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Discursos-->Juazeiro, no retrovisor -- 02/06/2005 - 09:28 (Paulo Maciel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
JUAZEIRO, NO RETROVISOR
Nenhuma cidade do mundo se iguala à minha!
referindo-se a Juazeiro, sua terra.
Guiomar Barreto Meira



A mais recorrente lembrança que tenho de Juazeiro é do “umbuzeiro de meu avô”, aquele que produzia os frutos mais saborosos, reservados para o prazer de “Meu Tonho”, como quase todos o chamavam.
Com mais de cem anos, ainda hoje está lá, não muito grande, como gostava de fantasiar, pois o ano passado fui visitá-lo na fazenda que hoje pertence a um primo, e reparei no seu tamanho médio. É debaixo dele que vão estar minhas cinzas, depois que eu me for.
Meus netos não acreditam quando lhes digo que a fase mais feliz de minha vida passei naquela fazenda, o “Sítio de Meu Tonho”, duas léguas para dentro da caatinga, cujos limites começavam no Serrote da Batateira.
Tendo como referência os confortos dos Shopping Center, onde se divertem, eles perguntam o que havia de tão bom naquele ermo e eu sempre prefiro anotar o que não existia: não havia água, nem luz elétrica, nem rádio, geladeira ou televisão e nem mesmo banheiro, eu dormia em cama de campanha ou esteira, acompanhado de morcegos e muriçocas e acordava às quatro e meia, para a ordenha das vacas.
Mas eu era livre, andava sozinho ou com os filhos do vaqueiro pela caatinga, bebia água de chuva, catava umbus, caçava rebançãs e pombinhas, montava em jegues e às vezes em cavalos, assistia às lutas de touros na malhada e participava das vaquejadas anuais. Um vidão!
Mas, não são apenas essas as recordações que me ligam a esse chão, onde minhas raízes estão tão fincadas quanto as do umbuzeiro de meu avô.
Não posso pensar em Juazeiro sem que tenha presente a “28 de Setembro” e a “Apolo Juazeirense”, suas filarmônicas, seus carnavais (a primeira vez que fui à “Apolo”, já com barba, quase apanhei de Tia Almerinda), as alvoradas em que, menino, saia à frente do cortejo da “28” com a lanterna que desvendava a escuridão; as corridas de cavalos e os jogos de futebol no Estádio Municipal onde, por única vez na vida, assisti a uma demonstração de cossacos; as misteriosas reuniões da Maçonaria, que tanto nos assombravam; os passeios na Rua da Apolo, tanta coisa que mantém cheio meu alforje de lembranças.
Na longínqua infância, minha vida está associada à de Guiomar Barreto Meira, parenta querida, uma força da natureza, com rica sensibilidade e inexcedível amor a Juazeiro, a Edilberto Trigueiros, poeta, escritor, compositor, casado com minha prima Dina, homem de grande dignidade, e à numerosa família que descendia de um varão ilustre, o Coronel Janjão Evangelista Pereira e Melo.
Como todos vêm, é muito fácil falar da Juazeiro do passado, sem saudosismo ou amargura, porque a vida também ofereceu outras coisas boas depois.
Em todo caso, os amigos me desculpem, mas não posso deixar de continuar nessa peregrinação pessoal pelo passado.
Como esquecer os “aguadeiros” que todo dia entravam em sua casa para abastecer os reservatórios de água, os barqueiros do rio, com suas longas varas, que nos transportavam para Petrolina, ou os pescadores de tarrafa!
E os vaqueiros, vestidos de perneiras e gibões de couro, armados de guiador – Seu Paulo, João de Gilú, Caetano, e tantos e tantos outros que formavam um grupo de extraordinária solidariedade.
A memória sempre me leva ao Café de Velhinho, à Sorveteria Glacial, ao Armarinho de Druby e ao Bazar Royal, cujo nome é um poema, à Padaria de seu Enéas,à Viação, à Farmácia de Seu Tonhá, ao Horto, ao Cemitério atrás da Banca, onde repousam minha mãe e meus amados ancestrais e onde sempre comi as frutinhas amarelas dos frondosos juazeiros.
Quem participou de um passeio a bordo nos vapores do nosso rio, tomou banho na Ilha do Fogo ou no Rodeadouro e freqüentou o BE sabe que há coisas que compensam as durezas da vida.
Juazeiro de meu tempo era cheia de personagens inesquecíveis – a começar por dr. Adolpho Viana, médico-filósofo que, quando jovem universitário, assistiu aos feridos da Guerra de Canudos e ainda trouxe para cá dois jaguncinhos órfãos, que levou para sua fazenda, o filho Dunga, inveterado jogador de gamão, “Maria Pezinho”, de pobreza infinita, mas de humanidade reconhecida por todos, às professoras Hélia e Lília Siqueira, paradigmas do magistério, Neinha, talvez o mais popular juazeirense da época, dr. Lauro Lustosa, dono dos melhores puros-sangue ingleses e pai das moças mais bonitas, Léa e Lourdes, ou ainda a Joãozinho de Dona Patú, que o Brasil e o mundo vieram a consagrar como João Gilberto, criador da Bossa Nova.
A honra que me concedem os membros da Academia Juazeirense de Letras de integrá-la na condição de sócio correspondente, me aproxima mais desta terra generosa, de povo alegre e talentoso, como é prova eloqüente seu prefeito Joseph Bandeira, acadêmico, escritor, poeta, que seduz pela oratória e pelo cavalheirismo.
Conquanto me faltem as credenciais que sobram no amigo João Fernandes da Cunha, por exemplo, não resisti ao convite para participar dessa Entidade, sendo certo que me empenharei para não desmerecê-la. Essa circunstância aumentará meus vínculos e minhas obrigações com Juazeiro e me dará oportunidade de descobrir formas de colaborar com sua gente para o seu desenvolvimento econômico, social e cultural.
Sr. presidente e demais membros da Academia Juazeirense de Letras, muito obrigado!
Julho, 2003
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- Discurso preparado para a solenidade de posse como Sócio Correspondente, a que o autor não pôde comparecer.
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