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Artigos-->Mulheres Pensam? -- 16/06/2004 - 19:15 (Tereza da Praia) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AS MULHERES PENSAM?



(Tereza da Praia)





Um dos poemas mais bonitos do Vinicius de Moraes, a meu ver, é o “Poema do aniversário” no qual ele cria a imagem de uma mulher sendo parida por um homem. Uma mulher nascendo do flanco masculino. Santo Tomas de Aquino, para mitigar as duras idéias de Aristóteles, a partir das quais “a fêmea é o macho falho”, desenvolve a idéia existente em Gênesis (Bíblia) de que a mulher foi tirada da costela de Adão (primeiro homem). E neste passo ele faz o raciocínio de que Deus, que é perfeito, não poderia criar a mulher como algo imperfeito.



Santo Tomas de Aquino desenvolve seu raciocínio a partir de perguntas, as quais ele procura as respostas, as soluções. A primeira indagação era se “a mulher teria sido produzida na primeira produção das cousas”. Neste primeiro passo, a mulher é pensada com a auxiliadora do homem (idéia até hoje disseminada - a mulher como a companheira do homem, aquela que lhe auxilia). Releva anotar, que a mulher como auxiliadora do homem, na idéia de Santo Tomas de Aquino, seria apenas para a questão da geração. Diz ele: “o sexo masculino não se une ao feminino todo o tempo, mas só no do coito”, a partir do coito se tornam uma só pessoa na ótica tomista.Assim chega à conclusão de que “a fêmea não é um ser falho pois está destinada, por intenção da natureza, à obra da geração.”











Neste passo, salvamo-nos por nosso destino biológico de sermos “mães”, de preferência de robustos varões.



A outra questão posta por Santo Tomas de Aquino é se a mulher foi realmente feita do homem. E argumenta que “o sexo é comum aos homens e aos brutos” e as fêmeas não são feitas dos machos, portanto a mulher não teria derivado do homem. Por outro, seres da mesma espécie tem a mesma matéria, daí a supor que, se o homem foi feito do barro, a mulher também o foi. Volta ao argumento de que a mulher foi feita como adjutório do homem. Logo a mulher foi feita do homem. E conclui que por questão de conveniência, a mulher foi formada do varão, porque o poder divino pode fazer um mesmo ser de qualquer matéria.



Por outra, ele se indaga se realmente a mulher foi feita da costela do homem. Se como, na visão poética do Vinicius de Moraes, o homem pariu a mulher de seu flanco. E Tomas de Aquino conclui que a “costela era a perfeição de adão”, considerando-o não como um indivíduo, mas como princípio da espécie. Por que da costela e não de outra parte qualquer? Porque deveria haver união ente o homem e a mulher. Nem a mulher deve dominar o homem e nem o homem dominar a mulher. Aduz ainda que o corpo da mulher foi formado da mesma forma como se deu a multiplicação dos pães (narrada nos Evangelhos).



Em suas reflexões, Santo Tomas de Aquino indaga ainda se a mulher foi feita imediatamente por Deus. Argumenta “a mulher foi feita do homem”, logo não foi feita imediatamente por Deus. Fortalece o seu raciocínio em Agostinho que em dado momento afirmou que os seres corpóreos foram feitos por Deus, por intermédio de anjos. Isto é, os anjos eram serviçais de Deus na elaboração de seres corpóreos. Mas o próprio Agostinho afirmou que só Deus poderia produzir a costela para que a mulher existisse. Daí concluiu o Santo filósofo que “só Deus, instituidor da natureza, pode, fora desta ordem, dar o ser às cousas”.









Este longo prólogo foi apenas para demonstrar toda a discussão que existe a cerca da criação da mulher, a partir da idéia aristotélica-tomista que vige até hoje. De todo o exposto, temos: Se a mulher é uma derivação do homem. O homem pariu a mulher a partir do seu flanco. Deus foi o feitor da obra. Se, como afirma Tomas de Aquino, “seres da mesma espécie têm a mesma matéria”, e “o macho e a fêmea são da mesma espécie”; Se o homem pensa, logo a mulher também pensa. A grande indagação é: Por que negaram a capacidade pensante da mulher durante tanto tempo? Teria ou tem o homem medo da mulher?



Talvez esta indagação venha ser razão das reflexões de Olímpia Gouges, na Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, quando logo no preâmbulo solta o grito: “Dize-me, que te deu o soberano poder de oprimir o meu sexo? A tua força?” E eu indago, até aonde é o homem quem oprimi a mulher, ou é a mulher que se deixou oprimir, num movimento de acomodação? E de tanto ouvir que era um ato falho da natureza, como disse Aristóteles: “a fêmea é o macho falho” introjetou, dentro de si, esta crença? A própria mulher, a partir da educação dos filhos, terminou por propalar esta idéia. Será que nós, mulheres, não somos as maiores misóginas? Será que não temos a mesma fala, que o Millor Fernandes coloca na boca de seu personagem Vera, na peça “É”: “Você sabe que de vez em quando eu tenho a sensação de que sou um escravo a quem tentam impor a libertação? Estou bem na minha senzala, ela é ampla e limpa. Meu dono não me espanca, de vez em quando fica inexplicavelmente de mau humor, passa dois ou três dias sem falar comigo, é tudo. Em troca eu não penso na subsistência, ele pensa por mim, paga minhas contas, mata o javali. Que é que estão querendo - me dar a liberdade para morrer de fome? Trocar uma escravidão nominal por uma escravidão real? Concessão todos fazem, todos fizeram, todos farão sempre. (...) Quando eu tenho que me ajoelhar, faço como se fosse brincadeira. Não dói nada”.



Nós ouvimos o poeta dizer: “a mulher tem que ter qualquer coisa além da beleza, qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora, qualquer coisa que sente saudade, um molejo de amor machucado, uma beleza que vem da tristeza de se saber





mulher, feita APENAS para amar, para sofrer pelo seu amor e para ser só perdão.”(Samba da Benção – Vinicius de Moraes/Baden Powell). E nós saímos por aí repetindo a poesia, achando isto lindo. E nem nos lembramos, que estamos tal qual as Penelopes gregas. Que estamos nos mirando nos espelhos das mulheres de Atenas, que

ficavam bordando, enquanto os Ulisses iam para suas noitadas nas boites helênicas, se envolverem com as sereias, e as déias. E elas eram só perdão.



Quero concluir minha fala, com uma citação da escritora Lya Luft, num texto, onde ela faz reflexão sobre a forma da escrita feminina: “Não existe isso de homem escrever com vigor e mulher

escrever com fragilidade. Puta que pariu, não é assim. Isto não existe. É um erro pensar assim. Eu sou uma mulher. Faço tudo de mulher, como mulher. Mas não sou uma mulher que necessita de ajuda de um homem. Não necessito de proteção de homem nenhum. Essas mulheres frageizinhas que fazem esse gênero, querem mesmo é explorar seus maridos. Isto entra também na questão literária. Não existe isto de homens com escrita vigorosa, enquanto mulheres se perdem na doçura. Eu fico puta da vida com isso. Eu quero escrever com vigor de uma mulher. Não me interessa escrever como homem.”



Parafraseando-a, não no sentido da lógica, não existe isto da mulher não pensar. A mulher pensa. Pensa de forma tão vigorosa e tão criativa, produtiva, quanto o homem. A mulher pensa também com a intuição. Eu penso e logo duvido. Tenho a impressão que nós, mulheres, temos que voltar a Descartes e duvidar de tudo que nos disseram sobre nós mesmas. Eu duvido se sou louca ou se sou lúcida. Eu duvido logo eu existo. Eu duvido logo eu penso. A dúvida é minha certeza. Eu duvido de Aristoteles, de Tomas de Aquino e do bispo. Eu duvido logo eu insisto, eu não desisto, enquanto não encontrar o meu fundamento.



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