PERDÃO, NOVAMENTE, MISSIONÁRIA DOROTHY
(Por Domingos Oliveira Medeiros)
Hoje, 12 de fevereiro de 2006, completa um ano da morte da missionária norte-americana, a freira Dorothy Stang, assassinada por uma quadrilha de grileiros em Anapu, no Estado do Pará. Até agora, os supostos mandantes do crime ainda não foram julgados. Coincidentemente, o governo iniciou uma serie de ações na região Amazônica, visando combater a violência que tem sido a marca daquela região, envolvendo desde a disputa por terras, até a presença de narcotraficantes.
A iniciativa do governo mereceria aplausos mais contundentes, não fosse a intempestividade de que se reveste, sugerindo a natural desconfiança de que a medida tem forte apelo eleitoral, além de pretender demonstrar à comunidade internacional, que o Brasil não está de braços cruzados diante dos conflitos que ocorrem naquela região.
Todavia, conforme noticiam os jornais, a Polícia Federal , dentro do pacote de providências acima citadas, iniciou a destruição de 34 pistas de pousos clandestinas, localizadas na bacia do rio Xingu, obviamente para inibir a ação do contrabando de drogas.
Ocorre que apenas na primeira pista destruída, localizada na Fazenda Limão, a 140 quilômetros de São Felix do Xingu, ainda segundo os jornais, foram utilizados 500 quilos de dinamite, quantidade que acarretará, no entendimento do Coordenador de Operações Especiais de Fronteira, a recuperação daquele espaço, localizado, exatamente, na estação ecológica ali criada. Infelizmente, o governo apostou mais no barulho da medida, do que na sua eficácia.
Não foi por outra razão que, há um ano atrás, publiquei o artigo em seguida, para manifestar minha indignação acerca da lentidão e do descaso com que nossas autoridades tratam a questão da violência e da agressão desferidas contra pessoas, contra o meio ambiente., contra a natureza, contra a vida, portanto. Perdão, novamente, Missionária Dorothy.
“PERDÃO, DOROTHY
(Por Domingos Oliveira Medeiros)
Quem teve a oportunidade de ler “A Crônica de Uma Morte Anunciada”, do escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez, znão pode deixar de traçar um paralelo entre a ficção e a realidade - trágica e rotineira -, da violência, sem preconceito, que grassa neste país.
Mais uma vez, mancharam o verde de nossa bandeira com o vermelho da ousadia: assassinaram, de forma brutal e covarde, com seis tiros à queima-roupa, a missionária Dotothy Stang; e, no mesmo embalo, o colono Adalberto Xavier Leal.
Não é a primeira vez, infelizmente, que o roteiro de crimes com requintes de barbárie acontece: alguém lutando por justiça; em favor da dignidade do ser humano; em busca da preservação de nossas florestas; de nossa fauna; dos que trabalham; dos menos favorecidos; dos indefesos e abandonados à própria sorte; dos que vivem no meio da mata, derramando o suor de suas esperanças por dias melhores; e, vez por outra, as lágrimas da indignação, que molham a terra de onde brotam o sustento para si e sua família.
O roteiro é o de sempre: Tentativas de ameaça. Pedidos de proteção e ajuda. Ameaças anônimas. Ameaças explícitas. Denúncias. Promessas e mais promessas. Sem soluções. E tudo volta à normalidade. Até que surge a notícia, na telinha da TV, nas rádios e nos jornais. E o fato toma corpo, com repercussão internacional. A morte ganha destaque. Passa, num segundo, a ser o tema do dia.
Começam, imediatamente, os depoimentos. Ministros e autoridades em geral, todos clamam por justiça. Prometem esforços para elucidar o crime, com todo o rigor da lei. Surgem os discursos inflamados. Providenciam reforço policial e comissão é enviada para o local do crime. Ministério Público entra em cena. Volta-se a falar na necessidade de aumentar o efetivo da polícia, e outras providências afins. Tudo isso regado a pedidos de “um minuto de silêncio” em homenagem ás vítimas.
Convenhamos, senhores! É muito descaso para com o ser humano. Verdadeira indiferença para com o direito à vida, conforme preceituado em nossa Constituição, elaborada pelos senhores parlamentares, e que nossos presidentes se obrigam a cumpri-la. É uma vergonha para todos nós: não temos capacidade de criar condições mínimas para conter à ganância e a especulação fundiária e financeira que sobrevivem graças ao desordenamento jurídico alimentado, em alguns casos, pela conivência e omissão de algumas autoridades; que só pensam em reeleição, cargos, vantagens, benefícios e perpetuação no poder. Como se o nosso país fosse uma grande banca de negócios; e eles, seus eternos donos, e únicos beneficiários. E o povo servindo, apenas, como álibi: emprestando-lhes legitimidade através do voto. Para depois olhar a banda passar, desafinada ou silenciosa.
Um minuto é muito pouco. Precisamos de muitas horas; e até meses de silêncio e de reflexão. Reflexão sobre os crimes que são cometidos, muitos dos quais em silêncio, nos bastidores do poder. Crimes como a CPI do Banestado, que perdeu para a impunidade e para o descaso, indiferente à moral e à ética. Crimes praticados sob a égide da especulação e da mentira, mas que enriquecem poucos, às custas da miséria da grande maioria. Ilícitos praticados pelos que militam, impunemente, no contrabando de drogas, de armas, jogos-de-azar, prostituição infantil, desvio de recursos orçamentários, enfim.
Enquanto crianças, adultos e idosos tombam (mortos, mutilados ou feridos) nas ruas, parques e calçadas das cidades, vitimadas pelo desemprego, pela falta de segurança, de assistência, de proteção, de escolas, hospitais, etc.
Um minuto de silêncio é muito pouco. Que tal aproveitarmos os quarenta dias dedicados à Quaresma para refletirmos sobre tudo isso? Seria um bom começo. Até porque, está em curso a campanha “Solidariedade e Paz!. Paz, que a rigor não depende de leis especiais; ou de recursos financeiros; mas, sobretudo, de atitude que deve começar, necessariamente, dentro de cada um de nós. Só dessa maneira poderemos valorizar cada minuto de nossas vidas.
15 de fevereiro de 2005”.
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