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Artigos-->DAS INTENÇÕES E DO IMAGINÁRIO -- 28/09/2005 - 22:47 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
DAS INTENÇÕES E DO IMAGINÁRIO



Francisco Miguel de Moura

(Escritor, da APL)



A respeito da decisão da juiza Sandra de Mello sobre os matadores do índio Galdino dos Santos, em Brasília, diz a revista Veja, desta semana (20.8.97): «Numa decisão corajosa, uma juíza decide não levar os matadores do índio pataxó a júri popular.»

Para mim, a decisão não tem nada de corajosa. Ao contrário, a juíza capitulou ao que lhe é ditado por sua classe, que é a mesma dos acusados. Idealmente, o juiz deve portar-se como se não pertencesse a nenhuma classe, fosse superior a todas elas. Sua classe é a da lei, a da justiça. Daí, poder agir com justiça. Mas o que a juíza fez foi retirar o poder de julgamento da sociedade, o corpo dos jurados, e entregar a um juiz singular, rebaixando o homicídio - que realmente houve - para lesão corporal.

E o que invoca?

Diz que «não houve intenção de morte».

Como se pode saber da intenção? Morreu o índio Galdino de morte matada, houve um homicídio, um crime hediondo, praticado por eles: Eron de Oliveira, Tomaz Oliveira, Antônio Novély Vilanova, Max Alves e o menor G. N. A. (l7 anos). Então, justiça neles. O direito é uma ciência objetiva. As intenções não contam porque não podem ser provadas mas apenas atribuídas, imaginadas, insinuadas. Isto não é direito. O direito é. A justiça é. Julgamento neles, o corpo de jurados representa a sociedade, não apenas um classe. Nenhum julgamento, especialmente de crimes hediondos, deve ser feito por apenas uma pessoa, ou por um tribunal representante de uma classe ou categoria. Daí porque as justiças militares para julgar o militar não podem ser justas, uma justiça médica para julgar o crime de um médico não pode ser imparcial.

Este comentário me faz lembrar artigo que li em algum jornal cujo nome não gravei, de autoria de Olavo de Carvalho, estudioso da cultura brasileira pois já publicou o livro de título «O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras». Na matéria, ele cita quatro peculiaridades do povo brasileiro. A que nos interessa no momento é aquela que cita como «o ódio ao criminoso sem correspondente desamor ao crime». Peculiaridade essa que, em muitos casos, pode apresentar-se pelo outro lado da moeda, digo eu, ou seja: «amor ao criminoso, sem o correspondente ódio ao crime.» É o caso desse horrendo crime de Brasília.

No caso da guerra das gangues, que julgou anteriormente, porque os criminosos não se enquadravam dentro de sua classe social, a mesma juíza Sandra de Mello, casada com o Ministro Marco Aurélio de Mello (do Supremo, primo do Collor) mandou os onze adolescentes para o tribunal do júri popular e eles foram condenados à cadeia. O que distingue os dois casos é apenas a separação de classe, nada mais.

Eles, os de Brasília, os matadores de Galdino dos Santos, são os «meninos de rua da classe alta». Imaginei até um diálogo para situá-los na sociedade familiar, que é onde se recebem a educação e a moral de toda a vida, onde se aprendem as virtudes, ou não se aprende nada. Tomei por base naturalmente informações apanhadas na imprensa e ajuntei-lhes a alguma coisa inventada, construindo um interrogatório imaginário.

Na Delegacia de Polícia, logo depois do crime:

- Por que vocês queimaram o índio Galdino?

- A gente pensava que era um mendigo.

- Mas mendigo é gente também.

- É? - murmuraram, baixando a cabeça.

- O que vocês faziam quando eram mais crianças do que hoje?

- Queimava gatos.

- Que é que seus pais diziam disso?

- Achavam graça.

- E dos mendigos, que dizem eles?

- São gente que não vale nada. Carlos Lacerda, no Governo da Guanabara, estava certo quando consentiu que afogassem alguns, no rio.

- Meu pai é do tempo de Carlos Lacerda - acrescentou um. - Só fala nele.

- O meu também - outro fez coro.

- E dos índios, que acham eles?

- Uns preguiçosos, dão muito trabalho ao Governo.

- E agora, depois do crime, que vão eles dizer?

- Agora... Ah! moro com meu tio.

O delegado aponta para o segundo, como se perguntasse: »E você?»

- Moro com minha avó, disse.

Um terceiro completa: «Moro com minha mãe, que é desquitada mas tem um homem, embora receba pensão de meu pai.» O quarto: «Eu moro sozinho. Meu pai me dá apartamento, carro, pensão e dinheiro.»

Um articulista da mesma revista Veja, em edição anterior, disse que o que aconteceu foi o seguinte: «O índio tinha cama de menos e os rapazes tinham carro de mais.»

E visto que foi levantada a suspeita de que os meninos não tinham «intenção» de matar o índio, queriam apenas queimá-lo vivo e dormindo, minha pergunta é simples:

- Será que Galdino dos Santos, o índio pataxó, tinha «intenção» de morrer?

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