Crédito de cheque especial lembra muito visita de parentes distantes. Eles chegam quase sem avisar para um único final de semana. Como bom anfitrião, você os recebe e os acolhe. Eles, então, vão ficando, testando sua hospitalidade, invadindo sua privacidade e desafiando sua paciência.
Quando abrimos conta corrente em um banco, somos impingidos a acatar a contratação do “produto cheque especial”. De fato, esta é apenas uma das metas impostas pela área comercial dos bancos ao gerente que o atende. Solícito, você assina o contrato – em branco, como todos os documentos que assinamos junto às instituições financeiras –, permitindo a implantação de um limite de crédito. Sem perceber, você acaba de autorizar a instituição a lhe cobrar tarifas periódicas para manutenção deste cheque especial.
Mas o problema surge quando você começa a utilizar, por necessidade ou impulso, o crédito que lhe foi concedido. E, quando se dá por conta, está tomando o limite integralmente, como se fosse parte de seu patrimônio, de sua renda. A partir deste momento você incorpora à sua planilha de gastos mensais uma despesa com os juros do referido crédito.
As taxas de juros no cheque especial giram atualmente em torno de 7,80% ao mês, segundo informações disponíveis no site do Banco Central do Brasil (www.bcb.gov.br). Mas, na verdade, chegam a atingir o despropósito de 15% ao mês, o equivalente a 435% ao ano. Um garrote financeiro quando comparado às taxas igualmente anualizadas de expectativa de inflação (7%), meta Selic (19,25%) e ao rendimento da caderneta de poupança (6,17%).
Se você é correntista de algum banco, certamente tem o cheque especial como convidado de suas finanças pessoais. Assim sendo, possivelmente está enquadrado em uma das situações ilustradas a seguir.
1. Você não utiliza o cheque especial
Neste caso, sua única providência deve ser negociar com o gerente o estorno das tarifas de manutenção do cheque especial cobradas periodicamente ou já embutidas naquele “pacote de tarifas” que é levado a débito em sua conta mensalmente. Aproveite-se de seu poder de barganha para obter até mesmo a isenção da cobrança deste pacote de tarifas sob pena de solicitar o cancelamento do cheque especial.
2. Você utiliza o cheque especial e está com ele sob controle
Nesta situação, o produto tem utilidade para você. Seu objetivo deve ser reduzir a taxa de juros cobrada. A regra de ouro consiste em negociar uma redução significativa da taxa em troca da compra de outros produtos RESGATÁVEIS do banco, tais como títulos de capitalização e previdência privada. Fazendo isso, você estará convertendo um débito em investimento. Acompanhe o exemplo real abaixo.
Um cliente apresentava, em determinado banco, limite de R$5.000,00 à taxa de 8,90% ao mês. Ou seja, o desembolso mensal com juros, sem CPMF, supondo utilização integral do limite, era da ordem de R$445,00.
Fizemos uma proposta ao banco: adquirir todo mês R$150,00 em títulos de capitalização mediante redução da taxa de juros para 3%. Os argumentos apresentados foram:
a)O banco continua vendendo o produto cheque especial, com uma taxa de 3% a.m. (42,58% a.a.), muito acima da taxa básica Selic;
b)O banco passa a ter um outro produto, “título de capitalização”, vendido mensalmente, num sistema pré-programado;
c)A compra do título de capitalização é uma garantia para o próprio banco pois, supondo um resgate após 24 meses, já haverá R$3.600,00 brutos entesourados, ou seja, 72% do risco do cheque especial.
Os argumentos acima foram suficientes para obter a redução desejada. O correntista, por sua vez, auferiu um ganho extraordinário. Considerando-se que o valor investido em capitalização será resgatado em apenas 80%, a economia obtida segue o raciocínio abaixo:
Juros sobre limite de R$5.000,00 a 3% a.m.= R$150,00
Reserva matemática de 20%, não resgatável, sobre a capitalização de R$150,00 = R$30,00
Custo total mensal = R$180,00
Em outras palavras, o dispêndio mensal caiu de R$445,00 para R$180,00, isto é, 60% de redução!
3. Você utiliza o cheque especial e já perdeu o controle sobre ele
Esta é uma das situações mais recorrentes e que mais afetam psicologicamente os profissionais. Como se não bastasse a elevada taxa de juros, o correntista está sempre com seu saldo devedor acima do limite de crédito aprovado. Além de correr o risco de ter cheques devolvidos, paga tarifa adicional por exceder a este limite.
Se você está nesta condição, restam-lhe apenas dois caminhos:
a)Cancelar o cheque especial, parcelando o saldo devedor. Possivelmente você fará a contratação de um empréstimo pessoal (o CDC, ou Crédito Direito ao Consumidor, é uma das modalidades possíveis). Como você está frágil dentro desta negociação, terá que lutar muito para conseguir uma taxa razoável, na casa dos 3% mensais. Sobre a operação de crédito incidirá, ainda, IOC (Imposto sobre Operações de Crédito), elevando ainda mais o custo efetivo. Mas é um expediente mais adequado do que continuar na ciranda dos juros.
b)Acionar judicialmente o banco, questionando a legalidade dos juros cobrados, invocando a prática de anatocismo (capitalização de juros sobre juros) pelo banco. É um processo que pode levar anos para ser julgado. Se o valor de seu débito for inferior a R$5.000,00 você poderá recorrer a um juizado de pequenas causas. Acima deste valor, terá que indicar um advogado para representá-lo. O risco ao longo deste processo é ter seu nome incluído nos órgãos de proteção ao crédito (SCPC, Serasa) o que pode ser evitado mediante obtenção de uma liminar.
Assim como aquele parente distante do início do texto, seja severo com o fantasma do cheque especial. Pois especial deve ser você.
* Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA-FEA/USP, é empresário, consultor, professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting e Diretor Estadual do NJE/Ciesp. Contatos através do e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br Visite: www.tomcoelho.com.br.