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Cronicas-->A ILHA -- 03/02/2002 - 07:31 (Marcelino Rodriguez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
ILHA

Agora é preciso reconstruir o mundo com pala-vras. A solidão até pode lembrar-te um céu violáceo. Agora que foste de vez abandonado, que mais neces-sitas? Pássaros, apenas pássaros brancos e nuvens. Areia fina, coqueiros. Um mar noturno, silente e ru-moroso. Agora vai, caminha. Estás aqui por tantas coisas, tantas. Algumas talvez sejam eternas. Mas da tua memória, pouco tem valia. Não nasceste da carne, mas do espírito. Filho das estrelas, irmão do vento, esperavas pelo amor para permanecer. Esperaste em vão.
Acumulaste desde a infància a saudade de ti mesmo; olhava as inabitáveis pessoas com estranhe-za. Quem são? Foi sempre a pergunta que te fizeste. Foste crescendo múltiplo personagem na arena da vida. Só a tua alma secreta nunca souberam, nunca. E a tua vida era como uma estrela despercebida pela pressa. Brilhavas, mas ninguém te via. Nem te adivi-nhavam. Como interagir, sendo de tão longe?
Chora, porque não foste amado. Chora, porque nada tiveste. Na tua história não houve testemunhas, nem consolo. Sabias o quanto lutaria, mas subesti-maste a crueldade. Ergueste-te vencedor sobre imen-sas covardias; o silêncio era teu par; vitória sem amor, foste vencido! Hoje é palavras mudas no teu coração, sempre teu coração, clamor no deserto!
A esperança de seres descoberto era vã. Terias de explicar-te. Santo ou soldado era teu dilema. Luta-vas por um Deus suposto e justiceiro, que afinal se revelou hipotético. Pouco importa tuas dores, não tens colo, metais, refúgio. Não tens valia, só valores. E assim a vida te embalava, combate após combate, sem tréguas!
Eras da margem, do rio límpido. Entre pessoas, exílio. A tua missão era o amor; ao menos cria. E foste suportando, calando e crescendo, fundo e forte acu-mulavas dores. Fazias o que podias, ou pensavas; sempre havia algo mais ou o dia seguinte, a vida pri-sioneira. Ó voracidade de encontrar alguém que te entendesse, que te amasse. Que justificasse. Que soubesse sem perguntar.
Enfim te cansaste de guerras, da espera em vão. Te refugiaste no amor. Nada esperavas. Cumpria teu dever impossível de viver com dignidade mais que impressionante. Nada te deram, tudo tiraram. E ainda resistias bravamente, embora sem sentido. Já estavas atordoado como ferido pássaro sob predadores. Quem te amaria em tal estado? Tudo venceste, tudo supor-taste. Na verdade, eras temido com tua presença. O amor era tua invisível coroa. Amavas porque eras.
O amor veio no teu momento mais triste, na tua fragilidade suprema. Veio por uma lei da fatalida-de desconexa do universo. Veio para ti com ardor, promessa, cumplicidade. Veio para desafiar-te a mais uma guerra. Temias. Tentaste fugir. Seguravas suas mãos brancas e pequenas como quem segura a pró-pria vida, náufrago. O universo transbordava no teu corpo; tua alma, porém, temia. Tinhas ainda tanto da paisagem real, embora escondido sob a poeira. Se o amor prestasse, esperaria.
O amor, porém, não se descobriu na sua que-da. O amor não permitiu que te erguesses, que te ex-plicasses. O amor veio abrupto, talvez nem fosse o amor. Mas o amor não erra de endereço, e te encon-traste. E houve ali, sem que ele soubesse, um pacto eterno. Era ela o amor, embora traiçoeiro, imaturo, impaciente. Era ela tudo que sonhaste sem sonho. Talvez ela não saiba nunca que acertou a porta, quando pensou aventurar-se. A única porta onde ela encontraria não o pensamento do amor, mas seu fi-lho. O seu mais amado filho, pai, mãe e mistério.
Ela te encontrou exatamente onde estás agora, despojado e triste. Deixou-te naquilo que sempre foi teu, naquilo que sem ela és: ilha.
2

Podes agora, embora ferido, abrir tuas asas. Não precisas disfarce: és eterno. Ninguém te vê, sem ela és menino perdido, desorientado, mas não precisa mais dar-te a quem não amas; achaste-a, ou foste achado, pouco importa o que te cerca ou agride. Ela deu-te o infinito secreto compartilhado. Foste cativa-do. Abre teu coração, declara. Quem sabe o eco não a comova e faz com que ela retorne, para por as estrelas no lugar?
Vinde a mim anjos, arcanjos, querubins; estou só, porém a lembrança dela me faz afundar na areia branca. A palavra branca me lembra mãos pequenas, cinco dedinhos, onde eu procurava apoiar meu desas-sossego, nascer novamente entre os homens, lutar. Não se toca num coração sem qualquer movimento de fatalidade. Eres tu ou ela? A ilha abarca o universo, sem que nem um pássaro se perca.
O mar da ilha são lágrimas, o céu saudade, o silêncio música triste, a vida suspensa. O que ela, mulher, te acrescenta, apenas palavras? Serão os sentimentos apenas palavras vazias como conchas? Mas se puseres as conchas aos ouvidos, o mar retor-na: mistério. Ela falou em vão que te queria, ou foi um inexorável movimento metafísico que a fez mover-se? Gostaria de agora, nesse exato momento eterno, en-contrá-la. Ela era o milagre, como perdê-la?
Querida, retorna. Tudo já está esperando na ilha. Aqui não há tempo nem conflito, nem aparência de perfeição; tudo é superado com passos leves, ruflar de asas, aconchego. Tudo tenho, porque tudo vem à ilha: navios, namorados, peixes, mensagens, tesouros, piratas. Sobretudo, há nela alguém que se esticar as mãos colhe estrelas, apenas para te fazer colares. Esse homem só te espera, para fazer sentido o fato de haver homem, palavras, ilha e eternidade. Querida, retorna.

6/1999.
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