Abaixo a tirania das crianças
Eu sempre acho que a melhor fase de minha vida foi a infância, até os doze anos, mais ou menos. Nessa época, morava em Juazeiro e passava todas as férias na fazenda de meu avô, que ficava na caatinga mais fechada, a duas léguas da cidade.
Quando digo isso para meus filhos e, agora, para os netos, eles não compreendem porque eu era feliz e perguntam de que exatamente eu gostava, já que a fazenda não tinha luz, nem água encanada, nem rádio, geladeira, ventilador, sempre havia muita muriçoca e morcegos e o banheiro era o mato atrás do curral.
Água para beber e para tomar banho era da chuva, acumulada em caldeirões e pequenos açudes.
Ademais, naquele tempo, ser criança não era moleza: a obediência aos pais, avós e pessoas mais velhas era sagrada; criança que sentava à mesa para as refeições não “piava” e era servida por último.
Lembro, por exemplo, que nas vezes em que acompanhei meu avô à Soledade, outra de suas propriedades, que ficava a três léguas da fazenda Santo Antônio, onde passávamos as férias, uma viagem de várias horas, ele em sua mula favorita e eu num jeguinho que ele me dera, meu avô não conversava comigo. Nas raras vezes em que precisava dizer alguma coisa, dizia a João de Gilú, o vaqueiro.
Essas lembranças vêm a propósito do status que as crianças alcançaram nos dias de hoje.
Diante da situação atual, eu é que não compreendo porque crianças tão cheias de vontade, paparicadas, cuja educação é motivo de insegurança para os pais e objeto de teorias extravagantes de psicólogos e educadores, porque essas pestinhas gozam de tantos privilégios. Na mesa, são servidas antes dos outros, nas recepções e festas de adultos destroem os buffets, comendo o que houver de salgadinhos e doces. Nas viagens de avião são chamadas antes de todo mundo, escolhem as melhores poltronas, embora nelas não se acomodem, pois ficam zanzando pelo corredor, perturbando os passageiros.
É demais!
Precisamos dar um basta a essa tirania e voltar a tratar as crianças como seres normais, nossos dependentes e subordinados, dando-lhes a educação e o tratamento que funcionou tão bem no passado.
A meu pedido, um amigo psicólogo levará essa discussão ao próximo congresso da classe dele que tratará de assuntos de educação infantil!
Estou com muita esperança de que dele resulte u´a mudança de orientação.
03.05.2002
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