Agora — quando estou longe de tudo,
juntinho a mim mesmo,
existindo apenas em mim mesmo,
agora vou pensar em viver,
agora vou relembrar o que fui,
agora vou verificar o que sou.
Nasci de meus pais e por eles vivi,
e assim fui durante anos e anos.
Depois, por instantes, afastei-me.
Agora volto para eles sem senti-los,
pois agora não sou mais puro.
Haverá depois uma extensão de mim.;
agora, porém, flutuo, apenas.
Quisera sacrificar-me para ser feliz,
mas não sei.
Sei apenas pensar no futuro,
sem lembrar-me de que o futuro é um presente
que adiei.
Agora, juntinho a mim, vivo,
assim como um canto que não é ouvido pelo ente amado,
assim como uma flor que não é vista por ninguém.;
vivo — sol iluminando o nada,
terra sem habitantes.
Já não sei sequer revoltar-me
nem esperar
nem realizar-me
nem querer.;
restou em mim apenas o sofrer:
sofrimento sem lágrimas,
sofrimento sem dor,
sofrimento das coisas abandonadas,
sofrimento das coisas mortas,
sofrimento sem sofrimento.
15.07.60.
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