Quando se fala de contas governamentais, de equilíbrio, de superávit, de déficit público, costuma-se emitir opinião que prima pela superficialidade, pela imediata leitura dos números, frios e fora de contexto, chegando-se a conclusões distanciadas da realidade, porquanto os dados de um balanço sempre são resultados de um sistema, de uma conjugação de fatores que exigem leitura, interpretação, opinião e conclusão.
Ao olhar para um quadro de balanço, as pessoas tendem a dar destaque à coluna dos totais e dela extrair conclusões que consideram definitivas.
Em relatórios de contas públicas, há que se distinguir a diferença entre superávit e déficit de execução orçamentária, entre superávit e déficit financeiro, entre disponibilidades e indisponibilidades de caixa, em face de recursos vinculados e recursos livres.
Também é bom atentar para superávit primário e superávit nominal e seus significados técnico-econômicos, cujas explicações e esclarecimentos da realidade estão embutidos nos dados analíticos e não nos seus somatórios finais.
Comecemos pelo balanço da execução orçamentária e a situação de equilíbrio, superávit ou déficit. Da receita arrecadada num exercício subtraí-se, algebricamente, a despesa realizada, lembrando que despesa realizada, no conceito orçamentário, é representada pela despesa efetivamente paga mais a despesa empenhada e ainda não quitada. Nesse caso, se a diferença é positiva, há superávit de execução, mas parte das disponibilidades estão vinculadas às despesas a pagar. Logo, esse superávit não significa dinheiro na mão do gestor para aplicação a seu talante. Está compromissado.
O balanço financeiro, que decorre da execução orçamentária, mas a ele conjugados saldos do exercício anterior, é calculado no balanço patrimonial, pelo comparativo entre o ativo financeiro e o passivo também financeiro. O superávit financeiro obtido é diferente do superávit da execução orçamentária, mas guarda conformidade, quando se considera que o saldo positivo embute também compromissos vinculados.
Vejamos um simplificado exemplo de balanço financeiro e suas reais disponibilidades.
BALANÇO
ATIVO FINANCEIRO
DISPONÍVEL 100
Caixa 30
Bancos 70
- Conta Arrecadação 40
- " " Convênios 20
- " " Programas 10
TOTAL 100
PASSIVO FINANCEIRO
Restos a Pagar 50
Consignações Devidas 30
Outras Dívidas 10
Subtotal 90
SUPERAVIT 10
(Ativo menos Passivo)
TOTAL 100
Nesse caso, o Ativo Financeiro é 100, está todo no título Disponível (100 – Caixa 30 e Bancos 70), mas, na prática, o administrador só pode contar com 10. Porque no Passivo há 50 de Empenhos a Pagar, 30 de Consignações descontadas da Folha e não recolhidas aos interessados e 10 de outras dívidas flutuantes.
Portanto, sem a visão analítica dos dados podem ser tiradas conclusões falsas sobre dinheiro em caixa, sobre disponibilidades efetivas.
No aspecto do Superávit Primário e do Superávit Nominal, objetivamente, acontece o seguinte(teoricamente, sem relação com o balanço acima):
O Superávit Primário (Receita Arrecadada menos compromissos, exceto os compromissos com juros e encargos da dívida) é um mero dado estatístico, porque ele se destina a pagar as dívidas, ou seja, vai para os banqueiros.
Se sobrar alguma coisa, ter-se-á o Superávit Nominal, também meio falseado pelas vinculações.
Além do mais, olhando para os dados analíticos, vê-se que o Superávit Primário foi obtido com dinheiro da Educação, da Saúde, da Previdência, da Infra-estrutura, da Agricultura, e vai por aí.
Então, leitor/contribuinte/cidadão, muito cuidado com essa história de superávit em contas públicas. É uma história que pode servir aos dois lados, governo e oposição, dependendo do ângulo e do interesse da visão.
O cidadão deve botar um cuidadoso olhar na questão, para não ser manipulado ou ludibriado.
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