NA CONTRAMÃO DO BOM SENSO
(Por Domingos Oliveira Medeiros)
O que é bom a gente costuma repetir. A premissa, todavia, não vale para as medidas geradas nos gabinetes pouco criativos de determinadas autoridades governamentais. Mais uma vez, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) trafega na contramão do trânsito ao anunciar que, a partir de março, para renovar a Carteira de Habilitação, o cidadão terá que voltar à auto-escola, aprender o conteúdo e prestar exame sobre direção defensiva e primeiros socorros.
A medida consta da Resolução 168 do Contran e seu objetivo, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), é aprimorar a qualidade do condutor brasileiro, que estaria entre os piores do mundo; sendo a causa a deficiência de formação dos condutores.
A disciplina de direção defensiva envolve o conceito de condições adversas, segundo o qual o motorista precisa estar atento aos erros dos outros e às dificuldades do ambiente, além de reforçar ensinamentos sobre como evitar acidentes, melhor conduta e atenção ao dirigir, manutenção do veículo e cuidados com os demais usuários da via.
Na disciplina de noções de primeiros socorros, o aprendizado voltar-se-á para o domínio de procedimentos básicos de socorro às vítimas de acidentes, sinalização do local do sinistro, uso correto do extintor de incêndio, e acionamento do corpo de bombeiros, polícia e ambulância, entre outros.
Os cursos poderão serão ministrados à distância, e terão carga horária total de 15 horas: 10 horas para direção defensiva e 05 horas para noções de primeiros socorros. Num primeiro momento, serão avaliados 5 milhões de motoristas, ao custo unitário de R$50.
Não se falou de questões relevantes, tais como: as péssimas condições de nossas rodovias, em termos de buracos, sinalização, iluminação e falta de segurança, para citar as mais conhecidas. São questões que, a rigor, deveriam constar dos cursos, pelo menos para que os motoristas aprendessem como tapar ou desviar de buracos, sem causar acidentes, ou como dirigir com segurança, sem sinalização e iluminação adequadas.
Repete-se, de certa forma, a questão do malfadado estojo de primeiros socorros; medida que gerou, quando de sua implantação, em janeiro de 1999, desconfiança da população de que se visava, tão-somente, beneficiar fabricantes e fornecedores dos itens que compunham o kit de primeiros socorros..
A bem da verdade, tesouras, esparadrapos, gazes, água oxigenada, enfim, não se mostraram suficientes para a prestação de socorro às vítimas de acidentes nas rodovias. Sem falar no perigo de remoção de feridos, sem o necessário e adequado treinamento. O resultado não poderia ser outro: a desconfiança inicial transformou-se em frustração; o kit foi deixado de lado; alguém ficou com o lucro e o cidadão, como sempre, arcou com os prejuízos.
A história se repete. Com outra roupagem. O curso, curso, por suas limitações de tempo, de conteúdo programático e de amplitude de abordagem, em relação ao universo de variáveis que subsidiam as sombrias estatísticas de feridos e mortos em nossas estradas, não se sustenta diante da fragilidade de suas argumentações; carece, portanto, de fundamentação lógica e de respeito ao cidadão, para dizer o mínimo.
Por conta disso, não possui condições de atingir seu desiderato. Sua eficácia, mais provável, não passará dos lucros originários das taxas a que estarão obrigados todos os motoristas; impedidos de fazer o retorno ou de parar no acostamento para esperar a chuva da insensatez passar. Sob pena de terem a carteira cassada. Ou, como da outras vezes, bater de frente com a realidade, quando a medida for deixada de lado.
No meu entendimento, os dirigentes da coisa pública é que precisariam freqüentar um curso de direção defensiva dos direitos do cidadão; e de primeiros socorros, para evitar acidentes de percurso, fruto de quem acelera e ultrapassa os limites de velocidade das vias, na pressa de arrecadar mais recursos. É hora de pisar no freio da insensatez. E parar com essa mania de resolver tudo pelo lado do bolso alheio.
14 de janeiro de 2005
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