O LUCRO É PROIBIDO
Está no maior jornal do Estado. E em manchete de página interna: “proibido lucrar com o forte”.
A determinação é do Ministério Público Federal, que proibiu a Associação Brasileira dos Amigos das Fortificações Militares e Sítios Históricos (ABRAF) de obter algum lucro com a administração do Forte do Mar (Forte de São Marcelo).
Pode até parecer extravagância, uma coisa bizarra, mas é isso mesmo, consta da longa matéria assinada por uma jornalista.
A explicação para esse posicionamento do Ministério Público está no fato de se haver constatado que a ABRAF usou indevidamente lucros obtidos com a realização de eventos naquele local.
Diga-se, a propósito, que as associações, sindicatos, OSIPS e entidades filantrópicas são impedidas por lei de obter lucros, no sentido comercial. O resultado positivo de suas atividades, ou seja, a sobra de receitas sobre as despesas é chamada de superávit, enquanto o prejuízo corresponde a déficit.
Essa visão caolha do Ministério Público nos remete ao tempo em que os reacionários e extremados da Igreja Católica enxergavam o lucro como uma tentação demoníaca, algo imoral, quase o mesmo pensamento da teoria comunista, que o via como conseqüência da exploração das massas operárias pela burguesia.
Entidades como a ABRAF e outras associações, e mesmo as de caráter filantrópico, têm que ter gestão de alta qualidade, que priorizem a eficiência.
Sem descuidar de seus objetivos principais, elas precisam buscar superávits, como única forma de capitalizar-se, garantir sua perpetuidade, a ampliação de suas atividades e a realização de investimentos.
Tome-se, por exemplo, o caso da Santa Casa de Misericórdia da Bahia, entidade fundada no mesmo ano da criação da cidade do Salvador, muito provavelmente a ONG mais antiga do país e uma das primeiras em todo o mundo.
Como essa importantíssima organização filantrópica poderia ter sobrevivido durante esses mais de quatro séculos se não houvesse obtido resultados financeiros que garantissem a manutenção ininterrupta de seus serviços e, mais do que isso, que propiciassem sua contínua expansão?
Pode até parecer que forças superiores tenham sustentado o funcionamento da Santa Casa, e isso tem que ser considerado, mas na verdade foi a eficácia de sua administração que a trouxe atuante até os nossos dias.
Muita gente não sabe que a Santa Casa mantém o Santa Izabel há mais de cem anos, hospital que hoje é uma referência no país, com mais de quatrocentos e cinqüenta leitos.
Foi graças aos superávits obtidos nos últimos anos que ele pode ser modernizado e grandemente ampliado, enquanto a entidade criou um plano de saúde, manteve o Cemitério do Campo Santo e iniciou um projeto social de grande relevância no Bairro da Paz.
Obter resultados positivos, ou seja, alcançar superávits é condição indispensável à sobrevivência e desenvolvimento dessas entidades, à sua auto- sustentabilidade.
O que a lei proíbe, e que o Ministério Público sabe muito bem, é que esses resultados sejam distribuídos, que qualquer diretor ou conselheiro deles se beneficie sob qualquer forma, que nenhum perceba salários ou gratificações de qualquer espécie.
Mas, voltando à ABRAF, que é afinal o objetivo desses comentários, seria de todo desejável que ela obtivesse ganho com a exploração do Forte do Mar, recursos que seriam totalmente investidos na recuperação e conservação desse extraordinário patrimônio histórico da cidade e na realização de investimentos que sirvam à melhoria dos serviços e do atendimento.
Afinal, com ou sem superávit, a Associação sempre pode aplicar os recursos que recebe de modo indevido.
Cabe ao Ministério Público velar para que isso não aconteça.
Imagine-se que os diretores da Associação queiram instalar um moderno auditório em algum salão do Forte, com ar condicionado e cabine para exibição de filmes e audiovisuais, ou um bom restaurante. Se for contar com recursos públicos, oriundos do orçamento federal, vão ter que esperar sentados por muitos e muitos anos...
Salvador, 28/07/06
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