DUAS VOZES
Diz-me, de ti, o que te assombra,
Conta-me da tua alma,
Do que te move,
Para que, conhecendo o caminho,
Possa eu aventurar-me nessa senda
Em mim, tudo é silêncio.
Em tédio mortal passo meus dias
São criaturas o que vejo
A procissão fatal do meu destino
Ai, mas não o podes,
Se há tanta vida em ti
Se o teu sorriso antigo
Tem a meiguice de uma noite de lua
Se teu verso anterior
Tem uma música tão própria e terna
Que me toma a alma e a arremessa
Num colo terno de carícias...
Não te enganes
Sou alma velha
Tanto já vi
Que nada comove meu espírito
É como se fosse o mundo
procissão eterna
Que não muda
Que passa por mim
E eu me quedo a olhá-la
Apenas olho
E olhando
Mais me convenço
Que é a mesma todo tempo
Então, me vou
Mas vou com pena
Porque se não podes ver em mim o amor
É que nada vês
Além de ti
- tua própria dor
não vês além do teu próprio poema
que é solitário e frio
por mais que o tenhas
dado a tanta gente
e sejas amado, odiado, admirado,
sejas o bruxo, a quem temem.
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