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Artigos-->24. NONA PEREGRINAÇÃO ASSISTIDA -- 10/09/2001 - 08:25 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Resildo pediu-nos um momento de atenção para discorrer a respeito de sério tema dentre os que agitamos até aqui. Mas não desejou imprimir a sua forma de expressão, dando ao grupo total autonomia para refletir sobre o que nos propôs, para a elaboração da mensagem.



Após ler os nossos rascunhos, afastou-se da equipe por cinco justos dias, atribuindo as tarefas de instrutor a um companheiro da equipe dos docentes. Voltou com o cenho carregado, passando-nos a impressão da mais profunda seriedade. Foi assim que iniciou a aula:



— Vocês devem estar surpresos com a minha atitude, porque não estava no programa comentar a respeito dos traficantes e demais pessoas envolvidas com a produção, a distribuição, a venda e a garantia do comércio ilegal de drogas. É sobre isso que desejo falar-lhes. Mas não vou fazer uma exposição ex cathedra, senão que dou preferência a que me interrompam sempre que algo não estiver bem claro.



Vários parceiros impacientaram-se porque tinham desempenhado algum dos papéis aludidos no preâmbulo. Resildo, porém, foi logo apaziguando-lhes os ânimos:



— Nós havíamos combinado de não tratar desses elementos porque não queríamos emanar vibrações de baixo teor contra ninguém, muito embora tenhamos queixas em relação a muita gente que permanece enfronhada na carne, prosseguindo nas atividades de subversão do humanitarismo evangélico. Por isso, vamos orar por eles uma prece compungida, solicitando ao Pai que lhes proporcione oportunidades de reflexão sobre o que fazem, lhes dê recursos para se regenerarem e, se possível, repararem ao menos uma pequena porção dos crimes. Eu vou puxar o pai-nosso e vocês se concentrem nas pessoas que reputam as mais perniciosas para suas existências, buscando propiciar-lhes um momento de conforto consciencial, para o necessário exame de seus atos.



O tempo que levamos para estabelecer o clima de superior harmonia cármica com as forças que denunciávamos como representativas da própria maldade foi de exatas duas horas. Enquanto a turma não se enquadrava no princípio moral determinado, Resildo não deu início à prece. Mas recebemos forte ajuda dos mentores da colônia, previamente alertados para o intento do instrutor. Se dependesse apenas de nós, estaríamos até agora reunidos sem sucesso.



Seria de interesse falar como é que os benfeitores da colônia nos ajudaram. Resumindo, porque se trata de mais um tópico daqueles sem correlação com o que os encarnados conhecem, podemos dizer que ouvíamos a voz dos mentores, como se estivéssemos mediunizados ou imantados. Eles procuravam vasculhar os meandros dos nossos sentimentos, alertando-nos para as falhas mais prejudiciais ao ato de amor que nos cabia realizar. Ouvíamos palavras de incentivo, como estas:



— Deus é pai! Deus é pai! Foi Jesus quem apregoou a figura de Deus como de pai. Qual pai daria uma pedra ao filho com fome? Deus é pai de amor, de misericórdia. A sua luz alumia-nos os caminhos do bem e nos conforta para a apreensão da verdade. Deus é pai; é pai de todos nós; e a todos distribui as oportunidades de redenção. Jesus, que se poderia considerar o mais injustiçado dos homens, aquele que maior rigor poderia solicitar contra os juízes que o condenaram, pediu o quê? Pediu a Deus que perdoasse os algozes, dizendo: — Pai, perdoai-os porque não sabem o que fazem.



As incitações ao bem, ao amor e ao perdão foram surtindo efeito nos corações dos alunos, até que nos condicionamos para a emissão de vibrações saudáveis para aqueles que considerávamos nossos inimigos.



Após a prece, Resildo prosseguiu:



— Infelizmente, temos de enfrentar a dura realidade da existência desses seres infelizes. Se pudéssemos, como num passe de mágica, ainda que com o sacrifício de milhares de anos de sofrimento, tornaríamos todas as criaturas envolvidas no ramo das drogas em almas compreensíveis, ao menos no que toca ao fato de não respeitarem a integridade física e espiritual dos semelhantes.



Nicanor, um dentre os que traficaram, pediu a atenção para uma observação pertinente:



— Caros irmãos, pretendo regenerar-me sob a luz do evangelho. Os que me conhecem sabem o quanto me dou aos estudos e o quanto procuro produzir em favor do próximo. Na derradeira encarnação, trafiquei, coagido pelo próprio vício. Qualquer descrição que hoje faça poderá parecer simples vanglória, porque logrei os meus intentos, até que me apagaram como queima de arquivo. Talvez tenha sido o que de melhor me sucedeu na vida, porque não vejo como é que iria subtrair-me à influência das drogas ou às imposições dos mandachuvas. Diante da minha experiência, temo que tenha de concluir por certa inocência de muitos que se dedicam a tão nefando mister. Verdadeiramente, eles não sabem o que fazem. No entanto, quando desembocam no etéreo, são acusados tão intensamente que se vêem num verdadeiro inferno. Se Deus é pai de misericórdia, deveríamos também orar pelos que perseguem os criminosos, os quais também não sabem o que fazem.



À vista da manifestação do colega, Resildo adiou o restante da aula e nos propôs a imantação hipnótica do orador, debaixo da proposta de levá-lo em peregrinação até onde se encontravam os que o haviam executado.



Nicanor concordou de pronto e rapidamente se pôs em estado sonambúlico.



— Você está de acordo com tudo o que disse em favor de certos traficantes ou apenas se manifestou empolgado pelas palavras de incentivo evangélico que ouviu dos preceptores?



— Posso dizer que não precisei de mais do que dez minutinhos de apoio vibratório, aguardando em preces até que todos imergissem nas águas tépidas da boa vontade.



— Existe algum traço de ironia nos seus pensamentos?



— Sem dúvida, estou fabricando um tipo de reação malévola, mas faço isso com o intuito de provocar as lições de que me julgo merecedor.



— Não será esse o pior caminho para se chegar à verdade?



— É que estou habituado a receber todo tipo de impacto de forças negativas, de forma que acabei criando grossa casca para repelir as agressões. Muitos daqui passaram por crises de consciência poderosíssimas. Poucos, entretanto, estão em condições de saber o quanto sofre quem é perseguido pelos irmãos que se tornaram ferrenhos inimigos.



— Entre esses, você coloca quantos da classe?



— Não coloco nenhum, a não ser por esporádicas vibrações endereçadas em sentido geral e que se concentram em mim, por estar à mão. Estes também não sabem o que fazem.



— Você os tem perdoado em consonância com as próprias expressões do Cristo?



— Esse é o lastro de culpa mais difícil de soltar. No meu discurso, enfatizei a necessidade da prece a todos os que chamei de inocentes de certo modo, mas pensava sobretudo em mim mesmo.



— Consideramos as suas observações muito lúcidas, tanto que nos parece cediço trazer-lhe qualquer acréscimo de conhecimento evangélico. Não é verdade que você absorveu integralmente os textos sagrados?



— É verdade, não obstante, estou carente de compreensão, porque todos os parentes, amigos e companheiros me viraram as costas. Soube que me constituí em assunto de primeira página dos jornais sensacionalistas e que a foto de meu corpo desfigurado ali foi impressa, para o impacto da população ávida por novidades de sangue. Os ânimos se viram acirrados e os criminosos que me recepcionaram não tiveram a mínima compaixão por mim.



— Pela forma que você se expressa, temos a impressão de que a sua luta se desenvolveu com extrema ferocidade. Como é que em tão pouco tempo logrou agasalho junto a esta colônia? Mais ainda, como é que foi admitido na Escolinha?



— Esse é segredo que ainda não desvendei. Imagino que tenha recebido o apoio de algum figurão não identificado, mas a suspeita colide de frente contra tudo quanto venho aprendendo a respeito das ações em prol dos mais perversos, entre os quais cheguei a me incluir.



— Não terá sido essa conscientização dos males que você provocou que lhe deu mais rápido acesso a esta casa?



— Desconfiei também desse fator mas foi tão mínimo o meu arrependimento que não pude considerá-lo com peso suficiente para o equilíbrio momentâneo de minha balança cármica.



— Quantos traficantes você conheceu que se encontram em estágio de tão notória ascensão, tendo em vista o rol das atividades em desacordo com as normas cristãs?



— Conheci três, mas o dever humanitário me proíbe de revelar quem são.



— Não temos interesse algum em identificar esses indivíduos como ex-malfeitores. Todos os seres de nossos relacionamentos tiveram contas a ajustar com suas consciências. O que desejamos saber é se vocês se encontram de forma amistosa, para mútuo amparo no aprendizado que empreendem para superação dos problemas.



— Imagino que estejam fazendo referência às clínicas para drogados existentes na terra, onde as pessoas procuram nas outras a compreensão das próprias causas para o consumo dos alucinógenos, bem como os meios para enfrentarem os danos quase irreparáveis de seus efeitos.



— Guardadas as devidas proporções, é pouco mais ou menos isso aí.



— Pois bem, na verdade, entramos em conflito e renegamo-nos entre nós, como se fizéssemos de cada um o espelho do outro; e o reflexo não foi nada agradável. Na terra, o método pode até ser positivo para a cura ou atenuação dos dramas individuais, sempre acompanhado de outras atividades tendentes a ocupar o cérebro através da atribuição de responsabilidades gregárias. Não sou a pessoa mais indicada para este tipo de informação técnica. No etéreo, com certeza, a reunião dos traficantes mais aguerridos, mesmo em processo de superação psíquica dos males, haverá de ser perniciosa para os fins da salvação, porque, se me permitem repetir, eles ainda não sabem o que fazem. Aqui, o método há de ser o do interesse dos entes melhor dotados espiritualmente.



— Isto quer significar, necessariamente, que você não se entrosa neste grupo, que foi reunido justamente tendo como critério os problemas comuns e a semelhança existente entre as nossas personalidades?



— Não vejam no que disse uma crítica às diretrizes programáticas, pelo amor de Deus! Quero afirmar, ao contrário, que me sinto muito bem entre os colegas, a quem agradeço tanta afeição e tanto interesse, como se comprova nesta sucessão de sugestões que me passam através das perguntas e, principalmente, por meio da sustentação energética que estão dando-me para tão longa perquirição íntima. Mas não nego que tenho colocado objeções quanto ao método empregado.



— O que você propõe para melhorar o desempenho da turma nos estudos e na aplicação socorrista que empreendemos junto aos que estão ainda mais necessitados que nós?



Nesse ponto, Nicanor estancou. Alheou-se completamente das comunicações que tentamos estabelecer, obrigando-nos a desfazer a corrente vibratória que lhe dava a condição para a hipnose. Acordou sonolento e, sob o influxo de poderoso sedativo, adormeceu, permanecendo acamado por duas semanas. Quando voltou às aulas, solicitou permissão para ouvir tudo o que dissera durante a sessão, mas desejou fazê-lo apenas na presença de Resildo. Após mais de duas horas entretidos com a gravação, ressurgiram abraçados. Foi então que Nicanor nos pediu que esquecêssemos tudo o que dissera em transe, sendo taxativo quanto ao seu pedido de perdão:



— Pai, perdoai-me porque não sei o que faço!



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