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cronicas-->A Pequena Grande Hutu -- 15/11/2001 - 18:58 (Elisabeth Carvalho Nascimento) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A PEQUENA - GRANDE HUTU

Elisabeth Carvalho Nascimento (fogocorredor@uol.com.br)



Outro dia, fui surpreendida com uma cena de tamanha grandeza humana e dramática, que me fez silenciar e pensar durante dias sobre a mesma. E mais do que - me fez pensar na nossa "complaisance devant la violence" - que existindo anos e anos, acabou por trazer uma estranha mudança em nossa escala de valores, no certo e no errado - fazendo-nos inerte, diante das chacinas, da corrupção, das crianças abandonadas, dos velhos esquecidos, da fome no Nordeste, da violência na Bósnia, no Haiti, Seul, em Ruanda...
Estava assistindo televisão e dentro do noticiário sobre a horrenda guerra civil de Ruanda, foi mostrada a terrível travessia dos hutus (derrotados na guerra), sobre a ponte da "vergonha", que faz fronteira com o Zaire, e onde existe horário predeterminado para a passagem dos refugiados. E findo este, as pessoas são encurraladas no lado de Ruanda, sob a força de uma vara, que nas mãos de um truculento soldado do Zaire, rasga os céus, em açoites, sobre os mirrados corpos dos hutus famintos e perseguidos.
Fechada a fronteira sobre a ponte, pelo corpulento soldado, de repente, o inesperado. Uma criança sozinha - uma menina aparentando uns nove anos de idade, desnutrida, quase careca, em trapos, trazendo apenas uma trouxinha na mão esquerda, adentra na ponte, sob um silêncio do "Olimpo à noite". A atitude da pequena anónima, paralisou à todos: hutus, soldados da força de paz, repórteres. Somente o càmera-man ficou registrando aqueles pequeninos passos de coragem e dignidade, que avançavam um a um sobre a ponte.
A pequena hutu seguia, como num ritual silencioso de paz, dentro da violenta e estúpida guerra. E levava no seu pequenino corpo uma grandeza luminosa de coragem, determinação e tamanha dignidade que ao chegar no outro lado da ponte, o soldado do Zaire, quedou-se como diante de uma rainha. E numa reverência, curvou-se retirando o obstáculo à passagem daquela pequena senhora, que trazia sobre os ombrinhos a força e postura dignas de toda uma Nação Hutu, massacrada violentamente pela tribo Tutsi.
Quando dentro do sossego e conforto da minha casa vi aquela pequena anónima andando sobre a ponte fronteiriça, senti vergonha dos meus medos, do meu egoísmo, das minhas omissões, das minhas vaidades e lamentações.
Aquela criança, não tinha se deixado alquebrar pela fome, violência, pelas perdas sofridas. Alí estava, imponente, vestida em trapos que reluzia a esperança. Andava sobre uma precária ponte de madeira - calma e determinada - como uma Maria Imaculada, no Calvário do Filho Amado.
Ao terminar de cruzar a ponte, já em território do Zaire, a pequena hutu, não fez nenhum gesto obsceno ou debochado para o soldado da fronteira, como qualquer outra criança faria - não. A pequena anónima olhou para trás, olhou para sua terra Ruanda. E seu olhar era de saudade, promessas de amor e regresso. Nenhum rasgo de ódio ou vingança passava pelo seu olhar.
E o càmera-man, como que hipnotizado, continuou a filmar a pequena hutu que se perdia sozinha no seu caminhar sem rumo - mas com um destino: de ser Grande! Luminosa! Como só os anjos sabem ser.
E eu me percebi falando baixinho: Que Deus siga contigo! Pequena-Grande Hutu.
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