A cena mais marcante de “Bananas”, de Woody Allen, anárquica esculhambação de caudilhos e ditaduras, atinge em cheio a espinha dorsal do tal “way of life” norte-americano: trata-se do momento em que os Estados Unidos – fielmente retratados pela arte – vendem armas aos dois lados que se digladiavam na republiqueta latina. A aguçada visão do diretor nova-iorquino pôs a nu, sem piedade, a origem remota do impressionante atentado que pôs abaixo as torres gêmeas, expondo ao riso nervoso da platéia contradições insolúveis, capazes de dissolver um sistema político e econômico com uma pressa digna do aço exposto a 500 graus centígrados.
Os Estados Unidos não são apenas, como se diz, a gloriosa demonstração de superioridade do sistema capitalista. São também o fruto de duas guerras transcorridas a milhares de quilômetros de distância de seu território, e de sua ultradimensionada indústria de armamentos, que os enriqueceu sem nunca questionar de onde jorravam os recursos. Vendiam armas aos inimigos da União Soviética – entre eles o talibã maluco suspeito dos atentados – e vendiam armas à própria União Soviética, cujo poderio militar se explicava, em grande parte, por operações clandestinas que engordavam ainda mais a imensa águia autofágica.
Explicações e projeções, contudo, parecem importar menos do que a falta de perspectivas que toda essa cretinice impôs ao futuro dos meus filhos. Quando desmantelaram a União Soviética, depois que ela já havia servido de forma dedicada e oculta aos seus interesses escusos, os barões da indústria bélica pouco se incomodaram com as milhares de armas nucleares que os seus títeres haviam abandonado nas Chechênias e Casaquistões da vida. Em nome do “business”, que, como o espetáculo, não podia parar, largaram na mão de uma porção de desmiolados um arsenal atômico capaz de explodir o mundo 23 vezes, embora nunca se tenha chegado a nenhuma conclusão razoável acerca do que seria feito com as outras 22.
Mencionei meus filhos. Olhando-os, vejo-os em um mundo que, em nome de interesses econômicos, pôs bombas de hidrogênio sob o controle de loucos aptos a jogar aviões de passageiros contra edifícios. Olhando-os, vejo-os vitimados pelos que faziam guerras no território alheio, de forma cada vez mais asséptica, e, vendo explodir o próprio quintal, agora anunciam represálias ao resto da humanidade.
Não serão necessárias. O planeta já sofre essas represálias, invadido por bandidos de toda sorte, os quais, descobriu-se com atraso, sempre foram financiados pelos mocinhos.
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