tenho certeza que esse dinheiro do rei de Dinamarca lhe será enviado. Nossa Expedição vai ser um sucesso

Lund sorri

PETER LUND
Sabe de uma coisa, acho que vou aceitar o charuto

Riedel pega a caixa e estende a Lund que pega um charuto. Riedel lhe ascende o charuto. Lund dá uma baforada e começa a tossir sem parar. Riedel lhe bate nas costas e sorri.

INT. MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL -- MOMENTS LATER

Riedel e Lund caminham pelos corredores do Museu de História do Rio de Janeiro. Ele entram em uma sala.

Na sala, ao redor de enormes mesas, homens trabalham sobre mapas. Nas paredes da sala, também estão afixados mapas de toda sorte

RIEDEL
Vamos ver o mapa. Eu venho estudando o itinerário. Venha ver

Riedel leva Lund para uma mesa onde estão vários mapas. Ele retira um grande mapa do Brasil.

RIEDEL
Depois de Petropolis sugiro que sigamos em uma linha reta até São Paulo através da serra

Lund concorda com a cabeça

PETER LUND
Estou de acordo. Ainda não encerrei minhas pesquisas na mata litorânea

RIEDEL
Pois bem. Atravessamos a serra até São Paulo e Campinas....

Riedel percorre com o dedo o caminho pelos mapas.

RIEDEL
Até aqui tudo bem. Podemos inclusive nos dar ao luxo de sair da estrada em alguns pontos e percorrer trilhas na serra em busca de material. As dificuldades vão começar no interior.

PETER LUND
Este país fica cada vez mais inóspito...

RIEDEL
...e desconhecido. Até Villa Franca podemos nos guiar por mapas mais ou menos confiáveis. A partir de Villa Franca, em direção a Província de Goiás, no coração da savana, vamos ter que contar, na melhor das hipóteses, com guias

PETER LUND
.. ou com mateiros na pior.

RIEDEL
Vão ser mais de 2 mil quilometros. O senhor está preparado ?

PETER LUND
Estou. Parece que ganho forças nesta terra.

Lund respira fundo

PETER LUND
Não se preocupe Sr Riedel, o Senhor está diante de um homem determinado. Estou decidido a obter sucesso nesta nossa expedição

RIEDEL
De qualquer forma uma expectativa já se forma aqui.

PETER LUND
Como assim?...

RIEDEL
Estamos sendo esperados em Petrópolis pelo Imperador e pelo Regente. Hoje o imperador faz aniversário

EXT. PALÁCIO IMPERIAL -- DAY

Riedel e Lund descem da carroagem. A entrada do casarão está bastante iluminada. Escravos vestidos com um colete vermelho e botões dourados postavam-se bem perfilados, postados de cada lado da escadaria que dá acesso ao Palácio.

Riedel e Lund sobem a escadaria.

No alto da escadaria, defronte a enorme porta, guardas imperiais fazem reverência aos convidados que chegam.

INT. PALÁCIO IMPERIAL -- CONTINUOUS

Dentro do salão um pequeno circo está montado. Cortesãos circulam entre engulidores de faca, contorcionistas, palhaços e malabaristas. Em um canto, semi encoberto por uma cortina, um elefante aguarda a hora de entrar.

Os dois amigos adentram no salão enorme e são logo recebidos pelo Marquês de Itararipe e senhora. Ele meio amorenado e de perucas brancas e já meio embriagado. Ela enorme de gorda e suando em bicas

MARQUÊS
Há quanto tempo Professor Lund... e profesor Riedel . É um prazer enorme revê-los

Riedel estende a mão ao Marquês. Ele faz uma deferência a Marqueza, que sorri e olha para Lund

RIEDEL
Sua majestade quer conhecer Lund...

O Marquêz estende a mão ao Dr. Lund. Lund repete o gesto de Riedel e cumprimenta a Marqueza

MARQUÊS
Seja bem vindo ao Rio de Janeiro. Então preparam uma expedição ao interior?

Enquanto Lund fala, a marqueza gorda não tira os olhos dele

PETER LUND
Procuro catalogar espécimes animais e vegetais ainda desconhecidos pela comunidade ciêntifica. Embora meu objetivo principal nessa expedição seja a botânica...

A marqueza interrompe

MARQUEZA
...espero que os cavalheiros também tenham tempo para aproveitarem os prazeres da corte

Ela pisca para Lund. O Marquês aponta o interior do salão

MARQUÊS
Senhores o nosso pequeno imperador vos aguarda

Enquanto Lund e Riedel saem, O marquês sai puxando a esposa pelo braço na direção de outros convidados que estão chegando.

O grande salão está repleto. A elite carioca rodopia ao som de uma valsa. Lund e Riedel são abordados por um negro que serve bebidas das mais variadas. Eles escolhem as bebidas e começam a circular

O grande salão de baile era decorado segundo a moda européia, cadeiras de estilo Luis XIV enfileiradas umas após as outras. As senhoras ocupam esse lado do salão e falam todas ao mesmo tempo, competindo com a valsa. Eles cruzam com um senhor meio afeminado que os cumprimenta

CONDE
Messieurs!

RIEDEL
Boa noite, Conde , permita-me apresentá-lo ao Dr. Lund eminente cientista dinamarquês, agraciado pela Academia em Copenhagem por suas pesquisas feitas no Brasil. Está iniciando junto comigo uma grande viagem ao interior

CONDE
Bon soir Monsieur

Lund acena com a cabeça

PETER LUND
Boa noite

CONDE
Nunca entendi esta sua turma Senhor Riedel.... Oh! Dieu, o Rio de Janeiro já me parece o fim do mundo o que se pode dizer do interior deste país, "quel enfer",

O conde põe a mão na testa e depois olha para Lund

CONDE
Os mosquitos vão devorá-lo, permita-me aconselhá-lo a levar em vossa viajem um artigo recém chegado dos Estados Unidos

Riedel e Lund tentam escapar do Conde efeminado que insiste

CONDE
Chama-se Filus e pode ser encontrado na rua do Ouvidor . Deve ser colocado antes do chapéu, não turva a visão e o senhor poderá expulsar esses insetos que não terão acesso a essa pele tão branca

Lund se esquiva do Conde

PETER LUND
Obrigado senhor, vou me lembrar

Riedel sai puxando Lund para o interior do salão. Riedel comenta

RIEDEL
Não sei o que é pior, os perigos da selva ou este empertigados brasileiros. Reparou como todos gostam de falar francês ?

PETER LUND
É verdade, que gente estranha. Fazia tempo que eu não via essas perucas brancas. Na Europa há muito que não se usa mais.

RIEDEL
Tudo o que já não tem mais uso ou serventia eles mandam para esses idiotas que compram tudo que lhes é oferecido. Basta vir da Europa, ou até mesmo dos Estados Unidos...

Uma jovem senhora passa pelos dois. Ela olha para Lund e sorri. Riedel comenta

RIEDEL
Parece que o senhor está fazendo um imenso sucesso por aqui. Eles não podem ver uma pele branca...

Lund e Riedel se aproximam de onde está o imperador D. Pedro II. JOSÉ BONIFÁCIO os vê e se aproxima

JOSÉ BONIFÁCIO
Senhores. Bem vindos. O imperador está ansioso por conhecer vocês

José Bonifácio cumprimenta Lund e Riedel

JOSÉ BONIFÁCIO
Venham por aqui.

INT. PALÁCIO IMPERIAL -- CONTINUOUS

José Bonifácio adentra um quarto. No chão, um menino observa atentamente um mapa do Brasil em relevo. Ele passa as mãos sobre as montanhas. Quando vê Bonifácio.

D.PEDRO II
Adorei esta mapa Regente . Foi o melhor presente que ganhei... a propósito, quem foi que teve a idéia idiota do circo...acham que eu eu sou um bebê...

José Bonifácio olha para Lund e Riedel e sorri.

JOSÉ BONIFÁCIO
Sua majestade quero lhe apresentar os Professores Lund e Riedel que estão em expedição pelo Brasil

O imperador sorri. Os dois fazem uma reverência.

D.PEDRO II
Vão viajar pelo Império. Que bom vão me trazer mais infromações. Mostrem aqui por onde vão

O imperador aponta para o mapa. Riedel acena para Lund

PETER LUND
Por aqui majestade.

Lund percorre com o dedo os locais

PETER LUND
A idéia é chegar até aqui.

D.PEDRO II
Vila Rica. O que vão estudar senhores ?

PETER LUND
Plantas e animais sua majestade

O imperador olha para José bonifácio com uma cara de "pidão". José Bonifácio acena negativamente com a cabeça

JOSÉ BONIFÁCIO
Sinto muito majestade. Não podeis sair da Corte neste momento

O menino faz uma cara de contrariado

D.PEDRO II
Vocês estão vendo senhores... ser imperador é não poder viajar quando se quer...

Lund e Riedel sorriem

PETER LUND
Não se preocupe majestade, virei contar pessoalmente tudo que vi.

EXT. PALÁCIO IMPERIAL -- NIGHT

Mulato Henrique chega com uma lamparina. Peter Lund e Riedel estão arriando os burros de montaria. A luz da lamparina ilumina os dentes de Mulato Henrique mostrados no indefectível sorriso

MULATO HENRIQUE
Tudo pronto professores.

Quando o grupo se prepara para sair. Um grupo se aproxima. Um menino de camisolas com uma tocha seguido por um negro e uma mula. Quando eles chegam mais perto dá para ver que é o imperador

PETER LUND
Majestade...

O imperador pede silêncio com ao dedo sobre os lábios

D.PEDRO II
Leve esta mula e este escravo com vocês. É um presente do imperador

Todos fazem uma reverência

D.PEDRO II
Me ajude a conhecer o meu país

O menino se vira e volta correndo para o interior do palácio

EXT. RUAS DE PETRÓPOLIS -- MOMENTS LATER

A expedição se põe em marcha. Montados em dois burricos Lund e Riedel estão no fim da caravana. A sua frente, escravos carregadores. Mais à frente a tropa de burros guiada pelo TROPEIRO JOAQUIM e seu filho pequeno EPAMINONDAS que corre de um lado para outro.

Na frente da caravana, o GUIA MAMELUCO e, mais a frente um pouco, Mulato Henrique, falante, sorriso largo, que cumprimenta a todos que vê

EXT. TRILHA NA MATA -- DAY

A caravana sobe a serra. Muitas vezes a trilha se fecha diante deles, os escravos pegam facões e vão abrindo a picada como podem. Lund e Riedel seguem a trilha no final do grupo puxando suas montarias. O grupo chega em uma clareira ao lado de um córrego. Os escravos depositam suas cargas. Epaminondas vem correndo curioso na direção de Lund, ele o observa com um vivo interesse. Lund seca com o lenço seu front suado. Acaricia o cabelo do moleque que se deixa acariciar. Mulato Henrique está conversando com um dos escravos que faz cara de "saco cheio" com o palavrório do mulato. Os homens dividem um bornal de água.

Quando os escravos descobrem novamente a trilha, a caravana retoma a marcha lenta.

Escravos recolhem suas cargas , os burros são emparelhados, e todos continuam a viagem.

O Guia mameluco que desbrava a trilha com o facão, o tropeiro, o guri, o Mulato Henrique que agora assedia a cozinheira, os carregadores e as mulas e no final, Riedel e Lund

Chegam a uma trilha que serpenteia uma montanha, eles sobem com morosidade, Lund olha o penhasco que se abre, do alto do cavalo a trilha parece ainda mais estreita do que é de fato, os cascalhos deslizam na ribanceira, Lund segue com os olhos a queda da pedra de sua origem até seu destino final.

A trilha se alarga e a subida continua, íngreme. As vezes é preciso descer do cavalo e puxá-lo. Os escravos sobem cantando um lamento.

A mata se fecha subitamente e a luz forte do dia enfraquece. A vegetação é densa a umidade se faz sentir. Riedel enxuga a testa. Lund afasta os mosquitos. Os escravos seguem resignados, o tropeiro altivo.

Dr. Lund segue sempre olhando para o chão em busca de espécimes interessantes.

EXT. TRILHA NA MATA -- NIGHT

Em torno da fogueira Lund e Riedel conversam

RIEDEL
Este país é mesmo uma sequência de surpresas. Já cataloguei 2 novas espécimes de orquídeas em apenas algumas dezenas de horas de caminhada. Acho que para uma delas vou ter que inventar um nome pois trata-se de um espécime não catalogado.

PETER LUND
Parabéns... e a formiga que encontrei. Já lhe mostrei ?

RIEDEL
Não

PETER LUND
É quase do tamanho da minha mão.

Lund se levanta e vai até a barraca. Ele volta com uma caixinha na mão. Ele se senta de novo ao lado de Riedel e abre a caixa. Dentro, fincado com um alfinete, uma formiga gigantesca.

RIEDEL
Meu Deus do céu....você viu o formigueiro?

PETER LUND
Não. O monstro estava solitário, passeando sobre meu bornau quando paramos da última vez. Tenho que ver meus catálogos para ver o espécime. Acredito que seja um macho a procura de sua rainha.

RIEDEL
Extraordinário, a gente se depara a todo instante com descobertas. Aqui, o que cremos ser uma chance se produz a uma sequência repetitiva e previsível. Este país é para um botânico assim como uma confeitaria é para uma criança.

PETER LUND
Ou como um salão de baile é para a nossa nobreza desocupada.

Os dois riem. Neste momento chega Mulato Henrique. Riedel comenta.

RIEDEL
Falando em desocupados.

Mulato Henrique chega sorrindo.

MULATO HENRIQUE
A nossa cozinheira já está chamando. Ela preparou uma comidinha
(segurando o lóbulo da orelha)

RIEDEL
Que é que tu sabe, ô Mulato indolente. Andaste provando a comida do teus senhores.

Mulato Henrique para de sorrir. Lund comenta descontraidamente

PETER LUND
Mulato Henrique tu és o único escravo no Brasil que janta antes dos senhores. Como é que tu consegues ?

Mulato Henrique ameaça responder mas Riedel lhe ameaça com o chicote

RIEDEL
Sai daqui traste e não ouses responder se não te amarro num burro desses e te arrasto pelos pés a viagem inteira.

Mulato Henrique se afasta enquanto Lund e Riedel se dirigem ao "refeitório".

EXT. TRILHA NA MATA -- CONTINUOUS

A cozinheira, com ajuda de dois escravos, deposita um enorme caldeirão sobre um girau situado sob uma enorme árvore onde estão pendurados vários lampiões.

Ela olha para Riedel que acena com a cabeça. Ela pede a outro escravo que comece a servir os escravos que se amontoam em volta do caldeirão.

A cozinheira pega uma outra panela e se dirige a Riedel e a Lund que se acomodam em uma mesa de campanha alguns metros adiante

COZINHEIRA
Os sinhô pode comer desta aqui

Enquanto Lund, aristrocráticamente , arruma um guardanapo nas pernas, Riedel já atacou a gamela, enchendo o prato com generosas colheiradas de uma pasta disforme. A cozinheira volta com pão, frutas, embutidos e uma garrafa de vinho e coloca na mesa. A cozinheira ascende um lampião que está pendurado. Lund ainda cheira a comida antes de, desconfiado, dar a primeira garfada. Ele faz uma cara de quem aprova.

EXT. TRILHA NA MATA -- MOMENTS LATER

Em um canto do acampamento, ao lado de uma pequena fogueira, um grupo de escravos batuca e canta.

Sentados a beira da fogueira, Riedel oferece a última dose de vinho da garrafa a Lund. Riedel serve o companheiro e depois a atira na fogueira a garrafa vazia. Riedel já começa a ficar embriagado

RIEDEL
É uma vida muito dura essa que levamos. Viagens intermináveis em busca de verdades irrisórias e glórias minúsculas.

Lund sorri

RIEDEL
Palmas para Riedel que descobriu mais um inseto no fim do mundo... Seu prêmio ? Uma citação em um rodapé do livro de um figurão qualquer

PETER LUND
O senhor está muito ácido Sr Riedel. Nossas descobertas não devem ser mensuradas pelo prestígio que nos trazem. Descobrir insetos no fim do mundo, como o senhor diz, é importante pois completa o trabalho de inventário da Criação. O senhor tem o seu papel...

Riedel o interrompe amavelmente

RIEDEL
O senhor sabe quanto tempo eu não vou a Europa ? ... quase dez anos.

PETER LUND
É muito tempo realmente

RIEDEL
Nem diga. Estou há tanto tempo no Brasil que algumas sensações, gostos, odores e até sentimentos, não são mais que uma mera lembrança

Riedel se levanta meio cambaleante da cadeira. Ele pega mais uma garrafa de vinho que está sobre uma mesa de campanha mais adiante. Antes de sentar dá um enorme gole no gargalo mesmo. Depois ele serve Lund que lhe apresenta o copo

RIEDEL
Cereja. Gostaria de comer uma cereja agora. Qual é o gosto da cereja Sr Lund

PETER LUND
O senhor está nostálgico. O vinho, as novidades da Europa...mas não deixe que este sentimento se transforme em tristeza... A ciência não combina com emoções, muito menos com assuntos de foro pessoal

Riedel ri antes de responder

RIEDEL
Duvido que se possa fazer algo sem emoção

Lund não responde

RIEDEL
... são dez anos de Brasil. Se o senhor ficar mais algum tempo vai descobrir o quão incovenientes podemos nos tornar... Não existe nada de foro pessoal ou íntimo nesse país....nada que os escravos da casa não comentem depois na cozinha

Riedel tenta se levantar e não consegue. Lund o ampara

RIEDEL
Sem formalismos professor, estamos no Brasil

Ele começa a berrar

RIEDEL
Henrique ! Henrique !

O Mulato vem correndo

RIEDEL
Venha aqui inútil e me leve para a minha barraca...

Henrique dá um grande sorriso e pisca para Lund que sorri de volta. Ele pega Riedel pelo braço e acompanha o cientista cambaleante até sua tenda

Lund toma um outro gole de sua caneca e olha o céu estrelado. Ele procura entre as estrelas até achar o Cruzeiro do Sul

EXT. TRILHA NA MATA -- MORNING

O Tropeiro toma o último gole de sua caneca e joga o resto na fogueira.

Seu filho Epaminondas sorri com o efeito que a água causa na fogueira e repete o gesto, toma um gole na sua caneca e cospe metade em si mesmo e metade na fogueira.

O Tropeiro já está a caminho. O menino sai correndo atrás do pai

A expedição se põe em marcha novamente. No final da fila, Riedel de "ressaca" segue o grupo em cima de sua mula.

EXT. LEITO DE RIACHO -- DAY

A caravana deixa mata e sai sobre o leito de um riacho.

Lund está sempre absorto ao contemplar a natureza exuberante do lugar.

Lund faz a expedição parar. Sobe a ribanceira e se posta sob uma enórme árvore. Ele chama

PETER LUND
Riedel...

Riedel responde lá embaixo

PETER LUND
Mande um escravo.

O escravo sobe abrindo passagem entre arbustos. Lund aponta para árvore.

PETER LUND
Está vendo aquela planta lá em cima, grudada no tronco, pegue-a para mim

O escravo assente e sobe na árvore. Lá no alto ele colhe a bromélia e desce. Na descida ele também colhe uma orquídea.

Lund recolhe as plantas e as colocas em sua sacola depois de dar uma moeda e um tapinha nas costas do escravo que sai sorrindo

A caravana volta a avançar. As dificuldades aumentam a medida que o córrego se alarga e a correnteza no sentido contrário à eles se faz sentir cada vez mais forte.

Impossível prosseguir, eles são então obrigados a subir mais uma vez a ribanceira e abrir picada pela margem.

Os escravos e as mulas costeam as margens abrindo picada na mata, Lund, Riedel, o tropeiro carregando seu filho avançam em seguida.

Eles avistam uma queda d água com uma espécie de escorregador natural feito de pedra e limo que acabavava em um lago pouco profundo.

O tropeiro e Epamaminondas são os primeiros a tirar as botas e cair na água. Lund, Riedel e depois toda a tropa se divertem nos escorregadores.

EXT. TRILHA NA MATA -- DAY

A expedição caminha na trilha. O guia e Mulato Henrique vão na frente. Logo atrás Riedel e Lund, logo após os carregadores, o tropeiro com os burros amarrados uns aos outros e no fim Mulato Henrique, a Cozinheira e o menino Epaminondas.

EXT. TRILHA NA MATA -- AFTERNOON

Lund está a espreita. De repente ele captura uma enorme vespa com sua rede. Ele retira o bicho da rede, o pega pelas asas e o examina a contra luz. Depois ele o coloca em um vidro. Ele sorri satisfeito. Lund continua sua caminhada no meio da mata

EXT. ACAMPAMENTO -- AFTERNOON

A beira de um córrego, a Expedição de Lund e Riedel acampa. Enquanto os escravos arrumam as barracas, os burros pastam, a cozinheira e mais um ajudante estão nos seus afazeres. Mulato Henrique toma banho no córrego enquanto Lund e Riedel trabalham em uma mesa de campanha. Riedel mostra anotações para Lund

INT. TENDA DE LUND -- NIGHT

À luz de velas, Lund compara as ranhuras de uma folha. Ele anota suas observações em um livro. Ele dá um grande bocejo. Ele se levanta da cadeira e se espreguiça. Ele guarda as folhas. Fecha o livro. Deita na cama de campanha e, por fim, sopra e apaga a vela

EXT. MATA -- NIGHT

Relâmpagos cortam o céu da Mata Atlântica. Uma chuva fina começa a cair. Rapidamente ela se torna uma chuva torrencial.

EXT. ACAMPAMENTO -- NIGHT

O acampamento de Lund está sob a chuva na madrugada

INT. TENDA DE LUND -- MORNING

Vários objetos já estão boiando na tenda de Lund.

Lund desperta com a gritaria. Quando ele percebe que sua tenda está inundada ele se levanta e sai.

EXT. ACAMPAMENTO -- CONTINUOUS

Fora da barraca, sob uma chuva torrencial, Lund vê a correria dos companheiros de expedição.

O Tropeiro, com o filho Epaminondas nos ombros procura um lugar seco nos barrancos. Ele deixa o filho na mata e volta para o seu carreto.

Os escravos estão retirando as mulas que estão amarradas em árvores e já estão com água nas patas.

Riedel vem correndo em direção a Lund que está sem saber o que fazer diante de sua barraca

RIEDEL
Temos que levar o material para a mata. O rio está subindo rápido.

Lund retorna a sua barraca.

INT. TENDA DE LUND -- CONTINUOUS

Lund começa a recolher suas coisas. Ele recolhe mapas, seus escritos, objetos e alguns espécimes que estão na barraca.

EXT. ACAMPAMENTO -- CONTINUOUS

Lund sai e corre até a mata e deposita o que recolheu do lado de outras coisas que já estão amontoadas.

Lund volta correndo. Ele cruza com Henrique que também corre para salvar algumas coisas.

Muitos caixotes já estão descendo a correnteza. Lund se precipita para pegá-los.

Riedel o ajuda a retirar um caixote da água, enquanto outro caixote se distancia córrego abaixo.

Uma parte das mulas já está na mata enquanto os escravos tentam retirar as mulas que faltam. Riedel e Lund chegam a mata com mais caixotes.

De repente um estrondo. Lund e Riedel se olham. O tropeiro começa a gritar.

TROPEIRO
Enxurrada !!! Enxurrada !!!

Os escravos saem correndo enquanto o barulho aumenta.

Logo depois, uma torrente d água , escura, carregando todo tipo de detrito da mata, aparece na curva do córrego. Da mata Lund arregala os olhos. Dois escravos ainda tentam retirar uma mula. Eles são levados pela enxurada sob o olhar incrédulo da expedição

EXT. TRILHA NA MATA -- DAY

Riedel e Lund fazem o inventário do que sobrou. Ainda chove, mas a intensidade da chuva é menor. Eles voltam a arrumar e dividir o restante do carregamento.

PETER LUND
Meu Deus o que é isso ? Nunca vi nada igual

RIEDEL
Nem eu.

PETER LUND
Como está o moral ?

RIEDEL
Todos estão abalados. Tive que falar com eles.

PETER LUND
Temos que continuar nosso caminho. Perdemos muita coisa ?

RIEDEL
Uma parte dos mantimentos e alguns caixotes que continham espécimes

PETER LUND
Vamos seguir mesmo assim. Não podemos retornar agora

RIEDEL
Claro que não. Vamos em frente

Riedel e Lund se dirigem ao que restou da expedição. Os escravos estão reunidos confabulando em um canto. Henrique também está com eles. Ao avistar Lund e Riedel, Henrique se dirige a eles.

MULATO HENRIQUE
Os carregadores se recusam a seguir antes que sejam dadas sepulturas aos dois escravos que foram arrastados

RIEDEL
O que é isto uma sedição ?

PETER LUND
Como vamos achar os corpos ? Devem estar a quilômetros daqui

MULATO HENRIQUE
Eles querem permissão para que dois deles possam descer o rio em busca dos corpos

RIEDEL
De maneira alguma !!!!

Lund fica pensativo

PETER LUND
Como terei garantias de que voltarão

Henrique dá de ombros indicando que não pode garantir nada

PETER LUND
Deixe eles irem. Mas que voltem em no máximo dois dias, senão farei denúncia de fuga.

Henrique volta para avisar o pessoal. Riedel olha surpreso para Lund

RIEDEL
O senhor acha que fez a coisa certa?

PETER LUND
Não sei. Mas não posso impedir que tentem sepultar os seus. Vamos ver o que acontece. De qualquer forma eles estavam se recusando a partir.

RIEDEL
Nada como uma boa reprimenda (balançando o rebenque)

PETER LUND
Senhor Riedel. Não creio que os escravos vão trocar as moedas que lhes ofereço nesta viagem por uma vida incerta de foragidos. Eles voltarão

EXT. CÓRREGO -- DAY

Os dois escravos descem o leito do rio. Com água pela cintura eles observam os estragos que a torrente causou nas margens. Árvores retorcidas e arrancadas pela raís. Depois de uma curva eles encontram o cadáver de uma mula. Mais abaixo um caixote e restos de uma barraca. Mais a frente, enfim, um dos cadáveres pendurado em uma das árvores. Mais abaixo o outro homem, metade do corpo enterrado na lama.

EXT. TRILHA NA MATA -- DAY

Os escravos cantam uma melodia diante da sepultura dos dois homens. Lund e Riedel observam de longe.

EXT. FAZENDA DE CAFÉ -- DAY

A tropa de Lund está em frente a imponente porteira de uma fazenda de café. Um menino negro vem correndo abrí-la. A expedição atravessa a porteira

EXT. FAZENDA DE CAFÉ -- MOMENTS LATER

Nas escadarias de um enorme casarão colonial, o Barão, acaráter, sua esposa, todos os seus filhos e uma dezena de escravos todos vestido de linho branco recepcionam aguardam que Riedel e Lund desmontem . O barão avança para os recepcionar

BARÃO
Sejam bem vindos, é uma honra recebê-los em minha casa

O Barão cumprimenta efusivamente Riedel, com um abraço forte que "espreme" o alemão

BARÃO
Que bom que aceitaste o meu convite para os festejos de Natal

RIEDEL
Obrigado pela hospitalidade Senhor Barão. Deixe-me apresentá-lo ao professor Lund, o eminente estudioso dinamarquês que lhe falei na carta

O Barão cumprimenta Lund da mesma forma

INT. CASARÃO DE FAZENDA -- NIGHT

Uma escrava carrega um leitão assado. Ela atravessa a porta da cozinha e anda um corredor enorme. Ela atravessa mais um aposento e depois mais outro até chegar em uma enorme sala.

O leitão "voa" até uma enorme mesa onde já estão centenas de pratos diferentes em uma profusão de cores e formatos.

INT. CASARÃO DE FAZENDA -- MOMENTS LATER

O violinista está lutando contra uma enorme mariposa que insiste em sobrevoá-lo atraído pelas luzes da lamparina.

O regente da pequena orquestra levanta a batuta. Ao seu comando a pequena orquestra começa a tocar

Os comensais já estão sentados na enorme mesa de mais ou menso 40 lugares. Escravos em colete se situam atrás de cada mesa, prontos a intervir.

Lund conversa com a Baronesa enquanto Riedel conversando com o Barão, gesticula com uma costeleta de porco na mão.

Na janela, do lado de fora, Henrique espia o festim.

EXT. CASARÃO DE FAZENDA -- CONTINUOUS

No parapeito da enorme janela, Henrique observa. neste momento chega uma escrava com um enorme prato. Henrique sorri e aproveita a deixa

HENRIQUE
Que alma boa. Só alguém como você para me ajudar... você sabe, não tive a sorte de ter um senhor bondoso como o seu

A escrava faz uma cara de compadecida. Henrique continua já com uma coxa de galinha na boca

HENRIQUE
A minha vida é muito dura... eu já mostrei as marcas de chicote em minhas costas

EXT. FAZENDA DE CAFÉ -- DAY

emontado em um belo cavalo, o Barão leva Lund e Riedel até a porteira. Todos se despedem

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

A caravana reduzida segue seu caminho. Eles estão agora em uma trilha em pleno cerrado.

O tropeiro arrastando sua carroça com a ajuda dos empurrões da cozinheira, fecha a fila levantando poeira no por do sol.

EXT. CERRADO -- DAY

Lund percorre com os dedos em cima do mapa o itinerário que a expedição já cumpriu. Ele aponta para o rio São Francisco representado no mapa.

EXT. RIO SÃO FRANCISCO -- DAY

A tropa chega a beira do enorme Rio.

Enquanto embarcam as mulas em uma balsa, Lund percorre as margens do Rio a alguns metros dali.

EXT. RIO SÃO FRANCISCO -- MOMENTS LATER

A tropa agora a atravessa o enorme rio a bordo de uma balsa. Um barco ao lado com remadores segue puxando a balsa em direção a outra margem. Lund e Riedel conversam.

EXT. CURRUTELA -- DAY

Sob um sol causticante, Lund e Riedel já com os rostos bastantes castigados pela longa viagem, fazem um inventário dos mantimentos sob um árvore ao lado de uma vendinha miserável a beira da estrada.

A paisagem, os personagens, tudo é meio avermelhado, da cor da poeira que se desprende de tudo.

Henrique descansa ao lado dos senhores. Em uma sombra mais adiante, o tropeiro está deitado no colo da cozinheira enquanto o menino Epaminondas tenta subir na árvore.

RIEDEL
A partir deste ponto a viagem vai ficar mais difícil

Henrique pensa alto

MULATO HENRIQUE
Mais difícil ainda...

Riedel abre um mapa.

RIEDEL
Nosso destino é a vila de Curvelo. São 400 KM talvez 500 com muito poucos recursos no caminho.

PETER LUND
Mas o mapa mostra algumas vilas no meio do caminho

RIEDEL
Temo que algumas sejam, fantasmas ou tenham apenas o suficiente para si mesmas.

PETER LUND
Vamos enviar algumas mulas de volta com o que já dispomos. Vamos seguir em grupo reduzido.

Da venda miserável sai um velho homem que vai até embaixo do pequizeiro e oferece uma jarra de água a Lund e Riedel. Ele deixa a jarra caminha até a porta. Antes de entrar ele bate as mãos na pernas para limpar as mãos. Uma poeira vermelha se despreende da calça do velho.

INT. BIROSCA -- MORNING

Lund fecha um envelope e o coloca em uma das caixas. Ele carrega a caixa para fora da birosca.

EXT. CURRUTELA -- MORNING

O grupo se separa . Enquanto Lund, Riedel, Henrique e mais 3 carregadores avançam com 3 mulas. O tropeiro, com a carroça cheia retorna, em companhia de mais duas mulas dois escravos, a cozinheira e o menino Epaminondas que, sentado na trazeira da carroça, acena dando adeus para Lund

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

Lund e Henrique conversam

MULATO HENRIQUE
Gostaria de lhe fazer uma pergunta Dr Lund....

PETER LUND
Pode falar Henrique

HENRIQUE
Quando vai acabar a nossa viagem ?

Lund se surpreende com a pergunta

HENRIQUE
Desculpa lhe perguntar. Mas o Senhor Riedel me prometeu a liberdade logo após esta viagem. Ele disse que vai me comprar do Museu e me dar a alforria

PETER LUND
Parabéns Henrique.... Estamos a meio caminho de Ouro Preto. Acredito que mais algumas semanas e estaremos encerrando nossas pesquisas

Henrique sorri satisfeito. Os dois voltam a caminhar lado a lado. Depois de algum tempo

HENRIQUE
Professor.... posso lhe fazer uma outra pergunta

PETER LUND
Sim...

HENRIQUE
Eu sempre quis fazer esta pergunta....

PETER LUND
Não se acanhe, pode fazer...

HENRIQUE
Qual a diferença entre eu e o senhor?

Lund estranha

HENRIQUE
....Quero dizer ... entre os negros e os brancos... o senhor sabe... muitos dizem que nós negros somos escravos porque os brancos são melhores que nós. Qual a diferença entre nós Doutor ?

Lund está embaraçado. Ele dá de ombros

PETER LUND
Sinto muito Henrique..

Henrique olha sério para Lund enquanto se afasta

INT. BARRACA -- NIGHT

Lund escreve

COPENHAGEN 1835

INT. CAFÉ EM COPENHAGEN -- DAY

Kierkegaard lê a carta enquanto toma seu chá na varanda de um café

PETER LUND
Caro primo, quando receberes esta carta, certamente nossa Copenhagen já estará livre do vento cortante que congela o corpo e alma. Escrevo pensando em nossas caminhadas sob o sol morno de Copenhagen. Naqueles dias em que a luz e o calor do sol estão na medida certa, nem frio, nem quente, somente prazer.

Kierkegaard interrompe a leitura para cumprimentar um militar que passa perto de sua mesa em companhia de uma jovem senhora. Depois ele volta a leitura

PETER LUND
Escrevo em meio ao nada. Nossa viagem fica cada vez mais dura. Os resultados são bons a despeito do esforço e da fatiga. Deveria estar satisfeito. Tudo que planejei está se confirmando. Contudo uma grande melancolia me invade.

Kierkegaard toma mais um gole do seu chá

PETER LUND
O jovem e brilhante cientista que saiu de Copenhagen em busca de sucesso e sabedoria, o homem que saiu determinado a deixar seu nome na ciência, este homem hoje se perguntou: O que eu estou fazendo aqui ?

INT. BARRACA -- CONTINUOUS

Lund pinga sua caneta no tinteiro.

PETER LUND
Henrique, o escravo de Riedel, veio hoje me falar. Ele me perguntou qual a diferença entre nós. Pois acredite, sua pergunte me congelou. As diferenças são tão grandes e ao mesmo tempo tão ínfimas que eu não soube responder. Devia ter dito que o que nos separa é a liberdade. Enquanto para mim ela é um conceito, para ele é apenas uma esperança. Devia ter dito alguma coisa. Uma palavra amena ou mesmo um incentivo.

EXT. CAFÉ EM COPENHAGEN -- CONTINUOUS

Kierkegaard afasta com um aceno um mendigo que estva na mesa ao lado e que estava vindo lhe importunar. Com o aceno o mendigo balança a cabeça e se retira, indo pedir na mesa seguinte

PETER LUND
Mas a vergonha me paralizou. Neste ponto a diferença entre nós se tornou clara: ele não é culpado de nada...

Kierkegaard fecha a carta. Ele toma o último gole de seu chá, deixa uma moeda na mesa e se levanta. Ele sai pelas ruas de Copenhagen em um dia claro e radiante

MINAS GERAIS 1935

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

O sol caustica a expedição. Lund vira o cantil vazio em busca de água. A poeira vermelha domina o ambiente e nada se move no cerrado além da expedição.

EXT. TRILHA NO CERRADO -- AFTERNOON

A expedição está parada ao pé de uma pequena colina. Uma fumaça espessa sai de trás da colina. Riedel e Lund sobem a colina para ver o que está acontecendo.

EXT. COLINA -- CONTINUOUS

Riedel e Lund chegam ao topo da colina. O que eles vêem os aterroriza. Uma coluna de fogo de dezenas de quilômetros de extensão avança na sua direção.

RIEDEL
Minha nossa.... estamos cercados.

PETER LUND
Temos que chegar ao riacho

Lund e Riedel descem correndo da colina. Riedel grita

RIEDEL
Para o rio... temos que voltar para o rio...

Os escravos e Henrique iniciam o caminho de volta. Eles andam apressados puxando as mulas. Riedel e Lund pegam suas montarias e fazem o mesmo.

EXT. TRILHA NO CERRADO -- MOMENTS LATER

O barulho do mato queimando é cada vez maior. A fumaça está cada vez mais perto. Bichos cruzam a estrada à frente da expedição. A caravana aperta o passo. Riedel está resfolegante. Lund também tem dificuldades para respirar.

Os escravos já não esperam os seus senhores e correm em um salve-se quem puder.

Henrique fica para ajudar Lund e Riedel que estão mais atrás. A fumaça branca já invade a paisagem.

MULATO HENRIQUE
Temos que correr...

Lund não consegue falar nada.

Eles voltam por uma trilha pedregosa onde é difícil a locomoção. Lund finalmente tenta correr. Mulato Henrique faz o mesmo.

Lund puxa seu burrico e, junto com Herique, vão deixando Riedel para trás.

Riedel está em dificuldades.

A fumaça impede que ele respire e também lhe atrapalha a visão. Ele cai.

O burro lhe atropela e sai correndo o deixando desacordado.

O burro passa por Lund e Henrique que, finalmente olham para trás. Riedel está caído e o fogo avança atrás dele.

Uma árvore cai na trilha bem atrás de Riedel.

PETER LUND
Continue Henrique.. vou buscá-lo

Lund volta atrás de Riedel que está desmaiado. Ele arrasta o companheiro. Uma outra árvore ameaça cair. Um dos galhos cai bem a frente de Lund que tem enormes dificuldades de arrastar Riedel que continua desacordado.

O fogo já está bem próximo e o calor é intenso e Lund não consegue arrastar Riedel.

É quando surge Henrique que aparece em socorro dos dois. Com a ajuda de Lund eles carregam Riedel.

Mulato Henrique põe Riedel nos ombros. Todos continuam o caminho até o rio em um passo apressado.

EXT. RIO -- CONTINUOUS

Dentro do Rio a expedição olha o fogo devorar as margens. Os burros fugiram e agora só restam Lund, Riedel, Henrique e 2 escravos. Riedel se recupera apoiado em uma pedra no rio.

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

Os seis homens caminham em uma trilha. Dos dois lados da trilha, a vegetação completamente calcinada que se estende a perder de vista

EXT. ACAMPAMENTO -- NIGHT

Lund, Riedel e Henrique estão conversando. Todos estão bastante maltratados pela aventura e mais parecem maltrapilhos do que cientistas

RIEDEL
Estou preocupado com os mantimentos

PETER LUND
Quanto ainda nos resta Henrique

MULATO HENRIQUE
Dois dias, talvez três

RIEDEL
Queira Deus que o vilarejo não esteja deserto

EXT. VILAREJO ABANDONADO -- DAY

Ao lado da estrada 4 ou 5 casas formavam o vilarejo abandonado. A caravana "Brancaleone" chega ao meio do vilarejo. Riedel entra em uma casa. Henrique entra em outra. Lund e os escravos aguardam de fora. Os dois saem

PETER LUND
Nada...?

Lund abre um mapa e chama Riedel

PETER LUND
O que você acha

RIEDEL
A situação não está nada boa

Riedel mostra no mapa

RIEDEL
O próximo vilarejo está a mais de 100 Km e nada me faz crer que ele não esteja em situação semelhante a este

Henrique aparece

MULATO HENRIQUE
Os poços estão secos

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

O grupo se arrasta pelo cerrado. Os escravos já não carregam mais nenhum peso e avançam atrás de Lund e Riedel que lideram a expedição.

EXT. VILAREJO FANTASMA -- NIGHT

O grupo chega a uma currutela parecida com a anterior. Com o fogo de tochas o grupo ilumina os casebres abandonados

EXT. VILAREJO FANTASMA -- MORNING

Amanhece na currutela e a expedição não está em movimento. Os homens estão estirados no chão, encostados nas paredes dos casebres. Lund está sentado sem forças. Riedel dorme encolhido ao seu lado.

EXT. VILAREJO FANTASMA -- DAY

O sol está a pino e o grupo permanece imóvel. Agora todos estão sentados. Henrique tenta beber água de uma bolsa mas ela está vazia. Ele volta a se deitar. Riedel continua dormindo encolhido. Lund olha para Riedel que parece muito doente e não tem forças. Henrique se aproxima

MULATO HENRIQUE
Um dos escravos está muito doente

PETER LUND
Riedel está mal também. Temos que encontrar comida Henrique. A vila não pode estar muito longe... amanhã eu vou partir em busca de ajuda

EXT. TRILHA NO CERRADO -- DAY

Lund está estirado na beira de uma estrada.

EXT. TRILHA NO CERRADO -- MOMENTS LATER

Alguém a cavalo se aproxima. Lund vê a contraluz, um homem descer do cavalo. Ele está de chapéu e vem em sua direção. O homem tira o chapéu e aparece uma vasta cabeleira loira. O homem se aproxima mais ainda e Lund vê seus olhos azuis. Lund fala em dinamarquês

PETER LUND
Soren, meu primo, que tal um passeio pela Dansk Platz....

COPENHAGEN 1835

INT. CASA DE KIERKEGAARD -- DAY

Soren vai a janela e vê a nevasca. Ele retorna a sua escrivaninha. Ele se senta abre seu bloco e escreve para Lund

KIERKEGAARD
Meu caro primo. Tuas cartas são para mim uma viagem ao novo mundo. O relato das pessoas, paisagens, flora e fauna, mais parecem as notas de um escritor do que o inventário de um cientista. Vá em frente meu primo. Nenhum obstáculo faz frente a um homem que acredita no que faz. A ciência agradece, teus amigos se orgulham. No mais devo dizer que teu nome circula cada vez mais na imprensa que adora a mistura de ciência e aventura...

MINAS GERAIS 1835

EXT. TRILHA NO CERRADO -- CONTINUOUS

Peter Claussen chega bem perto de Lund

CLAUSSEN
Que diabos este dinamarquês está fazendo neste fim de mundo..

INT. CASA DE CLAUSSEN -- DAY

Mulato Henrique cuida de Riedel que está se convalescendo na cama. Ele ajuda Riedel a tomar uma sopa quando Lund e Claussen entram no quarto.

CLAUSSEN
Vejo que nosso alemão sobreviveu ao sertão

PETER LUND
Riedel este é Peter Claussen.. ele nos recolheu no vilarejo

Riedel assente com a cabeça.

PETER LUND
Veja que coincidência... ele também é Dinamarquês. Encontrar um compatriota aqui é realmente incrível

Claussen chega perto da cama. Com o rebenque ele afasta Henrique

CLAUSSEN
Seja bem vindo Dr Riedel.É uma honra recebê-lo em minha casa...

Riedel estende a mão

RIEDEL
É reaslmente uma surpresa.... pensei que não iríamos conseguir..

CLAUSSEN
Realmente foi por pouco Professor... mas agora está tudo bem... fique e se restabeleça.

INT. CASA DE CLAUSSEN -- NIGHT

Peter Claussen e Lund jantam.

EXT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- EVENING

Peter Lund e Riedel passeiam de braços dados pelos domínios de Claussen. Riedel, em convalescência, se apoia em Lund enquanto caminham sob o por do sol

INT. CASA DE CLAUSSEN -- MORNING

Mulato Henrique conversa ao pé de ouvido com a cozinheira. Eles estão preparando a mesa do café. Mulato Henrique cochicha algo. A cozinheira sorri.

INT. CASA DE CLAUSSEN -- MOMENTS LATER

Peter Claussen, Riedel e Lund tomam o seu café da manhã. Sob a mesa farta e abundandante, uma multitude de frutas, queijos, pães e quitutes. Riedel come com vontade. Lund e Claussen conversam

CLAUSSEN
Depois do café venha comigo Professor Lund, quero lhe mostrar algo

Lund assente com a cabeça

EXT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- CONTINUOUS

Claussen guia Lund da Casa Grande para um galpão. No caminho eles passam por alguns escravos que estão sendo levados pelo capataz. No meio do caminho entre a casa e o galpão está um tronco de punição. Claussem passa "batido" mas Lund observa as correntes amarradas no tronco.

INT. GALPÃO DE CLAUSSEN -- CONTINUOUS

Claussen e Lund entram no galpão.

As paredes vazadas do galpão ao mesmo tempo em que deixavam a luz penetrar, também enchiam o ambiente de sombras.

Claussen e Lund atravessam o galpão que está entulhado de ferramentas pesadas, montes de pedras, bichos empalhados, mais pedras e alguns montes cobertos de lona. Eles chegam ao fim do galpão onde uma extensa bancada vai de lado a lado da construção. Em cima da bancada um monte de ossos e fragmentos de porcelana.

Mais ao canto um homem dorme . Ao seu lado uma garrafa de pinga. Quando Claussen vê a cena e le parte para cima do homem e o acorda a pontapés

CLAUSSEN
Brant seu miserável...bebendo de novo...

BRANT acorda assustado e se encolhe diante da fúria do seu patrão

CLAUSSEN
... eu devia lhe mandar pro tronco como esos escravos...anda sai daqui...

Brant se levanta correndo e sai. Lund ainda assustado com a violência e rudeza da cena olha para Claussen como que pedindo uma explicação

CLAUSSEN
Desculpe Professsor Lund...esse noruegês não nega a raça ...é um bêbado, o senhor conhece os noruegueses, não se pode nunca confiar neles...

PETER LUND
Mas como ele veio parar aqui ?

CLAUSSEN
É um bêbado que vaga por Minas já faz um tempo. Estava preso por dívidas em Sabará . Paguei suas dívidas e o touxe para cá. Ele me serve de secretário e organiza minhas pesquisas...mas vamos ao que interessa.

Claussem retira um osso que está debaixo de um pano

CLAUSSEN
...olhe aqui professor, diga o que acha ...

Lund se interessa imediatamente. A primeira vista parecia o osso de um cavalo ou boi. Mas a espessura e o tamanho intrigam Lund que manuseia o osso com cuidado e atenção

PETER LUND
Do que se trata Sr Claussen...muito interessante nunca vi algo destas dimensões...exceto no Museu de História Natural.. mas petenciam a animais extintos

CLAUSSEN
Na mosca Professor. Esta região é uma mina de osso.. digo de ouro

PETER LUND
Desculpe Sr..

Lund pega o osso. Suas feições se transformam. Pode-se ver que ele ficou muito impressionado.

Ele observa mais ossadas da coleção de Claussen. Cada peça que observa, ele trata com respeito, mas que não deixa de ser um brinquedo na mão de um criança.

EXT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- DAY

Peter Claussen caminha com Lund pela pastagem. Ele vão a um clareira onde Claussen descobriu um sítio. Claussen recolhe, a flor da terra, vestígios de cerâmica.

Claussen se abaixa pega um caco e mostra a Lund. Lund pega o caco e o examina maravilhado. Claussen pega o caco da mão de Lund e joga por terra.

Lund tenta recolher. Claussen, rindo, o pega mais uma vez pelos braços e o carrega

INT. BIBLIOTECA DE PETER CLAUSSEN -- AFTERNOON

Claussen mostra os livros que possui. Lund se interessa pelas obras. Claussen pega um desenho de um rato ancestral, no desenho pode-se perceber a assinatura de Brant. Lund arregala os olhos

INT. CASA DE CLAUSSEN -- NIGHT

Lund e Claussen estão sentados na mesa. Clausen serve vinho a Lund.

CLAUSSEN
O sr sabe quanto está valendo isto na Europa.. mais de cem ducados meu caro... Já enviei centenas de ossos de diversos tamanhos...já me chamam de professor Claussen...

Claussen sorri satisfeito.

Lund ainda excitado afunda Claussen de perguntas como uma metralhadora

PETER LUND
Mas quanto aos seus estudos ? Posso ver o relatório ? O sr isolou a área ? Qual o aspecto geológico? Qual a posição do sitio com relação as águas ? o sr tem amostras dos extratos?.... Afinal quem é o Sr ?

CLAUSSEN
Um homem de negócios tentando sobreviver neste país feito de poeira e insetos.. Definitivamente Não sou um estudioso como o senhor, não tenho os louros e nem as glórias da academia. Mas devo dizer que o negócio me obrigou a conhecer algumas coisas...

Claussen toma um grande gole

PETER LUND
Mas o sr não pode proceder assim.

Claussen se surpreende

PETER LUND
O senhor está perdendo informações importantes agindo desta maneira

CLAUSSEN
Desculpe DR. Lund. Meus ossos tem muita serventia na Europa... além do mais me rendem um bom dinheiro. A propósito, o senhor não está interessado...

Lund o interrompe

PETER LUND
Não se trata disso. O dinheiro é o que menos importa nesta situação. O sr tem que proceder de forma científica em seus estudos

Claussem dá uma gargalhada. Depois Claussen segura os ombros de Lund e fala como que cochichando

CLAUSSEN
É aí que o sr entra...

Lund se incomoda com Claussem lhe segurando

CLAUSSEN
Enquanto os museus da Europa me pagarem pelos meus ossos está tudo bem... Podemos eu e o senhor, ganhar muito dinheiro e reputação

Claussen pisca o olho

CLAUSSEN
E o senhor sabe... quanto melhor a reputação, mais dinheiro e quanto mais dinheiro melhor a reputação

Claussen finalmente larga Lund.

CLAUSSEN
O que o senhor me diz ?

Lund está indignado.

PETER LUND
O Sr me respeite. Jamais faria um negócio desta espécie. Mais, formulo meus mais veementes protestos pela forma com que o senhor manipula estes sítios. O Sr me dê licença. Amanhã estaremos partindo de sua fazenda.

Lund se levanta ante um Claussen atônito.

INT. CASA DE CLAUSSEN -- MORNING

No amanhecer, da janela de seu quarto, Claussen vê a expedição de Lund partir. Suas feições são graves e ele chega a murmurar

CLAUSSEN
Burguês pedante...

EXT. CERRADO -- NIGHT

Peter Lund e o que sobrou de sua expedição, Riedel, Henrique e dois escravos, acampam na beira de um córrego. Enquanto os escravos comem em um canto, Lund e Riedel conversam ao lado da fogueira sob o olhar de Henrique que está sentado junto a bagagem. Enquanto arruma o local onde vai estender sua manta para dormir Lund comversa com Riedel que organiza alguns papéis

LUND
Mas é o que lhe estou dizendo.. um aventureiro, um mercador que se serve da ciência e da preguiça dos cientistas. Envia amostras totalmente desconectadas de seu sítio, com pouca ou nenhuma avaliação. O pior é que muitas informações estão perdidas para sempre...

RIEDEL
Mas ele lhe propôs negócio ?

LUND
Com a maior tranquilidade. Como se dilapidar sítios paleontológicos fosse a coisa mais natural do mundo. para eles já éramos sócios quando me ultrajei, ele não entendeu nada

RIEDEL
Mas você se interessou

Lund se anima e sua feições mudam

LUND
Meu caro amigo, essa região é uma mina de tesouros a céu aberto . Ossadas de animais os mais variados, uma verdadeira seara para cientistas... Estou seriamente inclinado a me aprofundar na matéria.

Do lado dos dois cientistas. Henrique está dormindo e começa a roncar interrompendo a conversa. Lund e Riedel sorriem

LUND
Henrique me disse que você lhe dará alforria após esta expedição

RIEDEL
É verdade. Dentro de alguns dias quando estivermos em Ouro Preto, vou lhe dar sua Carta de Alforria... Antes de embarcar para a Europa quero deixar tudo como encontrei. Vou comprá-lo do Museu e lhe libertar

LUND
É um gesto de boa vontade

Eles olham para Henrique que dorme tranquilamente.

RIEDEL
Tenho vistos negros libertos perambulando pelas ruas do Rio. A maioria Sai da senzala direto para a sarjeta. Temo por Henrique

PETER LUND
De qualquer forma ele já fez a sua escolha. Conhecendo Henrique, duvido que acabe dormindo na sarjeta

Henrique já dorme profundamente enrolado em uma coberta. Riedel olha para ele e afirma incrédulo

RIEDEL
Minha manta.... ele pegou minha manta...

Lund sorri

PETER LUND
Creio que ele exagerou

RIEDEL
É um abusado

Riedel sacode Henrique

RIEDEL
Saia já da minha manta, mulato abusado

Henrique levanta meio assustado mas já com uma desculpa na língua

HENRIQUE
Eu estava só aquecendo o lugar

Enquanto Lund e Riedel se ajeitam em suas mantas, Henrique esfrega os braços do lado da fogueira. Depois ele arruma alguns trapos e se ajeita ao lado de Riedel Finalmente ele se deita e se cobre com os trapos

EXT. CERRADO -- MORNING

Em volta das cinzas da fogueira os homens dormem. Lund enrolado em sua manta.

Encolhido, já encostado em Riedel e coberto com uma parte da manta do seu senhor, Henrique dorme tranquilo com um sorriso no canto da boca.

LAGOA SANTA 2001

INT. CASA DE VICENTINHO -- MORNING

O despertador do rádio-relógio toca. Uma dupla sertaneja se esgoela no rádio relógio. Vicentinho levanta apressado e interrompe a música. Ele veste rapidamente suas roupas. Corre ao banheiro faz xixi, e escova os dentes a jato.

Sai do quarto, desce a escadaria correndo e passa pela cozinha onde já está a cozinheira. Ele dá um beijo na cozinheira. Toma um copo de leite que já está na mesa, pega um pedaço de bolo e sai correndo apesar dos chamados da cozinheira.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

Vicentinho, bolo na boca, já está em sua bicicleta pelas ruas da cidade. Ele passa e acena para o Dono da Venda que está na porta do estabelecimento. Ele cruza com o Padre e quase o leva ao chão. Um grupo de meninos que joga bola na rua tem que parar o jogo para Vicentinho passar. Uma senhora na janela grita

SENHORA DA JANELA
Menino louco

EXT. CASA DE ANITA -- CONTINUOUS

Anita espera impaciente. Ela está montada em sua bicicleta e aguarda Vicentinho na frente de sua casa.

Vicentinho aparece no fim da rua. Ele se aproxima e estaciona sua bicicleta do lado da menina fazendo um cavalo de pau. Com a maior cara de gaiato, boca e camisa imundas de bolo, ele olha para Anita. A menina olha com cara de desdém para Vicentinho que guarda o sorriso gaiato no rosto. Anita olha de cima a baixo para Vicentinho e se fixa em um detalhe quando olha para os pés do menino: ele calçou um sapato diferente em cada pé.

Ela aponta e ri. Vicentinho passa do sorriso de gaiato para o sorriso amarelo.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- MOMENTS LATER

Vicentinho e Anita andam de bicicleta pela cidade a caminho da casa de Maria dos Anjos

EXT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- LATER

Anita e Vicentinho chegam a casa de Maria dos Anjos. Estacionam as bicicletas no muro da casa e entram

INT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- CONTINUOUS

Maria dos Anjos está terminando de arrumar a casa. O aspecto é muito diferente. A casa está mais iluminada e menos entulhada de coisas. Os potes nas paredes desapareceram e o ambiente ficou mais arejado e claro Anita e Vicentinho entram.

MARIA DOS ANJOS
Sejam bem vindo meus filhos

ANITA
Está diferente aqui...

VICENTINHO
É.. mais limpo..

Anita dá um pisão no pé de Vicentinho que geme. Maria dos Anjos ri

MARIA DOS ANJOS
Você tem razão meu filho. Ontem vocês vieram de surpresa. Hoje vocês são convidados e a casa tem que estar em ordem

Vamos para a mesa. Vó dos Anjos preparou um café da manhã

Vicentinho é o primeiro a sentar. Anita e Maria dos Anjos sentam

ANITA
Estamos curiosos para saber o resto da história.

Vicentinho ataca os quitutes. Maria dos Anjos serve Anita com chocolate quente e depois serve a si mesmo.

MARIA DOS ANJOS
Pois é. Agora vem a parte importante da história. Quando o Dr Lund chega aqui em Lagoa Santa

ANITA
Como é que deveria ser aqui naquela época

MARIA DOS ANJOS
Tá vendo aquele quadro ali

Maria dos Anjos aponta para uma paisagem amarelada na parede com uma vista antiga da Lagoa Santa

MARIA DOS ANJOS
Pois era assim, não tinha quase nada. Quando o Dr Lund aqui chegou não devia ter que mais do que vinte ou trinta casas em volta da Lagoa.

VICENTINHO
Nossa é bem antigo. Nem consigo imaginar

MARIA DOS ANJOS
Se você acha antigo, imagina então as descobertas que o DR Lund fez que são muito muito mais antigas, do tempo em que a gente ainda morava em cavernas

ANITA
Nossa..! conte tudo Vó dos Anjos, conte...

MARIA DOS ANJOS
Vou contar minha filha. Agora vem a melhor parte, agora vem a história de amor

Anita adora e sorri. Vicentinho faz uma cara de decepcionado

MARIA DOS ANJOS
Você também vai gostar Vicentinho. É uma história de quem encontra uma paixão e uma razão para viver. A história de um homem de coragem e de conhecimento...

LAGOA SANTA 1835

EXT. MORRO DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund e seu grupo chegam ao alto do morro e avistam a Lagoa Santa.

Lund olha para Riedel e sorri.

Henrique olha para Riedel que acena com a cabeça.

Henrique desce correndo o morro em direção a Lagoa. Os dois escravos fazem o mesmo.

Riedel e Lund olham um para o outro... e também saem correndo morro abaixo em direção a lagoa

EXT. LAGOA -- CONTINUOUS

Todos estão dentro d água. Lund e Riedel parecem crianças enquanto jogam água um no outro. Henrique se aventura mais ao fundo nadando cachorrinho. Lund mergulha.

Quando sai ele abre os braços, respira fundo e grita:

PETER LUND
Estou curado...estou curado...

EXT. MARGEM DA LAGOA -- MOMENTS LATER

Lund e Riedel conversam sentados sob a sombra de uma árvore na margem. Lund está eufórico

PETER LUND
Pois é isso meu amigo. Me sinto um novo homem. Apesar de tudo, este país é uma verdadeira cura para mim.

Lund respira fundo mais uma vez

PETER LUND
Venci minha moléstia de pulmão mas estou condenado a viver aqui

RIEDEL
Nada mal como penitência. Esta terra é generosa para com que sabe compreendê-la, valorizá-la. Vivi muitos anos aqui e vou sentir falta

PETER LUND
Pois eu já decidi, Vou morar aqui.

RIEDEL
Como assim...

PETER LUND
Vou morar aqui. Vou comprar esta terra... essa mesma que aqui estamos e vou morar aqui

RIEDEL
Mas os seus trabalhos

PETER LUND
Enviarei os meus últimos estudos. Peço aliás que me ajude nisto

Riedel balança a cabeça afirmativamente

PETER LUND
Daqui desta lagoa sairei por este vale repleto de mistérios a descobrir seres de outras eras.

Lund levanta e em tom solene

PETER LUND
Começo aqui meu caro, a pesquisar a aurora da criação...

Neste momento uma visão interrompe o discurso de Lund. Ele avista OFÉLIA que se aproxima da margem, há uns cinquenta metros adiante. Ela leva uma sombrinha e vem acompanhada da escrava CHICA que carrega um banquinho. A escrava deposita o banquinho na margem. A mulher levanta o vestido até as canelas e entra dentro d água

Lund está com o olhar paralizado na mulher. Riedel comenta

RIEDEL
É.. parece que tua decisão ja lhe rendeu alguns frutos

Lund não fala nada. Ele limpa os óculos e os recoloca para melhor ver aquela mulher

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Lund ladeado por Riedel assina um documento. O notário pega o documento, lê, aperta a mão de Lund e sai da casa.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

O notário monta em sua mula e parte pela estrada poeirenta. Lund e Riedel se abraçam.

INT. VENDA DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund entra na venda. As cerca de 7 ou 8 pessoas que ali estão, todas, param de fazer o que estão fazendo e olham para o forasteiro Lund.

Depois de um silêncio incômodo onde Lund qaundo embaraçado para as pessoas, Senhor VALDIR MAGALHÃES, dono do estabelecimento, interrompe o silêncio e dá as boas vindas

VALDIR MAGALHÃES
O que é isso minha gente, isso é maneira de receber um cidadão. Seja bem vindo senhor

O comerciante sai de trás de seu balcão e vai receber amavelmente Lund.

As pessoas voltam a fazer o que estavam fazendo.

O comerciante pega Lund pelo braço e o leva para uma mesa.

VALDIR MAGALHÃES
É um prazer recebê-lo no meu modesto estabelecimento, Sr ...

PETER LUND
Lund, Peter Lund

VALDIR MAGALHÃES
Já ficamos sabendo que o senhor comprou as terras do Capitão João Santos...

PETER LUND
É verdade, pretendo ficar por aqui durante algum tempo

VALDIR MAGALHÃES
..a propósito de que país vem vossa senhoria

PETER LUND
Sou Dinamarquês estou aqui para efetuar pesquisas

VALDIR MAGALHÃES
Temos um outro dinamarquês aqui pelas bandas , o Sr Claussen

Lund responde secamente

PETER LUND
Já o conheço

VALDIR MAGALHÃES
De qualquer forma fique a vontade. Vou lhe apresentar as pessoas...

Eles se levantam e vão em direção das pessoas.

Lund é apresentado a um casal, depois a uma senhora. Um outro homem se aproxima e já lhe dá um tapinha nos ombros.

Lund sorri e aceita de bom grado os cumprimentos

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

No café da manhã Lund e Riedel discutem

PETER LUND
Creio que já podemos nos aventurar em nossa primeira expedição pela região

RIEDEL
Tenho que estar em Ouro Preto dentro de no máximo 10 dias. Posso lhe acompanhar até certo ponto e depois sigo o meu caminho

PETER LUND
Está perfeito para mim. Vou apreciar sua companhia para discutir meus primeiros passos nesta nova disciplina

RIEDEL
Por mim podemos partir logo

PETER LUND
Feito. Vou ao comércio providenciar mais algumas provisões. Preciso também de algumas ferramentas.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- MOMENTS LATER

Henrique está sentado na soleira de uma casa. Ele observa o movimento enquanto descasca uma cana. Ele observa Lund que atravessa o povoado. A todo momento Lund levanta o seu chapéu e cumprimenta as pessoas que lhe retribuem o cumprimento. Lund passa apressado em direção da venda. Até cruzar com Ofélia.

Henrique observa de longe a cena. Lund e Ofélia cruzam. Lund diminui o passo e esboça um cumprimento com o chapéu. Ofélia segue o seu caminho sem olhar para trás, enquanto Lund não resiste e vira o rosto para acompanhar a mulher. Lund continua andando e olhando para trás. Henrique pressente o golpe e ainda tenta avisar, mas é tarde demais.

Quando Lund vira o rosto ele dá de cara com um cavalo amarrado à porta da venda.

Ato contínuo ele mete a testa nos arreios e na cara do bicho e cai no chão. Henrique põe a mão na cabeça e exclama

HENRIQUE
Ai,ai ai

Lund está sentado no chão. Algumas pessoas acodem. Henrique pensa em voz alta

HENRIQUE
Esse, a sinhazinha já derrubou

Ele ainda ri de sua piada, quando um Guarda aparece na porta da casa onde Henrique está sentado tranquilamente.

O guarda enxota Henrique

GUARDA
Vá arrumar o que fazer o negro preguiçoso. Vai te embora

Henrique levanta de um pulo e sai sem perder o bom humor e o sorriso. Na saída ele cruza com uma escrava que sobe a rua. Ele aproveita para dizer qualquer coisa no ouvido da moça. A escrava continua subindo a rua mas agora sorrindo.

INT. VENDA DE LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

Com uma ferida roxa na testa que ainda escorre sangue , Lund entra na venda. Mais uma vez todos que estão dentro da venda olham para ele

EXT. ESTRADA -- DAY

Henrique anda pela estrada margeada de árvores. Ele anda e assobia uma cantiga. Nas costas um facho de lenha. Ele atravessa uma pinguela de madeira e continua seu caminho em direção a cidade.

Ele cruza com uma charrete, conduzida por Ofélia que está acompanhada de sua Mucama Chica. Henrique troca olhares com a Mucama quando eles se cruzam.

Alguns metros adiante, a charrete de Ofélia tem uma das rodas presas entre as tábuas da pinguela ao atravessar a precária ponte. Os gritos de Ofélia instigando o cavalo a superar o obstáculo chamam a atenção de Henrique.

Ele deixa o seu facho de lenhas na beira da estrada e se encaminha para a pinguela. Ofélia ainda tenta com o cavalo que faz uma força tremenda mas não consegue tirar a charrete do lugar.

A Mucama já começa a ficar histérica e a soltar uns gritinhos.

OFÉLIA
Não começa Chica. Para de gritar e vê se ajuda

CHICA
Ai Sinhá , ai meu Deus, vamô caí nu rio

OFÉLIA
Cala boca

Henrique chega neste instante. Com o seu sorriso nos lábios

HENRIQUE
Posso ajudar a sinhazinha ?

HENRIQUE

A Mucama já começa a sorrir quando Ofélia responde secamente

OFÉLIA
Não obrigado.

Ela tenta mais uma vez instigando o cavalo a puxar a charrete empacada, mas o bicho patina e não consegue arrancar. Henrique intervém

HENRIQUE
A senhora pode confiar em mim. Deixe-me ajudá-la. A senhora não está me reconhecendo?... Eu sou o escravo do Dr Lund... o professor da Dinamarca.... que comprou a casa e as terras a beira da lagoa.

Ofélia abaixa a guarda. Ela se interessa embora ainda mantenha a cara fechada. Henrique percebe a abertura e continua

HENRIQUE
Deixa eu ver aqui.

Henrique abaixa para ver o que está prendendo a roda da charrete.

HENRIQUE
Preciamos de algo para servir de apoio

Ele vai até a mata. A mucama suspira. Ofélia vê a reação de Chica faz uma cara de contrariada. Henrique volta com um pedaço de pau. Ele o põe de baixo da roda e faz a alavanca. A mucama desce para ajudar Henrique que a recebe com um sorriso gaiato

HENRIQUE
Quando eu falar a senhora vai

No instante em que Henrique avisa, Ofélia chicotea o cavalo que finalmente consegue avançar e arranca a charrete da pinguela. Henrique a Mucama vão atrás.

OFÉLIA
Muito obrigado.

HENRIQUE
Por nada sinhá. É um prazer ajudar a enamorada de meu senhor

Neste instante Ofélia ruboriza. Henrique insiste

HENRIQUE
Desculpe Sinhá, mas o senhor está tão pertubado, que quase quebrou a cabeça hoje cedo quando cruzou com a senhora

OFÉLIA
Não entendi

HENRIQUE
A senhora não viu. Mas quando cruzou com ele esta manhã, a senhora passou e ele continuou olhando para senhora até dar de testa em pobre cavalo que estava na porta da venda de seu pai. Realmente....

Henrique não controla o riso. Ofélia sorri, a Mucama suspira de novo

OFÉLIA
Como é seu nome ?

HENRIQUE
Henrique , sinhá

OFÉLIA
Bom, obrigado Henrique. Venha Chica

A mucama monta na charrete e elas partem. Chica ainda olha para trás e manda um tchauzinho para Henrique que responde com um sorriso. Quando as duas desaparecem na curva da estrada, Henrique também se volta e vai embora

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Peter Lund põe uma compressa na sua testa. Riedel lhe ajuda

RIEDEL
Mas o que aconteceu ?

Henrique que está em um canto, se intromete antes que Lund responda. Henrique fala rápido

HENRIQUE
Eu vi. O senhor deu de cara no cavalo que estava arreado na venda. Ele viu a sinhazinha que ele ama e ficou sem rumo

Lund o interrompe indignado

PETER LUND
O que é que você sabe, seu mulato intrometido

HENRIQUE
Eu sei que o Professor tá apaixonado pela sinhazinha da venda

Lund sai do seu canto em direção a Henrique que já se escapole.

LUND
Vem cá que eu vou te ensinar a não se meter na vida dos outros. Vem cá mulato sem vergonha

Riedel dá uma grande gargalhada

RIEDEL
Venha cá Peter, vamos acabar de tratar esta ferida de amor

Lund faz uma cara de contrariado e sai batendo a porta de casa

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- MORNING

Lund, Riedel , Henrique e mais uma tropa de 10 burros e mais 10 carregadores estão se aprontando para partir. Henrique carrega a carroça de Lund, enquanto Riedel e Lund olham um mapa.

Neste momento aparece no fim da rua Ofélia e sua mucama. Lund vê Ofélia e a Mucama se aproximando e começa a ficar nervoso. Ele passa a mão no curativo. Ele olha para Henrique e fala entre os dentes

PETER LUND
Se você abrir a boca eu te mato

Henrique assente com a cabeça e Riedel já está sorrindo e observando as reações de Lund.

Ofélia e a Mucama se aproximam

OFÉLIA
Meu pai me pediu que lhe trouxesse isto. É para comemorar suas descobertas

PETER LUND
Obrigado Senhorita

Lund ainda está ruborizado e não consegue dizer nada além disso. Ele olha paralizado para Ofélia. Henrique se intromete mais uma vez

HENRIQUE
O senhor não vai abrir ?

Lund sai da paralizia e abre o pacote onde está uma garrafa de Vinho do Porto.

PETER LUND
Agradeça o seu pai por mim senhorita. Na minha volta o farei pessoalmente

Ofélia assente com a cabeça. Lund fica olhando abobado para Ofélia. Riedel interrompe

RIEDEL
Vamos embora gente, temos muita estrada pela frente.

Riedel, Lund e Henrique montam na charrete e a caravana começa a andar.

Atrás na carroça, Henrique olha para as mulheres, passa a mão na testa e faz cara de dor imitando Lund. Ofélia sorri.

EXT. TRILHA DO VALE DO RIO DAS VELHAS -- DAY

Lund e Riedel estão em plena atividade. Enquanto Riedel recolhe amostras das raízes que escorrem pelas paredes das cavernas, Lund pesquisa o flanco das pedras com seu piolet . Aqui e ali ele se abaixa, recolhe algum fragmento e o analisa bem de perto.

EXT. ACAMPAMENTO 2 -- NIGHT

Lund e Riedel conversam em volta da fogueira. Os dois dão gargalhadas. Henrique também está presente e participa da alegria dos cientistas

EXT. TRILHA DO VALE DO RIO DAS VELHAS -- DAY

Lund, Riedel e Henrique estão sob uma formação calcárea. Eles andam sobre as pedras. Tanto Riedel como Lund recolhem amostras e dão para Henrique que as coloca em dois bornais, um para cada cientista.

De repente um estrondo e Henrique simplesmente some, ouvindo-se apenas o seu grito.

Riedel tenta ir ao buraco mas Lund o impede

PETER LUND
Não se mova. Estamos sobre o teto de uma gruta, tudo pode desabar.

Riedel assustadíssimo não se move mais

PETER LUND
Vamos com cuidado

Lund vai rastejando até a ponta do buraco. Reiedel o segue. Eles avistam Henriuqe que está há uns 20 metros abaixo. A luz que entra pelo buraco ilumina apenas o tronco de Henrique. Lund e Riedel gritam. O som ecoa na caverna

Henrique finalmente se mexe.

RIEDEL
Ele está vivo. Precisamos descer

Lund corre até suas coisas e pega uma corda. Ele a amarra a uma raiz. Ele volta ao buraco. Quando ele está pronto para descer Riedel o interrompe e faz um sinal de que é ele quem vai descer.

Riedel amarra a corda na cintura e começa a descer o buraco. Ele desce cuidadosamente até chegar a em Henrique. A lamparina de Riedel ilumina Henrique que está muito ferido mas ainda está vivo.

Quando Henrique avista Riedel ele dá o seu tradiocional sorriso.

RIEDEL
Não se preocupe vamos tirá-lo daqui

HENRIQUE
Meu senhor veio cumprir sua palavra?

RIEDEL
Como?

Henrique sorri de novo e suspira fundo. Lund grita lá de cima e Riedel responde.

Riedel percebe então que Henrique tem um grave ferimento na coluna vertebral

HENRIQUE
Meu senhor trouxe a minha carta de alforria ?

RIEDEL
Já vou providenciar isto

Riedel retira sua tinta e sua caneta do bolso de seu colete. ele procura por papel. Mas não encontra. Ele grita para Lund

RIEDEL
Peter, mande-me papel, mande-me papel

Lund não entende

RIEDEL
Papel, bom sangue, papel..

Lund se arrasta até suas coisas e pega um maço enrolado de folhas. Ele se arrasta de volta ao buraco e joga o maço para Riedel.

Lá embaixo Riedel escreve sobre uma das folhas de papel. Por um instante, só se houve o barulho da pena de Riedel rabiscando o papel.

Riedel lê para Henrique a carta de alforria ao mesmo tempo em que escreve

RIEDEL
Eu Riedel, faço saber a todos que Henrique ...

Ele se vira para Henrique que geme ao seu lado

RIEDEL
Como é o seu sobrenome ?

Henrique, pela primeira vez, destrata seu senhor

HENRIQUE
Não seja idiota, escravo não tem sobrenome

Surpreendido tanto pela resposta mal-educada do escravo como pela informação que estava recebendo, Riedel fica em silêncio por um instante. Henrique rompe o silêncio

HENRIQUE
Escreva Henrique do Museu...

Riedel continua

RIEDEL
Eu Riedel, faço saber a todos que Henrique do Museu é um homem livre e que a ele é devido todo respeito que um homem livre merece.

Riedel leva o papel ao peito de Henrique, mas ele já está morto. Riedel abraça a cabeça de Henrique.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund, Riedel e mais alguns escravos estão de volta a Lagoa Santa. Eles atravessam a cidade com o corpo de Henrique sobre uma mula. As pessoas vão saindo das casas ou aparecendo nas janelas a medida que o cortejo passa. Na porta de sua venda o Sr Valdir Magalhães espera o cortejo

VALDIR MAGALHÃES
Mas o que aconteceu Sr Lund

PETER LUND
Tivemos um trágico acidente Sr Valdir. O teto de uma caverna cedeu e Henrique caiu

Riedel está paralizado em cima de seu cavalo. Ele nada diz e parece estar longe

PETER LUND
Precisamos dar a este homem um enterro cristão. Onde fica o cemitério da cidade ?

Nessse momento um Homem de aparência rude e mal cuidada aparece de dentro da venda e se apresenta

DONO DO CEMITÉRIO
O cemitério de Lagoa santa fica em minhas terras e sou eu o responsável

PETER LUND
Bom dia Senhor

Lund estende a mão e o homem o cumprimenta

PETER LUND
Temos um funeral a fazer, senhor

O homem responde secamente

DONO DO CEMITÉRIO
No cemitério de Lagoa Santa não enterramos nem pretos e nem protestantes

Desta vez é Lund que fica paralizado com a informação. Riedel se revolta em cima do cavalo

RIEDEL
Eu vou lhe mostrar maldito...

Quando Riedel ameaça apear do cavalo, o Dono do cemitério saca uma pistola

DONO DO CEMITÉRIO
No meu cemitério não tem preto e nem protestante. Por mim, este escravo pode apodrecer em cima desta mula

Valdir tenta colocar panos quentes

VALDIR MAGALHÃES
Calma senhores...

Lund intervém bruscamente

PETER LUND
Sr Valdir, o senhor sabe de quem são estas terras aqui em frente

Lund aponta para um terreno onde se sobressai um grande pequizeiro.

VALDIR MAGALHÃES
Por coincidências são minhas...

PETER LUND
Faça o seu preço

Valdir se assusta em um primeiro instante, mas depois abre um sorrisso

VALDIR MAGALHÃES
As terras são suas Professor. Falaremos depois sobre o preço justo

Lund ascente com a cabeça. Ele olha para o Dono do cemitério

PETER LUND
Lagoa santa já tem um cemitério para Negros, protestantes e Dinamarqueses.

Lund amonta em seu cavalo e se dirige para a terra que acabou de comprar

INT. VENDA DE LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

No segundo andar da casa do Sr Valdir. Ofélia observa a movimentação em baixo da janela de seu quarto. Chica, a mucama, chora soluçando na cama. Da janela de seu quarto Ofélia vê Lund, Riedel se afastarem puxando a mula com o corpo de Henrique. Ofélia faz o sinal da cruz.

EXT. CEMITÉRIO DO PEQUIZEIRO -- LATER

Os escravos acabam de baixar o corpo de Henrique envolto em um lençol. Riedel e Lund permanecem ao lado da cova e são os únicos além dos escravos que cavaram a cova.

Ofélia e sua mucama, ainda em prantos, chegam ao local. Ela deposita uma flor no jardim sob o olhar surpreso e atônito de Lund

OFÉLIA
Ele era um bom rapaz... a atitude dos senhores foi muito digna

Feito isso Ofélia se retira.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Lund e Riedel se abraçam. Riedel está de partida junto com um pequeno grupo de escravos. Lund lhe dá um maço de cartas que Riedel guarda no bolso de seu paletó

PETER LUND
Meu grande amigo. Muito Obrigado por sua companhia. O que vivemos nesta expedição vai ficar na minha lembrança para sempre

RIEDEL
Meu caro Peter...espero poder lhe encontrar na Europa em breve...

Riedel sorri

RIEDEL
... contudo, pelo que sinto, já fostes contaminado pela febre do Brasil e por aqui ainda restará muito tempo.

Lund sorri

PETER LUND
Escreva-me

Riedel assente com a cabeça. Ele monta em seu cavalo e sinaliza para os escravos que podem seguir adiante. Riedel ainda faz um sinal de cabeça para Lund

RIEDEL
Boa sorte...

COPENHAGEN 1836

EXT. CASA DE KIERKEGAARD -- DAY

Sob uma nevasca um homem se aproxima da casa de Kierkegaard. Ele toca o sino na porta e põe um pacote a porta do imóvel. Sören olha pela janela e vê o pacote e o homem se afastando. Ele abre a porta e pega o pacote

INT. CASA DE KIERKEGAARD -- LATER

Um gato se passa nas pernas de Kierkegaaarden. Sören está lendo a carta de Lund. Ele percebe o gato entre suas pernas. Ele serve um pouco de leite em um pires e põe no chão. O gato começa a beber. Sören volta a ler a carta

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- AFTERNOON

Lund está lendo um livro em uma cadeira de balanço

PETER LUND
... pois é isto que lhe digo caro primo. Encontrei um local onde me sinto bem. A temperatura durante 6 ou 7 meses não passa de 25 e não cai para menos de 20

EXT. MATA -- DAY

Lund caminha a beira de um córrego sob uma mata ciliar. Ele sobe um barranco e chega a uma clareira onde uma grande "plantation" se estende a perder de vista. No último plano uma fazenda e a movimentação de um engenho

PETER LUND
A região é linda, apesar de toda a destruição causada por 200 anos de ocupação. As florestas são em sua maioria, um arremedo do que foram. Persiste ainda algumas matas vistosas na beira dos rios, mas isso também tende a acabar. Espero o dia em que a ciência ilumine a indústria...

INT. CASA DE KIERKEGAARD -- CONTINUOUS

Sören afaga o gato em seu colo enquanto continua a ler

PETER LUND
...mas como se não bastasse esse bem estar e todos os projetos pessoais, ainda acontece na minha vida Ofélia. Será que alcancei a felicidade ?

Sören sorri

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund vai até a venda onde já lhe espera na porta Ofélia. Lund está todo alinhado e Ofélia também está bem vestida.

Ele saem passeando pelas ruas de Lagoa Santa. Alguns metros atrás a mucama Chica segue o casal.

Da janela da venda, o Português Valdir observa sua filha e Lund se afastarem. Valdir coça o queixo.

PETER LUND
... a verdade é que os pioneiros desta terra não levaram todas as pedras preciosas . Deixaram a mais cintilante e valiosa...

INT. CASA DE KIERKEGAARD -- CONTINUOUS

Sören sorri e fala consigo mesmo

KIERKEGAARD
Peter Lund apaixonado...está aí uma coisa que eu gostaria de ver...

LAGOA SANTA 1836

EXT. MARGEM DA LAGOA -- AFTERNOON

Lund e Ofélia conversam enquanto caminham as margens da Lagoa. Embaixo de uma árvore eles se sentam

OFÉLIA
Desde que o senhor aqui chegou, muita coisa mudou em Lagoa Santa...

PETER LUND
Gosto muito daqui senhorita. O clima me favorece e estou bem no meio de um sítio de pesquisa que me interessa muito

OFÉLIA
A propósito, o senhor estava me dizendo que, há muito tempo atrás, tudo isso aqui era coberto por florestas e que os animais que aqui estavam eram grandes e assustadores. Mas como ter certeza do tempo em que viveram ? Quem pode ver o passado?

PETER LUND
A senhorita, além de bela, tem a curiosidade. Permita-me dizer que isso me fascina

Ofélia se faz de durona

OFÉLIA
Por favor, quero uma explicação do cientista e não elogios de um galeantador

Lund sorri

PETER LUND
Senhorita...

LAGOA SANTA-PLEISTOCENO 30.000 A.C.

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- DAY

Árvores de dezenas de metros disputam espaços nas alturas. Por entre frestas, o sol desce sobre os cipós e troncos das árvores até chegar a um chão coberto de folhas imensas.

O lugar ainda está molhado o que reflete a luz e produz goteiras. Samambaias gigantes e bromélias coloridas enfeitam o ambiente.

Uma formiga surge por entre as folhas e se ilumina no sol. Alguns metros adiante a floresta se abre e aparece uma grande Lagoa.

PETER LUND
...antes este lugar era uma floresta sem fim onde chovia 365 dias por ano. Calor e umidade dominavam tudo. Com certeza muitos insetos e bestas viviam por aqui. Isto foi antes do dilúvio. Essas águas afogaram tudo, ou quase tudo. Com o fim do dilúvio, um tempo mais seco predominou mas as antigas florestas, e tudo que havia dentro dela, já não existia mais .

LAGOA SANTA 1836

EXT. MARGEM DA LAGOA -- CONTINUOUS

Lund pega a terra com as mãos

PETER LUND
...toda esta história quem nos conta é a própria terra. Cada punhado de terra tem uma história para contar.

OFÉLIA
Como assim...

PETER LUND
Através de uma técnica podemos contar por quanto tempo aquela terra se depositou no local onde pesquisamos. Por exemplo, eu achei um fragmento de uma folha do tamanho de meu braço. Ela estava fossilizada em uma pedra a mais de 15 metros do chão. Isso me diz com certeza que antes havia uma grande floresta onde estamos. Depois disso é induzir. Para se ter uma grande floresta é preciso de muita água e calor etc

OFÉLIA
Gosto de ouvir essas histórias

PETER LUND
Eu gosto muito de contá-las para a senhorita

Ofélia se ruboriza.

PETER LUND
Estou de partida na semana que vem para uma nova expedição. Na verdade a expedição interrompida pela morte trágica de Henrique

OFÉLIA
Espero que o senhor tenha sucesso. Quero ouvir mais histórias

Eles se levantam e continuam a caminhada

OFÉLIA
O senhor nunca pesquisou flores. Gosto tanto de flores...

PETER LUND
Confesso que não é o meu forte, embora as conheça... como é de obrigação de resto de todo cientista natural

OFÉLIA
Nunca vi comentário mais seco e impessoal sobre as flores. Não é de estranhar que nenhuma flor sobreviva ao frio de seus comentários. Não existem flores na Dinamarca ?

PETER LUND
Desculpe senhorita, a falta de sensibilidade no meu comentário

OFÉLIA
Como são sa flores da Dinamarca ?

Os dois enamorados continuam o passeio em volta da lagoa

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund conversa com 3 homens em torno da mesa. Ele gesticula animado enquanto os homens escutam. Depois ele lhes dá um punhado de dinheiro. Os homens ascentem com a cabeça e se levantam, cada qual aperta a mão de Lund.

Lund os leva até a porta. depois que eles se despedem, Lund fecha a porta e depois esfrega a mão animado.

Ele está tão feliz que faz um passo de dança com uma paca empalhada que ele tem na sua sala.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- MORNING

Vários escravos plantam flores nas rua principal de Lagoa Santa onde se localiza a venda do Valdir Português. Está amanhecendo e as pessoas começam a sair de suas casas. As primeiras pessoas que passam sorriem diante dos homens que plantam flores.

Algumas crianças já estão ajudando a plantar.

Valdir português abre seu estabelecimento e olha para as flores plantadas em toda a rua e coça a cabeça. Na frente da sua loja, uma carroça cheia de flores com uma mula toda enfeitada.

INT. QUARTO DE OFÉLIA -- CONTINUOUS

Ofélia acorda e vai a janela. Ela abre as cortinas e vê as flores e a carroça parada embaixo de sua janela. Ela sorri e chama sua Mucama

OFÉLIA
Chica, Chica , venha ver

A mucama, ainda de camisolão, vem a janela, olha e não vê nada. Ela olha para Ofélia

OFÉLIA
As flores Chica, as flores....

A mucama olha de novo

CHICA
Nossa... Como elas nasceram aí na rua?. Óia nasceram em cima da carroça também...

Ofélia balança a cabeça e fecha a cortina diante de uma mucama que continua com cara de quem não entendeu nada

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund sai para mais uma expedição acompanhado de alguns escravos. Antes de montar ele conversa com Valdir Magalhães e sua filha Ofélia na porta da venda. Lund aperta a mão do comerciante e depois beija a mão de Ofélia

PETER LUND
Vou voltar a gruta na Fazenda Maquiné. Espero estar de volta em 15 dias. Peço que receba as minhas encomendas que pedi da Europa

VALDIR MAGALHÃES
Pode ficar tranquilo professor

Lund monta em seu cavalo, olha para Ofélia e sorri. Ofélia corresoponde e ficam os dois, por alguns segundos, a se olhar e sorrir. O Comerciante pigarrea e Lund volta em si

PETER LUND
Bom.. até a volta

Lund toma a frente de seu grupo e sai

EXT. ENTRADA DA GRUTA -- DAY

Lund e dois escravos preparam tochas e ajeitam cordas e e ferramentas.

PETER LUND
Eu vou descer na frente. Um de vocês vem comigo.

O outro fica aqui Um escravo olha para o outro e ninguém se apresenta. Lund aponta para um deles

PETER LUND
Você vem comigo

Um dos escravos suspira aliviado. O outro faz cara de condenado.

INT. GRUTA DE MAQUINÉ

Lund começa a descer a caverna.

Dentro da caverna Lund se depara com três entradas. Todas parecem um tunel escuro sem fim. Ele amarra uma corda em uma das pedras e dá o restante do rolo de cordas para o escravo. Lund escolhe uma das entradas e prossegue.

PETER LUND
Venha atrás de mim

O escravo engole seco e ascente com a cabeça. Lund começa a entrar no túnel escuro. No começo ele anda em pé, mas a medida em que avança o túnel vai se afunilando, tanto para os lados, como de cima para baixo.

Depois de 50 metros Lund já está agachado. O escravo atrás já resmunga

ESCRAVO
Vamo imbora sinhô

Lund pede silencio com o dedo nos lábios.

O túnel acaba em mais dois buracos. Um deles é muito estreito e é impossível passar. O outro desce até não se sabe onde. Lund persiste. Ele chega perto do buraco e sente uma corrente de ar que vem lá de dentro

PETER LUND
Segure bem a corda. Eu vou descer neste buraco

ESCRAVO
Sinhô vai descer aí. Faz isso não sinhô

Quando o escravo acaba de falar, morcegos saem do buraco em revoada. Na passagem alguns deles atingem Lund e o escravo que começa a berrar.

ESCRAVO
Ai meu Deus , o que é isso...

Ele faz menção de partir. Lund o segura pelo braço

PETER LUND
Fique aí. Eu vou descer e já volto. Segure firme

Lund pega uma vela acesa e a põe na boca, amarra a corda na cintura e começa a descer o buraco

PETER LUND
Se acontecer alguma coisa eu puxo a corda

Lund desce devagar por um buraco um pouco mais largo do que ele. Ele desce com cuidado descendo passo a passo .

O buraco vai se alargando. Lund escolhe uma das paredes e continua descendo.

De repente ele perde o passo e cai. A corda que está frouxa começa a desenrolar rapidamente enquanto Lund cai no vazio gritando.

Mais acima, o escravo nota que alguma coisa está errada com os berros de Lund. A corda se desenrola rapidamente e ele tenta pegá-la mas a corda corta sua mão.

A corda finalmente se enrosca em alguma pedra e trava a queda de Lund que para de cabeça para baixo a alguns metros do chão.

A vela que caiu da boca de Lund e está no chão da caverna a alguns metros abaixo, continua acesa e ilumina uma pequena parte de um grande salão.

Lund se ajeita na corda e tenta descer até o chão da caverna. No chão ele grita

PETER LUND
Hei, Hei,

O escravo responde

ESCRAVO
Sinhô tá bem

PETER LUND
Jogue uma tocha aqui para baixo

O escravo vai até a borda do buraco de onde ele vê o pontinho luminoso da vela.

O escravo joga a tocha que cai direto como um cometa. A tocha cai do lado de Lund. Ele pega o fogo e levanta acima de sua cabeça. Ele descortina um enorme salão onde morcegos ainda descansam no teto

EXT. ENTRADA DA GRUTA -- LATER

Lund sai da caverna com o escravo. O escravo está com uma cara de pânico enquanto Lund está sorridente como uma criança.

Lund vai até onde estão suas bagagens e mantimentos e pega um lampiãoo e algumas ferramentas.

Ele se vira para os escravos que já estão confabulando em um canto. O escravo que entrou na gruta com Lund está gesticulando. Depois mostrando a mão ensanguentada para o escravo que ficou.

PETER LUND
Fiquem aqui e preparem o acampamento. Quando estiver escurecendo me avisem lá embaixo

Os escravos suspiram aliviados quando Lund passa por eles em direção a entrada da caverna

INT. SALÃO DE MAQUINÉ -- MOMENTS LATER

Lund caminha pelo salão da caverna.

Ele ilumina as formações calcáreas e os temas espeleológicos.

Lund põe o lampião em uma das pedras e começa a escavar o lugar que ele escolheu.

INT. SALÃO DE MAQUINÉ -- LATER

Lund já escavou um buraco de um metro quadrado com meio metro de profundidade. Suado e imundo Lund limpa o suor da testa

INT. SALÃO DE MAQUINÉ -- LATER

Lund examina com carinho um fragmento de osso que descobriu. Ele grita entusiasmado e seu grito ecoa na caverna

EXT. ACAMPAMENTO DA ENTRADA DA GRUTA DE MAQUINÉ

Lund faz anotações em sua barraca. Ele pega um fóssil e o examina na luz de seu lampião

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- AFTERNOON

Lund e sua tropa chegam em Lagoa Santa. Lund vai diretamente para a venda do Sr Valdir

INT. VENDA DE LAGOA SANTA -- MOMENTS LATER

Lund entra na venda de Valdir Magalhães. A venda está cheia. Forasteiros mal encarados examinam alforjes e outros artigos de couro. Senhoras desenrolam peças de tecidos enquanto comentam sobre sua qualidade. Do outro lado 3 meninos enchem a paciência de um dos atendentes a procura de guloseimas.

Alguns fazendeiros examinam sementes mais ao fundo, enquanto outro fazendeiro acompanhado de dois escravos escolhe ferragens diversas, inclusive algemas que ele faz um dos escravos experimentar antes de colocar em um saco onde já estão diversas outras mercadorias adquiridas.

Lund procura com os olhos Ofélia ou o o Sr Valdir, mas o que ele encontra em uma mesa perto da janela é Brant que está desenhando algo em sua prancha.

Lund se aproxima de Brant e vê que o norueguês está finalizando o desenho de um esqueleto de um animal. O desenho é grande. Lund gosta do que vê.

PETER LUND
Sr Brant que prazer encontrá-lo

BRANT
Professor Lund . O prazer é todo meu... Sente-se.

Lund se senta. Ele está radiante.

PETER LUND
Vejo que finaliza mais um bonito desenho

BRANT
São apenas mais alguns desenhos para o Sr Claussen....

Brant para de desenhar e guarda o seu desenho

BRANT
Mas vejo que o senhor está muito contente

PETER LUND
É verdade Sr. Brant. E terei o maior prazer em dividir este contentamento com o senhor

BRANT
Não espere portanto, notícias boas são raras por estas bandas

PETER LUND
Acabo de descobrir ossadas fantásticas. Um esqueleto completo de um animal que não conheço de nenhum registro nas várias Universidades porque passei. Estou ansioso por verificar com mais carinho estas ossadas.

BRANT
Fico feliz em saber que um verdadeiro cientista vai se ocupar deste meterial... são quase relíquias. Acredito que para um cientista vestígios destas natureza sejam quase sagrados

Lund ascente com a cabeça

BRANT
Pessoalmente... sem querer ofender ninguém... os métodos do Sr Claussen são.... como direi... pouco ortodoxos.

PETER LUND
Da mesma forma , sem querer parecer oportunista, gostaria que o senhor trabalhasse para mim. Preciso de um desenhista. Mais do que isto. Preciso de alguém para me ajudar.

Brant põe a mão na testa e parece desconfortável com o convite. Lund continua

PETER LUND
Claro que o pagamento será a altura do seu talento...podemos discutir o preço se o senhor quizer...

Neste momento Brant fica francamente desconfortável. Ele passa a mão na cabeça várias vezes e ameaça se levantar. Lund percebe que algo errado acontece

PETER LUND
Alguma coisa errada? Se o caso for Claussen, pode deixar que eu converso com ele

Ato contínuo, Brant se levanta. Ele recolhe apressado suas coisas antes de deixar a mesa. Da janela pode-se perceber que Claussen está entrando na taberna

BRANT
Me perdoe...não posso ajudá-lo... tenho que ir.

Dito isto Brant se vira e se dirige a entrada da porta.

Lund fica sentado na mesa sem entender nada

Mas antes que Brant saia da venda ele se depara com Peter Claussen que entra na venda. Brant recua e abraça os seus desenhos. Claussen olha para Brant de cima para baixo e bate o rebenque nas pernas

CLAUSSEN
Aqui estás, infeliz. Eu te procurando que nem um louco e tu estás aqui... aposto que a beber

As pessoas na venda já começam a olhar para a cena. Brant tenta responder.

BRANT
Não senhor estava apenas....

Antes que Brant termine o que começou a falar. Claussen desfere um golpe de rebenque na cara de Brant que cai no chão

CLAUSSEN
Levante-se inútil, tem uma expedição inteira te esperando para partir

Lund se levanta da mesa furioso. Ele fica frente a frente com Claussen. (Ele fala em dinamarquês)

PETER LUND
Quem lhe dá o direito de fazer isso...

CLAUSSEN
Ora ora, Professor Lund ....

PETER LUND
Responda-me... exijo desculpas públicas ao Sr Brant

Brant se levanta e tenta esfriar a situação

BRANT
Não é necessário...

Claussen o interrompe

CLAUSSEN
Eu é que lhe pergunto quem é o senhor. Chegou aqui outro dia e já está se metendo em coisas que não lhe dizem respeito. Primeiro os meus ossos e agora o meu lacaio

PETER LUND
Que ossos , que lacaio... o senhor é de uma prepotência e uma crueldade...

CLAUSSEN
Trato com minha gente a minha maneira e não tolero interferências de um borrabotas da corte

Lund parte para cima de Claussen e os dois começam uma briga. Depois de alguns golpes desferidos por Lund, Claussen está em plena desvantagem. É quando Claussen saca a pistola e aponta para a cabeça de Lund.

CLAUSSEN
É o seu fim, professor borrabotas

Claussen está prestes a disparar quando Brant pega uma pá e dá uma porrada no braço de Claussen.

A pistola voa longe e Lund consegue se desvencilhar do seu agressor.

Clausssen segura o braço ferido e olha com ódio para Lund e Brant

CLAUSSEN
Voces vão se arrepender.

Claussen olha furioso para Brant

CLAUSSEN
Quanto a você, noruegues traidor, devia ter te deixado mofar na cadeia.

Brant abaixa a cabeça. Claussen se vira e se retira. As pessoas que estão na loja suspiram aliviadas

Lund olha para Brant

PETER LUND
Obrigado

Brant sorri e comenta

BRANT
Parece que vou ter que aceitar aquele seu emprego

Lund sorri.

PETER LUND
Venha comigo

Os dois saem da venda.

No canto as pessoas comentam.

FAZENDEIRO
Voces viram. Eles quase se mataram ..... que diabo de língua eles estavam falando

A mulher que escolhia tecidos

MULHER DA VENDA
Sei lá que língua era mas só pode ser briga por conta de terra

Uma amiga que está a seu lado suspira...

OUTRA MULHER
Ou então de mulher...

O atendente da venda, um moreninho magro, comenta com autoridade

ATENDENTE
Né não, eu vi o povo comentando. Os estrangeiros tão brigando por conta dum tesouro. Um tesouro que o Professsor Lund encontrou no fundo duma caverna

O fazendeiro olha para a mulher

FAZENDEIRO
Nossa...

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund e Brant conversam na mesa de jantar

PETER LUND
Pois é isto que lhe proponho. Serás meu auxiliar e meu desenhista. Podes ficar aqui em casa se quizeres.

BRANT
Para mim está bom

Lund estende a mão para Brant

PETER LUND
Ótimo.

Os dois se levantam e apertam as mãos

PETER LUND
Venha comigo que quero lhe mostrar as ossadas que encontrei

Lund e Brant se levantam e vão até um outro cômodo da casa. Lund levanta uma lona onde estão vários fósseis e ossadas. Ele escolhe uma peça

PETER LUND
Veja isso

Lund pega um enorme osso, de mais de 1 metro de cumprimento. Brant arregala os olhos

BRANT
Nossa... que animal poderia ter uma ossatura parecida ?

PETER LUND
A única coisa que sei por enquanto é que trata-se de um enorme mamífero....Acredito que existam mais fragmentos dele nesta amostra que retirei

Lund aponta para mais material coberto por uma lona

PETER LUND
O Sr entende porque preciso de sua ajuda. Não posso nem mesmo começar meus estudos aqui nesta casa. Tenho que construir um local aqui ao lado, catalogar peça por peça, arquivar cada informação, enfim... não posso fazer sem a ajuda de alguém como o senhor

Lund recolhe mais um fóssil, uma pedra com um enorme inseto talhado. Brant observa tudo com admiração

PETER LUND
Veja isto...

BRANT
Estou há alguns anos com Claussen e nunca vi nada igual. Geralmente o que ele encontra são fragmentos de animais pequenos ou médios...

PETER LUND
Claussen nunca soube procurar...

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund e Brant estão jantando a luz de um candieiro

BRANT
Uma descoberta como esta vai lhe dar certamente muito prestígio nas Universidades da Europa

PETER LUND
Não seria sincero de minha parte afirmar que o sucesso e o dinheiro não me atraem. Isso seria a mesma coisa que dizer que não tenho vaidades e todo homem possui vaidades.

Enquanto eles comem continuam conversando.

PETER LUND
A propósito Sr Brant, quais são suas vaidades ?

BRANT
Vaidade é uma bagagem muito pesada para um viajante como eu.

Lund sorri discretamente

BRANT
Só posso levar o que consigo carregar. Orgulho, vaidade e ambição são pesos muito grandes para quem vive a caminhar

PETER LUND
Mas um dia a gente tem que parar

BRANT
Desde muito cedo estou a vagar pelo mundo. Eu tenho alma de forasteiro e ninguém gosta de forasteiros.

PETER LUND
Principalmente forasteiros sem posses.

Brant ri e confirma com a cabeça

BRANT
É verdade. Não possuo nada, mas em compensação também não tenho nada a protejer, não tenho ambições mas em troca também não sofro frustações

PETER LUND
Mas um homem tem que ter um objetivo na vida...

BRANT
Professor, o senhor é um homem de posses, criado e formado nas cortes da Dinamarca. Eu vim de uma parte do Mundo onde só se ouve o vento e o mar. Eu sei que deve ser difícil para o senhor compreender mas, as vezes , o único objetivo de um homem é sobreviver.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Lund comanda trabalhadores na construção de um galpão ao lado de sua casa.

Enquanto Lund mostra um plano a um capataz que coça a cabeça, Brant organiza as amostras de Lund sentado em uma mesa embaixo de uma árvore a 20 metros dali.

Ofélia e Chica também estão com Brant que mostra algumas peças para Ofélia

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Lund e Brant estão dentro do galpão enquanto os trabalhadores estão colocando as telhas. Lund aponta para Brant os locais onde estão sendo montadas duas enormes bancadas e um gaveteiro.

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Lund coordena trabalhadores que trazem para dentro do galpão as suas ossadas e fósseis. Lund segura no ar uma peça que cai de uma das cestas trazida por um trabalhador. Lund suspira e pega a pedra como se fosse um diamante.

O traballhador esvazia o conteúdo da cesta como se tudo aquilo não passasse de simples pedras. Lund olha incrédulo por entre a nuvem de pó que se forma. Ofélia põe as mão no rosto. Brant ri.

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Lund carrrega ele mesmo as cestas com fósseis para dentro do galpão. Brant e Ofélia o ajudam. Enquanto isso, os trabalhadores conversam animadamente em um canto do galpão. No centro da roda de trabalhadores está Chica que é cortejada por eles.

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Lund,Brant e Ofélia comemoram com uma garrafa de vinho a montagem do laboratório de Lund. No Galpão tudo está bem arrumado e organizado.

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Brant pendura um quadro na parede. Trata-se de uma paisagem de Lagoa Santa. Lund, Ofélia e o Sr Valdir aplaudem. Brant se curva agradecendo a sua platéia. Todos riem.

INT. CASA DE CLAUSSEN -- NIGHT

Uma caneca bate com força em uma mesa de madeira.

CLAUSSEN
Mais vinho ! Mais vinho!

Uma escrava vem correndo com mais uma garrafa. Claussen, já embriagado arranca a garrafa da mão da escrava e ordena aos berros

CLAUSSEN
Saia ...saia

Ele enche a caneca até que ela derrame.

Claussen dá um grande gole sem fazer careta. Enquanto limpa a boca com a a manga da camisa ele arregala os olhos. Quando ele tira a mão da boca ele já está sorrindo. Ele não termina sua caneca e sai apressado batendo as portas.

INT. CASEBRE DE FAZENDA -- DAY

Claussen conversa com um matuto.Enquanto o matuto enrola um cigarro, Claussem fala gesticulando. O matuto continua ouvindo e fumando. Claussen termina de falar e fica esperando uma resposta do matuto.

O matuto acaba de enrolar o cigarro, ascende o cigarro com um graveto do fogão de lenha e continua sem dizer nada. Depois de um silêncio que incomoda Claussen

MATUTO
Obrigado pela informação

Dito isso ele acena com a cabeça em direção da porta. Claussen se levanta e sai

Já do lado de fora Claussen resmunga em dinamarquês

CLAUSSEN
Maldito país de gente estranha

INT. TRILHA NA MATA -- DAY

Lund e Brant viajam em duas mulas.

PETER LUND
Eu vou lhe mostarar a Gruta onde encontrei aquelas peças

BRANT
Com certeza deve haver muito mais

PETER LUND
Sim, as cavernas são lugares ideais para procurar. Elas guardam os segredos que queremos descobrir,

Lund olha para Brant e sorri

PETER LUND
Quer descobrir algum segredo do passado ? Siga as águas meu caro. São as águas que depositam na gruta o que queremos encontrar. O clima constante das cavernas e o calcáreo fazem a sua parte. Eles conservam, guardam para nós os tesouros, quase que intactos, esperando por alguém que os compreenda e os decifre

EXT. ENTRADA DA GRUTA DE MAQUINÉ -- DAY

Lund e Brant chegam a gruta de Maquiné e tomam um susto. A entrada da caverna está murada. Uma parede foi construida na entrada da caverna impedindo a passagem

PETER LUND
Meu Deus , o que é isso ?.... fecharam a caverna....

BRANT
Fecharam ?...

PETER LUND
Construíram esse muro...

Neste momento o Matuto, acompanhado de meia dazia de mamelucos armados, aparece. Lund e Brant se surpreendem

MATUTO
"Ocês tão vadino minha terra"

PETER LUND
O que ele disse?.... o que ele disse ?

BRANT
Eu acho que O Sr acaba de descobrir quem fechou a caverna. Estamos em suas terras

MATUTO
"Mió ces irem imbora

Lund tenta argumentar

PETER LUND
Bom dia Senhor.

O Matuto não fala nada

PETER LUND
Eu sou o Profesor Lund e este é o meu auxiliar o Sr Brant....

O matuto dá uma cuspida no chão

PETER LUND
Esta caverna

MATUTO
Minha caverna..

O matuto cospe de novo

PETER LUND
...a sua caverna, é um sítio paleontológico

Diante do franzir de testa do matuto, Brant interrompe

BRANT
Esta caverna tem coisas importantes para a ciência..

A emenda é pior que o soneto e o Matuto cospe de novo.

Os jagunços já começam a dar risadinhas atrás do Matuto.

Brant comenta baixinho

BRANT
Vai ser difícil explicar...

Lund tenta de novo

PETER LUND
Dentro desta caverna estou estudando ossos de animais antigos ...

Neste momento o Matuto e os Jagunços não aguentam e caem na gargalhada. Lund e Brant riem amarelo. O Matuto resolve acabar com a conversa

MATUTO
Vois micê podi falar o que quizé. Tudo que tá dentro da minha caverna é meu

Ele olha para os jagunços e ri

MATUTO
Eu fico cus osso que Vois Micê encontrou.

Lund se exaspera e tenta intervir

PETER LUND
O senhor não está entendendo. Eu preciso entrar nesta caverna

Antes que Lund continue a falar ou dê o primeiro passo, o Matuto engatilha as armas, os jagunços fazem o mesmo. Brant segura Lund e suplica

BRANT
Vamos embora Professor

Lund ainda tenta uma última vez e avança em direção do Matuto. Brant põe a mão no rosto

PETER LUND
O senhor está cometendo um crime

O Matuto perde a paciência e atira para cima. Lund e Brant se agacham

MATUTO
Si eu vê oces aqui de novo eu vou matá oces.

Lund desiste finalmente. No momento em que estão montando o matuto ainda fala

MATUTO
Ni oces e nem ninguem podi entrar aqui. Diz isso também pro outro galego

Lund e Brant se olham e quase que ao mesmo tempo descobrem

BRANT
Claussem

PETER LUND
Claussen

EXT. ESTRADA DA GRUTA DE MAQUINÉ -- DAY

Lund e Brant estão no caminho de volta. Montados em duas mulas, eles conversam

PETER LUND
Não sei o que é pior, se a ganância ou a ignorância... você viu o que o brucutu nos disse ?

Brant sorri do adjetivo

BRANT
O senhor ainda vai se acostumar. O interior deste país vem sendo conquistado exatamente por estes dois tipos de homem: o ganancioso e o ignorante. Só depois deles é que a civilização chega... quando chega..

PETER LUND
O que será que Claussen disse para o troglodita... será que ele acredita que tem algum tesouro, moedas e diamantes lá dentro ?

BRANT
É um bom palpite

PETER LUND
Creio que perdemos este sítio

BRANT
Temos muito trabalho para fazer com o que o senhor já coletou nesta gruta

PETER LUND
Não consigo me conformar.. um ser rastejante este Peter Claussen

BRANT
Conforme-se Professor. Minas Gerais é feita de grutas, vamos encontrar muita coisa mais.

EXT. LAGOA SANTA -- DAY

Nuvens pesadas se formam. O vento sacode Lagoa Santa. Uma chuva torrencial começa

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

A Chuva cai lá fora. Lund e Brant estão catalogando seus ossos. Enquanto Lund recolhe os ossos de uma pilha, Brant escreve em seu caderno

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Lund começa a montar a preguiça gigante. Enquanto Lund tenta dispor na ordem os ossos que encontrou, Brant desenha um dos ossos da Preguiça.

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Lund e Brant começam a levantar um esqueleto. Eles amarram os ossos tentando montar o quebra-cabeças do enorme bicho. Brant se impressiona com o tamanho da preguiça. Lund afixa a mandíula da criatura

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund e Brant jantam e conversam a luz de lampiões. Continua chovendo lá fora

PETER LUND
Estou entusiasmado. Este esqueleto vai impressionar a todos os estudiosos

BRANT
Com certeza professor, O senhor fez um grande trabalho

PETER LUND
Nós fizemos meu caro, Nós fizemos...

Lund dá um tapinha nas costas de Brant

PETER LUND
Pretendo publicar seu nome como meu primeiro assistente

BRANT
Fico honrado senhor

PETER LUND
Tenho mais um trabalho para você. Creio que gostarás. É um trabalho artístico-pedagógico que pretendo expor por toda a Europa

BRANT
Fale Professor

PETER LUND
Quero que pintes um grande Painel retratando minhas descobertas.

BRANT
Como assim ?

PETER LUND
Gostaria que pintasses, segundo minhas informações

Lund mostra a parede do galpão

PETER LUND
Um painel de Lagoa Santa como era a 20 mil anos atrás. Um Painel da Criação com todas as criaturas que estamos descobrindo

Brant sorri satisfeito

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Ofélia e Chica chegam ao galpão de Lund. Elas batem na porta e ninguém responde. Como está chovendo elas resolvem entrar. Chica toma a frente e depois de andar alguns metros por entre ferramentas e material de trabalho de Lund ela dá de cara com o esqueleto montado da preguiça gigante. Ela grita e sai correndo, Ofélia sem entender nada recua. Chica que já começa a correr

CHICA
Ai, Ai....um monstro sinhá...

OFÉLIA
O que ?



Os gritos chamam a atenção de Peter Lund que está no fundo do galpão a catalogar peças. Lund vem correndo

PETER LUND
Ofélia... Ofélia

Lund chega a tempo de impedir que as moças saiam correndo galpão a fora

PETER LUND
Ofélia o que aconteceu ?

Chica não quer nem saber e sai correndo. Ofélia para ao ver Lund e corre para ele. Eles se abraçam

PETER LUND
O que foi ? O que foi ?

OFÉLIA
Não sei , não sei... Chica saiu gritando

Neste momento os olhos dos enamorados se cruzam. Eles se beijam

Ainda beijamdo Lund Ofélia abre os olhos e vê sob os ombros de Lund o esqueleto da preguiça gigante. Ela para de beijar Lund. Eles se olham. Ofélia ri e aponta para Lund

OFÉLIA
Olha o monstro que a Chica viu

Lund sorri

PETER LUND
Lindo não...?

Ofélia olha a as feições ameaçadoras do esqueleto. Especialmente sua enorme garra

OFÉLIA
Não é este o adjetivo que eu usaria

PETER LUND
Ela parece ameaçadora mas é apenas uma criatura comedora de folhas. Com certeza servia de presa para os carnívoros da floresta

Lund se aproxima do esqueleto

PETER LUND
Veja seu membros anteriores. O unico movimento possível é o de empurrar para baixo.

Lund simula o movimento o que faz Ofélia sorrir

Lund segura as enormes presas nas patas dianteiras

PETER LUND
Veja esta presa. Parece fatal mas serve mais como apoio na subida das árvores do que arma de defesa ou ataque.

OFÉLIA
É realmente impressionante Peter

Lund dá o braço para Ofélia

PETER LUND
Venha comigo minha querida. Vamos sair deste ambiente empoeirento. Vamos tomar um chá

OFÉLIA
Pensei que não iria me convidar

Os dois saem de braços dados do galpão

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MOMENTS LATER

Lund e Ofélia tomam o chá

PETER LUND
Gostaria de lhe fazer um convite, extensivo ao seu pai é claro

OFÉLIA
Pois não...

PETER LUND
A temporada de chuvas está acabando e gostaria de convidá-los para ir a Sabará

Ofélia se surpreende. Lund retira um panfleto e mostra para Ofélia

PETER LUND
Veja teremos uma temporada de Ópera no teatro Sabará a partir de maio...

OFÉLIA
Eu adoro música... amaria tanto poder ir a esta Ópera...vamos ...vamos...

PETER LUND
Nós vamos minha querida. Faz anos que não ouço uma boa música, uma Ópera, mesmo que em Sabará, irá me fortalecer o espírito

OFÉLIA
e o romantismo...

Lund segura as mãos de Ofélia

PETER LUND
Obrigado querida, por aparecer em minha vida

Ofélia sorri encabulada

COPENHAGEN 1836

INT. BIBLIOTECA REAL DE COPENHAGEN -- DAY

Kierkgaarden escreve no salão central da Biblioteca

KIERKEGAARD
Nada é mais fato do que isto que lhe digo. Se estavas a procura de fama e sucesso quando fostes ao Brasil já podes então voltar para casa. Não se fala em outra coisa nos circulos acadêmicos que não seja os estranhos animais do professor Lund... até o rei já está interessado. Dizem que ele está estudando uma verba enorme para as suas pesquisas no Brasil...

LAGOA SANTA 1837

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Lund dá as últimas instruções a Brant antes de partir. Ofélia e o Sr Valdir aguardam na carroça

PETER LUND
Estaremos de volta em alguns dias. Cuide de tudo

BRANT
Pode ficar tranquilo Professor

Lund aperta a mão de Brant e se dirige para a carroça. Ele monta e todos partem deixando Brant na porta de casa.

EXT. RUAS DE SABARÁ -- NIGHT

Lund, Ofélia e o Sr Valdir caminham nas ruas iluminadas de Sabará. Eles chegam ao Teatro

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Brant está dando um enorme gole em uma garrafa de pinga. Quando ele acaba, as pessoas que estão ao seu lado vibram. Brant está bêbado e é o anfitrião de uma dezena de pessoas em uma "festa de arromba" no Galpão de Lund. Por entre os ossos, esqueletos e a papelada de Lund, homens e mulheres se divertem. Um sanfoneiro toca ao lado da Preguiça gigante enquanto um homem branco e uma mulata dançam. Um outro convidado brinca com um enorme osso . Ele corre e grita com o osso na mão como se fosse um porrete para cima das mulheres que fogem rindo e gritando. Um bêbado dorme cara a cara, nariz a focinho, com uma paca empalhada. Por toda parte, para onde se olhe existem garrafas e muita bagunça.

INT. TEATRO DE SABARÁ -- NIGHT

Lund, Ofélia e o Sr Valdir se acomodam em um dos camarotes da galeria do teatro que está repleto. As luzes se apagam. Um cantor começa o seu recital

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Brant está abraçado a duas mulheres. Ao seu lado um homem gordo come uma galinha inteira. Suas mãos e sua cara são pura gordura de frango. O sanfoneiro continua tocando. Agora um mulato acompanha fazendo o ritmo, batucando com um osso no esqueleto da preguiça gigante

INT. TEATRO DE SABARÁ -- NIGHT

Seu Valdir dorme de babar em sua cadeira. Lund e Ofélia estão de mão dadas, assistindo o espetáculo.

INT. ESTRADA DE SABARÁ -- MORNING

A carroça com Lund, Ofélia e o Sr Valdir está na estrada

OFÉLIA
Adorei, professor Lund

PETER LUND
Fico feliz Senhorita. E o Sr o que achou, Sr Valdir

VALDIR MAGALHÃES
Muito bom , Professor, um primor...

Lund sorri e pisca para Ofélia

OFÉLIA
Quando será que teremos música em Lagoa Santa..O Sr sabe que minha mãe era pianista....

PETER LUND
É mesmo ?

Ofélia passa o braço em trono de seu pai

OFÉLIA
...papai não gosta de lembrar... mas desde que vendemos o piano de mamãe..não temos um sequer em toda a região

VALDIR MAGALHÃES
É verdade minha filha. Na época aquele piano me causava muita tristeza e nostalgia

OFÉLIA
Eu gostaria tanto de aprender...

PETER LUND
Confesso que não sou um virtuose, mas o piano e a música são uma paixão. Com a permissão de seu pai.. gostaria de ensiná-la os princípios básicos da música

Ofélia sorri e não se contém. Ela abraça Lund que fica sem graça. Quando o Sr Valdir tosse em sinal de alerta, Ofélia cai em si e volta a posição recatada. O Sr Valdir encerra a conversa tentando parecer austero

VALDIR MAGALHÃES
Veremos isso quando chegarmos em Lagoa Santa

Desta vez é Ofélia que pisca para Lund

EXT. ESTRADA DE SABARÁ -- NIGHT

Sob um céu estrelado a carroça de Lund avança na estrada.

INT. GALPÃO DE LUND -- MORNING

Brant dorme encostado em uma cadeira. Pelo chão estão esparramados alguns convidados. A bagunça é total. O sanfoneiro dorme tranquilo ao pé do esqueleto. Nas garras da preguiça, a sanfona pendurada.

EXT. VENDA DE LAGOA SANTA -- MORNING

Lund deixa Ofélia e Valdir. Está amanhecendo e as ruas de Lagoa Santa estão vazias. Lund caminha sorridente pelas ruas.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

Lund vai entrar em casa. Antes de entrar ele olha para o relógio. Ele resolve ir até Galpão

INT. GALPÃO DE LUND -- CONTINUOUS

Lund entra no seu Galpão e toma um choque. Tudo está uma bagunça. Ele avista Brant dormindo mais ao fundo. Furioso ele avança em direção a Brant. Ele vê uma série de garrafas ao pé da cadeira. Ele vira a cadeira onde Brant está dormindo

PETER LUND
O que é isso ?

Brant acorda assustado

PETER LUND
O que você está fazendo comigo ?

Os convidados começam a sair de fininho. O sanfoneiro já guardou suas coisas e já está de saída. Brant finalmente se levanta

BRANT
Professor... não se preocupe...

Lund senta no chão desolado.

Neste momento ele percebe o Mural de Brant pintado e sua preguiça gigante, quase de carne osso, em uma tela imensa que ocupa toda uma parede do Galpão.

Lund se levanta e vai em direção ao mural. Ele sorri para Brant que já está arrumando a bagunça. Lund balança a cabeça e sai do Galpão.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Lund se prepara para mais uma expedição. Desta vez são uma dezena de carregadores e o mesmo númeroo de mulas. Lund e Brant montam em suas mulas e indicam para que a tropa avance

EXT. TRILHA NO VALE DO RIO DAS VELHAS -- NIGHT

A expedição de Lund acampa a beira da estrada. Os escravos montam barracas sob a supervisão de Brant.

INT. BARRACA DE LUND -- NIGHT

Lund e Brant examinam mapas

PETER LUND
Acredito que subindo este rio vamos encontrar mais cavernas

BRANT
É bem prov1vel, professor

PETER LUND
Amanhã vamos em direção ao rio. Avançaremos a uma pequena distância da margem por todo o dia. Vamos ver o que encontramos

EXT. TRILHA NO VALE DO RIO DAS VELHAS -- DAY

Lund e a sua Caravana avançam em uma mata . A trilha é feita pelos escravos que vão a frente a base do facão. Lund olha para a bússula . Brant , que está bem atrás de Lund, avança penosamente entre os galhos.

Mais a frente eles saem da mata e se deparam com um enorme clareira e um grande paredão de pedra.

A expedição avança rápido pela clareira até chegar aos pés do Paredão. Lund sorri para Brant

PETER LUND
Vamos acampar aqui. Amanhã quero percorrer esta parede para ver se encontro um entrada. Com certeza existe uma caverna aqui

BRANT
Provavelmente estamos sobre ela

EXT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Lund está com Brant e mais 2 escravos. Eles avançam colados a parede. A vegetação invade a pedra e torna o caminho difícil e penoso. Lund já está arranhado no rosto e Brant tem as roupas meio rasgadas.

Lund finalmente encontra a passagem na pedra.

PETER LUND
Voilá

Brant dá uma olhada no buraco

BRANT
Parece assustador

PETER LUND
Está sentindo a corrente de ar? É aqui mesmo. Brant retorne ao acampamento e traga o nosso material. Vamos entrar ainda hoje

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Lund ajeita a lamparina pregada em seu chapéu. Dois carregadores fazem o mesmo.

Brant prepara as cordas.

Lund entra na gruta, os dois carregadores o acompanham. Brant permanece na entrada junto com mais alguns homens

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- CONTINUOUS

Lund avança pela escuridão. Atrás dele os dois ajudantes seguem os seus passos.

Lund e seus acompanhantes se esgueiram em uma fenda

Lund chega a um grande salão. Ele se dirige a um dos homens

PETER LUND
Volte até a entrada da caverna e diga a Brant que vamos instalar um acampamento aqui

AJUDANTE
O senhor vai dormir aqui dentro ?

Lund sorri e balança afirmativamente a cabeça

PETER LUND
Siga a corda até a saída e traga as minhas ferramentas e tudo o que for necessário

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- NIGHT

Peter Lund, com a ajuda de 2 homens, faz uma escavação a luz de lampiões. Com um pincel ele retira cuidadosamente o excesso de terra de cima de um osso que ele acaba de descobrir

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- LATER

Uma boa parte de um esqueleto quase que intacto está em alto relevo sobre terra. Dentro de um buraco Lund trabalha cuidadosamente.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- LATER

Lund aplica gesso sobre o esqueleto que está quase que totalmente livre da terra.

Depois que o gesso seca, Lund reira todo o esqueleto, ainda preso em uma camada de terra. Nesse momento o salão está cheio de gente. Todos estão envolvidos nesta delicada operação.

Brant coordena o transporte cuidadoso do achado de Lund

EXT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Lund, Brant e sua expedição partem da Gruta. A caravana toma seu rumo e Lund e Brant seguem atrás montados em suas mulas. Lund não para de falar com Brant. Ele gesticula e está visivelmente entusiasmado.

EXT. COLINA -- CONTINUOUS

Ao lado de dois capangas, Claussen observa a movimentaÇão da tropa de Lund.

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Ossos estão cuidadosamente enfileirados em uma bancada. São muitos ossos e no final da bancada está Lund que limpa os ossos.

Ao lado, Brant desenha alguns croquis

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Chica, a mucama de Ofélia, está parada em frente ao esqueleto da preguiça gigante. Ela ainda exita antes de examinar com mais cuidado os ossos do enorme animal

Mais ao fundo do Galpão, Ofélia serve uma bebida quente a Lund e a Brant. Lund beija a mão de Ofélia.

Brant mostra o desenho que está fazendo a Lund e Ofélia.

Um desenho preto e branco do majestoso Tigre de Dentes de Sabre

LAGOA SANTA. PERÍODO PLEISTOCENO. 20000 A.C

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- DAY

Dois olhos observam por entre as folhagens.

Ao longe, uma Preguiça gigante inicia sua subida em uma árvore. Aos poucos ela vai subindo, muito lentamente. Na subida ela produz um barulho no atrito de suas garras e unhas com o tronco da árvore.

Os olhos já não estão mais entre as folhagens

A preguiça para de subir. Ela subiu pouco e não está a mais de 2 metros do chão. Ela olha para os lados. Um silêncio se faz na floresta. A preguiça volta a subir.

Mais um pouco e ela para de novo. Desta vez para recolher com um dos braços folhas de galho para comer.

A preguiça come. Agora é o "croque" do mastigar da preguiça que domina o som da floresta.

Como uma flecha o tigre sobe os 3 ou 4 metros que separam a preguiça do solo. Como um gato subindo em uma árvore, o tigre em 3 pulos já está grudado no cangote da preguiça que urra.

Os dois permanecem assim engalfinhados até a preguiça perder as forças e largar do tronco. O bicho cai da árvore com o tigre grudado. mas antes de chegar ao solo o tigre se desvencilha do peso que cai e, com um pulo, aterrisa enquanto a preguiça desaba no chão levantando uma nuvem de poeira e folhas secas

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- EVENING

A beira da lagoa, em baixo de uma árvore. Vários filhotes de tigre brincam. Eles estão com a cara manchada de sangue. Ao lado deles a tigresa ainda mastiga uma parte da preguiça.

A tigresa se levanta e vai até a beira da lagoa onde bebe água. Os filhotes a acompanham.

A tigresa se deita à sombra. Os tigresinhos fazem o mesmo

Uma família de tigres dorme em baixo de uma árvore sob um céu poente deslumbrante

LAGOA SANTA 1837

EXT. MARGEM DA LAGOA -- EVENING

Sob a luz do pôr do sol, Ofélia e Lund passeaim a beira da lagoa

PETER LUND
Estou muito feliz, senhorita. Minhas pesquisas têm repercutido intensamente na Europa. O Próprio rei Cristiano VIII, está interessado em me financiar

OFÉLIA
Você tem se esforçado bastante, merece esta recompensa

PETER LUND
Tudo tem sido tão perfeito até aqui...

OFÉLIA
Quase perfeito. O senhor me prometeu que me ensinaria música...ainda estou esperando o professor

Lund sorri

PETER LUND
Se é isto que falta para a perfeição, então a perfeição está completa

Ele aponta para uma carroça. Em cima da carroça estão muitos instrumentos, com destaque para um piano.

Ofélia não se contém e salta nos braços de Lund que fica embaraçado. Quando eles se separam, Ofélia se debruça na carroça e vê a multitude de instrumentos

OFÉLIA
Agora sim, Lagoa Santa vai virar uma cidade

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund e Brant estão jantando,

PETER LUND
Você precisava ter visto o rosto dela, o sorriso que ela me deu... foi lindo

BRANT
Sim, tudo é muito lindo, muito romântico, mas quem vai tocar todos estes instrumentos...

Lund continua mastigando

BRANT
... que eu saiba o único músico da cidade é o sanfoneiro que não passa nem aqui na porta depois..

Brant interrompe sua fala quando percebe que vai tocar no assunto da festa de arromba no galpão. Ele põe a mão na boca

PETER LUND
... depois daquele festim, queres dizer...

Brant abaixa a cabeça

PETER LUND
Ora meu caro. Quem mais poderia tocar estes instrumentos... o povo de Lagoa Santa

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Uma fila se forma na porta da casa de Lund. Velhos, jovens e crianças, homens e mulhers aguardam a sua vez de fazer uma ficha com Brant que está em uma mesa anotando os nomes das pessoas.

As pessoas saem da mesa de Brant e aguardam em uma ante sala em pequenos grupos. Dentro da sala ao lado o som de instrumentos

Lund faz um teste com as pessoas. Com um trompete na mão ele diz ao ATENDENTE da venda

PETER LUND
Tente tirar este som

Lund faz o dó no trompete. O atendente olha admirado. Lund passa o trompete para o atendente, que o pega como se fosse algo sagrado. O infeliz tenta tirar o som Dó e o que sai é um ruído horroso

Lund faz gestos bizarros com a boca tentando fazer mímica da embocadura correta

PETER LUND
Feche os lábios...assim

O atendente da venda se espreme mas o que ele consegue arrancar é um gemido desesperado que sai da corneta junto com um monte de saliva

Lund balança a cabeça

PETER LUND
Tudo bem...ensaiaremos mais da próxima vez

Lund toma o trompete do atendente que resiste em largá-lo. Quando ele solta. Lund o carrega pelo braço até a porta.

Ainda na porta, Lund se dirige aos que estão na ante-sala

PETER LUND
O próximo !

Um senhor alto e forte, aparência calejada se levanta e sorri. Ele não tem um dente sequer na frente.

Lund devolve o sorriso sem graça

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- NIGHT

Lund se apresenta ao piano para o anfitrião, Ofélia e Brant. Todos estão confortavelmente instalados em poltronas. Brant e Valdir tomam um conhaque.

Mais atrás, na porta da cozinha, os escravos e a criadagem se espremem para ouvir Lund tocando.

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- MOMENTS LATER

Na mesa de jantar estão Valdir Magalhães , Ofélia, Lund e Brant. Todos estão tomando uma sopa. Brant, cutuvelo a mesa, gênero esfomeado, está alheio a conversa que travam os outros três comensais

VALDIR MAGALHÃES
Fiquei sabendo professor que seus achados aqui na região estão repercutindo na Europa

PETER LUND
É verdade. Estou progredindo rapidamente. Meus estudos estão sendo de grande valia na Europa. A preguiça gigante é um verdadeiro sucesso

Todos riem, até Brant com sua boca melecada de sopa

PETER LUND
Com efeito Senhor, estou enviando dentro de alguns dias mais material para o Museu da Dinamarca que é, como o senhor sabe, quem financia tudo isso

Valdir Magalhães coça o queixo

VALDIR MAGALHÃES
É verdade,... e olha que não é pouco....

Ofélia se intromete

OFÉLIA
E quanto aos músicos. Como o senhor está indo com a a Banda de Lagoa Santa

Brant desta vez se interessa

PETER LUND
Temos feitos audições

Brant limpa o o ouvido com o dedo

BRANT
E que audições...

Lund sorri

PETER LUND
Conseguimos oito ou doze rapazes que tiveram mais facilidade

VALDIR MAGALHÃES
Não se fala em outra coisa na cidade...

PETER LUND
Foi realmente surpreendente ver como tanta gente se interessou pelo nosso convite.

Valdir Magalhães esfrega as mãos enquanto uma escrava tira os pratos dos convidados

VALDIR MAGALHÃES
A cidade está crescendo.. as águas desta lagoa estão ficando famosas professor

Lund sorri amarelo

PETER LUND
Espero que ela consiga suportar uma cidade as suas margens

Ofélia insiste e faz trejeito

OFÉLIA
Estávamos falando da bandaaaa...

PETER LUND
Pois é. Temos 10 ou 12 músicos. Eles já conseguem até fazer a escala cada qual em seu instrumento

Neste momento entra o prato principal. Um belo assado vem pelas mãos de dois escravos. Eles depositam o assado no centro da mesa. Os olhos de Brant brilham

EXT. MATA DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund está passeando pelas redondezas de Lagoa Santa. Em uma mata ele caminha sossegado. Ele observa as plantas e os detalhes das árvores. De repente ele encontra uma linda flor azul.

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund escreve a luz de um lampião

PETER LUND
...te felicito com muito orgulho caro primo. Esta cadeira é mais do que merecida a você. Toda Universidade ganha com isso, Quanto a mim, parece que minha felicidade não tem fim. Lagoa Santa é um paraíso na terra. Tenho até medo. Você sabe... a lei das probabilidades não permite que haja um só ganhador. Um NoruegUes Andreas Brant tem me servido de auxiliar. Trata-se de uma artista seus desenhos, gravuras..

Lund passa os olhos pela parede de sua casa onde muita coisa de Brant está pendurada

PETER LUND
Imagine você. Um cientista e um artista trabalhando juntos. É difícil... tenho que lhe confessar. Valores como disciplina, método ou organização são como uma visita ao inferno para alguns deles.

Lund sorri

PETER LUND
...tenho sido condescendente com ele porque , nunca em minha vida consegui criar algo. Eu descubro,eu explico, mas nunca consegui criar. Deve ser assim que eles funcionam. Creio que ele, por sua parte, deve me achar um escravo das normas e procedimentos, um prisioneiro da razão.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Lund despacha umas mulas com seu material. Lund verifica como estão as amarras nas mulas e de como vai seguir o seu material.

Brant está ao seu lado enquanto ele dá ordens ao tropeiro.

Lund mostra ao tropeiro um envelope e enfia o envelope no alforje do tropeiro

A caravana sai

EXT. ESTRADA DE SABARÁ -- DAY

Montado em sua mula o tropeiro avança pela estrada. A caravana segue devagar com o tropeiro puxando meia dúzia de mulas

EXT. ESTRADA DE SABARÁ -- NIGHT

No acampamento a beira da estrada, o tropeiro mexe uma panela com uma gororoba dentro. De repente um cano de pistola encosta em suas têmporas

INT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- DAY

Claussen está no meio das caixas de Lund e um monte de material. Ele vasculha até achar, estudos e escritos.

Claussen folheia um dos escritos. No final do livro , onde está assinatura de Peter Lund, a página é arrancada

Claussen assina na primeira página do Estudo : PETER CLAUSSEN

CLAUSSEN
Quem disse que Peter Claussen não tem estudos publicados

Claussen ri e toma. Ele toma um gole de uma enorme caneca

LAGOA SANTA 2001

EXT. CASA DE MARIA DOS ANJOS -- DAY

Anita e Vicentinho ajudam Maria dos Anjos a dar comida para as galinhas

MARIA DOS ANJOS
Apesar das suas dificuldades, Lund ainda encontrava tempo para seus amigos e vizinhos...

EXT. MARGEM DA LAGOA -- DAY

Uma bandinha toca desafinada debaixo de um grande galpão. Mal vestidos e desconfortáveis em um uniforme todo amarelo eles tocam em uma festa. Lund e ofélia sorriem em meio a muitas mulheres. Ofélia está com a flor azul que Lund achou na mata.

MARIA DOS ANJOS
...Era com Lund que os problemas eram resolvidos. Ofélia reclamou que as lavadeiras queimavam ao sol, e ele construiu um galpão para elas lavarem suas roupas na sombra. Foi até a bandinha que inaugurou o galpão das lavadeiras

ANITA
E Ofélia. E o casamanto deles

VICENTINHO
Meu pai já ia tá preocupado se fosse pai da Ofélia

MARIA DOS ANJOS
Eles iam até ficar noivos, mas aí a guerra chegou

ANITA
Guerra ?

VICENTINHO
Guerra !

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Cerca de 3 dezenas de homens fortemente armados chegam a praça de Lagoa Santa. Um habitante local varre a frente de sua casa em frente a praça. Um homem a cavalo chega liderando dezenas de outro e se dirige a ele

TEÓFILO OTONI
Meu nome é Teófilo Otoni. Leve-me ao prefeito desta cidade

O morador coça a cabeça. Mais gente se aglomera

MORADOR DE LAGOA SANTA
Ói. Prefeito nóis não tem não. Mas tem o Dr lund que mora naquela casa ali descendo pra a Lagoa

Téofilo Otoni vendo que muita gente já se amontoa na praça resolve dscursar

TEÓFILO OTONI
Cidadãos de Lagoa Santa. A Revolução liberal chegou a Minas. Vocês são agora cidadãos e não mais súditos de rei ou imperador algum. Orgulhem-se. Lagoa Santa entrará para a história...

Mais ao fundo os caipiras já comentam. Um deles que pita seu cigarro e ouve o palavrório de Otoni comenta com o companheiro ao lado

CAIPIRA DE LAGOA SANTA
"cabou nossa tranquilidade, Chegou os puliticu".

EXT. PRAÇA DE LAGOA SANTA -- LATER

Teófilo Otoni desce a rua acompanhado de 3 dos seus comandantes.

Os homens da revolução estão cavando trincheiras e organizando posições de defesa.

A cidade está de ponta cabeça. O armazém de Valdir Magalhães está sendo esvaziado pelos homens de Teófilo Otoni, diante dos olhos do seu proprietário e de Ofélia que chora junto a sua mucama.

Teófilo Otoni passa com seus oficiais na porta do estabelecimento como se a reação dos proprietários e o saque que os seus homens fazem fossem a coisa mais natural do mundo.

Mais abaixo na rua, uma confusão se instala na frente da casa de Lund. Quatro ou cinco homens tentam segurar um Lund que se debate que nem um louco. O comandante e seus homens passam ao galope.

EXT. PRAÇA DE LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

Otoni chega ao local onde Lund se debate enquanto 4 homens tentam agarrá-lo. Os soldados finalmente imobilizam Lund

TEÓFILO OTONI
O que está acontecendo aqui ? Quem é o senhor

PETER LUND
Isto é um ultraje. Sou o Profesor Peter Lund... me soltem



Teófilo Otoni manda que seus homens soltem Lund

PETER LUND
Que raios de revolução é esta que passa por cima de flores ? Qual o propósito destes saques e desta destruição ?

Teófilo Otoni não se abala

TEÓFILO OTONI
Estamos em guerra senhor.

Sem descer do cavalo ele se dirige a Lund

TEÓFILO OTONI
Já ouvi falar do senhor. Cientista Dinamarquês, estudando os mistérios da Província de Minas gerais

Lund resmunga qualquer coisa em dinamarquês. Teófilo Otoni prossegue

TEÓFILO OTONI
Como estrangeiro o senhor tem a proteção total do governo provisório que faremos instalar nesta cidade. O senhor é nosso convidado. Mas o advirto que, como estrangeiro, o senhor deve se abster de se envolver políticamente

PETER LUND
E quem é que quer se envolver em política senhor...

Lund se aproxima de Teófilo Otoni

PETER LUND
... Sou um cientista Sr Otoni. E espero sinceramente que o novo governo não prejudique pesquisas importantes que fazemos na região. Todos temos a ganhar com isso

TEÓFILO OTONI
É também em nome da ciência que fazemos esta revolução Professor. O senhor terá toda a liberdade para pesquisar, fique tranquilo. Esperamos em contrapartida a sua colaboração

Lund assente com a cabeça. Teófilo Otoni lhe faz uma saudação militar e segue o seu caminho junto com seus homens

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund e Teófilo Otoni passeiam pelo Galpão de Lund. O Professor e Brant mostram ao revolucionário, o pequeno museu que já se formou no local

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund recebe o Sr Valdir Magalhães. Eles conversam na sala de Lund e mantém a porta aberta, por onde se pode observar as luzes e a movimentação do acampamento dos revolucion1rios

VALDIR MAGALHÃES
A situação está crítica. Há notícias de que as tropas do Imperador estão a caminho de Lagoa Santa. Temo pela destruição da cidade

PETER LUND
Estamos no meio de uma guerra.

VALDIR MAGALHÃES
Aconselho o senhor a protejer suas coisas Professor. A mim já não resta mais nada. Felizmente tenho economias na corte, que certamente terei que utilizar para recomeçar minha vida quando isto acabar

PETER LUND
Será que um dia as guerras vão acabar ?

EXT. IGREJA DE LAGOA SANTA -- DAY

Um tiro de canhão atinge em cheio a torre da igreja que voa em pedaços. Começa um corre-corre de soldados e da população.

EXT. POSIÇÃO DE ARTILHARIA DE CAXIAS -- DAY

Um Oficial do Exército Imperial caminha no acampamento militar. A poucos metros adiante, a artilharia está atirando.

Os soldados estão em formação e ajeitam baionetas ao comando de um oficial.

Outro Oficial adentra a tenda do Comandante

INT. TENDA DO DUQUE DE CAXIAS -- CONTINUOUS

O Oficial adentra a tenda e encontra o Duque de Caxias de costas.

OFICIAL DE CAXIAS
Tudo pronto General Lima e Silva. Os homens aguardam seu comando

O general não fala nada por um instante. Depois ele se vira para o oficial que se perfila.

DUQUE DE CAXIAS
Agora eles vão sentir o peso da minha indignação

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA

Ofélia, a mucama e Sr Valdir procuram abrigo na casa de Lund. Eles correm por entre bombas que explodem nas casas de Lagoa Santa.

Na praça, um canhão dos rebeldes responde ao fogo dos realistas até ser atingido em cheio por uma bomba.

O Galpão das Lavadeiras recebe também sua salva de bombas.

Ofélia chega ao Galpão de Lund junto com seu pai e Chica

INT. GALPÃO DE LUND -- CONTINUOUS

Lund e Brant correm de um lado para o outro tentando salvar o que é possível salvar. Quando Lund vê Ofélia ele corre ao seu encontro.

PETER LUND
Venham para minha casa, rápido

Lund leva Ofélia e os outros para sua casa por uma porta no Galpão. Brant pemanece tentando salvar o pequeno Museu de Lund.

Lund instala Ofélia, seu pai e mucama em um cubículo da casa.

PETER LUND
Fiquem aqui ... eu já volto

Lund volta para o Galpão. No momento em que ele entra, tudo desaba sob o impacto de uma bomba.

Brant fica sob os escombros

EXT. COLINA -- CONTINUOUS

O General Lima e Silva ordena o ataque. Do alto da colina os soldados avançam.

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Uma aranha fia sua teia no teto de uma casa. De repente uma mariposa se prende. Rapidamente a aranha se dirige ao local e envolve a mariposa com sua teia.

Brant está com os olhos abertos olhando para o teto. Ele está deitado em uma cama.

Ele é mais um paciente dentre uma dezena que se espalham na sala de sua casa que foi transformada em enfermaria.

Ofélia e Lund se aproximam. Eles estão com aventais brancos. Brant os vê. Ele tenta levantar o tronco e não consegue. Ofélia se precipita para ajudá-lo.

OFÉLIA
Não se mexa... fique quieto

BRANT
O que aconteceu ... meus desenhos, minha gravuras..

OFÉLIA
Não se preocupe.. Peter conseguiu salvar o que pôde ser salvo. Seus desenhos e o suas gravuras estão intactos, ou pelo menos, uma boa parte delas.

Brant suspira e volta a enfiar a cabeça no travesseiro

OFÉLIA
A guerra acabou. Estamos sob a proteção do Duque de Caxias que está cuidando para que o nosso Museu esteja, em breve, novamente de pé

BRANT
O que estão fazendo todos aqui ?

OFÉLIA
A casa de Peter é agora o hospital de campanha do exército do General Lima e Silva

PETER LUND
Como médico me senti na obrigação de cuidar destes rapazes.

Ofélia olha para Lund e sorri

OFÉLIA
Eles não têm culpa...e eu não esperava outra coisa de você

Brant sorri

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Ofélia está alimentando Brant com uma sopa, Lund está com ela.

Ao seu lado ainda existem algumas camas, mas a enfermaria está bem mais vazia.

Neste momento entra o Duque de Caxias seguido por alguns oficiais.

Todos param o que estão fazendo ao passar do General que vai direto onde está Peter Lund.

Lima e Silva acena para um ajudante que indica Lund. Ele faz uma reverência a ofélia e se dirige secamente a Lund

DUQUE DE CAXIAS
Bom dia Professor Lund, sou o General Lima e Silva, Duque de Caxias, venho visitá-lo em nome de sua Alteza Real D Pedro II que está muito preocupado com as repercussões desta rebelião sobre os seus estudos aqui na região.

PETER LUND
Obrigado por sua visita General. Vejo que as bombas que o senhor envia não fazem justiça a sua cortesia

Caxias não ri ou esboça qualquer reação

DUQUE DE CAXIAS
Infelizmente o senhor estava no lugar errado na hora errada. Espero que daqui para frente o senhor tenha toda a tranquilidade para trabalhar. Tenha um Bom Dia.

Dito isto , o general sai como entrou. Seguido por um séquito de oficiais e parando tudo a sua passagem.

Lund comenta com Ofélia

OFÉLIA
Nossa... seco e direto como uma lei matemática

Ofélia complementa

PETER LUND
Não se ganha uma guerra com palavras

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Na varanda de sua casa, Lu está sentado em uma cadeira de balanço com um cobertor nas pernas. Ele toma algo em uma caneca e tem um livro ao seu lado. Lund está entediado. Brant, apoiado em muletas, chega a seu lado. Lund se levanta e arruma uma cadeira e ajeita Brant. Os dois se sentam

BRANT
Como estamos hoje professor

PETER LUND
Agoniado. Não aguento mais esta casa. Preciso voltar para as grutas

BRANT
Tudo tem o seu tempo professor.Em breve tudo estará como antes

PETER LUND
Uma guerra no meio de meus sítios. Como é que eles conseguem isto ?

BRANT
Professor, o que são ossadas diante da luta pelo poder?

PETER LUND
Muito mais que esses idiotas crêem. Poder e conhecimento são uma coisa só. Poder sem conhecimento é arrogância.

BRANT
Espero que o senhor não diga isso ao próximo general que passar por aqui.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Lund continua a escavação. Desta vez ele localizou uma enorme presa e tenta livrar a peça da areia. Lund trabalha sozinho na gruta.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- NIGHT

Lund prepara uma cama dentro da Caverna. Ele ajeita uma manta , se cobre e deita.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Lund continua sua escavação para retirar a enorme presa. Com cuidado ele vai tirando a terra do buraco. Ele faz marcações de nível em uma das paredes do buraco.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- NIGHT

Lund, toma uma caneca de café e come um pedaço de carne seca. Ele continua sozinho na caverna.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- DAY

Brant chega ao sítio paleontológico de Lund. Lund trabalha dentro do buraco e está um lixo . Os cabelos duros, a cara marrom e as roupas imundas

BRANT
Professor Lund, o senhor já está aqui há 3 dias, não seria melhor sair e descansar um pouco ? Quem sabe tomar um banho ?

Lund continua cavando

PETER LUND
Não se preocupe. Você já viu o que encontrei ? Esta cidade é realmente uma Mina de Ouro.

Lund ri sozinho, ele fala mas continua trabalhando

PETER LUND
Tenho uma mina de ouro a alguns quilômetros da minha casa

Brant balança a cabeça e não responde

PETER LUND
Faça-me um favor, vá a cidade e traga ajuda, estou perto de retirar esta presa

Brant permanece onde está

PETER LUND
O que está esperando ?

BRANT
Professor eu tenho uma notícia que o senhor não vai gostar muito

Lund finalmente para de cavar

BRANT
o senhor recebeu um convite de Ouro Preto..

PETER LUND
Convite, não vou gostar, o que é.. não mediga que tem outra revolução?

BRANT
Não senhor, fora do buraco as coisas estão normais

PETER LUND
Odeio suas piadinhas Brant

BRANT
O senhor está sendo convidado para a apresentação de Peter Claussen sobre o Tigre Dentes de Sabre encontrado aqui na caverna

Lund faz cara de que não entendeu. Brant põe a mão na cabeça

BRANT
Peter Claussen roubou seus estudos e os divulga como seus no Brasil e na Europa. Entendeu agora ?

Quando cai a ficha , Lund fica possesso

PETER LUND
Maldito, esse pústula precisa de uma lição

Antes que Brant termine de falar sua frase, Lund já está a acaminho da saída

BRANT
Claussem vai estar...

Ao ver que Lund já está longe. Brant balança a cabeça, retira uma garrafa do bolso e toma um grande gole. Ele pensa alto

BRANT
Só mesmo Claussen para tirá-lo daqui. Essa história desses dinamarqueses ainda vai acabar mal

Brant dá de ombros e toma um outro gole da garrafa.

INT. UNIVERSIDADE DE OURO PRETO -- DAY

Uma dezena de estudiosos estão presentes no salão nobre da universidade.

Claussen parece que está em casa. À vontade ele circula no ambiente, Dá e recebe tapinhas nas costas dos pesquisadores e é tratado como um colega por todos eles.

Em um canto do salão, Lund está escondido sob um enorme chapéu. Ele observa tudo de longe na companhia de Brant.

Claussen sobe a tribuna para apresentar o "seu" trabalho. O burburinho cessa e todos procuram uma cadeira para se sentar. Depois que o silêncio se instala . Claussen começaa a discursar.

CLAUSSEN
Mes chers colègues. Tenho a honra e o privilégio de apresentar aos meus pares....

Lund comenta com Brant que lhe pede silêncio

CLAUSSEN
Pares ? O grosseirão é um aventureiro...

Claussen continua seu discurso

CLAUSSEN
Estamos reunidos hoje para conhecer o Tigre Dentes de Sabre, a minha altima descoberta

Neste momento Lund perde a cabeça.

PETER LUND
Impostor , canalha..

Brant põe a mão na cabeça. A platéia se vira para Lund com um "oh!".

Claussen se surpreende.

Lund avança em direção a tribuna

PETER LUND
Este homem é um ladrão...

Claussen sai da tribuna e parte para agredir Lund. A turma do deixa disso se interpõe mas não evita o bate-boca

PETER LUND
Ladrão, você roubou mihas pesquisas

CLAUSSEN
Eu vou te matar...

INT. CASA DO BARÃO DE CAMARGOS(OURO PRETO) -- NIGHT

Lund e Ofélia jantam com a família do Barão

PETER LUND
Creio que dei uma lição naquele plagiador sem caráter

BARÃO DE CAMARGOS
É...eu creio que o senhor acabou com a carreira de paleontólogo de Peter Claussen

Eles riem

PETER LUND
Além da desmoralização ele merecia muito mais ... ele merecia a cadeia

OFÉLIA
Vamos falar de outra coisa, vamos esquecer Peter Claussen

PETER LUND
A senhorita tem razão. Vamos falar do mastodonte que encontrei

Ofélia faz cara de entediada

PERÍODO PLEISTOCENO

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- DAY

Tigres de Dente Sabre descansam a beira da Lagoa. Um dos tigres dorme profundamente.

De repente ele acorda. Um barulho surdo acontece a sua volta. O tigre fica em alerta. Ele começa a correr quando aparece uma manada de mamutes na beira da Lagoa.

Um mamute enorme avança em direção dos tigres, urrando e levantando ameaçadoramente sua tromba. Os tigres levantam e saem correndo. O mamute vai conferir se os inimigos já foram rechaçados.

A manada então se aproxima e toma conta do lugar. Alguns mamutes entram na água, enquanto outros se instalam na margem, inclusive alguns filhotes

LAGOA SANTA 1840

INT. CASA DO BARÃO DE CAMARGOS(OURO PRETO) -- CONTINUOUS

Lund e Ofélia dançam acompanhados por um conjunto de câmara. Outros casais também dançam.

OFÉLIA
Será que podemos agora falar de música.

PETER LUND
Claro que sim. Me perdoe a fluência... mas eu me empolgo

INT. VENDA DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund entra na venda de Valdir Magalhães. Logo as pessoas cercam o professor para cumprimentar e pedir. Lund tenta dar atenção a todos. Valdir sai do fundo da venda e vem socorrer Lund

VALDIR MAGALHÃES
Calma minha gente, depois o Dr Lund vai atender a voces

Valdir pega o braço de Lund e o carrega para o fundo da venda

VALDIR MAGALHÃES
Foi bom o senhor ter vindo. Gostaria de conversar

PETER LUND
Pois não..

VALDIR MAGALHÃES
É sobre Ofélia... o senhor sabe... já se fazem alguns anos que vocês andam por aí.

Lund se apressa em intervir

PETER LUND
Tudo no maior respeito eu lhe asseguro..

Valdir bate nas costas de Lund

VALDIR MAGALHÃES
Eu sei .. Eu sei.. mas o senhor tem que definir esta situação. Não sei como funciona lá no norte

Valdir aponta para o que ele pensa ser o norte

VALDIR MAGALHÃES
...mas aqui em Minas Gerais é assim. O que o senhor quer com a minha menina ?

Lund engole seco com a "intimada". De toda forma ele está constrangido e "da cor de um pimentão". Valdir não desiste

VALDIR MAGALHÃES
...e além de tudo tem o povo...

PETER LUND
.. o povo?

VALDIR MAGALHÃES
É.. já fazem alguns anos que o senhor está aqui ... e nem na casa da das meninas o senhor nunca passou. O Sr. Brant passa sempre por lá, mas o senhor...

PETER LUND
Mas é claro que não.. prostitutas ... imagina

VALDIR MAGALHÃES
Pois o povo tá dizendo, ou o senhor é sonso ou gosta mais de osso do que de mulher

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund arruma uma trouxa e coisas. Água, comida e cobertor. Brant aparece

BRANT
Onde o senhor vai ?

PETER LUND
Para a gruta

BRANT
Mas já é de noite

PETER LUND
Tanto faz, eu vou estar na gruta mesmo

BRANT
Mas...

PETER LUND
Tenho que pensar na minha vida

Lund pega suas coisas e sai. Brant fica na sala por um momento. Ele dá de ombros e depois esfrega a mão.

Ele vai a cozinha. Ele volta com uma mulata em uma mão e uma garrafa na outra

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- LATER

Lund estende suas coisas na caverna. Ele resmunga em Dinamarquês

PETER LUND
Se a gente não respeita a moça é pervertido, se respeita é pederasta. Que país é este ?

Lund deita na sua cama na caverna

PETER LUND
Prefiro o meu buraco

Lund sopra a sua lamparina.

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- MORNING

Ofélia segue o caminho de lamparinas que Lund instalou na caverna. Ela segue até o lugar onde Lund está dormindo.

Ela chega perto de Lund e põe a mão em seu ombro. Lund se vira e vê Ofélia. Ele sorri

PETER LUND
Você quer casar comigo

Ela apenas acena com a cabeça. Eles se beijam

Chica suspira atrás da pedra. Ofélia faz um sinal para que ele vá embora. Chica obedece

INT. GRUTA DA LAPA GRANDE -- MOMENTS LATER

Lund desamarra lentamente o vestido de Ofélia. Ao mesmo tempo, ele acaricia o corpo de Ofélia se detendo em seus seios. Ofélia fecha os olhos e sente as mãos Lund que passam levemente sobre o seu vestido. Finalmente ele tira o vestido de Ofélia e começa a beijar o seu corpo. Pescoço, seios e costas recebem pequenos beijos. Ela o ajuda a tirar suas roupas.

Nus, ele rolam na cama improvisada na caverna

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- NIGHT

Valdir Magalhães dá um abraço tão forte que Lund derrama quase todo vinho de sua taça. Valdir Magalhães tira um charuto do bolso e enfia na boca de Lund.

Ofélia ao piano, sorri

Chica a mucama está em prantos em um canto.

Brant de copo cheio e gravata já meio torta, está de olho na criadinha que responde com um sorrisinho as piscadas do "bebum".

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- LATER

Lund, sua noiva , seu futuro sogro e seu amigo completamente bêbado, jantam

PETER LUND
Pois é como eu estou lhe dizendo...

Brant já está meio "adernado" na mesa. Lund retira o seu copo e lhe faz uma cara ameaçadora. Lund lhe devolve um sorriso ingênuo

PETER LUND
... bom. Marcamos o casamento para quando eu estiver de volta de minha próxima expedição

Neste momento Brant despenca no chão.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund se despede de Ofélia com um beijo. Ao lado, o Sr Valdir está orgulhoso e lança um olhar debochado para os cidadãos que estão presentes.

A bandinha toca desafinada, e a cada martelada do bumbo,ou "pratada" de um ritmista, os cavalos ao lado se assustam

Lund monta em um cavalo. Brant, com um enorme curativo na testa, monta em outro. Eles começam a andar.

Alguns metros adiante Lund comenta com Brant

PETER LUND
Na nossa volta tenho que intensificar os ensaios de nossa banda

BRANT
É uma boa providência

EXT. COLINA -- MOMENTS LATER

A enorme caravana de Lund sobe a colina. De Lagoa Santa pode-se observar a longa fila indiana que desaparece atrás do morro.

A bandinha finalmente para de tocar. Dá para perceber que muitos fazem uma cara de alívio.

EXT. SUMIDOURO -- NIGHT

Lund e Brant conversam em frente a uma tenda no acampamento da expedição ao lado da entrada da gruta.

PETER LUND
Este é o lugar ideal para que se acumule ossadas. Tenho informações de que no período da chuva a gruta fica toda inundada

BRANT
Falaram também de inscrições rupestres

PETER LUND
É verdade. Estou ansioso por começar as minhas pesquisas.

Neste momento chega o capataz da expedição. Um homem forte e mal encarado

CAPATAZ DA EXPEDIÇÃO
Está tudo pronto senhor. As ferramentes e mantimentos estão todos descarregados

PETER LUND
Pode voltar ao seu posto

O homem se retira

BRANT
Onde o professor contratrou este homem. Ele me dá calafrios

PETER LUND
Ele me procurou, dizendo que já tinha experiencia em expedições com outros pesquisadores europeus. Uma boa ajuda, voca não acha?

Brant não fala nada

PETER LUND
De qualquer forma, não temos fartura de pessoal por estas bandas. Por enquanto ele parece dominar o seu ofício. Tudo tem saído perfeitamente

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- MORNING

Ofélia têm um acesso de tosse quando está tricotando em seu quarto. Chica lhe trás um lenço. Ofélia tosse no lenço. Pode-se ver algumas manchas de sangue. Chica olha assustada

OFÉLIA
Isso não é nada Chica. Acho que me resfriei.... não diga nada a ninguém

Chica ascente com a cabeça

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- MORNING

Lund e mais 2 carregadores, incluindo o capataz, estão prontos para entrar na caverna. Eles se aproximam da parede que está repleta de desenhos rupestres. Brant já está instalado em frente a parede com sua prancheta de desenho. Lund se aproxima

PETER LUND
Incrível não ?

BRANT
Estou fascinado...

Lund sorri

PETER LUND
Deve ser fantástico encontar as obras de um colega ancestral

Brant sorri

PETER LUND
Estamos descendo. Espero retornar no final da tarde. Cuide de tudo aqui em cima

BRANT
Pode deixar Lund aperta a mão de Brant

BRANT
Boa sorte.

INT. SUMIDOURO -- MOMENTS LATER

Lund e os companheiros avançam na escuridão. A caverna é estreita. Eles chegam a uma parte alagada.

Lund está com água nas canelas.

De repente uma bifurcação e duas entradas.

Lund retira outra corda da cintura e oferece a ponta a um dos homens

PETER LUND
Segure esta ponta e não a largue

Lund penetra na entrada sozinho amarrado a corda que liga aos seus homens.

Lund caminha por um túnel seco por muitos metros.

INT. SUMIDOURO -- LATER

O Capataz olha para os comparsas e faz um sinal. Um deles corta a corta que guia Lund. Eles se retiram.

INT. SUMIDOURO -- CONTINUOUS

Lund sente a tensão da corda diminuir. Ele puxa e a corda vem fácil. Lund puxa ainda um pouco mais e a corda continua vindo. Ele começa a gritar

PETER LUND
Não venham rapazes. Fiquem onde estão ....Alô.....

Depois do silêncio. Lund realiza o seu drama

PETER LUND
Eles me deixaram

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- MOMENTS LATER

O Capataz e os dois comparsas saem apressados da gruta. Eles se dirigem as suas montarias. Brant que está pintando observa a movimentação e se assusta. Em um instante ele compreende tudo quando vê os homens deixarem apressados o acampamento. Brant sai gritando

BRANT
Professor Lund , professor Lund

INT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- DAY

O capataz e seus asseclas recebem uma bolsa de Claussen

CAPATAZ DA EXPEDIÇÃO
Duvido Seu Claussen que o homem saia de lá.

Claussen sorri

CLAUSSEN
Suma da cidade. Suma da região. Não quero ver voc6es por aqui

Os homens concordam e saem

INT. SUMIDOURO -- CONTINUOUS

Lund se desamarra e deixa a corda cair no chão . Ele começa a voltar pelo caminho, seguindo a corda no chão.

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- MOMENTS LATER

Brant organiza uma missão de resgate. Ele e mais 4 homens se preparam para entrar na gruta

BRANT
Atenção para as pegadas no chão. Esta vai ser nossa única forma de chegar ao Professor Lund

Os homens entram na caverna

INT. SUMIDOURO -- MOMENTS LATER

Lund chega até a ponta da corda. Depois dali ele não tem mais nehuma indicação. É tudo escuro. Lund procura o caminho por onde passou.

Ele faz marcas nas paredes por onde passa. Lund continua caminhando pelo labirinto escuro da Gruta, olhando para o chão onde ele vê pegadas. A cada dez metros ele faz uma marca na parede

Lund chega a uma das paredes que ele já marcou. Ele escolhe um outro caminho

INT. SUMIDOURO -- CONTINUOUS

Brant e a equipe de resgate chegam até o final das pegadas. Depois dali existe um corredor alagado. Brant exita

BRANT
As pegadas acabam aqui. Será que eles prosseguiram por aqui. Um dos homens avisa

HOMEM DO RESGATE
Tem sinal de pegadas aqui.

Brant vai examiná-las

BRANT
Eles estão indo em direção contrária. Devem ser dos homens que saíram. Vamos pelo corredor alagado

Os homens entram no corredor.

INT. SUMIDOURO -- LATER

Lund se senta em uma pedra e tenta se lembrar da saída. Lund está preocupado. Ele se levanta e se dirige para mais uma porta da caverna. Antes de entrar ele marca a parede.

Lund percorre algumas dezenas de metros até uma bifurcação. Ele não vê marcas nas paredes

INT. SUMIDOURO -- CONTINUOUS

Brant e o grupo avançam com água nas canelas. Eles chegam a um ponto onde estão vestígios da passagem de pessoas

BRANT
Eles estiveram por aqui

Brant ensaia um chamado

BRANT
Professor Lund ! Professor Lund

Ouve-se apenas os ecos

INT. SUMIDOURO -- LATER

A luz da lamparina e Lund está cada vez menor. Lund dá de cara com uma parede de pedra e é obrigado a retornar. Visivelmente apavorado, respiração ofegante Lund grita pela primeira vez

PETER LUND
Socorro. Alguém

Ouve-se apenas os ecos.

INT. SUMIDOURO -- LATER

Lund retorna a uma sala por onde passou. A luz está cada vez mais fraca. Lund resolve parar e fazer um acampamento. Ele se senta e mexe nos pés. Lund está muito cansado. Ele retira o relógio de bolso e se assusta.

PETER LUND
Meu Deus estou andando há mais de 8 horas

Lund estende um cobertor no chão.

Ele prepara uma fogueira para não perder a luz que se esvai. Ele começa queimando alguns papéis. Depois acrescenta um de seus "piolets". O cabo da ferramenta queima.

Lund se senta no cobertor e começa a separar a sua "lenha". Ao lado ele coloca em fila, outros piolets, uma caixa de madeira, o alforje de couro, o lenço.

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- NIGHT

No acampamento, Brant se reúne com os homens em volta da fogueira

BRANT
Amanhã bem cedo começamos. Quero todos os homens comigo. Vamos entrar e encontrar o professor Lund

Um dos homens presentes comenta com seu colega

CARREGADOR
Humm...seinão. Quilo lá parece um furmigueiro.

INT. SUMIDOURO -- DAY

Lund coloca mais uma ferramenta no fogo. Restam poucos objetos a queimar. Lund toma um gole de água. Já não resta muita água no seu cantil de pano.

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- DAY

Brant e cerca de 20 homens estão penetrando na gruta. Os homens passam diante das pinturas ruprestes e entram na caverna.

INT. SUMIDOURO -- LATER

Lund está quase cochilando. Sua cabeça insiste em tombar, mas ele acorda e olha para o fogo mínimo que já consumiu seus 3 piolets, e quase tudo o que havia. Lund pega o cantil de pano e bebe a última gota. Ele o joga na fogueira, junto com o seu chapéu

INT. SUMIDOURO -- DAY

Brant e alguns homens chegam ao local onde Lund foi sabotado. Eles avistam sinais da passagem de homens. Todos estão no local que está bem iluminado pelas dezenas de lamparinas. Os homens partem em grupos e em diferentes direções

INT. SUMIDOURO -- LATER

Lund dorme em seu cobertor. A fogo está nas últimas

De repente é tudo escuridão.

INT. SUMIDOURO -- LATER

Lund acorda assustado com uma revoada de morcegos. Eles são em tão grande número que Lund luta para não ser atingido por eles. Muitos acertam Lund que com as mãos tenta se defender dos bichos que voam em direção a saída.

Depois de algum tempo o silêncio volta a imperar. Lund, ferido, volta se deitar no chão da caverna.

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- NIGHT

Ofélia acorda assustada em seu quarto.

EXT. CASA DE KIERKEGAARD -- DAY

Kierkegaard fecha um livro.

EXT. CAIS DO PORTO -- DAY

Mulato Henrique sorri e aponta a saída do terminal para Lund

EXT. FAZENDA DE PETER CLAUSSEN -- CONTINUOUS

Claussen bêbado, sorri com um crânio na mão.

INT. SUMIDOURO -- LATER

Um dos homens de Brant encontra Lund encolhido em um canto. Lund está desfalecido.

INT. TENDA DE LUND -- DAY

Lund desperta dentro de sua barraca. O sol reflete intensamente no pano branco da barraca. Lund fecha os olhos. Quando ele reabre os olhos, é Brant que está ao seu lado.

BRANT
Desta vez foi por pouco profesor

PETER LUND
O que aconteceu ?

BRANT
Você ficou 3 dias perdidos naquela caverna

Lund tenta se levantar e não consegue

PETER LUND
Meu Deus, perdi muito tempo, tenho que trabalhar...

Brant sacode a cabeça enquanto obriga Lund a ficar deitado

INT. GRUTA DO SUMIDOURO -- DAY

Lund avista um osso. Ele limpa a terra em volta com todo cuidado. A medida em que ele vai tirando a terra um crânio aparece.

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- DAY

Mamutes estão na beira da lagoa. De longe, no meio da relva, o Homem de Lagoa Santa observa.

INT. GRUTA DO SUMIDOURO -- MOMENTS LATER

Lund retira o crânio com todo cuidado. Ele sorri

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO

Um mamute se desgarra da manada e pasta sozinho a algumas dezenas de metros adiante. Agora são 3 homens que observam na relva. Com lanças e porretes nas mãos ele aguardam a hora de agir

INT. GRUTA DO SUMIDOURO -- CONTINUOUS

Lund guarda o seu crânio com todo cuidado dentro de uma caixa. Ele pensa alto

PETER LUND
Quem é você ?

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- LATER

Meia dúzia de homens atacam o mamute. Enquanto um grupo fura o bicho com suas lanças, outros tentam derrubar o bicho. Um homem já está em cima do animal. O mamute se sacode e lança longe o seu atacante que cai desacordado sobre algumas pedras. Os outros homens continuam o ataque.

EXT. FLORESTA DO PLEISTOCENO -- DAY

Um Homem de Lagoa Santa pinta na parede de pedra. Ele tem nas mãos uma cabaça de onde retira com a ajuda de um pincel uma tinta vermelha.

Ao lado homens "dessossam" o mamute.

Uma mulher dá carne vermelha a duas crianças que se lambuzam com o sangue que pingam dos pedaços de carnes.

Um outro homem arrasta a enorme presa.

Ao longe hienas observam e no céu alguns urubus já estão de prontidão

O Homem de Lagoa Santa pinta o mamute na pedra

EXT. ENTRADA DA GRUTA DO SUMIDOURO -- DAY

Brant copia um animal pintado na pedra.

Neste momento Lund sai correndo da gruta. Ele chega ofegante

BRANT
O que houve ? ...

PETER LUND
Um homem...um homem...

BRANT
Onde ? .. lá dentro ?

Lund balança a cabeça. Brant começa a se preocupar. Lund abre sua caixa.

BRANT
Nossa !...

Lund sorri

PETER LUND
Chegamos a criatura que faltava.

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Lund posa para um retrato para Brant.

Ao lado de Brant, Ofélia faz uma careta para Lund que sai do sério e modifica a pose. Brant faz uma cara de contrariado. Lund pede desculpas com um aceno

INT. ANFITEATRO ACADEMIA DE CIÊNCIAS -- DAY

Acadêmicos comentam o desenho do Homem de Lagoa Santa feito por Brant. Na parede, um aviso indicando a conferência sobre os achados de Peter Lund

EXT. ESCADARIAS DA RELA ACADEMIA DE LONDRES -- DAY

Nas escadarias, da Real Academia um livro com a caricatura de Lund feita por Brant, circula de mão em mão entre jovens pesquisadores

INT. COLLEGE DE FRANCE PARIS -- DAY

Pesquisadores examinam o crânio encontrado por Lund. Do lado, uma caixa com inscrições: Peter Lund, Lagoa Santa, Minas Gerais, Brasil.

EXT. PRAÇA DE LAGOA SANTA -- NIGHT

Em clima de quermesse, com a bandinha tocando desfinada, Lund e Ofélia estão noivando.

Eles recebem os cumprimentos de Valdir Magalhães que ri a a toa. Mais abaixo um grupo ataca uma mesa de quitutes, eles comem como se fosse a última refeição.

LAGOA SANTA 1840

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- MORNING

Ofélia acorda tossindo muito. Chica percebe o desconforto de sua sinhá e lhe toca a fronte. Ela se assusta. Ofélia transpira muito.

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund corre pelas ruas de Lagoa Santa, ele vai em direção a casa de Ofélia.

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- MOMENTS LATER

Lund adentra a sala onde já estão O Sr Valdir e outras pessoas. Lund se dirige ao sr Valdir que está muito abalado. Neste momento,um padre sai do quarto de Ofélia.

INT. CASA DE VALDIR MAGALHÃES -- LATER

Lund adentra o quarto de Ofélia. Ao seu lado Chica e mais 2 mulheres se revezam para colocar compressas e ajudar.

Ofélia delira de febre. Lund se retira chorando do quarto.

EXT. CEMITÉRIO DO PEQUIZEIRO -- DAY

Lund , Brant , O sr Valdir e toda a cidade se espremem no pequeno cemitério do pequizeiro.

Lund planta uma flor azul.

Chica abraça o diário de Ofélia

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Brant entra no Galpão e encontra Lund sentado em uma cadeira, lendo um livro

BRANT
Professor, o senhor ainda aqui. Fazem alguns dias que o senhor não sai daqui.

PETER LUND
Eu estou bem Andreas. Me deixe sozinho, por favor

BRANT
Mas eu tenho algo para lhe mostrar. Eu acabei o nosso Mural da Criação.

Lund esboça um sorriso mínimo

BRANT
Venha vou lhe mostrar

Brant levanta Lund e o conduz pelo braço até o Mural.

Lund olha para o mural que contém todas as suas descobertas

PETER LUND
Falta a maior delas

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund escreve uma carta

PETER LUND
Meu querido primo. Estou lutando bravamente para não cair de vez na escuridão. A vida sem Ofélia é pior do que a experiência que tive, perdido naquela caverna. Também me falta luz, o ar é pesado e quente, um silêncio soturno impera. A diferença é que vou viver isso para sempre

EXT. RUAS DE LAGOA SANTA -- DAY

Lund sai de sua casa. Ele não anda 50 metros e crianças já lhe cercam. Durante o caminho ele é cumprimentado por todos. Os homens tiram o chapéu, as senhoras param em sinal de respeito, as senhoritas sorriem interessadas e até os desocupados da varanda da taberna que erguem os copos quando o Profesor Lund passa

PETER LUND
O que me conforta é o carinho da cidade. Todos fazem de tudo para me agradar e tornar a vida menos difícil. Por isso ainda não desci para sempre a caverna. Muita gente gosta de mim...

INT. PALÁCIO IMPERIAL COMPENHAGEN -- DAY

O REI coordena pesoalmente o transporte das caixas para uma grande área que está reservada para abrigar a coleção de Lund.

Nas caixas pode-se ver escrito: Lagoa Santa - Brasil

KIERKEGAARD
...junto com esta carta segue todo o acervo que faço doação ao nosso Rei Cristiano que sempre soube me apoiar. Não se preocupem, agora passo o meu tempo a me ocupar de minha cidade

INT. GALPÃO DE LUND -- DAY

Lund passa em revista a um grupo de alunos que está perfilado diante de um quadro negro. Os meninos sentam depois que o Professor faz um sinal

PETER LUND
... e tenho muito trabalho a fazer. Seja feliz meu querido primo. Com certeza um dia, junto de Ofélia, eu também voltarei a ser.

EXT. PRAÇA DE LAGOA SANTA -- DAY

Muitas pessoas esperam em torno do jardim da praça.

Pode-se ver os uniformes amarelos da indefectível bandinha.

No centro do jardim, um botão de uma flor azul começa a desabrochar.

Neste instante, sob o comando do Maestro Lund, vestido no horrível uniforme amarelo, a Banda Municipal de Lagoa Santa entoa uma linda música.

Desta vez, a banda toca perfeitamente, enquanto a flor termina de desabrochar.

EXT. TRILHA DO VALE DO RIO DAS VELHAS -- DAY

Claussen está a espreita.

Lund passeia sozinho a cavalo a beira de um riacho.

Claussen aponta uma pistola por entre as folhas e atira

O tiro pega em uma árvore ao lado assustando o cavalo de Lund que empina e derruba Lund dentro d água.

Claussen sai de trás de uma árvore sorrindo

CLAUSSEN
Finalmente nos encontramos

PETER LUND
Peter Claussen, minha penitência. A minha sombra negra que me persegue por todo sertão das Gerais.

Claussen dá uma gargalhada

PETER LUND
Sempre me perguntei. Que diabos dois dinamarqueses tem na cabeça para sair de tão longe e vir fazer uma guerra no Brasil...

CLAUSSEN
E parece que desta vez te encontrei e a Guerra vai ter um vencedor

Lund se levanta todo molhado

PETER LUND
Sim, mas o que o traz aqui. Qual armadilha me preparas agora. Por incrível que pareça,desta vez ,és benvindo

Claussen estranha a afirmação

CLAUSSEN
Chegou a hora de acertarmos nossas diferenças

Lund sorri

PETER LUND
Impossível. Nossas diferenças são tão grandes que é impossível acertá-las.

Lund se senta em uma pedra

PETER LUND
Há alguns anos atrás, talvez pudéssemos fazer isto.No fundo eu e você éramos a mesma pessoa, buscando fama, sucesso e apreço. Nossas diferenças eram mínimas e, até então, podiam ser acertadas.

Claussen ouve atento, pistola na mão

PETER LUND
Hoje em dia acho que não é mais possível. O apreço dos sábios já não me diz nada. O respeito dos banqueiros ou a simpatia dos cortesões não são mais uma obssessão para mim. Eu sou um homem livre da vaidade e da ambição. Creio que no máximo que podemos fazer agora é reconhecer nossas diferenças.

Lund se levanta. Claussen se inquieta

PETER LUND
Portanto, acabe logo com isso. Vou até facilitar

Lund se vira de costas e vai em direção ao seu cavalo que está a alguns metros adiante. Ele se vira de novo

PETER LUND
Vamos Peter Claussen. Atire. faça-me este favor. Ataque da forma que você mais gosta. Por trás, traiçoeiramente

Lund encara Claussen e se vira. Ele anda em direção aos seu cavalo.

Claussen engatilha a pistola e mira as costas de Lund. Ele hesita, aponta de novo.

Ouve-se um tiro.

Lund para onde está, sem olhar para trás

Finalmente Claussen guarda a pistola e comenta consigo mesmo.

CLAUSSEN
Quem precisa de lição de moral..

Depois ele grita para Lund, que se vira

CLAUSSEN
Você já está morto Lund.

Lund monta em seu cavalo. Claussen faz o mesmo e cada um sai para o seu lado.

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Lund ajuda Brant a arrumar suas coisas

PETER LUND
Quando chegares a Oslo fale com o Diretor do Museu que é muito meu amigo e lhe dará um emprego digno de suas qualidades. Não se esqueça, tens 10 dias para chegar ao Rio de Janeiro e tomar o navio

Brant arruma suas coisas sem muito entusiasmo

BRANT
Mas o senhor tem certeza de que não vai mais precisar de mim

PETER LUND
Não meu caro amigo. Encerrei minha carreira de pesquisador quando enviei meus achados para o rei da Dinamarca

Eles se abraçam. Lund lhe passa um maço de notas. Brant se assusta

PETER LUND
Ai está um pouco do que mereces. Sempre me falas da Noruega com nostalgia e com esperança no retorno. Pois aí está a oportunidade

BRANT
Mas é muito dinheiro senhor

PETER LUND
Muito menos do que você merece, meu caro amigo

BRANT
E o senhor ?

PETER LUND
Vou ficar bem. De qualquer forma tenho uma cidade inteira de Brants, de gente amiga e pronta para me ajudar

Brant sorri e os amigos se abraçam.

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MOMENTS LATER

Lund acena para Brant que parte em um cavalo.

INT. GALPÃO DE LUND -- NIGHT

Lund passeia pelo galpão completamente vazio. Ele para diante do Painel da Criação feito por Brant. Lund fala consigo mesmo

PETER LUND
A esta altura Brant já deve estar embarcando para rever a sua Noruega

Lund sorri satisfeito

EXT. RUAS DE SABARÁ -- NIGHT

Brant passa a cavalo pelas ruas iluminadas da cidade. Ele passa diante do cabaré. Uma mulher, debruçada na janela lhe sorri. Brant retribui

INT. CABARÉ EM SABARÁ -- NIGHT

Brant é o rei em uma noitada no cabaré. Na companhia de 3 mulheres e uma garrafa de campagne na mão. Brant se diverte como um louco. No meio dos beijos das mulheres, do assédio dos amigos de ocasião, ele ainda tem força para anunciar bêbado como um gambá

BRANT
Champagne, mais champagne, Hoje a festa é por minha conta.

INT. CADEIA DE SABARÁ -- DAY

Lund chega com o carcereiro a cela de Brant onde o Norueguês dorme apenas de ceroula

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

O sol matinal entra pela janela adentro onde Lund lê em uma poltrona. Com uma xícara fumegante na mão e uma carta na outra, Lund parece traquilo e confortável sob o sol da manhã

KIERKEGAARD
As pessoas nem acreditam e eu imagino a cara que você está fazendo agora...

Lund sorri

KIERKEGAARD
..mas é verdade. Casei-me com uma linda moça que entende minhas idiossincrasias e o que é melhor,ou pior, ela lhes estimula e lhes aprofunda. Pode acreditar...

INT. CASA DE KIERKEGAARD -- NIGHT

Sören e REGINA Olensen rodopiam no salão. Muitos convidados elegantemente vestidos observam os noivos

KIERKEGAARD
Seu nome é Regina Olensen e é uma moça surpreendente. Inteligente, culta, parece ser uma esposa ideal para um homem como eu.

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- CONTINUOUS

Lund deposita a xícara em uma mesa. Chica entra para recolher a xícara

LUND
Obrigado Chica.

A criada sai. Lund volta para sua carta.

EXT. CASA DE KIERKEGAARD -- MORNING

No jardim da casa dos Kierkegaard, Soren e sua esposa estão confortávelmente instalados em poltronas, cada qual lendo o seu livro. No meio uma mesa com um lindo café da manhã já metade consumido.

Soren pega uma ameixa e oferece a sua esposa. Ela sorri e aceita a fruta. Os dois parecem tranquilos e felizes.

KIERKEGAARD
De qualquer modo estou casado e me sinto feliz. Mesmo os solitários convictos, o que é certamente o meu caso e parece ser o caso dela também, têm que admitir: é melhor estar sozinho acompanhado do que sozinho sozinho

EXT. LAGOA -- EVENING

Lund toma banho na lagoa ao entardecer. Ele está sozinho

LAGOA SANTA 1855 (10 ANOS MAIS TARDE)

EXT. LAGOA SANTA -- DAY

A comitiva do Imperador Pedro II adentra a cidade. Uma cavalaria garbosa precede a carruagem imperial e outras carruagens da comitiva. No final mais homens a cavalos.

A Bandeira Imperial vem na mão de um dos cavaleiros que avisa a todos

CAVALEIRO
Atenção para o Imperador... Abram alas para o Imperador

A multidão se afasta para que a carruagem do imperador possa passar. Todos fazem reverência a sua passagem.

A carruagem para na frente da Casa de Lund.

Um dos cocheiros desce solene e bate com o bastão na porta de Lund

A porta se entreabre. Alguém olha pela fresta. O cocheiro, engasga e avisa em tom solene nariz empinado, corpo ereto

COCHEIRO IMPERIAL
Sua alteza Dom Pedro de Orleans e Bragança , Imperador do Brasil, solicita uma visita ao professor Peter Lund e..

Neste momento a porta se abre e aparece Chica

CHICA
Oí..vai tê que voitar dispois, que o Dr Lund tá pescanu na lagoa cu o Dr Brant

O cocheiro perde a pose e com uma cara feia dá uma bronca

COCHEIRO IMPERIAL
Vai atrás do teu patrão moleca abusada

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- LATER

O imperador D. Pedro II, longa barba preta, espera impaciente na sala de Lund quando o Professor e também Brant aparecem.

Aparência mais envelhecida. Lund parece ainda ágil e lépido para um senhor já cinquentenário. Por sua parte Brant já está bastante depauperado.

Lund instala Brant em uma cadeira

PETER LUND
Mais que honra receber o jovem e inteligente imperador brasileiro

D.Pedro II se levanta e dá a mão a Lund que o cumprimenta

D.PEDRO II
Já fazem quase 20 anos que lhe prometi vir conferir de perto seus importantes trabalhos. O senhor é uma honra para este país e nos sentimos orgulhosos de tê-lo conosco

Lund sorri comovido

PETER LUND
Obrigado Sua alteza, eu é que tenho muito a agradecer ao imperador e a todos os seus súditos que me receberam como um brasileiro... Mas sente-se vamos conversar sobre as últimas novidades..

Lund e D. Pedro se sentam

PETER LUND
Soube que sua alteza esteve recentemente na Europa....

Lund e D.Pedro continuam conversando.

Brant já dorme na poltrona onde foi instalado.

D. Pedro pede a um ajudante que lhe traga o livro. D. Pedro recebe um livro e passa às mãos de Lund. Dá para se ver que é o livro de Darwin sobre a evolução das espécies. Lund recebe o livro e os dois continuam a conversar

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- DAY

Sentado em sua varanda Lund lê avidamente o livro de Darwin. Por vezes ele para e passa a mão na cabeça

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Ainda sentado na varanda, Lund recusa a xícara que Chica lhe oferece. Lund está descabelado e não desgruda os olhos do livro

EXT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- MORNING

Passarinhos cantam ao alvorecer. Na varanda o livro de Darwin descansa na poltrona. Um passarinho vem pousar nos braços da poltrona

INT. CASA DE LUND EM LAGOA SANTA -- NIGHT

Lund conversa com D. Pedro II

PETER LUND
... o impresionante é que de algoz virei vítima. Sempre soube que é sobre os destroços de idéias superadas que brotam as novas certezas. Mas a gente nunca pensa que este dia vai chegar para a gente.

D.PEDRO II
Aí reside meu caro professor, a força fundamental do conhecimento. A cada dia novas verdades surgem complementando ou destruindo as antigas

PETER LUND
Me sinto assim...atropelado pela verdade dos fatos. Sirvo de adubo para os jovens e vigorosos cientistas florescerem com suas novas idéias...

Lund olha para o livro ao seu lado

PETER LUND
...o livro de Charles Darwin foi como um terremoto para mim. Meu chão simplesmente desapareceu. O homem descendente do macaco é uma verdade que um velho naturalista como eu não pode acreditar.

D.PEDRO II
A ciência realmente tem o poder de destruir convicções. Contra fatos não há argumentos...que o arcebispo não nos ouça...

D. Pedro faz sinal de silêncio e Lund sorri

D.PEDRO II
O homem descendente do macaco... se não conhecesse pessoalmente Darwin homem e a reputação que desfruta nos maios acadêmicos europeus.. teria me juntado ao coro dos que o chamam de herege e pecador.

Desta vez é D.Pedro que sorri

PETER LUND
Eu li sua obra. Seus argumentos são poderosos...evolução, adaptação, competição, tudo isto elimina o criador..

Lund põe a mão na testa e suspira

PETER LUND
Ai Meu deus...perdão.

D. Pedro sorri ironicamente

D.PEDRO II
E o seu pecado é enorme. O Sr sabia que suas pesquisas aqui no Brasil contribuíram para que Darwin chegasse a conclusão que chegou ?

PETER LUND
Sabia. No mundo da ciência os velhos cavam sua própria sepultura

LAGOA SANTA 2001

EXT. CEMITÉRIO DO PEQUIZEIRO -- DAY

Uma bandinha toca animada no cemitério de Lund.

Vicentinho, Anita e Maria dos Anjos estão sentados em um banco do cemitério

MARIA DOS ANJOS
Obrigado meus filhos. Só vocês mesmo para me trazer de volta ao convívio de nossa cidade

ANITA
E se prepare que amanhã iremos ao cinema

Vicentinho interrompe a conversa.

VICENTINHO
Anita... Anita...Só falta a gente no coral

Os meninos saem correndo e se juntam ao coral que começa a cantar

Vicentinho e Anita cantam em solo acompanhados da bandinha e do coral,

Vê-se os túmulos de Lund, Ofélia, Brant e Henrique.

Pequizeiro. Fusão.

EXT. CEMITÉRIO DO PEQUIZEIRO -- DAY

ANITA
Canção de Anita

Lund e Ofélia fazem um piquenique à sombra do pequizeiro. Ofélia corta um pedaço de melancia e dá na boca de Lund. Lund finge morder os dedos de Ofélia.

Ofélia e Lund se beijam.

FIM.

LETREIRO

PETER LUND MORREU AOS 79 ANOS EM LAGOA SANTA , NO DIA 3 DE MAIO DE 1880.
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