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Artigos-->Despedida melancólica -- 02/06/2005 - 17:38 (Paulo Maciel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Despedida melancólica







O banco foi minha grande escola. Escola no sentido acadêmico, de aprendizado técnico e humanístico pois que, por sua iniciativa, freqüentei dezenas de instituições de ensino e centros de excelência; mas foi também uma escola de vida, em que as lições resultaram do exemplo de alguns dirigentes, dos conceitos que formulavam, da experiência do dia a dia, em funções e cargos que ocupei em sua hierarquia, desde os mais modestos aos de maior exigência profissional e da convivência com milhares de clientes, gente que dirigia negócios de todo tipo, que trazia à minha mesa os mais variados problemas.

Enfim, não fôra o banco e eu teria concluído o curso de direito e, quem sabe, ingressado na magistratura, a seguir a carreira de meu pai.

Os trinta primeiros anos de trabalho no banco foram muito mais do que uma relação formal de emprego, em que eu dava a ele empenho, energia, minha inteligência e recebia de volta a remuneração correspondente, sob a forma de salário propriamente dito e de promoções na escala funcional. Muito além disso, eu havia empenhado meu entusiasmo, a fé nos valores que a instituição professava, meu amor. Minha integração ao seu espírito era tão grande que, como outros colegas, eu achava que o banco me pertencia, e agia como tal, como um de seus donos.

Enquanto durou, essa foi uma relação extremamente satisfatória para mim: aquele mundo me bastava, tanto no plano material, quanto no espiritual.

Falar dessa maneira de uma empresa, como se se tratasse de uma pessoa, pode soar como uma coisa piegas, para muitos. Para mim, contudo, significa apenas revelar minha intimidade, meus sentimentos.

As lições morais e éticas que aprendi, sobretudo de meus superiores Miguel Calmon, Eugênio Teixeira Leal, Jayme Villas-Boas e de muitos colegas, entre eles, notadamente, Manoel Keller fizeram com que eu me sentisse em casa, depois que deixei de estar com meu pai. Seus princípios e valores, os mesmos que aprendi em família, se sobrepujavam ao interesse comercial, financeiro, e eu não me sentia preso a uma entidade sem cara, impessoal, ávida pelo lucro.

Os últimos doze anos de minha carreira, contudo, foram difíceis, cheios de conflitos e questionamentos e significaram uma ruptura com o passado. Eu me sentia às vezes fora do meu ambiente e isolado.

Em 1985, como forma de me livrar do estresse da vida junto ao centro nervoso do banco, pretendi voltar ao Recife, onde atuei durante 8 anos, e fui muito feliz, mas as circunstâncias impediram que esse projeto se realizasse.

Mas, em 1987, graças às fricções crescentes com o líder da empresa e à cada vez mais difícil dificuldade de adaptação aos novos tempos, fui transferido para o Fundo de Pensão e aí, longe do “burburinho”, do pragmatismo das políticas negociais então adotadas, passei um tempo de bonança, preparando-me para uma aposentadoria que, esperava, me trouxesse outras perspectivas de vida.

Em 1991, apesar de fora daquele ambiente perturbador, os ecos das novidades que chegavam ao meu conhecimento me levaram a propor à presidência da empresa um acordo para rescisão do meu contrato de trabalho, em condições que me permitisse continuar vinculado à fundação de previdência para poder requerer a aposentadoria quatro anos depois, aos sessenta de idade.

Infelizmente, porém, minha proposta não foi aceita e eu fui reconduzido à superintendência do Fundo de Pensão por mais quatro anos.

Afinal, no início de 1995, com 42 anos de serviços, requeri a aposentadoria e fui tocar minha vida.

Às vésperas de minha saída dirigi carta de despedida ao presidente, a todos os diretores e a mais de cem colegas, velhos companheiros de trabalho.

Sabendo do que acontecera com Manoel Keller, por muitos considerado o funcionário padrão da empresa, que deixara o banco sem receber uma só homenagem, sequer uma caneta, como lembrança (os únicos atos que marcaram a aposentadoria de Keller consistiram num almoço que lhe ofereci no Iate Clube da Bahia, ao lado de dois outros colegas da “velha guarda” e na edição de uma plaqueta que editei com artigos sobre ele), fui para casa certo de que o mesmo sucederia comigo.

E foi o que aconteceu!

Até mesmo a entrevista que solicitei ao presidente para apresentar-lhe, pessoalmente, minhas despedidas, não pôde realizar-se, em razão dos constantes adiamentos conseqüentes da falta de tempo desse ocupadíssimo dirigente.

Passa-se o tempo, eu me envolvo em novas atividades, o banco é submetido à intervenção pelo Banco Central do Brasil quando, nos primeiros dias de setembro de 1995, recebo em minha casa, um estojo com placa de prata com dizeres que buscavam homenagear-me, em que se destacava a frase: “ O que somos hoje contou com o seu efetivo profissionalismo, desempenho e crença no destino desta Instituição”.

A ironia do fato está na circunstância de haver recebido essa honraria através de carta assinada pelo interventor do Banco Central, Francisco Flávio Sales Barbosa, do seguinte teor:

“Em se tratando de objeto pessoal, localizado em um dos armários desta Presidência, envio em anexo uma placa em prata de lei, que lhe seria doada em março/95, quando se desligou da ECOS.”

Sem comentários!



Salvador, 5 de setembro de 2004

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