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Contos-->O Menino Que Não Sabia -- 14/03/2002 - 02:42 (Alessandro Ramos) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ele não sabia de onde vinham aquelas gotas salgadas. Só sentia que algo caía em sua boca, e logo a abria. Era assim que as coisas funcionavam: cutucavam seus lábios com algo duro e frio, e ele a abria para que colocassem aquelas coisas de entrar. Sabia que tinha que pô-las para dentro, mesmo sem saber ao certo o motivo. As fadas sempre o tratavam bem, pelo que ele podia notar, apesar de não saber o que era o bem e o mal.

Ele sabia que as cores que via eram distintas, mas não sabia distinguí-las. Isso porque não sabia que algumas pessoas ouviam, e não aprendeu a nomear as coisas. Mas aprender palavras de nada lhe importaria, pois não sabia falar, e mesmo que falasse, não via as coisas para poder diferenciá-las.

Tudo era cores na vida daquele garoto que não sabia o nome. Mudavam sempre, e pensava delas o que outras crianças pensariam das fadas. Não sabia o que era um sorriso, mas sentia algo gostoso quando seu corpo se aquecia entre laços macios. Também sentia algo ruim que não sabia como chamar, quando tudo o que via ficava escuro, e sentia as gotas salgadas na boca. Alguma coisa lhe machucava sempre. Às vezes era por fora, às vezes por dentro. Tinha vezes que sentia muita dor, passava a mão sobre o local ferido, e ao levá-la aos lábios podia saber que tinha um líquido grosso e ruim saindo dele. De qualquer forma, isso não importava muito, pois não sabia chamar alguém em auxilio, caso pudesse chamar.

Mas esse garoto sabia de algumas coisas. As fadas que lhe faziam bem iriam levá-lo a um lugar bom em breve. Ele mergulharia nas cores que existiam, e iria viver em um lugar em que pudesse fazer muitas coisas legais que ainda não sabia como chamar, pois nunca brincou.

Como ele poderia saber que nascera cego, surdo e mudo, além de ter uma terrível doença terminal? Quem poderia contar-lhe, já que não podia ouvir? Como poderia se penalizar ao ver as pessoas apontando-o, já que não enxergava? E pra que chorar, se o mundo em que viva era tão agradável? As pessoas que o olhavam, choravam desesperadas ao vê-lo com aquele sorriso ingênuo. Apiedavam-se por ele não poder falar com outros meninos, olhar as coisas ao redor, ouvir o que as pessoas lhe diziam, e ter uma vida tão curta. Elas não imaginavam que ele não tinha a mínima noção da existência dessas coisas, e que tudo era como sempre foi. Como ele poderia se agoniar por algo que não conhecia? Apesar das coisas ruins que às vezes sentia, sua vida era ótima sem saber de nada.

Como não sabia de várias coisas, também não sabia distinguir o tempo, e para ele era tudo a mesma coisa. A não ser quando as coisas ruins que sentia por dentro estavam aumentando muito, e as fadas tinham ido embora, deixando apenas aquela falta de cores. Mas não se preocupou, pois sabia que elas estavam preparando seu lugar no mundo das cores, para onde ele logo iria.

Suportou bem as coisas ruins, até que ficou daquele jeito em que não se mexia, mas dessa vez, não voltou a se mexer depois de um tempo que não sabia qual era. Não precisava mais se mexer, pois as cores tinham voltado, mais densas que nunca. Pareciam massas de todas as cores, por todos os lugares. Agora podia ver como eram as fadas, apesar de que não sabia descrevê-las. Ouvia ruídos agudos e gostosos que saiam delas, e juntos corriam por aquele infinito mundo lindo.

As pessoas choravam tristes pela morte do menino que não sabia que morreu. Amaldiçoaram o céu por não deixar o menino saber o que era a vida, mesmo sem saber se ele queria isso. Não entendiam como um cadáver podia conservar sorriso tão sincero, pois não sabiam que velavam o menino mais feliz de todo o mundo.



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