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Artigos-->RASGO LUMINOSO - ASSIM SE FEZ PORTUGAL -- 19/06/2005 - 19:27 (FRASSINO MACHADO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Por

Frassino Machado



1. Na preclara manhã de 24 de Junho de 1128 duas frentes militares travaram uma das mais emotivas batalhas da história do ocidente peninsular. As hostes organizadas do galego Fernando Peres de Trava aliadas ao exército do Condado Portugalense, às ordens da viúva D.Teresa, enfrentaram um reduzido exército rebelde, mas convicto do futuro que estava em causa, chefiado por experientes fidalgos durienses que apostaram forte na aclamação do jovem príncipe Afonso Henriques para chefia do Condado.

A decisão política seria adoptada pelo desfecho deste prélio memorável entre os interesses diplomáticos de uma obstinada mãe e o rasgo luminoso de um filho sonhador em busca do seu Graal, como era comum na Média Idade. Ora ficou na História que na tarde desse dia de sol ardente, nos extensos campos de São Mamede, em frente ao mítico castelo de Mumadona, em Guimarães, o destino ditasse a vitória deste último. Aqui nasceu o sonho, daqui partiu o caminho que levaria à autonomia de uma Nação, tornada grande na Península, na Europa e no Mundo – Portugal.

A partir deste facto, como atestam os grandes historiadores, o Condado, entretanto declarado independente, passa a ser governado exclusivamente pela gente portuguesa, de que é a primeira figura Afonso Henriques. Começou desta forma a histórica gesta da Nação Lusíada. Este monarca e a Dinastia por ele inaugurada – Afonsina – irão ser os responsáveis pelo crescimento de um dos Estados mais antigos e poderosos do Ocidente Europeu.

As linhas de força determinantes deste crescimento poderemos caracterizá-las da seguinte maneira:

– As lutas pela independência territorial e pelo seu reconhecimento como entidade política. Inserem-se neste contexto a assinatura do Tratado de Zamora ( 1143 ), o casamento do rei com Dona Mafalda, descendente de uma das casas reais mais célebres do Centro da Europa – Sabóia e Piemonte – e o reconhecimento da realeza portuguesa (1179) pela corte Pontifícia de Alexandre III, através da Bula Manifestis Probatum;

– As conquistas realizadas de Norte para Sul que alargaram o território nacional desde a bacia do Mondego até ao Algarve, destacando-se entre estas: as de Lisboa e Santarém (1147), a de Alcácer (1158), a de Évora (1165), a de Silves (1189) e, finalmente, Sta. Maria de Faro (1249). Esta última no primeiro ano de reinado do rei Bolonhês;

– As diplomacias internacionais, entre as quais destacamos: o aproveitamento oportuno da passagem na Península de esquadras de tropas cristãs que navegavam para o Médio Oriente. Daí os diversos tratados feitos com os reis de França, da Inglaterra, da Dinamarca e outros para que autorizassem a intervenção dos Cruzados nestas lutas regionais; o chamamento ou fundação das Ordens Militares e Religiosas, com autorização do Pontífice romano, tendo em vista a segurança e colonização das terras conquistadas. Foram estas, em geral, que construíram os castelos e fortalezas existentes em solo nacional, nomeadamente junto às fronteiras;

– As grandes Reformas estruturais da Nação levadas a cabo pelos principais monarcas, tendo em vista o desenvolvimento da economia do Reino. Neste contexto realçam-se as do tempo de D. Dinis, D. Afonso IV e D. Fernando. Estas Reformas tiveram como objectivos: o desenvolvimento da Terra (reformas agrárias diversas e forais), do Comércio (feiras, mercados e comércio externo), da Cultura e Ensino (língua portuguesa, literatura e Universidade) e Política Marítima (construção naval, náutica, seguros e contratações).

Deste crescimento efectivo nasceu um País respeitado, temido e desejado, no contexto europeu, de que se orgulham os honrosos consórcios com as mais célebres Casas Reais, a constituição de Alianças duradoiras e algumas personagens de renome inquestionável. Lembramos apenas : Sto. António de Lisboa, Pedro Hispano (papa João XXI), Isabel de Aragão e os lendários Pedro e Inês.

2. Interrompida, pelos desígnios da História, a gesta dos Afonsinos vai dar lugar a uma das maiores odisseias nacionais da História da Humanidade. Atestam historiadores de diferentes escolas e nacionalidades, sem nenhum preconceito, que as façanhas lusíadas coevas da famosa geração de Avis cimentaram um dos maiores impérios marítimos de que há memória. De facto assim aconteceu. Coube à Dinastia de Avis dar continuidade ao processo histórico português que, alicerçado numa economia próspera e numa governação digna dos maiores encómios, contribuiu para a consagração de uma das mais modernas e poderosas monarquias do mundo.

Os monarcas portugueses da Segunda Dinastia – poderemos dizê-lo sem ambiguidades – contribuíram, cada um à sua maneira, para que dum rasgo luminoso de inteligência e de predestinada alma colectiva brotassem as sementes e os frutos que vieram a corporizar aqueles traços genuínos a que Camões brilhantemente anunciou na sua Epopeia de “dar novos mundos ao Mundo”. Foi assim mesmo. Portugal constituiu-se como o primeiro, e quiçá o maior, Império moderno da História. Sem as lutas pelo poder, dentro dos parâmetros e estratégias as mais modernas e actuais, travadas com empenho destemido, jamais a Casa de Avis teria demonstrado às famosas dinastias do tempo – e estamos falando do Século XV e XVI – que mesmo um pequeno país, que o mesmo é dizer um pequeno povo, pode crescer à dimensão dos grandes Povos da História. Sem a diplomacia ousada e os projectos de sucesso, do rei Príncipe Perfeito, discutidos pela primeira vez à escala planetária, jamais haveria lugar para a tomada de consciência da supremacia europeia no mundo. Sinais dessa histórica saga estão personificados pelas obras e feitos do Infante das Sete Partidas, de Henrique, o Navegador, de Gil Eanes, de Bartolomeu Dias, de Vasco da Gama, de Álvares Cabral, de Afonso de Albuquerque e de Magalhães e, noutra dimensão, de Gil Vicente e Sá de Miranda, de Camões e João de Barros, de Duarte Pacheco e Pedro Nunes, de João de Castro e Damião de Góis...

Mas, pese todavia esta fabulosa caminhada histórica, não deveremos esquecer que não há bela sem senão. Daí que, paralelamente aos sucessos e avanços na senda da fama e da glória, teremos de considerar que os custos de todas estas façanhas saíram elevados. Pelo que relembramos as famigeradas derrotas, nos secos e traiçoeiros desertos africanos – com o triste epílogo de Alcácer Quibir – nas armadilhas dos mares sem fim, nas tempestades e nos naufrágios das viagens trágico-marítimas que, pela sua infeliz ocorrência, levaram o luto praticamente a todos os lusitanos lares. Desta outra face da mesma moeda, somada que foi a subjugação episódica ao poder espanhol e a perda de independência nacional, nasceu aquele sentimento tão português a que o poeta de Amarante apelidou mais tarde de “saudade”. Por outro lado teremos de considerar – na linha da perda de influência no mundo – as feridas abertas pela doentia subjugação ao Santo Ofício e à Inquisição que em si mesmas constituíram a fonte mais negra do retrocesso da alma empreendedora da Nação. Que o digam nomes sonantes da nossa Cultura como Diogo do Couto, Manuel de Melo, Bernardo de Brito e António Vieira. E nem as vitórias demolidoras da Restauração – que elevaram e consagraram no poder a Casa de Bragança – nem as moderníssimas reformas à sombra do ouro e dos diamantes do Brasil, nem as regeneradoras e inteligentes, quão rigorosas, medidas Pombalinas conseguiram inverter seguramente a tendência regressiva do Império Luso. É que para lá da vontade e da aplicação das políticas oportunas aquela antiga alma lusitana carecia agora da energia e do rasgo luminoso que deixasse ver com limpidez o sulco por onde seguiam as sendas dos maiorais.

3. A aurora das Luzes estava próxima de acontecer em Portugal quando as Memórias da Academia começaram a agitar a consciência e a mente nacionais. Por outro lado o fermento e o legado culturais vindos do sopro do Estrangeirismo foram paulatinamente lavrando algumas leivas propícias à boa terra do futuro. Todavia, as contingências internacionais e os vectores estruturados sobre as contradições socio-políticas e económicas – para não falar do obscurantismo assaz reinante na sociedade por culpa, no dizer sábio de Herculano, de um clero cada vez mais retrógrado – jamais permitirão que a claridade da razão no sentido dos desígnios colectivos seja pura. Assim perderam-se simultaneamente os projectos de Luiz Verney, de Correia da Serra e os lamentos coruscantes de Barbosa du Bocage e Ribeiro Sanches. Muitas foram as causas para este falhanço das quais destacamos obviamente a loucura da Rainha “Pia”, os ventos jacobinos vindos do coração da Europa, as invasões gaulesas ao território continental e a mudança do poder de decisão que transitou para o Brasil. Ora todos estes factores, aliados ao accionamento da Velha Aliança que entregou de bandeja a bússola orientadora nas mãos dos governantes londrinos, contribuíram para a descaracterização da alma lusitana, esbatendo qualquer hipótese de novo rasgo salvador.

Será no anterior contexto que traçámos que ocorrerá a grande fractura no Império que, em si mesma constituirá a pedra de toque da grande mudança. Mudança esta para muitos o fim do mesmo Império e para alguns a possibilidade de acontecer a génese de uma alma nova redentora. Estamos falando da independência da Jóia da Coroa – a colónia brasileira – da qual nos vinha, no dizer de Vieira, o sustento do corpo e os vícios do espírito. A fatalidade desta separação teve como é óbvio duas resultantes: a alvorada de um país novo que, desde o grito revolucionário das margens do Epiranga, se veio a tornar pouco a pouco numa das primeiras bandeiras do ideal liberal e da contemporânea emancipação dos povos e, por outro lado, lançou no território nacional durante um quarto de século o incêndio demolidor entre os defensores da Tradição caduca absolutista e os Sonhadores obstinados da nova ordem liberal. O apaziguamento das paixões viria a decidir-se com a vitória da segunda linha por alturas dos meados do século XIX sem que , no entanto, nos bastidores desta contenda crucial, viesse a emergir paralelamente, aqui sim num rasgo profético oportuno, a mão jurisprudente e sagaz de Mouzinho da Silveira. Foi este legislador que, do sossego do seu refúgio insular atlântico, traçou o rumo certo do Portugal contemporâneo. Insere-se nos conteúdos do seu espirito das leis toda a revolução Fontista que, no terceiro quartel do século, lançou as bases da nova face internacional do país e ergueu os germens de uma postura imperial alternativa, com a África austral por horizonte.

Apesar disso, as linhas de força económicas, dominantes e amadurecidas na Europa mas frágeis internamente, ditaram infalivelmente as suas leis e o Estado português, aos poucos tornado subserviente e devedor, jamais conseguiu construir uma imagem digna de respeito e admiração. Contra isso bradaram as vozes de Herculano, de Oliveira Martins e, em suma, da Geração de Setenta que, remando contra a maré não mais fizeram que cavar a sua própria derrota. Porque “vencidos da vida” e perante a incapacidade da governação e da permanência na sociedade das forças bloqueantes tradicionais de então – impedindo a emergência das forças vivas da Nação – deixaram, por sarcasmo e ironia do destino, de lutar por um futuro melhor.

Mas, entretanto, outros ventos sopraram do centro da Europa. Cá chegaram novas sementes de mudança e diferentes propostas de Regime que, por aqui e por ali, criaram fervorosos adeptos. A proposta política de República sobressairá entre todas. Aproveitadas a circunstância do falhanço colonial africano e as denúncias, mais uma vez, da subserviência perante os interesses de Londres, num rasgo matutino de cinco de Outubro de 1910, assistiu-se à tomada de poder mais rápida de que há memória, de nada valendo aos resistentes monárquicos o nobre apelo ao sangue derramado, dois anos antes, pela família real que, na figura mui juvenil e franzina do último rei que Portugal teve, partiu para sempre em direcção ao exílio.

4. Pensava-se então que desta vez seria possível, num rasgo perene e genial, fazer a revolução por excelência. Seria a oportunidade para que os sobreviventes da Geração de Setenta, finalmente, levassem à prática o seu programa planeado. De facto, o espírito de Quental, de Martins, de Ortigão, de Camilo e de outros mentores ancestrais, pela mão viva de Teófilo Braga, de António d’ Almeida, de Machado e do eficaz Afonso Costa encarnaram as grandes e oportunas reformas de que o país tanto carecia desde há muito.

Tudo parecia caminhar sobre rodas mas, uma vez mais, quer por acção detractora das forças bloqueantes quer, principalmente, pela trágica ocorrência da Grande Guerra, cujo devir desviou as energias da nação para um sentido de alma depressivo, o evoluir histórico da Terra Lusíada ficou por cumprir. E nem as tentativas de rectificação sugeridas por Sidónio – demasiado comprometidas com o emergente misticismo fatimista – nem as acções indefinidas de Gomes da Costa e do dinossauro de Santa Comba Dão – isolado pelas convicções de um obsoleto Império à escala do mundo – conseguiram essa regeneração. Contribuíram, sim, para o crescimento acentuado e nostálgico de um saudosismo intimista e para uma mentalidade individualista a que não faltou o gemer do fado nas casas de noite da capital, nas repúblicas académicas coimbrãs e no escorregar do líquido bachiano nas tabernas populares de cada rua e de cada bairro...

Resta à nossa memória colectiva e à nossa crença anímica lusíada o último rasgo luminoso providencial. Foi numa madrugada de Abril de 1974. Ao longo desse dia benfazejo finalmente e, pela primeira vez, todas as forças activas da Nação sentiram que era chegada a hora da sua consagração. Foi o despertar da revolução democrática – conhecida como Dos Cravos – a qual teve o seu epílogo concreto e festivo uma semana após, no dia 1º de Maio. Constituiu o fim decisivo do velho Portugal e escancarou as portas do Portugal apetecido europeu que, ao longo de todo o último quartel do Século XX, passou de um país sem voz no mundo para um País que todos respeitam nas suas opções e linhas de conduta entre os povos da terra. Daqui se entende que – apesar das inevitáveis sequelas deixadas pelas grandes mudanças e da ainda existência de algumas franjas sociais bloqueantes saudosistas dos velhos privilégios carunchosos de antanho – Portugal tenha passado, em menos de vinte anos, de um país de emigrantes escorraçados pelo destino fatalista da sobrevivência terceiro-mundista para um país acolhedor de deslocados das mais variadas gentes, na esperança ecuménica da sua realização.

E se dizia o poeta “falta cumprir-se Portugal” poderemos – olhando de frente todos os mais ousados – dizer bem alto que « A Terra Lusíada irá ser uma realidade! »



À PÁTRIA DE XVI



Passando indiferente ao turbilhão das guerras

Ousas sempre vencer, ó Pátria memorada.

Rainha és dos mares e dona das terras

Temendo os povos tua forte e austera armada.

Um só brado não chega àquilo que encerras

Gloriando os heróis da prol organizada.

Avante pela Cruz, o teu mais nobre ideal,

Longe, p’ lo mundo teu nome vai, Portugal !





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