Usina de Letras
Usina de Letras
232 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62152 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10448)

Cronicas (22529)

Discursos (3238)

Ensaios - (10339)

Erótico (13567)

Frases (50554)

Humor (20023)

Infantil (5418)

Infanto Juvenil (4750)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140785)

Redação (3301)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1958)

Textos Religiosos/Sermões (6176)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Artigos-->AMOR:PROFUNDA INTERROGAÇÃO -- 02/09/2006 - 12:36 (Délcio Vieira Salomon) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AMOR:PROGUNDA INTERROGAÇÃO

Délcio Vieira Salomon



Françoise Sagan, com humor tipicamente francês, escreveu em “Bonjour Tristesse” que o amor é “o que se passa entre dois que se amam”. Não sei se ela terá incluído em sua definição a atitude interrogativa que, a meu ver, é a que mais caracteriza a essência do amor.



Recorreria ao “Luzes da ribalta”, de Chaplin, para com ele firmar convicção mostrada com a temática e a ação do filme: “o amor é uma terrível, definitiva e profunda interrogação”. Sim, é isto: realidade interrogativa, tal qual o personagem que se interroga. Poderia lembrar também Otelo diante de Desdêmona: conhece a força da interrogação que é o amor, a ponto de sentir-se fora de si mesmo, ou seja, fora da positividade de sua vida, no limiar da morte, arrebatado por uma interrogação apaixonada e infinita.



Hoje como nunca o amor passou a ser vulgarizado. Basta atentar para o dia dos namorados: o marketing de toda ordem, desde os “outdoors” nas estradas, ruas e avenidas até os “clips” de televisão, passando pelas vitrinas das lojas dos ‘shoppings’, quer vender a imagem de que o amor é a exaltação de um momento.



Mas a experiência ensina e a sabedoria confirma: pelo contrário, o amor é, antes de tudo a consciência do outro como autocentrada sobre ele e não sobre si mesmo, deste ser cioso de sua individualidade e não do infinito, de sua particularidade e não de qualquer coisa possível, sentindo dentro de si a perturbação absoluta da estabilidade, da serenidade, da segurança, que o hábito e atenção à vida proporcionam ao existente. Daí ser essencialmente interrogativo.



Esta a mensagem que qualquer comemoração do amor deveria gravar em nosso pensar e em nosso sentir; o despertar do amor é o despertar da presença do existente na existência. Por isso mesmo o amor é revelação.



Alguém poderia contestar indagando: - acaso o amor não é certeza e afirmação de si? Por causa do milagre positivo da presença do outro em minha vida, talvez o amor não ultrapassaria a ausência e a própria interrogação? Ledo engano. O que é amar, senão lançar-se numa interrogação apaixonada para o irredutível duma individualidade? Alguém consegue verdadeiramente amar, sem responder à interrogação (estou amando?) com outra interrogação mais premente (você me ama?), onde os olhares se afrontam, se entregam, se confundem para mais uma vez voltar a se interrogar? Ninguém, na situação de amar, pode estar tão seguro, que jamais possa duvidar.



Quem ama jamais repousa na tranqüilidade da certeza e da segurança, pois como diria J. Delhomme, em “La pensée interrogative”: “o repouso é proibido aos que se amam”1. Eles não podem deixar de se interrogar sem cessar. Há de se concordar plenamente com Delhomme: “a tranqüila serenidade dos amantes é um mito literário”.

Os amantes felizes jamais existiram, pois um duplo movimento de transcendência joga um à procura infinita do outro, à procura atormentada de uma outra individualidade sempre presente e sempre ausente, sempre perdida e sempre encontrada”2 .



Através do amor tomamos consciência da presença do outro em nossa vida. Unamuno dizia estar situado nessa presença “el sentimiento congojoso de nuestra identidad y continuidad individual y personal”. Por isso acenava para o duplo mistério da vida: “o mistério do outro” e o “mistério da presença”.



Queiram ou não os românticos e os idealistas, o que faz o amor é esta dialética da maravilhosa incerteza, este sentir-se de fato limitado diante da limitação do outro, finito diante da finitude do outro e admirar-se diante da constatação de que o amor é misto de certeza e dúvida. Tal qual a fé. Se não houver um mínimo de incerteza, deixa de ser fé e passa a ser automatismo psicológico. Que o digam os grandes místicos como Tereza d’Ávila e São João da Cruz.

_______________________



1 DELHOME, Jeanne. La pensée interrogative. Paris : PUF, 1954

2 Idem, ibidem, p. 22







Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui