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Artigos-->TESTEMUNHANDO A HISTÓRIA -- 04/01/2007 - 08:11 (Jeovah de Moura Nunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos








No Brasil, a ditadura em 1968 chegava ao auge com o temível AI nº 5. A partir daí os algozes tinham carta branca para fazerem o que bem entendiam. E do bem nunca entendiam, só entendiam do mal. Havia torturadores de todos os matizes. Alguns até com bíblias na mão. Faziam o preso político ler alguns trechos mosaicos e depois o pau comia. E não havia ninguém para socorrer o pobre diabo. A Constituição era como ainda é, e sempre foi apenas letras mortas, inexpressivas e sem nenhuma atividade real, servindo apenas aos interesses escusos de pessoas socialmente privilegiadas.

Residíamos eu, minha mãe e meus irmãos no bairro da Luz, perto de um Batalhão de Polícia, o “Tobias de Aguiar”. Em frente ao batalhão e descendo alguns metros pela Avenida Tiradentes ficava uma cadeia. Não se podia passar pelas calçadas porque elas eram bloqueadas. Com as crianças ou menores não havia problema. E minhas irmãs menores que por lá passavam ouviam gritos estarrecedores.

As saídas de viaturas, carros brucutus e alguns tanques repletos de policiais da tropa de choque indicavam mais uma passeata de estudantes, (os únicos heróis deste país naqueles fatídicos tempos). E isto ocorria quase que diariamente. Os problemas políticos misturavam-se com a luta pela sobrevivência. Os empregos eram cada vez mais raros. A polícia prendia quem portasse Carteira profissional sem registro de emprego. Os empresários deitavam e rolavam sobre a infâmia vivida pelos trabalhadores. Bem por isso ainda hoje tem quem aprecie saudosamente a ditadura. Pelo que posso avaliar daqueles tempos, tínhamos os mesmos direitos de uma barata.

Participei de muitas passeatas ao longo de cinco ou seis anos. Fui paralisando após a institucionalização da violência que foi o AI 5, pelo fato dos companheiros de lutas pacíficas desaparecerem nos subterrâneos da luta armada. Fiquei na dúvida: ou partia para a liberdade que a luta armada nos propiciava, ou ficava na escravidão de uma falsa cidadania em razão de minha mãe ser viúva e com filhos menores. É claro que fiz minha opção correta, pois ou estaria morto, ou desaparecido sem deixar vestígios e minha família também sofreria, posto que a ditadura além de cruel, corrupta e assassina também matava ou torturava as pessoas que eram parentes dos libertadores. Mas, sem dar importância a isso, a maior vantagem foi ter dado alguma assistência a minha família.

Contudo, ainda participava das poucas passeatas que aconteciam. Numa delas vi coisas que só tinha tomado conhecimento em filmes e livros. Era liderada pelo estudante Wladimir Palmeiras, um gênio na arte do discurso-relâmpago. Estávamos no Largo do Paissandu ouvindo os principais lideres, que mostravam a camisa ensangüentada de um estudante morto na véspera. Palavras de ordem se repetiam pela multidão de mais ou menos vinte mil pessoas. Todos jovens. Todos estudantes. Menos eu.

A polícia chegou. Havia policiais de choque e cavalarianos. A tropa de choque subia a São João e os cavalarianos desciam em nossa direção. Na praça já tinha uns duzentos policiais com cães pastores nos observando. Algumas moças choravam. Palavras de ânimo eram proferidas aqui e ali, mas o choque era inevitável, pois estávamos cercados. Tremi nas bases, mas mantive o moral elevado. Com paus e pedras nas mãos fiquei com um grupo que tentava furar o bloqueio policial no rumo da praça da República. Conseguimos passar e fugimos numa correria louca. Alguns policiais tentaram nos pegar, mas foram ficando para trás. Quem ficou no Largo do Paissandu teve de lutar e boa parcela dos estudantes foi presa. Alguns ficaram aleijados de tanto apanhar. Este era e ainda é o Brasil digno de um Hitler, de um Stalin, de um Pinochet: países repletos de injustiças de cabo a rabo. As indenizações pagas aos que sofreram os abusos e torturas são de um valor semelhante àqueles dos porões da ditadura: tirânico, opressivo e esmolento. Fica difícil amar um país assim, onde os direitos dos que nada têm é semelhante aos direitos de um porco, ou de um réptil. Sou contra a bandidagem, porque estão matando inocentes. Porém, se fossem guerreiros, ou revoltosos contra a falta de bom senso de nosso país, eles teriam com certeza o meu apoio.



Jeovah de Moura Nunes









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