GOSTO DE SAL
Rômulo Marinho
Minha querida Vitória,
Que passei a vida a procurar.
Foi lá que vi o mar pela primeira vez.
A bela capital do meu estado natal,
Na qual os índios capixabas proliferavam
Antes dos nossos antepassados os expulsarem,
Certamente, com uma vitória suja.
Cheguei lá levado pelas mãos calejadas de meu pai,
Onde o velho mantinha negócios de café.
Não a Vitória de hoje,
toda poluída pelo que dizem ser progresso.
Apenas uma ilha sem pontes e viadutos, bela e pachorrenta,
Em cujas ruas meu pai deixou-me brincar,
Mesmo sendo lá do interior, despreocupadamente.
E tinha apenas cinco anos de idade,
Mas me recordo como se fosse hoje.
A viagem de trem, pela velha Leopoldina,
Durava, se não caíssem barreiras, cerca de doze horas.
Vinha de Celina,
Pequenino torrão onde passei parte da minha infância.
Foi minha primeira viagem de trem,
Que só via passar como o tempo, lentamente.
Pelo menos muito mais vagaroso que meus sonhos.
Da estação, no continente, à ilha, se atravessava de bote.
Assim, mal o barqueiro começou a remar,
Estabeleci o meu primeiro contato físico com o mar.
E, afinal, já não era sem tempo. Nasci Marinho.
Coloquei a mão na água e, a seguir, o indicador nos lábios.
Para ver se era salgada mesmo, como diziam.
Até hoje trago na boca aquele inolvidável sabor.
Toda vitória é doce, dizem.
Mas minha Vitória tem gosto de sal.
Um saboroso gosto de sal.
Brasília, 06 de abril de 2002
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