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Artigos-->EU E O CLIP - MARCOS DA LITERATURA DO PIAUÍ -- 09/03/2006 - 20:45 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
EU E O CLIP, MARCOS DA LITERATURA DO PIAUI



Francisco Miguel de Moura*



Desde os meus 13 a 14 anos sou poeta, tenho dito em minhas entrevistas. Porém não conservei poemas daquela época. Todos representavam só experimentos iniciais, imitação, imaturidade. A partir de 1953/1954, quando comecei a publicar nos jornais estudantis de Picos, Piauí, onde nasci e vivi oito anos, onde fiz o curso ginasial, foi que guardei alguns, poucos. Que me lembre, tenho três ou quatro desses poemas publicados na imprensa e alguns artigos.

Porém, chegando em Teresina, como baiano expulso pela revolução – era outubro de 1964 – foi que praticamente comecei minha vida intelectual, embora já trouxesse da Bahia, na bagagem, boa parte dos poemas que integrariam meu livro de estréia.

Considero, portanto, que o ano de 1964 foi um divisor de águas, na minha vida. Já casado e com filhos, eu estava morando em Itambé, no Estado da Bahia, para fora transferido como funcionário do Banco do Brasil, e lá exercia o cargo de Chefe da Carteira Agrícola e Industrial do referido banco. Mais ou menos pelo final de outubro assumia meu emprego no Piauí. Escolhi Teresina por ser a Capital e também porque sonhava fazer uma faculdade. Esse desejo tinha sido postergado por três anos.

Na nova agência do Banco, conheci o teatrólogo Tarciso Prado. Antes mesmo de assumir minha função, ainda de férias e licença por transferência, li, por empréstimo de alguém, o livro “Ulisses entre o Amor e a Morte”, primeira edição, de O. G. Rego de Carvalho, sem conhecer o autor, mas de antemão sabendo ser piauiense, morar em Teresina e trabalhar também no Banco do Brasil. Gostei do livro. Até aquela data, de literatura e literatos piauienses só conhecia o poeta Da Costa e Silva e o escritor Fontes Ibiapina, este por sermos conterrâneos e ainda parentes. O Tarciso Prado me apresentou ao Hardi Filho, poeta recentemente laureado com prêmio da Academia Piauiense de Letras. Tarciso fez mais: levou-me a uma radialista cujo nome não guardei, me apresentou como poeta e entregou-lhe um poema de minha autoria sobre o Natal, que ele próprio já havia lido e gostado. A moça recitou-o num programa da Rádio Pioneira de Teresina. Foi dessa forma que estreei como poeta, na Capital. Como radialista, fá-lo-ia depois de alguns anos, na Rádio Clube de Teresina. Depois foi a vez de conhecer Herculano Moraes. Não me lembro como foi o encontro, quem mo apresentou, possivelmente o Hardi Filho ou o próprio Tarciso.

Assim, desde os primeiros dias, nós três nos tornamos amigos, cada vez mais unidos em torno da poesia e da literatura. E queríamos um meio de divulgar a nossa, publicar nossos livros, e não víamos como realizar esses sonhos. Uma das alternativas era formar um movimento, uma associação, chamando para nosso convívio mais escritores e artistas, apresentar-nos à sociedade com chance de obter simpatia e respeito.

Era 1965. Trabalhamos nessa direção, com afinco, determinados. No final do ano eu publicava “Areias”, minha estréia, mas datando-o de 1966, como se fosse uma projeção para o futuro que almejava sempre melhor. Herculano Moraes publicaria nesse mesmo ano seu primeiro livro, com muito esforço, cujo título não me vêm à memória. Hardi Filho tivera o patrocínio da Imprensa Oficial, em virtude da obtenção do primeiro lugar em concurso da Prefeitura Municipal, para a edição de “Cinzas e Orvalhos”, 1964.

Mas, e o restante dos que faziam poemas e crônicas, contos e romances? De que maneira divulgar, compartilhar idéias, arte, trabalho, com melhor visão de futuro diga-se, como intelectuais interessados no soerguimento da cultura e das artes piauienses? O ano de 1965 foi de muitos sonhos, muita discussão, muita expectativa, reunindo-nos quer na casa de um, quer na de outro, já contando com a adesão de um bom número de pessoas comungantes das mesmas idéias ou semelhantes, no mesmo ideal de cultivo do espírito e da inteligência.

O ano de preparação foi exatamente 1966.

Finalmente, em 1967, o CLIP (Circulo Literário Piauiense) estava criado, com estatuto, lançamento do jornal “O CIP” e reuniões, agora oficiais, no “Teatro de Arena”, aos domingos de manhã, reunindo o que havia de escritores, poetas e artistas interessados em discutir arte e as possibilidades de fazer que circulassem nossas idéias, pensamentos e ações. O CLIP sustentou-se, como entidade, por todo um ano. Foi muito trabalho: lançamento de livros, publicações de artigos nos jornais, divulgação da entidade recém-nascida, entrevistas e programas nas rádios (ainda não existia a televisão no Piauí) e apresentação de peças teatrais e recitais. A presença mais constante era do Hardi Filho, a minha e a do Herculano Moraes, mas outros nomes podem e devem ser lembrados: Tarciso Prado, que naquela época apresentaria no dito “Teatro de Arena” a peça “Testemunha de Acusação”, Osvaldo Lemos – historiador e jornalista; Castro Aguiar, romancista já bastante lido e apreciado pela juventude; Geraldo Borges, contista e cronista; e mais João Henrique Sousa, contista, e Benoni Alencar, poeta (os dois, mais inclinados para a política), além das mulheres Cacilda da Mata e Rosa Castelo Branco. E assim mais pessoas iam-se juntando a nós, aos poucos, como Honorato Rocha Costa, poeta, e Magalhães da Costa, contista, Juiz de Direito no interior, este último, só por tal motivo deixou de assinar o estatuto de fundação. E por que o consideramos da geração clipiana? Claro, porque naquela época já preparava seu livro de estréia, só acontecida em 1970 com “Casos Contados”, cujos contos tinham sido, quase todos, publicados antes no “Almanaque da Parnaíba” e depois reescritos, com muito cuidado, perícia, inteligência, sentimento e amor ao que fazia. Dessa forma, publicara também alguns outros que depois fariam parte do segundo livro, “No Mesmo Trilho”, do qual fui o prefaciador, com muito gosto.

O ambiente cultural do Piauí à época de criação do CLIP era realmente deplorável. O que existia como instituição? Só a Academia Piauiense de Letras, e isto mesmo funcionando precariamente, dirigida por um jornalista político, Simplício Mendes, que não tinha vocação nenhuma para a arte das letras. E quem eram os intelectuais e escritores que atuavam no Piauí, precisamente em Teresina? Fontes Ibiapina e J. Miguel de Matos. O primeiro buscava novas formas para a arte com seus contos e romances, homem que era de grande conhecimento do folclore e da sociológica da população do campo; com alguns dos seus contos e romances eu já me deliciara no meu tempo de Picos, nossa origem comum. E o último citado? Jornalista e poeta bissexto, um crítico de bom faro para a poesia, divulgava-a através dos seus livros com a crônica dos poetas e personalidades piauienses. Ambos, Fontes Ibiapina e Miguel de Matos, estavam vivos, presentes e trabalhando.

Com relação a H. Dobal, M. Paulo Nunes e O.G. Rego de Carvalho, criadores do movimento meridianista (“Revista Meridiano”), não estavam na terra. O último voltara com pouco tempo, mas doente, a produção parada em “Rio Subterrâneo”. Conquanto sua obra seja muito boa, pessoalmente não podia fazer nada em torno do nosso ou de outros movimentos. E, assim, nós trabalhávamos praticamente num vazio. Não tínhamos contra o quê e contra quem ser “contra”. Fomos mais um movimento agregador e restaurador do que de “vanguarda”. Não significa que não tivéssemos nossas idéias de liberdade e independência do que havia sido feito anteriormente no Piauí, no campo literário e político-social. Tínhamos, sim, porque os tempos eram outros. Realmente, 1964, com a ditadura militar, foi um divisor de águas não somente político quanto intelectual, artístico e ético. Tomava corpo no Brasil a poesia concreta, independente do pessoal de 1945, com quem a geração meridiano estaria mais identificada. Nós restauraríamos o passado, mas contruíamos o presente. Boa poesia fizemos e alguns, como eu, também fizeram prosa. Demos bom exemplo para as gerações futuras, inclusive a que se nos seguiu, chamada de “marginal” ou geração do mimeógrafo. Meu livro “Areais”, o melhor que pude fazer até aquela época, foi ainda apressado e sem a consistência do amadurecimento que só as obras seguintes foram mostrando. Mesmo assim, ocasionou artigos, ensaios e alguma imitação dos neófitos. “Pedra em Sobressalto”(1974), este sim, foi um grande passo na atualização de nossas formas poéticas (falo do Piauí, mas foi bem aceito pelos escritores e críticos de outros estados também. Tenho notícia, inclusive, de que alguém encontrou exemplares em “sebos” do Rio, o que já é uma glória para qualquer escritor. Na prosa crítica fiz o melhor da época, fui distribuído do Piauí ao Rio Grande do Sul, falo do livro de ensaios “Linguagem e Comunicação em O.G. Rego de Carvalho”, Editora Artenova, Rio, 1972. Outro obra de prosa que não pode ser esquecida, já que venho falando quase que só da poesia, foi a “Visão Histórica da Literatura Piauiense”, trabalho de pesquisa e crítica de grande fôlego feito por Herculano Moraes. Era ele, até bem pouco tempo, o único livro do Piauí sobre o assunto, visto que o “Literatura Piauiense - Escorço Histórico”, de João Pinheiro, saído na década de 30, não tinha sido reeditado.

Embora não tenha o propósito de falar das gerações anteriores e posteriores à nossa – que foi o CLIP – pois fugiríamos do fulcro da questão, somos obrigados a referir aos nossos e seus limites. Claro que esses limites são sempre muito precários, se não se levar em conta também a forma, as inovações, a criatividade de cada época. Somente os livros dão testemunho do que se faz em literatura, talvez mais do que outras publicações. Nesse limite entre o CLIP e a geração seguinte está um livro editado por Cinéas Santos, denominado “Ciranda” por sua então Editora Nossa, em 1976. Creio que é um marco divisor claro entre as duas gerações mais recentes da Literatura Piauiense: a clipiana e a marginal. Pelos poetas que entraram nessa antologia poética, ver-se-á a enorme quantidade de novos e, como poetas convidados do CLPI apenas eu e o Hardi Filho. Sem medo de cometer injustiças, pode-se dizer que até o meado dos anos 70, do século XX, os recentes livros da literatura piauiense e os melhores daquele tempo haviam sido publicados pelos cliplianos. Somente daí em diante é que se pode considerar ter tido início o que veio a ser posteriormente chamado de geração marginal.

Eu sempre fui muito ativo, tanto nas letras quanto nos movimentos em que me metia, desde o tempo de estudante. Então, me parece que, no CLIP, eu era aquele que “fazia a fogueira”, os outros me acompanhavam tudo com sua experiência e mais tempo disponível – Herculano, jornalista, Hardi, funcionário publico. Coitado de mim, empregado do Branco do Brasil! Tinha por demais o que fazer no emprego, mas entrei de cara para o movimento. Hardi Filho digamos que era “o apagador de incêndio”, (embora não fosse tão quieto quanto parece – veja-se a propósito sua produção no “Jornal de Bolso”, do qual eu também participei). Nas discussões, nas contendas, entretanto, seu temperamento mais sereno e calado dava vez ao bom senso. Herculano Moraes, que era o mais jovem, estudante ainda, fazia das suas mas nunca foi muito revolucionário no sentido político do termo, embora tenha o seu valor como crítico, cronista e poeta em alguns livros “Seca, Enchente e Solidão” e “Pregão” (1977 e 1978), depois de beber a paisagem e a experiência dos gaúchos durante algum tempo que por lá viveu.

Para encerrar, agora olho para trás e posso dizer que me orgulho de pertencer a uma geração que, sem descuidar da beleza, da forma e da realidade do concreto, levou muito em conta os parâmetros da ética e da moral da sociedade. É que participou energicamente do seu mundo – intelectual e político – sem outras pretensões senão de contribuir para o bem social, no caso a produção literária contemporânea e o realinhamento das tradições, com os olhos no futuro, mas não num futuro egoísta. Sempre acreditamos que a literatura é um facho, um fogo sagrado, e que esse fogo deveria ser passado às gerações seguintes, sem empáfia, sem medo, sem vaidades que não as próprias do artista, portanto inteiramente compreensíveis. Porém, antes de encerrar, peço licença para reafirmar o que tenho dito e escrito em diversas ocasiões: O nosso CLIP foi o endez de outras associações como a UBE-PI e também, por muitas formas, responsável pela criação da Secretaria de Cultura, da Fundação Cultural, do Piauí, dos diversos planos editoriais como “Petrônio Portela” e pela instituição dos concursos literários àquele tempo praticamente inexistentes.





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*Francisco Miguel de Moura, escritor brasileiro, mora no Piauí. Seu e-mail: franciscomigueldemoura@superig.com.br

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