Nosso país, decididamente, não terá jeito enquanto as pessoas só respeitem a lei se esta for de seu interesse individual. A partir dos dispositivos constitucionais, mesmo aqueles referentes às chamadas “cláusulas pétreas”, o brasileiro não costuma dar ouvidos aos argumentos de defesa do estrito cumprimento das normas da Carta-Magna, quando a desatenção e até a vulnerabilização dos princípios constitucionais não o estejam incomodando diretamente, ainda que esteja afetando a coletividade e a própria segurança da nação.
São inúmeros os dispositivos constitucionais vistos como letra morta, ninguém respeita, a justiça releva as infrações, a imprensa fica indiferente e a pessoa que reclamar, isoladamente, ficará clamando no deserto, não será ouvida e pode até ser considerada louca, intrometida, inconveniente, perturbadora.
Por conta dessa postura generalizada, comete-se desde infrações civis, infrações penais, até crimes graves e hediondos. A impunidade e a vaga pressão da sociedade sobre os culpados tornam as ações criminosas meras manchetes e matérias sensacionalistas na mídia, as investigações somente são impulsionadas por uma gritaria popular, mas, infelizmente, a força da real cidadania não é exercida de modo suficiente e eficaz. Há muito barulho e pouco resultado, os assuntos caem no vazio, os criminosos escapam, a justiça põe pedra em cima dos processos e o aparelho policial arrefece o ânimo investigatório.
Tudo isso traz como lamentável conseqüência o descumprimento da lei, criando-se os institutos jurídicos das leis “que pegam” e das leis “que não pegam”. Quando a norma “não pega”, e isto acontece até com normas constitucionais, vira letra morta, abandonada, descartada e desaplicada. E fica por isso mesmo.
Tomemos como exemplo, entre muitos, o caso dos auxiliares do Presidente Luis Inácio Lula da Silva que cometeram crimes contra a administração pública. O Chefe de Governo, ao ter ciência das graves acusações, limitou-se a afastar dos cargos os infratores, e isso, depois de perder a batalha da comunicação, onde insistia na inocência dos companheiros. Sob pressão, afastava o auxiliar e com isso queria convencer a opinião pública de que havia adotado as providências que os casos requeriam. Mas, não é bem assim.
A Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, determina no seu artigo 143: “A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo, assegurada ao acusado a ampla defesa.” Ao não promover a apuração dos casos denunciados, o Presidente cometeu omissão e descumprimento do dever, incorrendo em crime de responsabilidade, de prevaricação.
O mundo jurídico, político e até a imprensa do país portaram-se desatentamente para o dispositivo da Lei 8.112/90, não cobraram a sua aplicação, nem tocaram na omissão do Presidente. Parece haver, apenas, uma encenação. A ordem é: “vamos denunciar, vamos pré-julgar, vamos sancionar moralmente o acusado. Mas nada de punir judicialmente, nada de afetar o mandato e o cargo eletivo.”
Deve-se deixar tudo como está, para ver como é que fica.
E assim o Brasil vai seguindo, como um país fora- da-lei.
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