As emissoras de rádio e de televisão antecipavam o confronto. As notícias davam conta do exército esperado. Ouviam-se os primeiros acordes incentivando a população de jovens de todas as idades para comparecerem ao campo de concentração. Civis e militares foram convocados. Aquartelados, os pequenos soldados se preparavam em meio a um oceano louro de cervejas e outros líquidos e tantos outros sólidos, durante o pequeno intervalo concedido. Como é comum, nesta ocasiões, para relaxar antes de partirem para o embate definitivo, houve farta distribuição de camisinhas e de seringas descartáveis. Soldados rasos, sem farda e soldados à caráter, inclusive armados, compunham o cenário.. Bem armados. De cães e cacetetes. Os hospitais reforçaram os plantões. A polícia, o corpo de bombeiros e a defesa civil foram acionados. Seguranças e inseguranças por toda a parte. Já se fazia sentir o aumento da demanda por material estratégico: gesso, mercúrio cromo e éter, entre outros afins. Fraturas, sangue e curativos, na lista de primeiras necessidades. Tudo preparado. Todos se preparando. Começou mais uma festa de carnaval fora de época. Em qualquer cidade deste país. É sempre a mesma coisa. Mais uma festa popular. Mais um dia de cão. Visto por um lado.Do outro lado, ao som de bandas baianas de todos os ritmos e cores, e de cheiros e de corpos saltitantes. A guerra começara. E parecia já ter acabado. Poeira, suor e lágrimas. Sorrisos. Alegria geral. Harmonia e desarmonia. O corpo a corpo era a tónica da festa. Ninguém falava nada. Ninguém ouvia nada. Empurrões, socos e pontapés. Porrada. Desespero e covardia. Loucura. Incompreensão. Desorganização. Nada ficou no lugar. Apenas eu e o bloco de lixeiros, no outro dia, os únicos que realmente aproveitaram o lixo da festa. Eles, trabalhando. Eu, olhando e refletindo. Em nome de que? Da Liberdade? De qual liberdade estão falando? De qual liberalidade estão falando? Ah! Bom!
Domingos Oliveira Medeiros
O6 de fevereiro de 2002 (adaptado para as festas de Momo)