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Artigos-->O caso Herzog -- 04/11/2004 - 15:57 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O CASO HERZOG



Raymundo Negrão Torres (*)



No início de 1974, a guerrilha urbana e o terrorismo em São Paulo haviam praticamente sido desbaratados. A aventura guerrilheira do Araguaia começava a dar seus últimos suspiros. Iniciava-se o período da “distensão lenta, gradual e segura”, como a imaginava o Presidente Ernesto Geisel. Os órgãos de segurança voltavam suas vistas para o PCB que, seguindo a orientação de Moscou, não se envolvera na luta armada. Em pouco tempo, o pessoal que enfrentara os difíceis anos de uma luta sem quartel concluiria que o pessoal do “Partidão” não tinha o treinamento, a estrutura psicológica e a garra da turma da luta armada.



Cerca de um ano depois, entra na mira da repressão uma célula comunista do PCB existente na redação da revista Visão. Entre os suspeitos está o jornalista Vladimir Herzog Procurado na TV Cultura - onde era responsável pela edição de um telejornal – e intimado a comparecer ao DOI para prestar declarações, alega a impossibilidade de afastar-se do trabalho naquele momento. Fica então combinado que o fará no dia seguinte, o que é cumprido. Em sua cela, após trocar sua roupa por um macacão, o uniforme de todos os presos, Herzog recebe uma folha de papel e uma caneta para escrever o que tivesse a declarar. Era a chamada DPP, declaração de próprio punho. Apesar do pouco tempo de militância, escreve extensamente, descrevendo as atividades de sua célula e apontando os companheiros de partido que conhecia, inclusive Rodolfo Konder, seu colega de redação na revista que também estava preso. Sete horas depois, Vladimir Herzog estava morto e sua morte iniciaria um dos mais rumorosos casos envolvendo os órgãos de segurança e seus incansáveis acusadores.



O ex-presidente Geisel – que teve participação direta e saliente no caso, principalmente depois que a morte do jornalista desencadeou um verdadeiro furor na imprensa, com evidente prejuízo para seu projeto de distensão – declarou em suas memórias, publicadas em 1997 pela Editora da Fundação Getulio Vargas:



“Agora a esquerda tem um herói. De fato criaram um herói. Pegaram uma pessoa relativamente sem importância e a transformaram num herói para a esquerda.” (pág. 372).



Tinha razão o ex-presidente. Mas sua observação era o ponto de partida para desmentir a versão de morte sob tortura. Torturar para quê? Para obter informações de um apagado integrante de uma célula do Partidão na revista “Visão”? As circunstâncias de sua convocação para depor não parecem indicar coisa diferente. Pressionar psicológica e/ou fisicamente quem já havia contado tudo em depoimento espontâneo e de próprio punho e que ia ser posto em liberdade, sem sequer ser indiciado em Inquérito? Não parece fazer sentido. Clarice Herzog, hoje, aos 63 anos, dona de uma conceituada empresa de pesquisa de mercado em São Paulo, dá a versão de que as “torturas” teriam sido conseqüência de ter o preso, em momento de fúria, rasgado o papel em que escrevera o depoimento – que ela chama de “nota de arrependimento” – deixando irados seus interrogadores.



Mas, a repercussão da morte de um jornalista, ainda mais que o fato passou a ser explorado com sensacionalismo pela mídia, traz o presidente Geisel a São Paulo. Meses antes, em março, ele autorizara a ida a São Paulo de seu ministro da Justiça, Armando Falcão, para avaliar as queixas do general Ednardo d´Ávila Melo, pela verdadeira campanha difamatória que a imprensa fazia contra as autoridades militares, visivelmente incentivada pelos novos ares da anunciada abertura política. O relatório secreto dessa viagem está transcrito no livro “Dossiê Geisel” (Editora Fundação Getúlio Vargas, 2002 - Anexo 2). Geisel diria, ainda, anos depois em suas memórias, sobre o caso Herzog:



“Quando resolvi mandar abrir o inquérito e o Ednardo opôs algumas dificuldades, vi que havia problemas,” (pág 370)



O problema é que o comandante do II Ex receava que o IPM pusesse em risco a segurança do pessoal envolvido até ali no combate ao terrorismo e à guerrilha, inclusive os “infiltrados”. Mas Geisel, não só mandou abrir um IPM, como escolheu o encarregado do mesmo, um homem de sua inteira confiança, o general Fernando Cerqueira Lima, circunstância que esqueceu de mencionar em suas memórias. E o que é pior, na página seguinte (371), deixa no ar torpe insinuação de que o homem de confiança que escolhera - um digno e inatacável militar – poderia ter-se prestado à farsa de fazer um inquérito para encobrir a verdade. O inquérito procedido com todo o rigor e a maior correção, apoiado em inúmeras perícias e laudos de autoridades civis, concluiu pelo suicídio, conclusão inteiramente respaldada pela Justiça, mas jamais aceita pela esquerda para quem vinha a calhar mais um cadáver a ser explorado, como já o fizera com o do inditoso estudante Edson, no Rio de Janeiro, nos idos de 1968. Mas este não foi o único inquérito feito sobre a morte do jornalista. Clarice Herzog, moveu ação judicial contra a União, a propósito do propalado assassinato de seu marido e um outro inquérito correu no âmbito da polícia civil. Esse inquérito concluiu que Herzog estava deprimido e fazendo uso de antidepressivos e havia se suicidado; para a Sra Clarice foram imputadas as custas do processo.



Ainda assim, raciocinemos por absurdo, artifício muito usado em matemática para a demonstração de certos teoremas. Admitamos que a morte se tenha dado em decorrência de maus tratos. Diante daquele inesperado e indesejável acidente, os torcionários, como gosta de dizer Jacob Gorender, resolvem simular um suicídio e são tão idiotas e primários que o fazem montando um cenário com uma das formas mais susceptíveis de dúvidas: um suicídio de joelhos, em que ao suicida, nas vascas da morte, bastaria levantar-se para escapar ao resultado de que poderia ter-se arrependido. Não haveria na rua Tutóia uma cela com um suporte mais alto para nele dependurar o corpo já inerte do inditoso jornalista? Seria mais crível do que fazer aceitar que um nó do cinto de náilon usado por Herzog, ao se apertar em torno do pescoço do suicida, o tenha morto por asfixia.



Depois de longo processo, o juiz Marcio Moraes imputou à União a culpa pela morte de Vladimir Herzog. Nada mais lógico, pois a incolumidade de qualquer preso é dever do Estado e nem mais justo, depois que a Avenida Água Branca – no caso de Marighela - e um pedaço do sertão baiano de Brotas de Macaúbas – na morte de Lamarca - foram declarados pela Comissão de Mortos e Desaparecidos, presidida pelo atual ministro Nilmário Miranda, dependências policiais, com a mais cínica desfaçatez.



(*) Raymundo Negrão Torres é militar reformado e autor do livro “O fascínio dos anos de chumbo”.











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