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Artigos-->A Teoria da Irrelevância -- 16/10/2001 - 09:33 (Magno Antonio Correia de Mello) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O pressuposto básico do capitalismo é o dogma da desigualdade entre os homens. Da premissa menor – os homens nascem diferentes – resulta a conclusão de que se justifica, ética e moralmente, que tenham acessos distintos a direitos, a condições de vida, à satisfação de suas necessidades.



Por sinal, a visão que o sistema tem das necessidades humanas se associa a essa perspectiva e consolida a ideologia capitalista. Dizem sempre, os economistas conservadores, que as necessidades humanas não têm fim, ao contrário dos recursos de que dispomos para satisfazê-las, o que torna muito natural que os detentores de 95% da renda se comprimam em percentagens muito mais irrisórias do que essa, relativamente à população com acesso aos fatores econômicos.



Essas considerações, como quase tudo o que se tem dito ou pensado nos últimos tempos, vêm a propósito do tal “choque de civilizações” anunciado por um analista. Ainda uma vez partindo do valor absoluto da diferença, esse sujeito decretou que derrubar edifícios é apenas a face aparente e radical de um conflito em que valores ultrapassados e primitivos se contrapõem à superioridade inegável e absoluta do capitalismo. Metidos num mundo enlouquecido por fanatismos os mais diversos, não restaria aos inferiorizados senão tentar reduzir a cinzas, no grito e no cuspe, à guisa de melhores argumentos, a vida boa de seus dessemelhantes.



Há, como se vê, e isso se faz sentir em sua própria essência, a necessidade de fugir a conclusões sensatas e a obsessão de continuar patinando sobre mentiras. Em primeiro lugar, inferioridade ou superioridade são conceitos que não se justificam sozinhos e não dispensam referências. Sob um parâmetro mais generalista, as culturas são equivalentes, porque satisfazem o ego dos que as adotam e nelas acreditam. Assim, haverá vantagem em uma cultura que subestima o papel da religião para os que não guardam nenhuma crença, mas esse ganho haverá de se diluir entre os crentes.



De outra parte, indivíduos de aparência barbuda e esquisita, capazes de determinar às mulheres que escondam a própria beleza sob quilômetros de panos podem até acreditar em princípios religiosos diferentes, mas nada faz pressupor que a fome incida sobre seus estômagos de forma menos importante. As necessidades básicas dos seres humanos – comer, vestir, morar, dormir e bandalidades equivalentes – não guardam qualquer correlação com aquilo em que acreditam. Pode-se até preferir o quibe ao acarajé, mas não se pode acreditar que estômagos vazios aceitarão contemplativos o destino que os aguarda mais adiante.



É evidente que a abordagem marxista carece de fundamentação científica mais sólida, quando reduz os conflitos sociais a desavenças de caráter econômico. Mas também não se pode partir para o outro extremo, supondo-se que conflitos étnicos ou culturais se explicam por si mesmos e não possuem qualquer inspiração na péssima distribuição da riqueza e da renda. O fanatismo convence o fanático a morrer por uma causa obscura, mas não cria essa causa, que de resto não existiria em outro contexto sócio-econômico.



O que estou pretendendo afirmar é que à constatação da impossibilidade de evitar que lunáticos morram por motivos que consideram justos deve ser agregado o esforço de evitar que esses motivos existam. Pessoas dispostas a acreditar que Alá, Jeová ou Jesus Cristo exigem sacrifícios existem desde que se teve a péssima idéia de transportar para a frente da caverna a noção de que tudo se explica por meio de entes sobrenaturais – nasceram assim que se fundou o conceito de religião na mente humana. Pensamento como esse é algo tão visceralmente humano que se deve buscar a inexistência de tais boçalidades talvez em Utopia, nunca na realidade palpável desde sempre predominante.



É praticamente impossível impedir que as crenças, apaixonadas ou não, levem, mais cedo ou mais tarde, a desatinos. O que o campo da razão pode evitar é que o ato extremo se justifique. E por “justificar-se” não se entenda que estou aqui dando motivos a procedimentos terroristas ou atos semelhantes. Estou apenas dizendo que atos terroristas como os de 11 de setembro possuem sólidas raízes no desequilíbrio que o mundo ocidental patrocina no Oriente, sobre o qual vale a pena operar, já que não se pôde e nem se poderá evitar o desvario. É possível que por outro pretexto as pessoas se disponham a imolar-se em nome de Alá, Buda ou um ente de cultos africanos, o que não justifica que os olhos se fechem para o que ainda pode e deve ser feito.



Enfim, pode parecer irônico que essa impressão tenha vindo à tona por meio de atitudes desmioladas, ao invés de surgiram lastreadas em reflexões pausadas e profundas, mas isso não importa. O que se revela inadiável é que as pessoas – principalmente os norte-americanos – finalmente se conscientizem. Abandonando-se a simplificação covarde de dar valor absoluto ao dogma da desigualdade social, deve-se admitir a conclusão de que ninguém terá sossego enquanto a idéia de solidariedade não substituir o mote de que os homens necessariamente merecem maior ou menor prestígio, conforme a posição que ocupem ou os valores culturais que sigam.



Se edifícios arrasados não foram suficientes para que se obtivesse o indispensável convencimento, microrganismos deverão obter esse resultado. De fato, ao que tudo indica, bactérias inoculadas por meio de atos terroristas estarão inevitavelmente pouco propensas a poupar uma vítima com base no papel social que desempenha ou na crença religiosa que professa. Se insistirem no caminho até aqui adotado, Bush e seu inusitado súdito inglês terão de providenciar mísseis equipados com microscópios eletrônicos – com a tecnologia de que dispõem no momento, não é muito provável que consigam semelhante equipamento, pelo menos não em tempo apto a evitar a completa ruína do sistema econômico, político e social que tanto defendem.



Enfim, a única conclusão sobre tudo e sobre todos é que nunca pareceu tão importante que o bom senso vença a arrogância.

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