O Verbo “Ficar” Entre os Políticos
(por Domingos Oliveira Medeiros)
Texto publicado no jornal “Correio Braziliense de 01-06-02-Caderno de Sábado”.
O “ficar” mais famoso e antigo que conheço é o Dia do Fico. Lá pelos idos do Império, em que D. Pedro I, pelo que dizem os historiadores, resolveu atender ao pedido de seu fã clube, e acabou ficando no Brasil; e, junto com ele, sua fama de “paquerador. Coincidência ou não, o fato é que, com o tempo, o sentido do verbo voltou às suas origens.
Ou seja, a ação do verbo ficou com outro sentido. Tal como D. Pedro I que, na sua época, já “ficava” com o sentido que hoje se empresa ao verbo. Ficar, agora, não significa mais ficar. Ficar, hoje, é quase um ”não vir”. Está mais para ir embora. Ficar é não ficar.
E com isso, o mundo deu um giro de trezentos e sessenta graus. Ficou cabeça para baixo. Mudaram-se, radicalmente, crenças e valores. Hábitos e costumes. O que se dizia antes, hoje significa exatamente o contrário. É como utilizar o dicionário de sinônimos ou de antônimos, indiferentemente, .sem que isso possa trazer qualquer prejuízo à compreensão.
Há, por conta disso, uma certa indiferença em relação as coisas. Apenas os ditames da moda permanecem como antes. O que for dito em moda, todos tendem a seguir. É ponto de honra para o grupo. Caso contrário, o estranho estará fora do contexto de sua tribo. É sinal que o indivíduo não está “ligado”. Ligado aqui, também, com outro sentido. Menos o de ligado, propriamente dito. Quer dizer, quem estiver ligado, nos dias de hoje, estará, com certeza, totalmente desligado. Ligou?
Sacar, também não tem nada a ver com o vôlei. Nem com o sistema bancário e tampouco tema ver com o puxar de as armas. Apesar de que, armas e bancos se juntam na questão da violência moderna. Principalmente nas grandes cidades. Onde a língua falada e a violência estão mais afetas aos jovens. Assim,.”ficar” significa uma relação que inclui “amassos” (nada a ver com lataria de carro batido) carícias e sexo, basicamente. Sem qualquer tipo de compromisso. Pode-se, inclusive, numa mesma festa, “ficar”com vários parceiros. Em questão de minutos. E às vezes nem tanto. Tudo é aceito “num a boa”.
E este fato linguístico, por assim dizer, ultrapassou o campo restrito aos jovens e passou a integrar o mundo da política. A partir dessas eleições, a nova linguagem ficou com força total. E, paradoxalmente, serviu até para dar uma certa “racionalidade” ao que vem sendo praticado em relação às famosas coligações partidárias. O PT anunciou que vai “ficar” com o PL. O PMDB “fica” com o PSDB. E o PFL, tudo indica, é o que mais abusará do “ficar”. Uma hora, diz que vai ficar com o PSDB; outra hora, pende para o lado do PT; Outra hora diz que não vai ficar com ninguém. E, em alguns Estados, ficará, temporariamente, com o PDT. Já há indícios de “ficar” entre o PT e o Partido do Garotinho. Depois, vai ficar difícil saber quem é o pai da criança. Isso se essas coligações durarem mais do que o previsto. Acho que não. Depois das eleições, tal como no “ficar” de fato, cada qual vai pro seu lado. E quem vai ficar na mão, com certeza, será o povo brasileiro. E ainda vai “dançar”, não de alegria, mas de tristeza, prá variar.
DM-2002
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