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cronicas-->Um Casal Especial -- 30/09/2001 - 11:34 () Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
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À medida que me aproximava de uma cidade satélite de Brasília, Santa Maria, na periferia da cidade, sentia a pobreza tomar conta até da paisagem. E realmente entendo que nem todas as pessoas, infelizmente, podem fitar o céu ou ver as estrelas com o mesmo deslumbramento. Para os moradores daquela parte da cidade, os dias ensolarados e claros devem ser ofuscados pela desesperança, e a maior parte dessas horas encobertos por um denso nevoeiro. Isso eu pensava enquanto me dirigia com cestas básicas para aquele lugar onde vi tanto sofrimento.
Mesmo que costumemos visitar bairros pobres ou asilos, toda vez que vamos a um lugar tão triste, onde pessoas como nós sofrem privações e fome, é como se nossos corações ficassem oprimidos e se sentissem culpados. Foi essa a impressão que tive ao ir chegando à casa de um casal de velhos. Quando bati e me viram embora já sabendo que eu iria lá, surpreenderam-se com minha visita. E ao me verem entrar, sentiram-se constrangidos embora eu fizesse todo o possível para deixá-los à vontade. Mas era um constrangimento que ocultava claramente felicidade. Logo sorriram para mim com a espontaneidade das pessoas simples e boas.
Seu António parecia bastante doente. Soube que usava uma sonda para que seu rim trabalhasse e fazia hemodiálise num Hospital do governo. Dona Maria andava com muita dificuldade, curvada, apoiando-se sempre, porque sofria de uma artrite perniciosa. A casa era tão pobre de chão batido e paredes frias e quase transparentes, que eu senti interiormente uma forte dor.
Ambos olharam a cesta de alimentos, agradecendo com um brilho nos olhos e então me disseram que estavam completamente sem nenhum mantimento em casa.
-Estamos com fome, moça, disse-me ela com uma voz frágil. Só temos agora farinha dentro de casa.
Engolindo o soluço que fazia um nó em minha garganta encetei uma conversa com o casal e soube que não tinham nem gás para cozinhar os alimentos. Contaram-me então as dificuldades, lutas insanas num país que não se preocupa com seus velhos e principalmente quando doentes, e sem sequer usufruir uma aposentadoria mínima. Haviam trabalhado no campo e estavam lutando por ela há muito tempo.
Enquanto providenciava o gás, ligando para a companhia do meu celular, aproveitei para me estender no diálogo e ouvi-los. E mais do que nunca pude entender como a miséria é penosa e ultrajante. Chegar àquela idade e não ter nem o básico para viver, se assemelha a ser enterrado vivo sem condições de emitir um grito que no desespero pudesse ser ouvido.Olhava-os, certa de que eles eram os verdadeiros heróis. Porque eram heróis, além de tudo, sem medalhas, comemorações ou festividades para engrandecê-los.
Deixei algum dinheiro para que pudessem comprar remédios e ele então me falou, olhos marejados e vermelhos, enquanto sua mulher chorava suavemente:
-Temos fome, mas sei que existe gente como você, moça. Nunca vou esquecer disso.
Pensei quão pouco eu ainda estava fazendo e enxerguei no humilde casal ídolos verdadeiros, cuja bondade e desprendimento, faziam com que vissem o lado positivo de tanto sofrimento.
Abraçei-os com carinho, mas jamais poderei deixar de ir visitá-los sempre porque nunca esquecerei o que significaram para mim em emoção misto de indignação e dor, mas também intensa admiração por alguém que é capaz de sofrer sem mostrar revolta ou desespero. Fui eu, que recebi verdadeiramente um presente maravilhoso tendo podido conviver com esse casal tão especial.
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