Numa grande cidade, em uma rua sem saída, vivia um homem quase rico, a custa de muito, muito trabalho. Era viúvo, pai de três filhos e criou todos eles sozinho.Os dois mais velhos casaram e mudaram, ficando apenas a filha caçula morando com ele.
Uma vizinha sempre observava aquele senhor bem apessoado e o admirava.Tinha uma grande intenção em conquistá-lo, mas não sabia como fazer para se aproximar.
Então pensou em seduzi-lo através de sua filha.Todo dia oferecia a menina doces e comprava-lhe brinquedos.Logo ela estava totalmente apegada à vizinha que lhe dava atenção e carinho, lembrando-a até um pouco de sua falecida mãe.
Convencida que a queria como mulher de seu pai, a menina então pediu a ele:
- Pai, case com ela.Ela me dá pão e mel.
O pai, que era um sujeito muito desconfiado, porém de um humor negro, respondeu:
- Minha filha, quando eu me casar com ela, ela lhe dará pão e fel.- e riu-se da frase.
O tempo passou e o homem viúvo foi vendo que cada vez mais a filha ficava dependente do carinho da vizinha.E ela tanto vez que ele decidiu mesmo se casar com ela.
Feliz, a menina viu a madrasta mudar-se para o sobrado onde eles moravam.Em seus sonhos ela acreditava que agora tinha uma nova mãe.
Mas um dia seu pai fez uma longa viagem, deixando sua filha a mercê da madrasta.Essa então mudou completamente seu comportamento com a menina, passando a maltratá-la.Triste, a menina viu o que era piada do pai, tornar-se uma profecia.Agora ela comia mesmo pão com fel.
Sádica e cruel, a madrasta então apenas por esporte a castigava.E como forma de um bárbaro castigo, coloco-a para vigiar uma figueira que estava carregada de figos maduros que ficava no quintal da casa.Toda vez que um passarinho bicasse um dos figos, a menina ganhava um açoite com uma varinha de bambu.
A madrasta batia na menina, mas a menina não chorava e isso a deixou furiosa.Pegou-a pelos cabelos e cometeu um desatino.Enterrou-a viva no quintal!
No local onde estava enterrada, cresceu uma relva castanha clara que cobria parte do jardim.Eram os cabelos da menina que cresceram.
Ao voltar da viagem, o pai então perguntou para a madrasta onde estava a sua filha.E ela cinicamente respondeu que a menina havia ido viajar com as amigas.O pai foi tolo e acreditou na mentira da madrasta e esta o distraiu com outros afazeres.
Vendo aquela relva cobrindo grande parte do seu quintal, o homem resolveu chamar um jardineiro para ajeitar o seu jardim.Foi então que enquanto o jardineiro cortava a relva castanha clara que cobria o jardim, escutou uma voz vinda do fundo da terra cantando uma canção de lamento:
“Jardineiro de meu pai, por favor, não capine meus cabelos, minha mãe me penteava. Minha madrasta me enterrou pelos figos que o passarinho bicava”.
Aterrorizado o jardineiro foi até o homem contar.Este quase não podia acreditar e em desespero foi cuidadosamente escavar com as próprias mãos o local de onde crescia a relva castanha clara.
E encontrou a menina, ainda viva...
P.S.: Essa história me foi contada através de um livro chamado “O amor que ascende a lua” de Rubem Alves, um grande e maravilhoso mestre.Esta é a minha versão.Coloquei muito do que vi nela.