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Discursos-->Em memória do 7 de setembro -- 14/09/2011 - 09:38 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Encaminhando matéria enviada pela brilhante professora Vania L. Cintra. Gostaria de lembrar que  é pela Espada de Athena que se impõe a Justiça. OJBR


 
 
ALVORECER
ou
EM MEMÓRIA DO 07 DE SETEMBRO – já que nada de novo há para ser dito
 
                   
 
 
I.
    Quem, hoje, ainda me estranha? Quem o meu nome pergunta? Quem o ousa? Que pretende? Procura-me desde onde? Ou desde quando é que mente e somente de mim se esconde? Não ouve o galo cantar, bem antes que a noite fuja, de todos, por trás do monte, quando irrompo no horizonte? Ou apenas não o entende? Não me vê aproximar, nem mesmo percebe a coruja escura, soberba e serena que a mim, em meu ombro, se junta?
    Eu sou a que surge plena, inteira e intensa em ser, gestada em Zeus, meu pai; a que tem aos pés a serpente, a que seduz sem vaidade, aquela, cujo bordado, em cada ponto que é dado, delineia a liberdade. Grotesco é me desconhecer! Sou a que despreza as peias, as manhas, as barganhas, a pequena e torpe aranha a tecer suas artimanhas, e a que, sem dó, rompe as teias; a que dá valor às vidas, não acode a quem decai e zomba dos suicidas – sem juízos a Demóstenes, à minha suposta crueldade, e também sem o descarte da remota possibilidade de que, algum dia, eu própria enfrente, ainda que inutilmente, minha indestrutibilidade.
    À minha luz, às do sol e da lua reluzem os elmos e os escudos, as achas, as flechas e as lanças que ganham outra luz que é só sua. E enquanto se fazem as danças, entre os gritos e sons mudos, ao ritmo do ranger de dentes dos que não estão tão somente exibindo o seu valor, os céus troam em meu louvor.
 
    Os deuses apenas se ocupam de suas responsabilidades.
 
II. 
    Conheço bem as crendices, conheço bem os farsistas; conheço todos os danos feitos por dolo ou tolices; aqueles que pensam pensar, os que se dizem artistas e usam os males por tema, conheço bem os enganos que do mercador são lema e suas oferendas vulgares, e os que determinam as leis e os que as tornam banais, às quais, depois, legitimadas sob vis emulações, querem impor-me obediência para erguer algo em tijolo em nome de santos ou reis, em nome do nome de anões a quem todos dizem amém se esquecendo da prudência ou, muitas vezes, da decência. Conheço de longe um tolo...
    Nenhum dos tolos, porém, me conhece ou conheceu. Mesmo os que tanto falam de mim em seu próprio nome e os que deles mesmos falam em nome de um outro nome, desse nome que é o meu. Ignoram a minha sina, qualificam-me de insana, maldizem minha existência, pensam fadar-me à desonra, crêem desonrar-me a fama, acusam-me de todo o mal, eliminam-me dos lares, proscrevem-me do real...
    Nem tomo conhecimento de tanta vã providência. Sou a sutil paciência, sou impulso e sou razão. Sou princípio, meio e fim, da filosofia o reverso, o avesso do direito; sou a procura e o deserto, sou o encontro e a multidão, e a mais sábia solução – aquela que vive em mim.
 
    Os deuses apenas se ocupam de suas próprias vaidades.
 
III.
    Dizem alguns que me venceram, que Péricles me conquistou, que Fídias me imobilizou, frígida, em ouro e marfim. Muitos nomes celebrados, muitos os impudentes impunes, hábeis em todas as práticas e nos prazeres da sega, que são as artes da paz. Por que eu seria, ao fim, vulgar sentinela do nada, não só venal como cega a distribuir meus favores, comprada por um circo de horrores como qualquer meretriz? A bem da verdade crua, a troco de quê, não mais que desnaturando a paidéia, aceitaria tais prendas, os trapos, os véus ou as rendas, e belas jóias que são freios, rédeas, grilhões e arreios, a macular-me a carne nua, a emascular-me a rija idéia, a impor-me a cor e o matiz?
    Desdenho de apelos tais, e não estarei em um só lugar. Meus olhos cinzentos e ternos só se voltam àqueles, raros, que vingam dispostos, eternos, sem seu poder ostentar. Não serei de um só mortal que se diga solitário. Pertenço ao bravo, ao viril, majestoso, que faz o que é necessário desde que seja honroso, que se compõe dos demais, àquele que é solidário, imune a qualquer desatino, àquele que se reconhece em qualquer um de seus iguais, àquele que jamais se esquece de que eu não permito louros, auras, luxúria, ócio ou ágio, uma só lágrima ou o medo ou momentos de aconchego aos que me protegem o destino forjado em bom aço e bons couros, do qual se fez um presságio: dele, o destino de todos, num todo, sem casca ou miolo, estará sempre a fluir. Porque um louco, um fraco e um tolo só sabem se diminuir.
 
    Os deuses apenas se ocupam da nobreza que há nos Homens.
 
IV.
    As sendas que nem sempre são mas nos parecem mais belas não são as mais generosas. E à sombra de todos os fogos, desde a primeira vontade, a senda das serventias praticadas como jogos, cantada em verso e nas prosas, é escrita à luz frouxa das velas com o sangue derramado, sangrado, dos que se dobram a falsos sorrisos e encantos – punhais, que, ocultos em mantos, os cortam sem qualquer piedade com suas lâminas frias.
    Entre Homens inteiros e mim, tal como se mal combinados, os mistérios permanecem como aparentes dilemas que possam algum dia ser, ao cabo e ao fim, desvendados. A pensar neles não paro, mas um dos mistérios é claro: se quem me declara são eles, se eles são os que me fazem, ou sou eu a que os faz através de seus emblemas e sou eu a que escreve as façanhas em legendas, confundindo-os, às vezes, tanto, que eles até pensam, de fato, que determinam a verdade, e eu, por vezes, relato que não mais que por seus meios e por sua integridade posso permanecer entre eles a fazer realidades que lhes enxuguem o pranto causado por suas lendas.
    Uma confusão desse porte será por um instante fugaz. Como lhes confiar minha sorte? Eu não sou quem lhes responde. Eu sou quem decide e acontece quando, sozinha, lhes falo, ou mesmo quando me calo, não importa por que e onde. Mas sempre que eles se elevem, como sempre que desatam minha idéia em sua mente, e sempre que eu ainda abrigue sua força no meu ventre, nós vivemos plenamente a mais fértil das disputas: a que não permite temores – pois sabemos das condutas – e só nos faz vencedores. Dou-lhes a fortuna de ser, dou-lhes o dom de fazer e as dores de conhecer.
 
    De virtudes se ocupam os estetas e os deuses não são poetas.
 
V.
    Sou como a paixão que atiça, como febre em corpo são; na linguagem mais castiça, sou o correto limite e o limite do perfeito: sou, da inércia, a ruptura, e da miséria, da ambição, da angústia e da ira, a cura. Essa é a verdade mais pura. Desvelo-a com cuidado em meu peito e tranço-a entre meus cabelos, transformando-a em desvelos com direção permanente e com dimensão conseqüente. E não mais há o que a imite. E sou o único remédio ao miserável veneno da fatal submissão. Só vou onde quero estar, para entrar ninguém espero, só entro à hora em que quero, faça sol, chuva ou sereno, só saio se for para ficar em cada lugar, soberana, ao absoluto sagrada em gesta na qual não há acasos, não há sanha desumana, não há mártires, não há tédio, não há vilões nem pretextos, não se obedecem os textos, não se observam os prazos e não se alega a ingenuidade.
    Consciência desdenhada, ressurjo do concreto desfeito e do pensar fragmentado, mesmo que amaldiçoada, sempre do mesmo jeito. E os tolos que me desprezam se gastam, inúteis, em meus dias – são sombras desfiguradas, confundem-se em suas próprias ciladas, vêem seu castelo arruinado, e são todos derrotados por total fragilidade, por suas tão vis covardias. São fracos, débeis e tortos em busca de ninharias, e não serão mais do que são. Estão eles todos mortos. E os mortos estarão, para sempre, apenas mortos.
 
    Os Homens se ocupam do mundo. Os deuses apenas se ocupam...
 
VI.
    E é só isso e nada mais. Eu sou a seiva, a vida, e o demonstro a cada passo porque quase nos bastamos: eu, que bem sei fazer sempre que nos encontramos, sei que assim os satisfaço e, assim, sei também quem sou; eles, que, por vezes, recebem o prazer que eu lhes dou, e que de outras me pedem desmedidamente, com fúria, dissimulando a volúpia, como a sugar-me a potência, na contra-ordem da ordem em tributo à inteligência. E eu os desejo, insensata, ainda bem mais furiosa, quase que desesperada, cobiçando ser amada como mera criatura e ansiosa por senti-los quais deuses à minha altura. Em me procurando o serão. E em se entregando à minha busca, porque é assim que me merecem, quando me encontram eu me entrego, porque é assim que eu os mereço.
    Essa é a única fé que eu prego e o preço que reconheço, e essa é a verdade mais pura e é só isso e nada mais.
    E a mim, cabem-me agora e para sempre caberão o mal, o bem e o profundo das mais sãs virtualidades. Porque os deuses só se ocupam de suas responsabilidades, de suas próprias vaidades, e da nobreza dos Homens. Não dos destinos do mundo.
 
    Os Homens se ocupam dos deuses. Os deuses já nem mesmo se ocupam.
 
VII.
    Tremei, pois: eu sou a Guerra. E tudo o que meu nome encerra.
    Em mim, só a coerência, não o joio nem o trigo, só o justo e a razão, não o que chamam de justiça, não o que chamam de inocência, menos ainda a salvação. Perturbo os fracos, os tolos e os loucos de qualquer gleba que haja na face da Terra, e os que ainda são mais tolos odeiam ser vistos comigo, odeiam-me e odeiam a fadiga, odeiam o cuidado e as fainas aos quais minha presença os leva. Da vida só querem painas cobertas de pano macio e brisas soprando no estio.
    Não me faz dano esse ódio. Loucura, tolice ou silêncio, aos loucos, aos tolos e aos mortos pode caber qualquer glosa, mas eles não viram um nó górdio nem lhes coube escolha honrosa. E eles próprios se condenam em sua triste trajetória.
    Eu sou a senda da glória. Em meu regaço protejo aqueles poucos que me seguem, que da vala comum emergem em saber e lucidez. A estes lhes cabe, então, a inteira decisão dos meios. E atendendo aos seus anseios, cabe-me a escolha da hora em que faço e farei a História mais uma e mais outra vez. E me restarão nessa hora, e para sempre restarão, o bem e o mal e a solidão de toda a minha eternidade. 
    Essa é a única verdade, a única verdade que vejo.
    Mas, a mim – quem não o sabe? – por certo só a mim me cabe a inexorabilidade da aurora.
 
    Os condenados, só os condenados estarão, para sempre, condenados.
 
 
De PALAS-ATENA ao seu guerreiro
(versão em texto corrido
do original em versos dedicados a OSF em 1997)
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Neste mesmo sítio, em “textos anteriores”, conferir o primeiro deles – “QUE É DE NOSSO SETEMBRO?” – de 2002
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VaniaLCintra

http://www.minhatrincheira.com.br

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