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Artigos-->O velho e o jovem guerreiro -- 13/12/2006 - 10:24 (anderson jose de aguilar) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O velho e o jovem guerreiro





Num tempo que não se pode precisar, numa região montanhosa e distante, o dia teria sido como outro qualquer não fosse o esforço que um jovem guerreiro fazia para alcançar o topo de uma montanha.

Havia caminhado por muito tempo, e naquele momento, tinha dúvidas se conseguiria chegar ao local que procurava.

Com um esforço tremendo, venceu a subida irregular do penhasco deparando com uma caverna cercada de arbustos. Sentado sobre uma pedra, um velho o observava há algum tempo.

Apesar das várias rugas que desenhavam seu rosto, dando-lhe uma aparência dura, o velho expressava serenidade e ao ver o jovem se aproximar, antes que dissesse algo, o saudou perguntando:



- O que traz um jovem guerreiro a terras tão distantes?



Cansado e ainda ofegante pelo esforço feito há pouco, respirou fundo para renovar o ar dos pulmões, olhou para o velho e respondeu :



- Olá velho sábio. Muitas terras percorri, muitos rios atravessei e por muitos vales caminhei. Em muitos desses lugares

abracei a dor e o sofrimento, mas em nenhum deles encontrei peso tão grande como aquele que trago desde meu nascimento. Por isso estou aqui. Muito andei para chegar até aqui.

Por terras desconhecidas andei para encontrar-te.



- Ora, ora. Que peso será esse que o traz à minha caverna?

Chamou-me de velho sábio, muitos assim me chamam e por isso me procuram. Acreditam que tenho respostas para perguntas, cujas respostas estão presas dentro do âmago da vida daqueles que as formulam.

Mas entre, descanse um pouco. Teremos tempo para conversar.



Eles entraram, e após o jovem se lavar em um riacho que passava por dentro da caverna e saborear um pedaço de carne que trazia, resultado de uma bem sucedida caçada, iniciaram a conversa sentados numa pedra na beira do penhasco, posição que lhes davam a visão de todo o vale que se estendia abaixo, perdendo-se no horizonte.



Com olhar penetrante, mas que transmitia sensação de paz e serenidade, o velho iniciou a conversa perguntando-lhe:



- Terá sido para obter respostas que o jovem guerreiro caminhou tanto para me encontrar?

- Jovem pelos dias e noites passados e guerreiro por crença. Respondeu.

Tenho passado minha vida em constantes batalhas. Batalhas que num momento me fazem acreditar num significado e no momento seguinte, parecem não ter sentido algum.



- Uma batalha sem sentido é igual à rosa que perdeu o perfume, pois a força e a beleza dessa flor é exatamente a

aparente fragilidade de suas pétalas, exalando tão suave e inigualável perfume.

Porque viveu tantos anos a ponto de o tempo tingir seus cabelos de branco, e é sabido que a idade leva ao conhecimento através da experiência adquirida, que todos lhe chamam de velho sábio.

Sim velho, sou um guerreiro que traz no peito a ferida da solidão, aberta por batalhas que me levaram a um vazio que transborda minha alma.

Cansado e com a força tolhida pela não compreensão, deixei então de lado todas as lutas, e me pus a caminho para lhe encontrar. Trago dúvidas em meu peito.

Na verdade não sei se o procurei para ter respostas ou para ter o acalanto da sabedoria.



Enquanto falava, o velho o observava profundamente. Percebia vida nas palavras daquele jovem.

A essência da alma do guerreiro aflorava enquanto falava e se mostrava a seus olhos como jamais tivera oportunidade de ver ou sentir.

O coração daquele jovem despejava as palavras, tal e qual a cachoeira despeja suas águas montanha abaixo.

Ele sabia, portanto, que deveria ouvir com muita atenção. Diante dele, a vida se manifestava através das palavras e da alma daquele jovem guerreiro.



- Em verdade jovem, a sabedoria não é norteada pelo tempo de vida que se tem, ela é sustentada por um delicado

fio, que somente o coração pode tecer.

Se consegue perceber onde está a força da rosa, então é possuidor de um nobre e valente coração.



O jovem o ouvia atentamente.



- Quando travou uma batalha – continuou o velho – e teve a sensação de ter tido uma luta sem sentido, na verdade

deixou-se levar pelo euforismo que todo jovem possui.

Essa euforia o fez crer que ao final da batalha seria coroado e aclamado pelo louro dos vencedores, e ao não receber essa coroação, sua frustração o levou a acreditar na falta de sentido daquela batalha, sentido-se injustiçado.

Entretanto, caso tivesse recebido o que esperava, teria caído na armadilha da vaidade e teria se afastado daquilo que o levou a ser um guerreiro: a Fé.

Ela é a semente que gera os guerreiros, ela é o poder da crença e só através dela pode o homem alcançar a sabedoria.



- Digo-lhe que toda batalha leva à sabedoria quando essa crença não é posta de lado, pois a crença é a fé, e é ela que une

os homens ao criador.

O verdadeiro louro recebe aquele que consegue entender que ao final de cada batalha, atingiu um degrau superior no caminho que foi desenhado e talhado pela mão do Criador.



O velho falava como nunca falara antes, o tom de sua voz era caloroso e firme. Ele queria alcançar o íntimo daquele jovem. Havia um motivo para isso. Continuou:



- A sabedoria é, na verdade, a pureza da simplicidade do caminho que conduz o homem ao amor.

Engana-se aquele que pensa que o amor tem o sabor da delícia do leve roçar da brisa. Em verdade, o amor não existe e não pode existir livre de um emaranhado de espinhos, pois assim como os espinhos protegem a rosa, o sofrimento protege ao ensinar.

O homem, não compreendendo esse fato, vive assolado pela dor e pelas feridas.

Falo de amor, jovem, porque anda em busca do que pensa não compreender. Veio à minha procura não para aprender, mas, na esperança de encontrar comigo a chave dessa compreensão.

Acontece que essa chave não está sob meus cuidados, e também não se encontra sob a proteção de nenhum velho.

Todos a tem dentro de si, todos a carregam dentro do próprio peito. A batalha é a chave dessa porta.



Enquanto o velho falava, uma luz prateada e suave surgiu em volta do seu corpo e o deixava com o semblante que parecia resplandecer. Seu olhar penetrava na alma do jovem como se fosse um raio, e gerava inexplicavelmente, uma sensação de paz e leveza que contagiava toda a montanha.

O jovem percebia esse fato. As palavras do velho pareciam brotar de dentro do coração da montanha.



- São as batalhas que levam ao topo da sabedoria. Disse o velho após uma pequena pausa.

- Digo-lhe porém, que sabedoria não é conhecimento. É harmonia, assim como o amor é simplicidade.

Andou por entre os vales, montanhas, pradarias e rios, deparou em suas andanças com vida de todas as formas e não parou um só instante para observar essas vidas.

Caminhava com o peso da obrigação de encontrar um velho e não percebeu que, o que busca estava a seu lado durante toda a caminhada.

Diga-me jovem guerreiro, como explicar a batalha travada contra o tempo por uma pequena abelha levando de flor em flor, o pólen da vida, e nessa luta ininterrupta, sem se dar conta, semea em volta, vidas que ela mesmo desconhece?

Ora, aquele que semeia a vida, é a própria essência do amor e da vida.

Percebe que em sua simplicidade, a abelha atinge a sabedoria plena da vida?



- Na verdade, aquele que verdadeiramente busca a sabedoria, busca o amor. Pois a sabedoria não deixa nenhum

vazio na alma, enquanto a falta do sentimento do amor provoca um abismo no coração dos homens e age como uma punhalada no peito de um guerreiro. A sabedoria, em sua essência, é o amor.



O jovem guerreiro ouvia atentamente as palavras do velho. Pensativo e após um breve silencio, respondeu:



- Suas palavras atingem meu peito como uma flecha mas não provocam dor. Estarei buscando o amor que não

encontro entre os homens?

Se nasce uma fruta a partir de sua semente, por que sendo o homem o fruto da semente do amor, precisa caminhar em busca desse amor?

Não caindo a folha de uma árvore ao se tornar aparentemente morta, essa morte aparente não é o início de uma nova vida?

Não é isso uma forma de amor?



- Jovem e ansioso guerreiro, isso não é uma forma de amor, e sim, uma linguagem de amor.

Quando disse que veio a minha procura em busca de amor, foi porque a simplicidade leva ao amor, no entanto, este não faz o caminho inverso, pois o amor é a harmonia da vida.



- Quando diz que uma batalha parece não fazer sentido, está se referindo de fato, ao vazio que percebeu nos homens e não

em você. Assim, se anda em busca desse amor, é porque o vazio da sua alma é o vazio da alma dos homens.

Quando diz que em nenhum caminho encontrou peso tão grande como o que carrega desde o nascimento, está enganado.



- “ A vida não tem peso algum a não ser a leveza do vôo dos pássaros ”.



O peso a que se refere, é o sentido da vida que foi desvirtuado pelos homens ao longo da estrada, movidos pela ambição, egoísmo e pela ilusão de se sentirem donos e senhores do poder e da força.

O que busca portanto, não está fisicamente comigo, nem dentro da caverna que moro e nem no alto dessa montanha.

O que procura é levado pelo soprar do vento, viaja em seu hálito.

Está na alma das montanhas, dos rios e dos vales, está no canto dos pássaros e na doce e sutil melodia das águas que descem nas pedras das cascatas. Está no desabrochar das flores e no esplendor das árvores em sua altivez como realezas das florestas.

O que procura por pensar não conhecer, está dentro do seu peito. É do seu conhecimento embora não tenha percebido ainda.

Por ser um guerreiro, digo-lhe que o vazio que sente é o anseio do querer que os homens não se afastem do que é sua única razão de existir: o amor.

É um guerreiro e não um lutador, por isso não posso dar-lhe o que veio buscar. Porque o que busca já lhe pertence.





O jovem escutava atento e se concentrava nas palavras do velho. Algo acontecia em sua alma, e ele não sabia exatamente o que era.



- Suas palavras são sábias e acalmam meu espírito, entretanto, permanece meu peito recheado de dores que não

encontram bálsamo.

Permanece o vazio que me levou a trilhar vastos caminhos até encontrá-lo nessa montanha.

Respondeu com alguma amargura o jovem.



- Jovem guerreiro, suas palavras revelam que as dores que transbordam em seu peito são as inquietudes do espírito de um

guerreiro indócil. Na verdade, essa inquietude faz transparecer uma alma gentil e plena de ternura. E é isso que o torna um guerreiro. Não poderá nunca se esquivar dessa condição.

Guarde o que lhe falo: os guerreiros existem pela mesma razão que os espinhos.



- A razão de ser deles, é mostrar aos homens que o caminho do amor é doloroso. Faz parecer ingrato e injusto, mas ao

compreendê-lo, percebe-se que a dor existente não causa ferimento nem deixa cicatrizes.

Ela é necessária porque é dessa forma que ensina aos homens seu significado maior.

Somente a partir dessa compreensão, é que o homem poderá desfrutar da plenitude do amor.

Assim também são os guerreiros.



- Não são as pétalas suaves e perfumadas das rosas que lutam para defender a planta, elas simplesmente exalam

seu doce aroma, são os espinhos que tratam de defendê-las.

“ Eles não vivem o Amor. Eles são uma linguagem do Amor.”

Pelas mesmas razões os guerreiros existem.

Eles são aqueles que lutam para manter viva, eternamente, a semente do amor. Por assim serem, não podem viver o amor, pois o amor não vive para si.



A voz do velho havia adquirido um tom divino. Nunca em sua vida o jovem presenciara tal sonoridade. Era enérgico, sereno, e provocava um estado de quase êxtase, tamanha a paz que irradiava.



- Precisa compreender isso - continuou - do mesmo modo que entende por que deve beber um gole de água

quando se tem sede.

Deve aprender a controlar seu espírito fogoso e atingir o degrau de sua própria existência.

Quando atingi-lo, verá que a ansiedade não mais habitará seu peito, e terá então compreendido que a vida não tem o peso que julgava ter.

Verá também que as batalhas sempre lhe ensinaram, embora não tenha naquele momento percebido. Concentrava seus pensamentos para a vitória esquecendo-se de que o vencedor é aquele que consegue atingir o equilíbrio da serenidade.

- Muitas vezes jovem, o vencedor é aquele que vai ao chão.

Se quer aliviar suas dores, deve compreender o que falo. Se caminhou tanto para encontrar sabedoria num velho, entenderá que isso não teria sido necessário, bastaria ter aberto seu coração.



Cada palavra do velho penetrava profundamente na alma do jovem, e a cada frase, algo parecia se transformar em seu espírito. Sorvia embevecido tudo que ouvia, e mesmo que em alguns pontos, não conseguia vislumbrar o real significado do que ouvia, seu coração lhe dizia para continuar ouvindo sem interrompê-lo.

Enquanto absorvia tudo que ouvia, o velho fez uma pausa e olhou fixamente para o infinito.



- Velho sábio - disse o jovem aproveitando o silêncio - como pode um jovem guerreiro conter seu estado fogoso se a

própria juventude é forjada pelo fogo da vida?



Ao ouvir tal pergunta, o velho teve certeza de que à sua frente encontrava-se um homem especial.

E a ele estava reservada a missão de orientar e prepará-lo, assim como o bom ourives lapida carinhosamente o diamante puro e cristalino, mas que ainda se encontra no estado bruto. Diante dele estava o motivo de sua ida para aquela montanha. Toda a preparação de sua vida tinha sido para aquele momento.

Sentado na pedra a seu lado, estava um guerreiro com um grau de elevação espiritual jamais visto por ele, e que se encontrava no ponto exato para receber o último ensinamento.

Essa era precisamente a missão final do velho. A missão derradeira de um velho guerreiro.

Olhou serenamente para o rosto do jovem e disse:



- Em verdade, não é a chama que o torna um guerreiro, ela acompanha sua existência.

Embora a juventude seja forjada pelo fogo da vida, é preciso compreender que do mesmo modo que o aço da espada é guiado pela destreza do braço que a empunha, o fogo da juventude deve ser guiado por um coração puro e valente. É desse modo que deve ser contido o estado fogoso que mencionou.



- Velho, não compreendo, respondeu o jovem.

Devo então sufocar minhas dores se o homem recusa sua própria razão de existir?

Devo então entender que não posso, por ter nascido guerreiro, buscar e viver o amor em sua forma mais simples?



- “Não pode buscar e viver o amor pois você é uma de suas manifestações.”

Assim como o galho da árvore é a extensão da sua alma, o guerreiro é a extensão de uma das manifestações do amor, uma de suas linguagens, portanto, você não nasceu para ter ou sentir o amor, porque o sentimento de amor é universal. E você é uma de suas linguagens.

Você não ama apenas um, você ama a natureza e suas criaturas de modo igual.

Não deve procurar o amor entre os homens, deve andar ao lado deles como a abelha vai de flor em flor. Caminhando entre eles e enfrentando suas batalhas, estará semeando o Amor.



- Presta atenção no que digo: “Não esperes o amor dos homens, tu não o terás.”

- O guerreiro é aquele que o Criador enviou para cultivar e defender as suas sementes. São eles os espinhos que moldaram

a coroa colocada em sua cabeça.

Se assim não compreender, estará se afastando da sua verdadeira existência.

Se entender e absorver o que falo, verá que sua alma terá alcançado a liberdade dos raios do sol. Verá que seus pés não mais andarão presos a nenhum elo de corrente, mas ao contrário, andarão soberanos como o vôo da águia, e seu coração estará pronto para guiá-lo entre os homens.

Poderá então, dessa forma vivenciar o amor que tanto procura.





Ouvindo tais palavras, o jovem guerreiro compreendeu que não havia mais o que falar. O velho penetrara com tal poder em sua alma, e plantara algo tão forte, que ele não compreendia ainda o que era, mas sabia, sem conseguir explicar, que essa compreensão viria aos poucos com o passar dos dias.

Aquele velho arrancara raízes antigas e profundas, e ele soube que não eram suas, estavam ali, mas eram raízes herdadas de batalhas passadas, eram as feridas dos homens que havia absorvido.

Entendeu afinal que entre os homens, existem aqueles que devem viver o amor, e existem aqueles que são o amor.

Entendeu que a rosa não se sente feliz por ser a mais bela das flores, mas porque sua beleza transmite alegria e pureza aos homens. Por esse motivo, nunca se sente frágil ou desprotegida.



Olhou uma vez mais para o semblante do velho. Queria registrar na memória a expressão serena, tranqüila, e de olhar profundo e doce daquele homem.

Teve por um breve momento, a sensação de que o velho não estava mais ali. Havia uma luz que não conseguia precisar de onde vinha, que parecia envolver o velho, ofuscando seus olhos.

Abaixou o rosto, como se protegesse os olhos daquela luz, pegou sua mochila e se levantou.

Pensou em se despedir, tentou olhar novamente e percebeu que a luz, além de permanecer, parecia ter ficado mais forte. Embora fosse uma luz entre o verde, o azul e o branco, em tons suaves, tinha nela algo especial que o impedia de olhar diretamente para o velho.

Não se preocupou com esse fato, sabia que não deveria.



Arrumou a mochila no ombro, olhou para o horizonte ao longe e começou, lentamente, a caminhar para a trilha que o tinha levado até aquela montanha, desta vez, para fazer o caminho de volta.





Anderson Aguilar















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