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Cronicas-->O PAPA E O PAPÓDROMO -- 14/01/2002 - 09:02 (CARLOS MÉRO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Deu-se que naquele tempo eu vivia nas convizinhanças do núcleo do poder terreno, aquele que se assentava e decidia nas entranhas no Palácio dos Martírios. E foi por isso mesmo que me sobrou o privilégio, ou talvez a provação, de ser quem carregaria nas costas, como delegado da província, os preparativos da visita do Papa.

Não é preciso dizer que tal empreitada me arrancou uma pá de noites de sono, para não falar do enjoado que é juntar um monte de gente que às vezes não sabe bem a que veio, ou talvez não liga nem um pouco para a serventia daquilo para que é chamada. Tanto mais, como era o caso, quando se tratava de lida por amor à arte, ou à fé, pois que não havia prenúncio, e muito menos promessa, de qualquer torna de encher os olhos.

A maior dor de cabeça, porém, disse mesmo foi com a locação do Papódromo. De feito, já fora firmado que se daria na beira da lagoa, no ponto em que, cumprida linha reta, botada a prumo do mar, logo adiante se enfrentaria a curva mais a leste da muralha do Trapichão. Quanto ao rumo, porém, da boca de cena, nisso divergiam gregos e troianos, pios e agnósticos, poderosos e populares, políticos e técnicos, uns entendendo que deveria olhar para o minguado espaço que dava para o estádio, outros que deveria se abrir para a longuidão da nova pista que se estendia pela ribeira do lago.

Eu, por mim, não podia enxergar razão a escorar os primeiros, vez que vindo o Papa compartilhar com os crentes, não me parecia razoável que logo não lhes ficasse de frente, justo olhando para o sítio que, por imensamente mais amplo, abrigaria milhares de almas, ao invés de uma só cuia de escolhidos. Mas nem por isso, pois que tinha juízo, estrebuchei quando vi vencer a primeira preferência, eis que a hierarquicamente prevalente, até porque, pelo que me forcei a entender, seria talvez a verdadeiramente mais acertada, pois que calçada em motivos que o meu ralo juízo não conseguia alcançar.

E como assim foi querido, por quantos capazes de assim querer, foi finalmente que assim foi feito.

Acontece que, chegada a antevéspera da pontifical visita, cá esteve a missão ordenada pela cúria vaticana, sob o comando de um circunspecto, imponente e zeloso cardeal de áfricas raízes, a que cumpriria dizer do estarem ou não em ordem todas as providências tomadas, de forma a que fosse ou não confirmado o iminente e apoteótico evento.

Foi então que, tudo visto e revisto, com o detalhismo que a nobre causa reclamava, eis que sentenciou o saber cardinalício a inconveniência do altar papal, precisamente porque de frente escancarada para os muros do Trapichão e não para as extensões a perder de vista da longa avenida ribeirinha.

- A ser assim - concluiu ele com todos os assentos do seu italiano adotado, - Sua Santidade não mais virá a Maceió.

Dá para imaginar a água que se pós na fervura. E eu, degredado filho de Eva, que nem diácono ou irmão leigo nunca fui, quase meto a viola no saco e me mando para lugar incerto e não sabido, seguro do inferno que despencaria sobre o meu cachaço.

No fim tudo deu certo, pois que depois de todo ranger de dentes, o que era de esperar, findou-se por fazer levantar um púlpito de madeira, geminado ao Papódromo, porém virado para o lugar em que o povo estaria, onde, finalmente, dando o ombro direito para os distintos da ocasião, lá se mostrou o Papa João Paulo, de lá derramando as suas bênçãos e a sua venerável pregação.

Eu, porém, até hoje não me refiz do vexame que me triturou o juízo. E ainda me aperreia, de vez em quando, o só imaginar o quanto de pragas me cobriria o caminho, caso me tivesse o rebanho por culpado, o que por certo me sobraria, se a divina visita tivesse enfim malogrado.
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