Meus caros, sei que a fatalidade persegue a passos largos cada um de nós, principalmente nós brasileiros, vitimas que somos do surrealismo social; mas deixe-me contar entre outras tantas coisas desa-gradáveis, uma que realmente jogou-me lá aonde há choro e ranger de dentes, onde é preciso abandonar todas as esperanças nós que lá entramos.
Bem, ocorre que entrou um vírus, um ali-ens, qualquer coisa assim de pegajoso no meu mi-cro-computador ; era, segundo o técnico que du-rante quatro dias combateu o infeliz, um tal de Ethan, proveniente da Segunda Guerra mundial ainda; um vírus cuja única finalidade, é, literal-mente, confundir-te, fazendo-te de tolo e mexendo nos teus programas e na lógica do aparelho xodó da modernidade.
Eu trabalho com meu micro, e como sou mais um eremita urbano das megalópoles inúteis, fiquei limitado nas minhas comunicações com o mundo exterior, posto que minhas amizades mais interessantes nesse momento são as virtuais, talvez até por serem virtuais, além das minhas paqueras; meu único divertimento tem sido a Internet, com sua pequena periculosidade e sua maior discrição, ideal para geniozinhos tímidos de óculos assim como eu!
Bem, o técnico ia e vinha levando meu HD (poderíamos nacionalizar esses termos, não é?) para limpar o Vírus; em grande parte desses dias, fiquei sem meu instrumento de trabalho, comunicação e lazer. Dei voltas e mais voltas como um cão atrás do rabo com uma sensação brutal de impotência dentro do meu quitinete de fundos, com seus pou-cos metros quadrados! Kafka teria escrito uma obra-prima com o que se passou no meu mundo interior nesses dias de martírio. Voltei até a fumar temporariamente; ou melhor, comer os cigarros. Estive além da loucura! Com mais o perigo do ti-gre da falência me rondando pela falta e retrocesso no trabalho.
Deus foi o mais xingado!
A minha humilhação foi brutal!
Comi o pão que Deus e o diabo amassou! Senti-me chicoteado pelo sobrenatural, levando to-dos os carmas da humanidade como um novo Cristo suburbano que não cometeu outro pecado senão o de depender dessa maquina estranha para sobreviver e tentar "subir na escala social", "progre-dir no mercado". Virar algo assim "tão brilhante" como a Vera Loyola, com o diferencial que eu levo algumas idéias marxistas e humanitárias na cabeça.
Caros amigos, acho que estamos sendo en-ganados pelo Modus Vivendi que adotamos. Essa impessoalidade, toda essa consumição de coisas e seres, essas "riquezas" extraordinárias como o com-putador, sujeito também as suas neuroses, algumas até fabricadas especialmente com a finalidade de prejudicar, como o Vírus que me atingiu; ou me-lhor, ao meu micro.
Afinal, eu lá no meu intimo em algum lugar secreto, tenho a memória de um lar agrário e pastoril, talvez até com lampião, no meio da selva e com vaga-lumes e murmúrios na noite, onde viver é bem menos complicado e os penares são bem menos sofisticados. Na selva amistosa dos antepassados, encontrarei forças para sobreviver ao caos terrestre!