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Textos_Religiosos-->DOM JOSÉ SONG SUI WAN — CARTA MORTUÁRIA -- 09/01/2014 - 08:02 (LUIZ ROBERTO TURATTI) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos





José Song Sui Wan

Salesiano de Dom Bosco


Em 29 de outubro de 2012 – dia da comemoração litúrgica do Beato Padre Miguel Rua, 1.º sucessor de Dom Bosco – Dom José Song Sui Wan foi submetido à uma delicada cirurgia no Centro Médico de Campinas, no bairro de Barão Geraldo, para extirpar um tumor maligno na região do pâncreas e fígado.

Seus últimos dias de vida foram vividos nesse hospital, acompanhado de sua irmã Lay Song e das enfermeiras que prestam serviços à Comunidade Salesiana do Liceu Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas.

Após a cirurgia, seu estado de saúde foi declinando até o seu falecimento em 15 de novembro de 2012, dia em que a Inspetoria Salesiana de São Paulo festejava o “dia da comunidade Inspetorial”. Na ocasião, o Inspetor, P. Edson Donizetti Castilho, ao iniciar a celebração da Santa Missa, pediu orações aos participantes para o nosso querido Dom Song que estava muito mal. Para estar mais perto de Dom Song, o diretor do Liceu, P. Reinaldo Barbosa de Oliveira não participou da festa inspetorial. Às 14 horas, Dom Song terminou seu longo calvário de sofrimento.

Dom Song, após sua ordenação sacerdotal realizada em 1971, trabalhou em diversas comunidades da Inspetoria Salesiana de São Paulo. Nos anos 1972 e 1973 fez seu Mestrado em Filosofia na Universidade Pontifícia Salesiana de Roma. Retornando ao Brasil, foi formador dos estudantes de filosofia no Pós-noviciado Salesiano de Lorena... A última casa em que trabalhou, antes de ser ordenado Bispo, foi Araras. Ele nos contava que, um certo dia, o Bispo de Limeira, Dom Ercílio, o chamou para uma conversa e lhe comunicou que o Papa João Paulo II o tinha nomeado Bispo de São Gabriel da Cachoeira, Amazonas. Sua ordenação episcopal foi realizada no dia 27 de abril de 2002. A cerimônia ocorreu na quadra coberta do novo Oratório Dom Bosco, obra que ele desejou e acompanhou. Sua irmã Lay, assim nos diz sobre a ordenação do irmão: “A ordenação episcopal do Dom Song foi em Araras. Foram dois ônibus da colônia católica chinesa de São Paulo, inclusive dois senhores idosos paroquianos com mais de oitenta anos de idade. A cerimônia de ordenação foi solene e grandiosa com a presença de numerosos padres e o bispo que seria substituído por Dom Song em São Gabriel da Cachoeira, Dom Walter Ivan de Azevedo. Estava presente a família, seu irmão Siang acompanhado pela esposa e pelo sobrinho mais velho, seu irmão Tah, eu... Tenho certeza que nossos pais estavam também presentes (espiritualmente) neste momento tão único e especial.”

Como bispo em São Gabriel da Cachoeira, Dom Song fez um minucioso trabalho de visitar praticamente todas as famílias da cidade. Em sua agenda pessoal havia anotações de algumas delas, sobre filhos, dificuldades pelas quais estavam passando, se frequentavam a igreja… etc. Enquanto pôde, lá permaneceu. Quando percebeu que não tinha mais condição de levar adiante seu múnus episcopal, pediu a renúncia. De lá veio para Araras e ali permaneceu até que necessitou de cuidados diários de enfermeiras, vindo então para a Comunidade do Liceu Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas, SP.

Dom Song cativava pela sua presença simples, alegre, generosa. Nesta carta mortuária, há algumas repetições, pois julgamos por bem transcrever as mensagens que nos foram enviadas por ocasião do seu falecimento. A missa de Exéquias, celebrada na Paróquia Salesiana Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas, foi presidida pelo Sr. Arcebispo Metropolitano Dom Airton José dos Santos, concelebrada por Dom Hilário Moser, SDB, bispo emérito de Tubarão e concelebrada por um grande número de sacerdotes salesianos. Sua irmã Lay também nos recordou que “a Igreja estava lotada e compareceram representantes da colônia chinesa católica de São Paulo, acompanhados pelo vigário chinês padre Tomas. Vieram dar um último adeus ao missionário, que como uma estrela vinda do oriente, agora brilha no Universo Celestial”.



Sua família

Durante os três últimos meses de vida de Dom Song, sua irmã Lay Wun Song Shih, residente nos Estados Unidos, veio para Campinas acompanhar o seu irmão bispo. Para Dom Song, a presença de sua irmã foi um grande consolo. Sua irmã Lay assim nos conta: “Quando eu estava no Liceu de Campinas acompanhando meu irmão em sua enfermidade, eu e meu irmão D. Song conversávamos bastante, falávamos e ríamos muito. Uma vez, contei para meu irmão sobre o Lucas, meu neto, de seis anos de idade, que gosta muito de pescar. Lucas falava na hora de pescar: ‘be patient, quiet and wait... [seja paciente, calmo e espere]’. E quando meu irmão D. Song estava se sentindo fragilizado e com muitas dores, ele falava para mim: be quiet, patient and wait...

E na semana antes da cirurgia de D. Song, ele pediu para eu agradecer a todos aqueles que rezaram por ele: seus amigos de Araras, de Lavrinhas, de São Carlos, de São Paulo, da colônia chinesa, de São Gabriel da Cachoeira, de Campinas etc. E falou ainda ‘Agora vou para o Paraíso, onde não existe sofrimento, onde não existe guerra, doença e morte...’ E, no dia da cirurgia, eu cortei suas unhas dos pés e das mãos, fiz a barba pra ele. Meu irmão estava muito sereno e tranquilo...

Sei que todos vocês também devem lembrar dos momentos agradáveis e tocantes com D. Song. Agora resta a saudade...”

Seus irmãos Siang e Tah, residentes em São Paulo, descrevem um pouco da vida em família. O que se segue conta um pouco de sua vida na China, antes da sua vinda ao Brasil:

Dom José nasceu em 16 de maio de 1941, na cidade de Shanghai, na então Avenue Dubail, cujo nome atual é Chongqing South Road, n.º 18, numa casa de três pavimentos que hoje ainda está de pé. Na época, em plena Segunda Guerra Mundial, essa rua se situava na chamada Concessão Francesa, daí a influência francesa nos nomes de ruas e demais locais da região. Essa rua ficava perto do então Parque Francês, hoje conhecido como Parque Fuxing.

Embora pouco comum, havia 200 anos que a família Song tinha se convertido ao catolicismo. Por ter nascido em maio (mês em que se celebra o dia de São José), José foi batizado com este nome, na Igreja São Pedro, situada na Chongqing South Road, no. 270, na mesma rua onde nasceu.

O pai de José, André Song, obteve o doutorado em Direito na então Université l’Aurore, fundada por padres jesuítas franceses. O ensino era bilíngue, em francês e chinês. Obtido o título de doutor, Sr. André foi convidado a ser professor da mesma universidade, lecionando na Faculdade de Direito. Hoje essa universidade ainda existe, com o nome de Escola de Medicina da Jiao Tong University.

A mãe de José, Inês, era uma dona de casa que teve oito filhos. José era o quarto filho, o primeiro homem. Na época, a mortalidade infantil era um problema sério devido, por exemplo, à inexistência de medicamentos como a penicilina. Três irmãs de José adoeceram e vieram a falecer ainda bebês. Mas José cresceu forte e já era alto entre os meninos da sua idade.

Quando menino, José teve aulas de catecismo aos domingos na Igreja São Pedro, facilmente acessível de sua casa com uma caminhada. Um fato que chamou atenção, quando José tinha uns 7 anos, foi ter sido visto sozinho diante do altar, contemplando as estátuas. Provavelmente foi com essa idade que José recebeu o chamado para o sacerdócio que mais tarde se concretizou.

Quando José tinha 9 anos, ao redor do ano 1950, a família Song obteve autorização do governo chinês para imigrar para Hong Kong, que era na época uma colônia britânica. O conhecimento de direito pouco ajudou para o pai de José, Sr. André, achar um emprego em Hong Kong, uma vez que as leis vigentes eram outras e o exercício de advocacia era regulamentado, como em qualquer lugar. Sr. André trabalhou então durante vários anos como tradutor da Bíblia para chinês, junto com o jesuíta Père Petit, sob a coordenação de Père Germain. Depois deste emprego, Sr. André foi aceito como professor de um colégio salesiano, chamado Tang King Po School, para lecionar inglês.

Em Hong Kong, José se matriculou num colégio jesuíta chamado Wah Yan College. Depois de pouco tempo, não se acostumando com este colégio, ele mudou-se para o colégio salesiano Tang King Po School, o mesmo onde seu pai lecionava inglês.

Em retrospecto, é curioso notar que, sem essa mudança, José poderia ter sido um jesuíta ao invés de um salesiano.

Depois de cursar um ou dois anos na Tang King Po School, José manifestou a vontade de ser padre salesiano. Em 1955, ingressou no seminário salesiano situada no bairro de Shau Kei Wan, no leste de Hong Kong, onde estudou até a sua emigração de Hong Kong ao Brasil, junto com a família, em 1959.

Depois de 45 dias de viagem no navio cargueiro-passageiro holandês Tjisadane, chegou ao porto de Santos. Pouco depois de sua chegada ao Brasil, continuou sua formação no Seminário Salesiano de Lavrinhas, no Estado de São Paulo, iniciando assim a sua trajetória no Novo Mundo, culminando com a sua consagração como bispo de São Gabriel da Cachoeira, quando adotou o lema “Vidimus stella eius in oriente”.



Dom Song por ele mesmo

“Meus pais já faleceram. Eram ótimos cristãos, que me imprimiram uma formação muito sólida. Tenho dois irmãos e duas irmãs. Vivemos muito unidos, embora distantes uns dos outros. Eu sou o segundo filho. Em Xangai, onde nascemos, tínhamos muitos bens e terrenos. Éramos uma família muito rica. Em Hong Kong, perdemos tudo e começamos tudo do zero. Esta mudança foi drástica, mas muito salutar. Ensinou-nos que os verdadeiros valores não estão na riqueza.

Fui aluno dos jesuítas em Xangai e depois em Hong Kong. Desde pequeno, quando tinha 7 anos, já queria ser jesuíta. Em Hong Kong, pela mudança de escola, mudei de ideia e entrei no aspirantado salesiano em 1955. Lá fiquei até 1959, quando minha família resolveu mudar-se para o Brasil. Em 1960 fui para Lavrinhas. Em 1961 para Pindamonhangaba para o noviciado onde fiz a primeira profissão em 31 de janeiro de 1962. Em seguida fui para Lorena para os estudos de filosofia onde permaneci até 1965. A Assistência foi realizada em Lavrinhas nos anos 1966 e 1967. Nos anos de 1968 a 1971 estive no Instituto Teológico Pio XI, na Lapa, em São Paulo, para os estudos de Teologia. Fui ordenado sacerdote no dia 17 de julho de 1971, em São Paulo. Após a conclusão da Teologia, trabalhei em Lavrinhas como Coordenador de Pastoral por dois anos e depois nos anos 1974 e 1975 em Lorena como formador dos pós-noviços. Fui enviado para fazer o mestrado em Filosofia em Roma, na Universidade Pontifícia Salesiana e de lá retornei em 1976 para Lorena onde fiquei até 1979. Nos anos de 1980 a 1982 fui diretor do Instituto Nossa Senhora Auxiliadora de Cruzeiro e, em seguida, fui diretor do Seminário Salesiano São Manoel de Lavrinhas de 1983 até 1987. Trabalhei por dois anos no Educandário Dom Duarte, em São Paulo e nos anos 1990 e 1991 estive em São Carlos. No ano de 1992 e 93 fui diretor do Externato São João de Campinas e em 1994 fui transferido para Araras onde permaneci até ser nomeado Bispo de São Gabriel da Cachoeira.

Ao longo da minha vida como salesiano procurei servir meus irmãos com alegria, responsabilidade e reconhecimento. Coloquei os dons recebidos a serviço da missão que me foi confiada; em tudo procuro ser útil e eficiente. Sinto-me aceito e acolhido como amigo por todos. Graças a Deus, não tenho nada de frustrações, nem grandes tristezas ou mágoas. Olhando para a nossa Inspetoria de São Paulo, admiro o zelo incansável dos salesianos; a animação pastoral; a união dos salesianos e o entusiasmo crescente em todos devido ao novo espírito de renovação impresso na Inspetoria. Percebo que a prioridade que a Inspetoria deve ter é a de cuidar da pastoral vocacional. Falo o chinês e outros dialetos locais, português, inglês, italiano e entendo o espanhol, latim, grego, francês e alemão.”



Sua caminhada salesiana

O P. João Roberto Pavani, seu colega durante todo o tempo formativo, assim o retrata:

“José Song chegou no aspirantado de Lavrinhas em 1960. Vinha da China onde já era seminarista salesiano.

Com muito jeito e inteligência foi-se entrosando na vida de seminário, muito ajudado pelas suas qualidades musicais, esportivas e muita capacidade de adaptar-se pela sua inteligência e temperamento maleável.

Não frequentava todas as aulas mas algumas como: português, latim e italiano. Nos tempos livres trabalhava em serviços da comunidade.

Para as traduções latinas ele enfrentava uma verdadeira maratona. O trecho latino era traduzido para o chinês, do chinês passava para o inglês e do inglês para o português.

Com seus estudos, vivências e prática tornou-se bom conhecedor da língua inglesa, da língua latina, da língua portuguesa, da língua italiana (estudou na Itália) e aprendeu também o alemão durante as férias dos seus estudos na Itália. Além disso, certamente deve ter feito algum conhecimento das línguas indígenas da sua diocese.

No tempo de sua formação, apresentava-se sempre com muita alegria, simplicidade e muita fraternidade.

Naquele tempo era membro da equipe missionária Auxiliadora (EMA), indo trabalhar em São Gabriel da Cachoeira, onde depois tornou-se bispo dessa diocese.

Numa de suas férias, durante o tempo de formação, ao participar da missa na paróquia de seu bairro, como era de costume, estava de batina e uma senhora pediu para confessar-se. Achou meio complicado dizer que não era padre; disse que não estava em jejum, não podendo assim atendê-la em confissão. A mulher achou razoável a explicação, dizendo que voltaria num outro dia.

Depois de ordenado sacerdote trabalhou em São Carlos. Nesta ocasião, a obra salesiana ganhou todos os instrumentos para montar uma banda de música.

Um mês depois a banda já estava abrilhantando a festa de Nossa Senhora Auxiliadora. O pároco, padre Albano, dizia: ‘é um milagre a banda se formar e tocar em tão pouco tempo.’

Qual o segredo?

O maestro tocava quase todos os instrumentos, facilitando a aprendizagem dos músicos iniciantes.

Trabalhou também no Educandário Dom Duarte, um grande orfanato da liga das senhoras católicas. Essa obra acolhia em Lares mais ou menos 370 crianças das quais uma grande porcentagem vinha da antiga Febem. Para as crianças externas havia um programa da prefeitura e do estado para o andamento do projeto educativo. Também funcionava dentro do terreno do educandário uma escola da prefeitura, uma oficina mecânica, uma marcenaria, uma pequena gráfica. Diariamente, em sua grande cozinha, eram preparadas mais de mil refeições.

Os salesianos coordenavam todo esse conjunto, cuidando da formação humana e espiritual dos educandos. Era um trabalho árduo e difícil devido à condição das crianças, dos adolescentes e jovens.

Ele e o salesiano Ir. Alberto Gobbo preparavam as peças de piano a quatro mãos à distância (sem internet), para tocar em algumas ocasiões.

Dom Song tinha um bom ouvido musical e muito trato com a música. Quando alguém queria a partitura de um canto, ele pedia para a pessoa cantar a melodia e ia escrevendo as notas musicais ao mesmo tempo.

Perto do fim, na visita ad limina dos bispos da região alegrou o Papa João Paulo II tocando diversas músicas na gaita de boca. O Papa contente dizia após cada música: ‘toca mais uma!’.”



Ir. Hamilton Bernardo Rodrigues assim o recorda:

“Conheci Dom Song, ainda Padre, diretor do Seminário de Lavrinhas. Ele era nosso professor no curso de Filosofia, sempre muito acolhedor e preocupado com a formação dos então ‘filósofos’.

Tinha eu a tarefa de, ao final das aulas, levá-lo de carro a sua comunidade. No caminho sempre tinha alguma história oriental que, sem ele saber, eu as usava em minha pastoral.

Depois de muito tempo, mais de 25 anos, pude conviver com ele na cidade de Araras, já Bispo emérito e com seus achaques.

Havia retornado da sua diocese que sempre trazia na sua lembrança ‘os causos’. E, quando podia, visitava-a para matar a saudade e rever os amigos, apesar das limitações da doença.

Trago na lembrança um grande salesiano preocupado com a vida e atividades inspetoriais. Ele gostava de participar e de se fazer presente. Gostava de ver o Santuário em festa e procurou participar das diversas missas e novenas organizadas, sempre elogiadas pela animação e conteúdo.

Lembro sempre com carinho das poucas vezes que aceitou ainda realizar alguma sessão de mágica junto às crianças do oratório, bem como da APAE. Retornava com seu sorriso característico nos lábios. E vi, com alegria, tocar diversas músicas no teclado ao longo da Festa da Pizza com os Salesianos Cooperadores. Também acho importante salientar que, como presidente nas missas, eu admirava suas homilias escritas, bem preparadas, sempre com um cunho otimista, em que misturava com sadia alegria a Palavra de Deus com alguma ‘historinha’ oriental.

Como salesiano Irmão sempre notei o respeito e preocupação dele em falar bem da vocação laical salesiana, bem como dos Irmãos que fizeram parte de sua vida. Isso se confirma com o convite feito ao Ir. Benedito Belucci para cerimoniar a sua consagração como Bispo.

Muito querido pelo povo de Araras que fala de sua alegria e sua disposição no trabalho pastoral com os jovens. Eles falam das tantas viagens e da presença amiga. Falam do atendimento e da presença sorridente. Falam do seu amor aos pobres e de seu projeto para a zona leste da cidade com a construção do Oratório Dom Bosco.

Grande Pastor! Grande Salesiano!

Grande sorriso! Grande amigo! E sempre irmão que guardo com carinho no coração e a certeza de que ‘Vimos a Estrela que, vinda do oriente passou em minha vida a me iluminar e conduzir’.”



Um testemunho de quem acompanhou muito de perto a trajetória de Dom Song, Vandete Augusto, de Araras:

“Dom Song, missionário imigrante e salesiano empreendedor.

Primeiros contatos com Pe. Song

Tive o privilégio de conhecer o Pe. Song no ano de 1973, como integrante da EMA (Equipe Missionária Auxiliadora). Nessa época, nós, jovens de Araras, participávamos, no Instituto Teológico Pio XI, da Lapa, SP, dos encontros preparatórios para as ‘expedições missionárias’ que ocorriam no mês de janeiro, com destino às aldeias indígenas de Mato Grosso: Meruri, São Marcos e Sangradouro, também na cidade de Corumbá, no Colégio Salesiano.

O Pe. Song acompanhava, juntamente com outros sacerdotes e teólogos e leigos(as) que, durante o mês de janeiro, anualmente, partilhavam suas habilidades profissionais com um trabalho pastoral evangelizador, sempre assessorados(as) pelos Salesianos.

Nessas experiências missionárias aprendi e vivenciei, com Pe. Song, valores que tento praticar até os dias de hoje: simplicidade, religiosidade, alegria, entusiasmo, disponibilidade, partilha, o aprender com o outro, ternura. Assim, vivíamos: ‘Razão, Religião e Amorevolezza.’

Padre Song – Diretor do Santuário do Sagrado Coração de Jesus – Araras

Em meados da década de 1990, novamente convivi com o Pe. Song. Nessa época ele começou as obras do Oratório Dom Bosco e um dos conjuntos habitacionais, na zona leste de Araras. Esse trabalho inicial consistia em capinar o terreno e colocar as estacas para cercá-lo. Pe. Song, com seu chapéu de abas largas, juntamente a jovens integrantes do Coral Dom Bosco, do Santuário, nos fins de semana, alegres, entusiasmados e felizes marcaram o início da obra salesiana, hoje Oratório Dom Bosco.

Pe. Song, nos anos que ficou no Santuário, além das atividades pastorais, também ministrava cursos de música: violão, teclado e flauta que até hoje são lembrados por muitos alunos, cuja aprendizagem aplicam em seu trabalho para o qual foram preparados pelo Pe. Song. A música era para ele o grande dom recebido e colocado a serviço da evangelização, sobretudo dos jovens.

Também dinamizou curso de computação, corte e costura, reforço escolar, nos quais trabalhávamos como voluntários.

Dom Song – Bispo de São Gabriel da Cachoeira

Juntamente com a ordenação episcopal, D. Song viu concretizar seu grande sonho de ser missionário ao receber a destinação para a Diocese de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas.

Viveu ali oito anos entre o povo e os indígenas. Contava ele que visitou 1.500 famílias e percorria as aldeias, viajando pelos rios numa ‘voadeira’, muitas vezes, permanecendo nela mais de oito horas. O que lhe dava forças era, certamente seu grande espírito missionário.

A oferta de Dom Song

Já bastante debilitado pelo mal de Parkinson, retornou para o Santuário S. Coração de Jesus, em Araras, para ficar mais próximo dos médicos que o acompanhavam, tanto de São Paulo como de Araras.

Nesse período minha convivência com D. Song foi mais intensa e marcante, pois ele me chamava de ‘seu anjo’ e eu, com muito carinho desempenhava o papel de ‘cuidadora’.

Muitas vezes, em meio às intensas dores que ele sentia, pedia-me que rezássemos juntos, pois ele oferecia todo o seu sofrimento pela perseverança dos sacerdotes. Rezava constantemente para Nossa Senhora Auxiliadora e, muitas vezes, eu o encontrei com o terço nas mãos, repousando na cadeira, em seu quarto.

Durante sua enfermidade nunca teve um gesto de revolta, nunca reclamou dos incômodos e das reações adversas dos medicamentos que tomava.

Dom Song sempre me dizia que ofereceu sua vida a Deus e via na sua doença, com suas dores, um tempo especial de preparação para o seu encontro definitivo com seu Deus Pai-Mãe!”



A comunicação do seu falecimento

“Comunico aos irmãos que faleceu nosso querido salesiano bispo Dom José Song Sui Wan, bispo emérito de São Gabriel da Cachoeira, Amazonas.

Dom Song, após a renúncia, por motivo de saúde, retornou à Inspetoria Salesiana de São Paulo e residiu em Araras. Agravando seu estado de saúde, e necessitando de contínuo acompanhamento de enfermeiros, foi transferido, em 2011, para o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas. Além do Parkinson que o fazia sofrer muito e o deixou sempre mais debilitado, foi constatado um tumor na região do fígado. Rezemos por esse irmão tão querido.”



NOTA DE FALECIMENTO

“Dom José Song Sui-Wan

Bispo Emérito de São Gabriel da Cachoeira

Faleceu na tarde de hoje, dia 15 de novembro de 2012, em Campinas, aos 71 anos, Dom José Song Sui-Wan (SDB), bispo emérito de São Gabriel da Cachoeira, Amazonas.

O corpo será velado a partir das 6h00 de amanhã, dia 16 de novembro, na Igreja Matriz Nossa Senhora Auxiliadora (Liceu), em Campinas. Serão celebradas Missa de Corpo Presente às 7h00 e a Missa Exequial às 11h00. O sepultamento, às 14h30, será no Jazigo dos Salesianos no Cemitério da Saudade em Campinas.

Unimo-nos em oração à família salesiana e à Diocese de São Gabriel da Cachoeira neste momento de dor, certos de que Deus acolhe seu servo Dom José Song Sui-Wan em seus braços misericordiosos.”

Setor Imprensa – Arquidiocese de Campinas



A repercussão da sua morte

“ho appreso la notizia della morte del nostro carissimo confratello vescovo Dom José Song Sui Wan.

Insieme a tutti voi rendo lode e grazie al Signore per il prezioso dono che ci fece nella persona di questo nostro confratello, che ha servito con fedeltà e generosità la Congregazione e la Chiesa.

Il Signore saprà ricompensare abbondantemente la tua totale consegna, dedizione e servizio.

Da mi parte mia assicuro il mio ricordo particolare nella eucaristia chiedendo il Signore Gesù lo riempia della Pace, della Luce, della Gioia e della Vita eterna della Sua Risurrezione.”

Con affetto, in Don Bosco
Don Pascual Chávez V., SDB
Rettor Maggiore



“Fiquei surpreso com a notícia do falecimento de Dom José Song Sui Wan, bispo emérito de São Gabriel da Cachoeira. Fomos da mesma ‘turma de nomeação’; e tínhamos muita sintonia. Fui visitá-lo em S. Gabriel da Cachoeira e pude constatar que era um bispo missionário maravilhoso, um bom pastor daquele povo indígena, que o amava e era amado por ele.

Que Deus o acolha em sua companhia na vida eterna, como ‘bom operário na vinha de Cristo’ que foi. Vou celebrar na sua intenção, dado que não poderei estar presente em seu funeral.

Deus conforte e recompense a ‘família salesiana’ por esse valoroso missionário que deu à Igreja!”

Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo

“Peço transmitir ao Pe. Inspetor a minha tristeza pela morte desse querido irmão, Dom José Song Sui Wan.

Para mim foi uma surpresa a sua morte. Sabia que estava doente de Parkinson, mas que fosse para casa do Pai tão cedo não passava pela minha mente.

O que nos consola é que foi um bom salesiano, desde quando entrou no aspirantado de Lavrinhas, em 1960, quando eu era assistente novo até quando foi chamado para o Episcopado e durante todo esse tempo também. Dele tenho gratas recordações.

Foi bom pastor com o coração de Dom Bosco. Foi perseverante até o fim.

Certamente já está gozando no céu das delícias da eternidade junto aos santos salesianos e com o Bom Pastor de nossas almas.

Ainda hoje vou celebrar a santa Missa em seu sufrágio.

Deus lhe conceda o repouso eterno, intercedendo Nossa Senhora Auxiliadora por ele.”

Dom Vitório Pavanello, SDB – Arcebispo Emérito de Campo Grande, MS


“Recebi com muito pesar a notícia do falecimento de Dom Song.

Foi ele um DISCÍPULO MISSIONÁRIO do jeito de Dom Bosco: alegre, laborioso, corajoso!

A Congregação Salesiana, a Inspetoria Salesiana... ganham um MÁRTIR da Fé!

Muito obrigado pelo seu E-mail: com Dom Bonifácio estamos em oração!

Abraços! Em Cristo, com Maria.”

Dom Milton Santos, SDB – Arcebispo de Cuiabá

“Recebi com muita tristeza a notícia do falecimento do nosso querido irmão Bispo Dom Song. Uno-me à Inspetoria de São Paulo e à nossa Congregação Salesiana na recomendação a Deus com preces e agradecimentos pelo que nos mostrou de amor à missão e à Igreja. A sua figura alegre e missionaria ficará para sempre nas memórias salesianas e certamente estará alegrando todo o Paraíso salesiano com suas mágicas. Esteja, com Dom Bosco e os nossos santos para sempre.”

Com fraternas condolências,

Dom Bruno Pedron, SDB – Bispo de Ji-Paraná, RO


“Agradeço a gentileza da partilha fraterna.

Como já dissera, anteriormente, o ‘P. Song fez e continua fazendo parte de minha vida e de minha família’.

Em Araras, particularmente, é tido como um ‘santo moderno’.

Soube acolher as resistências da vida e transformá-las em oportunidades de real crescimento.

Minha geração de seminário ‘menor’ sempre cultivou para com o seu Song uma forte admiração: bom jogador de basquete, dominador de idiomas, mágico sem ‘pudor de errar’, rezador, disciplinado... principalmente – irmão e amigo.

Em minhas pobres preces continuarei cultivando o carinho que sempre tive por ele.

Ganhamos mais um intercessor.”

P. Nivaldo Luiz Pessinatti, SDB – Brasília – Rede Salesiana de Escolas

“Que seja abençoada, de modo especial, a comunidade que o acolheu nestes momentos mais difíceis.

Caríssimos irmãos da Inspetoria de SP, uno-me a vocês nesta hora de dor e de glória. Deus seja louvado pela vida e missão de D. Song. Em união de vocação e missão.”

Dom Flávio Giovenale, SDB – Bispo de Abaetetuba, PA


“Para a Inspetoria de São Paulo, as minhas condolências pelo falecimento de Dom Song, um autêntico filho de Dom Bosco.”

Dom Segismundo Martinez, SDB – Bispo de Corumbá, MS

“Agradeço a notícia e asseguro-lhe as minhas preces e também dos irmãos da Inspetoria São João Bosco.”

Cordialmente,

P. Nilson Faria dos Santos – Inspetor de Belo Horizonte, MG


“Agradeço pela informação, que será repassada aos salesianos da inspetoria.

Estaremos unidos na oração, em sufrágio do querido Dom Song.”

P. Diego Vanzetta – Inspetor de Recife, PE

“Estamos todos sentidos com o falecimento do tão ilustre e benemérito salesiano missionário.

Repassarei as informações aos SDB da Inspetoria para que estejam em comunhão de preces. Nossa Inspetoria estará representada pela Comunidade do Noviciado.

Estamos em comunhão de preces.”

P. Orestes Carlinhos Fistarol – Inspetor de Porto Alegre, RS


“Que Deus acolha Dom Song e ele interceda por nós, pela China e pelos Ianomâmis de sua diocese. Amém.”

P. Gilberto Luiz Pierobom, SDB – Mestre de noviços em Curitiba, PR

“Triste notícia, e de surpresa. Não sabia que estivesse tão mal nestes últimos tempos. Mas, o Senhor o encontrou já maduro para terminar a sua carreira e receber o prêmio do servo bom e fiel. É um irmão coroado de glória, de muitas virtudes, e de maravilhoso testemunho como homem, salesiano, sacerdote, bispo, pastor. Ainda por cima, a sua alegria e jovialidade, que até mesmo fez rir ao Beato João Paulo II, com as suas mágicas.

Nossa Senhora Auxiliadora e Dom Bosco se orgulham desse filho. Agora, já começou no céu a sua primeira sessão de mágicas... e até Noé está a assistir, com um bom copo de vinho na mão, ao lado do Pe. Modesti... Pe. Minson...

Abraços e saudades do teu amigo e irmão de sempre, e unidos na Eucaristia de cada dia.”

P. Luiz Gonzaga Piccoli, SDB – Mestre de noviços em Moçambique


“Nos solidarizamos com tão grande perda nesta terra e pela festa que há no céu.

Estamos unidos a toda família salesiana.”

Izabel Guatura – Comunidade Canção Nova

“Recebi com pesar o falecimento do nosso querido Dom Song. Uno-me a sua diocese e a nossa inspetoria com orações e missas. Dom Irineu está fazendo crisma em uma cidade vizinha assim que chegar eu o comunicarei.

Muito obrigado por ter lembrado de mim.

Com orações, preces e sentimentos de saudades...”

P. Marcelo Bezerra – Diocese de Lins, SP


“Obrigada pela mensagem do falecimento de D. Song. Esta notícia nos deixou imensamente tristes; apesar da esperança de Ressurreição que nos conforma. Dom Song era para mim e minha família um AMIGO. Hoje aqui na Alemanha não fez sol – o inverno se aproxima... os Salesianos ganharam mais um santo e mesmo neste céu nublado, meu coração insiste em ver mais uma estrela. Vá em paz, Dom Song. Quando meus filhos entenderem o que um amigo significa vou falar de você e da sua alegria nos rios da minha Amazônia.”

Nubia e Rudolf Wuest – amigos residentes na Alemanha

“Vimos as notícias mais detalhadas a respeito do falecimento do Dom José Song. Vamos rezar para que ele tenha uma linda entrada no céu depois de tanto sofrimento... que deve ter atraído graças para a Diocese e para a Família Salesiana. Unimo-nos, também, à Família Salesiana neste momento de certeza de ter ganhado mais um membro na Família Salesiana Celeste aumentando o número de intercessores.

Que o Senhor Jesus envie santas vocações salesianas para aumentar os trabalhadores da Messe.

Benedicite!”

Ir. Perpétua, OSB e Ir. Felicidade, OSB – Mosteiro Nossa Senhora das Graças – Belo Horizonte, MG


“Salve, Maria!

Primeiramente, nossos sentimentos de gratidão e reconhecimento por tudo o que Dom José Song Sui Wan significou para a Família Salesiana e por toda sua atividade pastoral em tantas paróquias e na Diocese de S. Gabriel da Cachoeira.

Deus em sua infinita misericórdia levou-o para junto da corte celeste como recompensa por todo o bem que realizou na terra e pela fidelidade à missão que lhe foi confiada, por seu amor a Cristo e à Igreja.

Nossa Provincial está em viagem no Paraná, por isso tomo a liberdade de enviar-lhe esta mensagem, como responsável pelo Secretariado da Causa de beatificação de nosso Fundador Pe. José Kentenich e da Venerável Ir. M. Emilie Engel.

Nós somos gratas de modo especial a Dom José Song, por tantas vezes que aos domingos veio celebrar aqui em Atibaia para as Romarias, no tempo em que morava em Campinas. Ir. Marlenis Hoppe, que na época era responsável por acolher os Romeiros, lembra-se muito dele, e hoje comentei com ela e imprimi algumas notícias sobre ele da internet.

Foi Dom Edson Tasquetto Damian quem me comunicou que ele havia sido operado em Campinas e logo coloquei um bilhete para nossas irmãs adoradoras, no livro de intenções da Adoração Perpétua.

Hoje, foi também Dom Edson, meu parente, que me comunicou por e-mail o falecimento. Estamos unidas na oração e na espiritualidade Mariana. Tenho certeza de que, no céu, já encontrou Dom Bosco e também nosso fundador Pe. José Kentenich que intercederá por todos que lhe são caros e os que o conheceram.

Unida na oração, aqui no Santuário da Mãe e Rainha, neste Ano da Fé continuamos no empenho para a nova Evangelização.”

Ir. M. Anadir Santini

“A inseparável escaleta estava sobre a mesa do escritório quando chegamos. Seu sorriso oriental, marca registrada de Dom Song, acolheu-nos e nos conduziu para conhecermos a cidade onde faríamos nosso trabalho missionário. São Gabriel da Cachoeira é um pequeno município no extremo noroeste da Amazônia, de população majoritariamente indígena e conhecido nacionalmente como ‘cabeça de cachorro’. Para nós, entretanto, a cidade também foi o ponto de encontro entre nossa família e este querido amigo, que homenageamos com esse breve relato.

Na ocasião, ‘Dom’ – como o chamávamos – trajava uma calça larga já bem gasta, camisa branca, sandálias de couro e um enorme crucifixo colado ao peito. As características não correspondiam às formalidades episcopais que conhecíamos até então, mas naquele momento não podíamos prever quantas vezes ele ainda nos surpreenderia. Foi assim que tivemos a honra de conhecer esse maravilhoso ser humano, dotado de uma simplicidade incomum e humildade que nos comoveu ao longo do tempo em que convivemos.

O convite para irmos até São Gabriel havia sido transmitido por um grande amigo, coordenador da Pastoral da Juventude e também missionário, P. Toninho. Em um primeiro momento, ficamos surpresos e curiosos com a notícia: o que faríamos lá? Quem estava nos convidando? Como chegaríamos a tal distância? Todas as dúvidas e questões foram cuidadosamente esclarecidas: o convite vinha de Dom Song que, por sua vez, recebeu carinhosamente a mim, minha esposa, nossas três filhas, outros cinco voluntários e um padre Salesiano em sua residência. A essa altura, sabíamos apenas que iríamos realizar um trabalho pastoral e de saúde bucal junto às comunidades indígenas, mas surpresas estavam por vir.

Certo dia nos preparávamos para a nossa viagem mais longa. A caminhonete azul da diocese (fabricada no ano de ‘só Deus sabe’) estava abarrotada de coisas e tralhas e ainda teria que suportar o peso do grupo. De repente, Dom aparece com chapéu de palha e uma pequena mala na mão. Era impossível não se comover com seu entusiasmo. Naquele dia, viajamos por duas horas em estrada de terra, passamos por atoleiros e subimos o rio Negro por mais sete horas até a comunidade indígena Yanomani, chamada Maturacá, onde também se encontrava a missão Salesiana.

Quando chegamos, as crianças brotavam da mata como pássaros e, em bandos, não demoraram a seguir o som da escaleta. Na palhoça central da aldeia, a surpresa: a maleta que Dom carregava estava repleta de materiais para fazer mágica. Dizendo algumas palavras indígenas, o “mágico” iniciou o espetáculo para crianças e adultos seminus que miravam aquele mágico de forma curiosa e atenta. Depois de alguns truques, todos riam, as crianças ficavam eufóricas ao participarem de alguns números.

Músico, mágico, viajante e bispo. Dom não cansava de nos encantar. Dormia em rede, viajava de caminhonete, barco, a pé pelas comunidades. Lembrávamos que era bispo quando se paramentava e fazia celebrações das missas, que sempre terminavam com uma historinha. Ficávamos esperando, inquietos, pela tal historinha.

Outras histórias também ouvimos no ano seguinte, em 2008, quando retornamos com outro grupo. “Dessa vez, a surpresa não era boa, nem mágica. Havia um tremor nas mãos, a escaleta tragava notas e nós engolíamos o ‘nó na garganta’. Nas comunidades não se ouvia mais o som do escaletista mágico. O ‘Parkinson’ começava a vencer o ‘chinês’ numa batalha sem piedade.” Deixar São Gabriel, seu povo indígena e retornar a Araras e depois seguir até Campinas foram golpes difíceis para o humilde mandarim.

A rigidez e as dores musculares, a limitação dos movimentos e os medicamentos não conseguiam fazê-lo reclamar em momento algum. Muitas foram os ocasiões compartilhadas nesse período. Perto do fim, ou melhor, do recomeço nos braços do Pai, foi o silêncio de Dom que nos ensinou sobre a perseverança e fé.

Dom de quem se doa, Dom de quem se faz criança, Dom que na sua autenticidade mostrou a pureza de seu ser, Dom que se faz amigo, Dom que chora com os mais sofridos, Dom que se alegra com um sorriso, Dom que é magia para os seus pequenos indígenas, Dom que se fez companheiro em todo nosso trabalho missionário dando a cada minuto de convivência um ensinamento de amor.

Nosso querido e amado Dom foi o companheiro e amigo mais suave que poderíamos conhecer. Foi um pai em nossa defesa, uma mãe em seu acolhimento, um fiel protetor em nossas itinerâncias pelo Alto do Rio Negro. Um anjo a nosso favor que nos fez sentir grandes pelo pouco que fizemos. Sua nobre sabedoria ensinou que a grandeza está no amor através da presença, do encontro e da união.

Que saudades, DOM!!!!!!”

Admilton Biscalquin, cirurgião dentista, sua esposa Diva e as filhas Juliana, Marília e Helena


“Estive viajando e recebi a notícia do falecimento de D. Song, o querido bispo emérito que fez de sua vida uma trajetória de construção do Reino, introjetando, inclusive, a cultura indígena do Amazonas. Como bispo, foi realmente um sinal de contraste, com o sorriso estampado em seu rosto, o cocar na cabeça, junto à comunidade em que pastoreava.

Eu sabia da gravidade de sua enfermidade, pois o Dr. Calejas mostrou extrema preocupação com o estado adiantado do tumor que lhe invadia as vísceras. Enfim, os desígnios de Deus, às vezes, nos escapam, e apenas, à luz da fé, entendemos a dimensão divina do sofrimento na terra e a colheita dos frutos na casa do Pai.

Recebam meus sentimentos e os de meu marido, solidários na dor da perda de D. Song. Por outro lado, vocês, salesianos do Liceu Campinas, são parâmetros da acolhida fraterna aos irmãos enfermos e cuidam deles com muito zelo e carinho. Que Maria Auxiliadora os abençoe por esse espírito tão fraterno, acolhedor e humano que permeia o Liceu Salesiano de Campinas.

Como não pudemos estar presentes, fizemos nossas preces para que D. Song fosse recebido na casa do Pai pelas mãos de Maria Auxiliadora para integrar a comunhão dos santos.

Abraços cordiais e autênticos pêsames.”

Ana Maria e Pedro Negrão


Uma palavra de despedida, de Dom Edson Tasquetto Damian, que é o sucessor de Dom Song na Diocese de São Gabriel da Cachoeira.

“OBRIGADO, DOM SONG!

No dia 15 de novembro, às 14h30, nosso querido irmão Dom José Song Sui Wan, 4.º bispo de São Gabriel da Cachoeira, realizou sua páscoa definitiva. Tinha completado 71 anos no dia 16 de maio. Há vários anos sofria do mal de Parkinson e ultimamente também teve um câncer no fígado. Foi submetido a uma grande cirurgia no dia 29 de outubro, mas não teve mais condições de se recuperar e morreu com infecção generalizada. A Sra. Lay, irmã de Dom Song, veio dos Estados Unidos e o acompanhou durante dois meses. A companhia dela trouxe grande conforto ao Dom Song.

No dia 16, Dom Airton José, arcebispo de Campinas, e mais de trinta padres concelebraram a missa de despedida. O Diácono Gilson Araújo, que será ordenado padre em Yauaretê, no próximo dia 15 dezembro, representou nossa Diocese: leu uma mensagem que enviei e também rezou a Ave Maria em Tukano.

Dom Song me ordenou como seu sucessor em São Gabriel da Cachoeira, no dia 24 de maio de 2009. Quando escolhi esta data para a ordenação, sem dar-me conta de que era também a festa de Nossa Senhora Auxiliadora, Dom Song logo me disse: ‘Bem que estava vendo o dedo de Nossa Senhora na tua indicação para ser bispo daqui.’

Primeiro e, até agora, único bispo chinês no Brasil, migrou de Xangai, China Continental, juntamente com sua família, quando tinha 18 anos. Ele conquistava a todos com sua simplicidade, sua bondade, seu sorriso alegre e cativante. As crianças de todos os recantos por onde ele passou jamais esquecerão o padre e o bispo mágico e músico. Dom Song foi professor e formador em mais de dez instituições de ensino dos salesianos, no estado de São Paulo. Aplicam-se a ele as palavras que escutamos na liturgia de domingo passado: ‘Os que tiverem sido sábios brilharão como o firmamento; e os que tiverem ensinado a muitos o caminho da virtude brilharão como as estrelas, por toda a eternidade’ (Daniel, 12,3).

Os alunos das escolas de São Gabriel quando vinham me saudar e conhecer me perguntavam: ‘Bispo, você faz mágica?’ Sem jeito, dizia que não. Olhavam para o piano que Dom Song deixou na sala e perguntavam: ‘Bispo, você toca piano?’. Mais sem graça, repetia que não. E eles, com olhar desapontado, pareciam me dizer: ‘Coitado, este bispo não está com nada!’

Na última viagem a Roma, durante a visita ad limina na companhia dos bispos do Amazonas, Dom Song tocou algumas músicas e fez mágicas diante do Papa João Paulo II, que também padecia do mal de Parkinson. O Papa ria muito e reagia como as crianças que, após cada apresentação, pediam: ‘outra, mais uma!’

Seguindo o exemplo do Bem Amado Irmão e Senhor Jesus que falava em parábolas, Dom Song em todas as suas pregações ou conferências contava historinhas que todos compreendiam e assim conseguiam captar o sentido da sua mensagem.

Dom Song deixou também sua marca indelével junto às famílias. No início de seu ministério visitou todas as casas, uma por uma, em todas as ruas. Na Cúria Diocesana encontra-se um fichário com informações preciosas sobre cada família de nossa cidade.

Em meados de julho visitei Dom Song pela última vez. Devo agora pedir-lhe perdão por não ter sido possível atender a um pedido que me fez com insistência. Queria retornar comigo a São Gabriel para entregar seus sofrimentos e seus últimos dias pela Igreja do Rio Negro e ser sepultado aqui onde viveu os fecundos sete anos como incansável e generoso bom pastor de todos.

Obrigado, Dom Song, pelo bem imenso que fez aos ‘parentes’ das mais de 500 aldeias indígenas espalhadas ao longo do Rio Negro e de seus numerosos afluentes. Foram dias incontáveis navegando de ‘voadeira’ sob o sol abrasador ou sob as chuvas torrenciais para levar às comunidades a alegria da visita, a força da Palavra e a graça dos Sacramentos.

Na pessoa do Pe. Edson Donizetti Castilho, Inspetor de São Paulo, e do Pe. Reinaldo Barbosa de Oliveira, Diretor do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, agradeço em nome da Diocese de São Gabriel da Cachoeira os cuidados médicos e o carinho fraterno que os salesianos dedicaram ao Dom Song nos quatro anos de calvário que precederam a sua ressurreição com Jesus Cristo Nosso Senhor.

Agora, na penumbra da fé, já podemos contemplar nosso amado Dom Song encantando os Anjos e os Santos com suas músicas e magias na festa que no céu nunca se acaba.

Até logo, querido e saudoso Dom Song. E vai preparando um lugarzinho para nós que não queremos perder a festa de jeito nenhum!”

Dom Edson Tasquetto Damian
Pobre bispo do mato
São Gabriel da Cachoeira, AM, 21 de novembro de 2012,
Sétimo Dia da Páscoa de Dom José Song Sui Wan




Agradecimentos

“Agradecemos, em nome da Comunidade Salesiana do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, o carinho e a dedicação das enfermeiras que assistiram Dom Song durante a sua permanência em nossa Comunidade. O cuidado amoroso de sua irmã Lay muito nos edificou.
Agradecemos a atenção do Dr. Jorge Gottschall, médico que atende nossos salesianos, o Dr. Francisco Calejas Neto e equipe médica e hospitalar do Centro Médico de Barão Geraldo onde Dom Song viveu seus últimos dias de vida nessa terra. A tantas pessoas que acompanharam Dom Song com suas orações e manifestaram seu pesar por ocasião do seu falecimento.”

Ao P. Antonio Carlos Galhardo, Irmão de Comunidade, que orientou e acompanhou a “montagem” dessa carta.

P. Reinaldo Barbosa de Oliveira, SDB
Diretor e Comunidade Salesiana do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas, SP




Dados para o necrológio

Dom José Song Sui Wan, nasceu em Xangai, China, em 16 de maio de 1941 e faleceu em Campinas, SP aos 15 de novembro de 2012. Foi Bispo de São Gabriel da Cachoeira, Amazonas, por 8 anos. Dom Song está sepultado no Jazigo dos Salesianos em Campinas, no Cemitério da Saudade.








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