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Infantil-->Papai Noel -- 30/08/2006 - 16:50 (Jader Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Papai Noel

A rua da minha casa era uma viela vermelha, de terra batida, onde a criançada brincava pra valer. Corríamos e gritávamos produzindo uma algazarra sem fim. A felicidade era vizível em cada um de nós —parecia que um adesivo vermelho tinha sido colado nos rostinhos de cada menino. As famílias antigas eram numerosas, na maioria das casas havia cinco ou mais filhos. Ainda não havia TV e a festa da meninada se prolongava pela noite, até perto das dez, hora de entrar para lavar os pés e dormir. Quando ia se aproximando o fim do mês, a meninada ficava ansiosa, esperando pelo “homem misterioso” da bicicleta preta “Peugeot”. A qualquer momento ele poderia passar. Seu Ismael era o seu nome, um homem que nos parecia rico e tinha nome de anjo. De repente, pontual como um cometa, lá vinha ele na sua “Peugeot”. A alegria brotava em nossos corações. Havia uma razão especial para nossa alegria: ele jogava dinheiro para o alto e fazia uma aleluia milionária com notas azuis de um cruzeiro. As cédulas formavam uma nuvem sobre nós, borboleteavam ao vento e depois pousavam na terra. Nossas mãos pequenas, ansiosas e febris, surgiam de todos os lados e recolhiam a fortuna vinda do céu. O Seu Ismael era o nosso herói, —o anjo do fim do mês, a bala e o picolé que nós, particularmente nós, jamais ganhávamos do Juca, nosso pobre e miserável pai. Seu Ismael era um tipo de Zorro bondoso. Era mais do que um santo, muito mais!
No Natal daquele ano de 1954 —Ô tristeza de vida!—, não tínhamos ganhado nenhum presente, mas o seu Ismael parece que adivinhava, chegou de surpresa e jogou mais notas para o céu do que seria razoável. O Juca, um homem pobre mas justo apesar de tudo, pai de nove filhos, achou que não estava certo e interveio. Antecipou-se a nós, recolheu todas as notas e convidou o seu Ismael para entrar e tomar um café. Esperava que, tomando o café forte, o seu Ismael tomasse ciência da besteira que estava fazendo e aceitasse receber de volta o seu dinheiro (um montão de notas azuis amassadas que o Juca recolhera de nós, emburradíssimos...).
Bem feito!... Doce e ledo engano do Juca. Era noite de Natal e o coração do seu Ismael estava ainda mais macio do que nunca. Ele viera no lugar do nosso Papai Noel e confirmaria que todo aquele dinheiro era nosso. Nós, que aguardávamos pela decisão favorável, explodimos de alegria. O seu Ismael estava apressado e dizia para a minha mãe: “Como é, Dona Francisca, esse café sai ou não sai?...” Minha mãe não conseguia entender a pressa dele, uma estranha pressa em tomar café e retornar para o tumulto da rua onde rolava a festa dos meninos. Mas tudo ficaria muito claro quando ele disse: “Tenho pressa, Dona Francisca... É Natal e eu ainda preciso distribuir mais dinheiro para a meninada...”
Dava para perceber que o Seu Ismael estava de “pilequinho”, mas continuava generoso como antes. Dizia e ameaçava: “Preciso ir, seu Ferreira, não tente me impedir. As crianças estão me esperando e eu ainda vou jogar mais dinheiro para elas...” E insistia em voz alta: “Como é, Dona Francisca, esse café sai ou não sai?...”
Era um anjo muito teimoso aquele seu Ismael, gostava de verdade das crianças. Quando deixou a casa e voltou pra rua, não só nos devolveu as antigas notas amassadas, como jogou para o alto mais um montão de outras notas azuis, novinhas... Ah, eu e os meus irmãos agora estávamos ricos! Não conseguimos dormir direito naquela noite —a adrenalina era tanta que nos tirava o sono. O nosso Natal daquele ano estava garantido! No dia seguinte, depois que a longa noite de emoções acabou, percorremos as vendas da Vila e torramos tudo, chupamos picolé, comemos maria-mole, bala de goma, pipoca e tomamos guaraná de canudinho.
Até hoje não me esqueço do seu Ismael, aquele santo que jogava dinheiro para nós e voltava de bicicleta para o Céu. Choramos ao vê-lo indo embora pedalando, flutuando numa carruagem de duas rodas. O Juca, meu pai, o mais pobre e incompetente Papai Noel do planeta, aprovava a nossa alegria e tinha lágrimas pesadas caindo dos olhos. O coitado do Juca não ganhou nenhum presente naquele Natal. Foi a única vez que tive pena dele!
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