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Peça_de_Teatro-->AUTO DA COMPADECIDA EM 2 ATOS -- 01/08/2002 - 11:33 (Andreia de jesus) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AUTO DA COMPADECIDA PRIMEIRO ATO
I
PALHAÇO: (voz alta) Auto da compadecida! O julgamento de alguns canalhas, entre os quais um sacristão, um padre e um bispo, para exercício da moralidade
PALHAÇO: A intervenção de Nossa Senhora no momento propício, para triunfo da misericórdia.
JOÃO GRILO: Ela diz a misericórdia, por que sabe que, se fôssemos julgados pela justiça, toda a nação seria condenada.
PALHAÇO: Silêncio! O distinto público imagina a sua direita uma igreja, da qual o centro do palco será o pátio. A saída para a sua é a sua esquerda e há uma padaria logo ao lado e o resto é com os atores. Que se abrem as cortinas e comece o espetáculo.
(Toca uma música alegre e o palhaço sai dançando. Entram Chicó e João Grilo)
II
JOÃO GRILO: Será que a gente fala....(voltando)
CHICÓ: Vai João... (empurrando)
JOÃO GRILO: Sei não, e se ela brigar comigo. (nessa hora Chicó empurra pra dentro da igreja)
MULHER: O que?
CHICÓ: É isso mesmo que a senhora ouviu...(eles vão saindo de dentro da padaria)
MULHER: Valei minha Nossa Sinhora, meu São Crispim , meu Santo Antônio.... a minha cachorrinha tá doente.... e tudo isso é curpa de vocês!! Agora pode chamá o padre pra benzer minha cachorra.
JOÃO GRILO: Num sei não dona...
MULHER: i o que é qui vocês estão esperando.... se a minha cachorrinha morrer eu mato vocês (entra na padaria) Ai minha cachorrinha...
JOÃO GRILO: E ele vem mesmo? Estou desconfiado Chicó.
CHICÓ: Que isso, João, juro que ele vem, o problema é que o bispo está aí e o padre não vai querer benzer a cachorra.
JOÃO GRILO: quer dizer que você acha que o padre vem?
CHICÓ: Só pode vir. O doutor diz que não sabe o que o bicho tem, o jeito é apelar para o padre. Hora de se chamar padre é hora de morte, de modo que ele tem de vir. Padre João! Padre João!
JOÃO GRILO: (ajoelhando, em tom lamentoso): Lembra-te de nosso senhor, Chicó. Chicó, Jesus vai contigo e tu vais com Jesus. Lembra-te dele o chicó... calma Chicó, você não está sozinho, siga o teu caminho...
CHICÒ: o que tem eu nessa história João?
JOÃO GRILO: (erguendo-se) Ah, e você está vivo?
CHICÓ: estou , que é que está pensando?
JOÃO GRILO: Você disse que hora de chamar padre é hora de morte, eu só podia pensar que estava lhe dando agonia.
CHICÒ: Padre João!
JOÃO GRILO: Padre João! Padre João!
III
PADRE: (aparecendo na igreja) Que gritaria é essa
CHICÒ: Mandaram avisar que uma pessoa vai trazer um cachorro para o senhor benzê.
PADRE: para eu benzer?
CHICÒ: Sim
PADRE: (com desprezo) Que maluquice! Que besteira!
JOÃO GRILO: Mas padre, no dia em que chegou o motor novo do major Antônio Morais o senhor não benzeu?
PADRE: Motor é diferente, é uma coisa que todo mundo benze, mas benzer cachorro?
JOÃO GRILO: É Chicó, o padre tem razão, benzer o cachorro do Major Antônio Morais não pode.
PADRE: Como? E o dono do cachorro é Antônio Morais?
JOÃO GRILO: É. Eu não queria vir, com medo de que o senhor se zangasse.
PADRE: (sorrindo) Zangar nada, João!
JOÃO GRILO: (cortante) Quer dizer que benze, não é?
PADRE: Não vejo mal nenhum em se abençoar as criaturas de Deus. Diga ao Major que venha. Eu estou esperando. (entra na igreja)
IV
CHICÓ: Que invenção foi essa de dizer que o cachorro era do Major?
JOÃO GRILO: Era o único jeito de fazer com que o padre bezesse, tem medo da riqueza do Major. Não viu a diferença? Antes era “Que maluquice que besteira!”, agora “não vejo mal nenhum em se abençoar as criaturas de Deus!”
CHICÒ: IH.. Vejo como você agora tá apegado ao patrão.
JOÃO GRILO: Muito pelo contrário, ainda ei de me vingar do que ele e a mulher me fizeram quando estive doente. Mas fiz o trabalho com gosto só por que se trata de enganar o padre. Mas a qualquer hora eu acerto as contas com o patrão. Eu o conheço o ponto fraco do homem, Chicó?
CHICÒ: Qual é? É a besteira?
JOÃO GRILO: É a mulher, Chicó, e você sabe muito bem disso. Você mesmo sabe que a mulher dele...
CHICÒ: João, fale baixo, que o padre pode ouvir.
JOÃO GRILO: Mas todo mundo sabe que a mulher do padeiro engana o marido?
CHICÓ: Sabe, mas não sabe que é comigo, entendeu?
JOÃO GRILO: Ainda ei de me vingar dos dois?
CHICÓ: João, deixe de ser vingativo que você se desgraça. Que qualquer dia você ainda se mete numa embrulhada séria.
JOÃO GRILO: e o que é que tem isso? Você pensa que eu tenho medo?
CHICÓ: Permita que eu lhe dê os parabéns, João, por que você acaba de se meter numa danada.
JOÃO GRILO: eu ?
CHICÓ: O Major Antônio Morais vem subindo a ladeira. Certamente vem procurar o padre.
JOÃO GRILO: Ave-Maria! Fique calado sua besta não diga uma palavra e deixe tudo por minha conta. (Para o major) Ora viva, seu Major Antônio Morais, como vai Vossa Senhoria? Veio procurar o padre? (Major, silencioso e terrível, encaminha-se para a igreja mas João toma-lhe a frente) É que eu queria avisar para vossa senhoria não ficar espantado: o padre está meio doido.
MAJOR: (parando) Está doido? O padre?
JOÃO GRILO: (animando-se) Sim, o padre. Está com a mania de benzer tudo, hoje mesmo eu fiquei espantado quando ele falou :hoje eu benzo até o cachorro do Major Antônio de Morais.
MAJOR: Pois vamos esclarecer a história. Quanto a mania de benzer, não faz mal, ele me será até útil. Meu filho mais moço está doente e quer a benção do padre. Padre João! Padre João!
(Chicó tenta fugir mas João o agarra pelo pescoço)
V
MAJOR: Ah! Padre, você está aí? Procurei-o por toda a parte.
PADRE: Ora quanta honra! O que trouxe aqui? Já sei, não me dia, o bichinho está doente, não é?
MAJOR: É, já sabia?
PADRE: Já, aqui tudo se espalha num instante. Já está fedendo?
MAJOR: fedendo? Quem?
PADRE: O Bichinho?
MAJOR: Padre o senhor anda com uns modos de falar muito esquisitos.
PADRE: Peço que me desculpe, um pobre padre sem muita instrução. Qual é a doença? Rabugem?
MAJOR: Rabugem?
PADRE: Sim, já vi um morrer disso em poucos dias. Começou pelo rabo e...
MAJOR: Pelo rabo?
PADRE: Desculpe, desculpe, devia Ter dito “Pela cauda”.
MAJOR: Padre, meu nome é Antônio Noronha de Brito Morais e esse Noronha de Brito veio do conde dos Arcos, ouviu? Gente que veio nas caravelas, ouviu?
PADRE: Ah, bem e na certa os antepassados da bichinha também vieram.
MAJOR: Claro, se os meus vieram, é claro que os deles também. Quer por acaso dizer que a mãe dele...
PADRE: Mas uma cachorra!...
(O major o segura pelo colarinho)
MAJOR: Repita o que disse...
PADRE: Mas não é mesmo uma cachorra?
MAJOR: Padre, não o mato agora mesmo por que o senhor é padre e está louco, mas vou me queixar ao bispo.
PADRE: (Aflitíssimo) Mas me digam pelo amor de Deus o que foi que eu disse.
JOÃO GRILO: Nada padre, nada. Esse homem só pode estar louco com essa mania de ser grande. Até o cachorro ele quer dar a carta de nobreza! Padre, eu queria um favorzinho do senhor.
PADRE: Eu já estava esperando por uma dessas. Diga João.
JOÃO GRILO: O cachorro do meu patrão está muito doente e ele queria que o senhor benzesse o bichinho.
PADRE: E quem é o seu patrão afinal?
JOÃO GRILO: É o padeiro.
(gritos da mulher do lado de fora)
JOÃO GRILO: É a velha, com o cachorro.
CHICÒ: Como é o senhor benze ou não benze?
PADRE: Pensando bem, acho melhor não benzer. O bispo está aí e eu só benzo se ele der a permissão.
(A mulher e o padeiro entram trazendo o cachorro)
VI
MULHER: Ai, padre, pelo amor de Deus, não deixe o me cachorrinho morrer.
PADEIRO: O senhor benze o cachorro padre João?
JOÃO GRILO: Não pode ser. O bispo tá aí e o padre só ia benze se fosse o cachorro do Major Antônio de morais, gente mais importante.
MULHER: (Furiosa) Quer dizer, que quando era o cachorro do major, já estava tudo pensado, para benzer o meu é essa complicação! Olhe que o meu marido é presidente da Irmandade das Almas! E Eu vou pedir a demissão dele!
PADEIRO: Vai pedir a minha demissão!
MULHER: E de hoje em diante não me sai lá de casa nem um pão para a Irmandade!
PADEIRO: Nem um pão!
MULHER: E olhe que os pães que vêm para aqui são de graça!
PADEIRO: São de graça!
MULHER: E olhe que as obras da igreja é ele que está custeando!
PADEIRO: (Fala quase chorando) Sou eu!
PADRE: que é isso, que é isso!
MULHER: Sabe o que é isso?
(Mostra o cachorro pra ele)
PADRE: Um cachorro!
(ela joga o cachorro no chão)
MULHER: ISSO QUE EU ESTOU FALANDO, É a voz da verdade, padre João. O senhor agora vai ver quem é a mulher do padeiro!
JOÃO GRILO: Ai, ai, ai, e a senhora o que é do padeiro?
MULHER: A vaca....
CHICÓ A Vaca?!
MULHER: A vaca que eu mandei para cá, tem que ser devolvida hoje mesmo.
PADRE: Mas até a vaca? Sacristão, Sacristão! (entra em cena o sacristão)
JOÃO GRILO: Sacristão a vaca da mulher do padeiro tem que sair!
SACRISTÂO: Um momento. Em primeiro lugar os cuidados com os arredores da casa de Deus. O que é isso? Um cachorro morto no pátio da igreja!
PADEIRO: Morto?
MULHER: MORTO?
SACRISTÂO: Morto sim; Vou reclamar a prefeitura.
MULHER: Ai, ai ai ai ai ai ai ai meu cachorrinho morreu?
CHICÓ: É verdade, o cachorro morreu. Por que tudo que é vivo, morre. Tadinha, Olha só como geme...
MULHER: ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai.
SACRISTAO: Que é isso? Que é isso? Que barulho é esse na porta da casa de Deus?
MULHER: Se o senhor tivesse benzido o bichinho, a essas horas ele ainda estaria vivo. Mas tem uma coisa, agora o senhor enterra o cachorro e tem que ser em latim.
PADEIRO: É, em latim não serve.
MULHER: Em latim é que serve.
PADEIRO: Isso mesmo é em latim que serve.
PADRE: não enterro.
MULHER: Decida-se padre João.
PADRE: Não me decido coisa nenhuma. Vou é me trancar na igreja e de lá ninguém me tira.
JOÃO GRILO: é ... Desse jeito, vai ser difícil cumprir o testamento do cachorro.
SACRISTÃO: Que isso? Que isso? E o cachorro tinha testamento?
JOÃO GRILO: É claro, treze contos, deixou dez contos para o padre e três para o sacristão.
SACRISTÃO: (Enxugando uma lágrima) Que animal inteligente! Que sentimento nobre!
JOÃO GRILO: e o bichinho vai ser comido pêlos urubus!
SACRISTÂO: (cortante) Que é isso? Que é isso? Não há motivo para essas lamentações. Deixem tudo comigo.
(Entra os dois na igreja)
PADEIRO: Que história é essa de treze contos de testamento?
JOÃO GRILO: que história é essa de cachorro enterrado em latim?
(Sacristão e padre saem da igreja)
VII
SACRISTÃO: Mas ,eu já disse que fica tudo por minha conta? Eu faço tudo.
PADRE: Vocês faz tudo?
SACRISTÂO: Faço!
MULHER: Em latim?
SACRISTÃO: Em latim
PADEIRO: Você acha que está tudo bem?
MULHER: Acho!
PADEIRO: Então eu também acho.
SACRISTÂO: Se é assim, vamos ao enterro. Como se chamava o cachorro?
MULHER: Xaréu.
SACRISTÃO: Absolve, domine, animas omnium fidelium defuctorum ab amni vinculi delictorum
Todos menos a MULHER: Amém
MULHER: ai, ai, ai,a i,ai,ai,ai,ai,ai
(Sons de tiros)
PADRE: Meu Deus, que terá sido isso?
JOÃO GRILO: Corre que é cangaceiro mesmo.
PALHAÇO: Vamo imbora moçada que o negócio ali atrás tá ficando perigoso.
MULHER: Valha-me Deus! Socorro seu padre tão querendo robá a igreja.
PADRE: Ave Maria! Valhe-me Nossa Senhora!
MULHER: É severino de Aracajú, ai meu Deus!
PADEIRO: Ai meu Deus!
PADRE: Onde está severino?
SEVERINO: Aqui.
PADRE: (Desmaiando)
SEVERINO: Um momento, ninguém corra. O primeiro que tentar fugir, morre. O que é isso que está deitado aí?
PADRE: (levantando) UM PADRE!
SEVERINO: ótimo. Nunca tinha matado um padre, o senhor vai ser o primeiro.
PADRE: (desmaia)
SEVERINO: (dando-lhe pontapé) levante-se e deixe de chamego. Xilique comigo não pega. Mostre os bolsos. (tira o dinheiro) Seis contos! Mas é possivel já vi que o negócio de reza está prosperando pro aqui.
JOÃO GRILO: Depois que começou a enterrar cachorro então, faz é gosto!
SEVERINO: E isto tudo foi para enterrar um cachorro?
JOÃO GRILO: foi ( nessa hora o sacristão sai da igreja)
SACRISTÃO: O que está acontecendo aqui?
SEVERINO: Ah mais um pra lista pode entrar aí na fila...
CHICÒ: (entrando em cena) Até que fim conseguimos enterrar aquele cachorro...
SEVERINO: MAIS um , vixe que hoje o trabalho vai rende muito... vai passando o dinheiro...
CHICÓ: Eu não tenho não, quem tem é o sacristão..
SEVERINO: Deixa vê, quatro Contos. O cachorro bom danado. Já estou pensando em sair do cangaço..
MULHER: Mas é uma grande idéia, Severino. Venha trabalhar comigo a padaria. Garanto que você não se arrependerá.
SEVERINO: Que vergonha, uma mulher casada na igreja se oferecer desse jeito. Aliás já tinha ouvido falar que a senhora enganava seu marido com todo mundo.
PADEIRO: O que? é possível?
JOÃO GRILO: É tá ficando tarde e eu tenho mais o que fazer. Vamos embora Chicó.
SEVERINO: Um momento amarelinho, senta aí. Você vai morrer junto com os outros.
PADRE: Quer dizer que vai matar a todos?
SEVERINO: Tenho que garantir o meu sustento..
PADRE: È um louco!
SEVERINO: Só por causa disso Vossa Exelencia via a ser o primeiro, e leve o sacristão junto.
SACRISTÃO E PADRE: Nâo!
SEVERINO: É a chegada a vez do senhor padeiro, que terá a honra de morrer junto a sua esposa.
PADEIRO: Antes de morrer tenho um pedido a fazer.
SEVERINO: O que é?
PADEIRO: Quero que ela morra primeiro para eu ver.
SEVERINO: Concedido. Mate a mulher primeiro
MULHER: A safado!
PADEIRO: SE ao menos fosse uma pessoa de respeiro! Mas até chicó!
CHICÒ: Até chicó o que?
PADEIRO: você me desgraçõu. Caminhe na frente! Faço questão de ver você morrer!
MULHER: E então? Pensa que vou fazer cara feia? Está muito enganado, tenho mais coragem do que muito homem safado que tem por aí. (ao cangaceiro) está pronto?
CANGACEIRO: ESTOU.
(nessa hora o padeiro sai correndo e abraça a mulher e os dois morrem juntos)
CANGACEIRO: Ia matar a mulher primeiro, como o senhor mandou, mas no momento em que ia puxar o gatilho, o homem correu, abraçou-se com a mulher e morreram juntos.
SEVERINO: Chega então a vez de sua desgracencia, o amarelo mais amarelo que já tive a honra de matar. Pode ir que a casa é sua.
JOÃO GRILO: Um momento. Antes de morrer, quero dar-lhe esta gaita de presente.
SEVERINO: Um gaita? Para que eu quero uma gaita?
JOÃO GRILO: Essa gaita foi benzida por Padre Cícero, pouco antes de morrer. E tem o poder de reviver os que já morreram...
SEVERINO: Nossa Senhora! Só sendo abençoada por meu padrinho Padre cícero.
CHICÒ: Já aconteceu isso comigo, morri e João grilo tocou a gaita. Fiquei 1 minuto morto e vi o padre Cícero...
SEVERINO: mas em tão pouco tempo? Como foi?
CHICÒ: Não sei, só sei que foi assim.
JOÃO GRILO: Eu lhe darei uma oportunidade de conhecer meu padrinho Padre Cícero.
SEVERINO: Como?
JOÃO GRILO: Seu cabra lhe dá um tiro de rifle, e você vai visita-lo. Então eu toco a gaita e você volta.
SEVERINO: Sua idéia é boa, mas por segurança entregue a gaita a meu cabra. (João entrega a gaita) Agora eu levo um tiro e vejo meu padrinho?
JOÃO GRILO: Vê, não vê, Chicó?
CHICÒ: Vê demais, Está lá, vestido de azul, com uma porção de anjinhos ao redor. Ele até estava dizendo: “Diga a Severino que eu quero vê-lo”
SEVERINO: Ai, eu vou, ATIRE, atire!
CANGACEIRO: Mas capitão, quer que eu atire mesmo?
SEVERINO: Atira, cabra frouxo eu estou mandando!
CANGACEIRO: Capitão!
SEVERINO: Atire!
JOÃO GRILO: Atire logo homem, pelo amor de Deus!
(O cangaceiro aponta o rifle e atira. Severino cai e o cangaceiro pega a gaita e toca duas vezes e nada)
CANGACEIRO: Capitão! Ah, Grilo amaldiçoado, você matou o capitão.
JOÃO GRILO: Em cima dele Chicó.
(Chico pega a arma do Severino disfarçadamente e atira no cangaceiro.)
CHICÒ: João meu filho você é grande! (João vai até o corpo de Severino e tira o dinheiro)
CHICÓ: Vamo embora, João.
JOÃO GRILO:Que isso rapaz eu só saio daqui com o testamento do cachorro.
CHICÒ: João danado vamos embora pelo amor de Deus!
JOÃO GRILO: Já vou, Chico!(Fala isso indo embora)
(O cangaceiro reergue dificilmente a cabeça, pega o rifle, atira em João e morre. João entra em cena segurando o espinhaço e senta-se no chão. Chicó volta correndo.)
CHICÓ: O que foi isso João?
JOÃO GRILO: O cabra estava vivo ainda e atirou em mim.
CHICO: Ai, minha Nossa Senhora, será que você vai morrer, João?
JOÃO GRILO: Acho que vou, Chicó, estou ficando com a vista escura.
CHICÒ: Ai, meu Deus, pobre do João Grilo vai morrer!
JOÃO GRILO: Deixa de latomia, chicó, parece que nunca viu homem morrer! Nisso tudo eu só lamento Ter perdido o testamento do cachorro. (Morre)
CHICÓ: João! João! Morreu! Ai meu Deus, morreu, pobre João Grilo! Tão amarelo, tão safado e morrer assim! Que é que eu faço no mundo sem João? João! João! Não tem mais jeito, João morreu. Ai meu Deus, o que vou fazer da vida sem João! João!. (Sai de cena)

AUTO DA COMPADECIDA SEGUNDO ATO

PALHAÇO: Peço desculpas ao distinto público que teve de assistir a essa pequena carnificina, mas ela era necessária ao desenrolar da história. Agora a cena vai mudar um pouco. Agora vai ser o julgamento daqueles que morreram a alguns tempos atrás....
(Sai o palhaço)
JOÃO GRILO: (Para o cangaceiro) Ei por que você me matou?
CANGACEIRO: E você não me matou primeiro?
JOÃO GRILO: eu sei, mas você já estava desgraçado mesmo, podia Ter me deixado vivo.
SEVERINO: eu, por mim, agora que já morri mesmo. Estou achando até bom.
JOÃO GRILO: É, estão todos muito calmos por que ainda não repararam naquele freguês que está ali, na sombra, esperando que nós acordemos.
(Toca música espantosa)
PADRE: Quem é?
JOÃO GRILO:Você ainda pergunta? Desde que cheguei aqui comecei a sentir um cheiro ruim danado. Essa peste deve ser o Diabo.
ENCOURADO: (saindo das sombras) Calem-se todos. Chegou a hora da verdade. Vocês vão pagar por tudo que fizeram.
PADRE: Mas o que foi que eu...
ENCOURADO: Silêncio! Chegou a hora do silêncio para vocês e do comando para mim. Que vergonha! Todos tremendo! Tão corajosos antes tão covardes agora! O senhor sacristão, tão cheio de dignidade, o padre, o valente severino.. E você, o grilo que enganava todo mundo, tremendo como qualquer safado! Vocês vão todos para o fogo do inferno, para padecer comigo. Vamos todos para dentro.
JOÃO GRILO: Ah, você acha que me entreguei?
MANOEL: E com quem você vai se apegar?
JOÃO GRILO: Com alguém que está mais perto de nós, por gente que é gente mesmo. Querem ver eu dar um jeito nisso?
TODOS: Queremos João.
ENCOURADO: É isso que eu quero ver.
JOÃO GRILO: Eu apelo para a mãe da justiça!!
ENCOURADO, rindo: Ah, mãe da justiça! Quem é essa?
MANOEL: Não ria que ela existe.
SACRISTÃO: E Quem é?
MANUEL: A misericórdia.
CANGACEIRO: Foi coisa que eu nunca vi.
SEVERINDO: Onde mora? E como chamá-la?
JOÃO GRILO: Ah isso é comigo. Vou fazer um chamado especial, em verso. Garanto que ela vem.
Valha-me Nossa Senhora,
Mãe de Deus de Nazaré!
A vaca mansa da leite,
A braba dá quando quer.
A mansa da sossegada,
A braba levanta o pé.
Já fui barco, fui navio,
Mas hoje sou escaler
Já fui menino, fui homem
Só me falta ser mulher.
ENCOURADO: Vá vendo a falta de respeito viu?
JOÃO GRILO: Falta de respeito nada! Esse foi o versinho que minha mãe me ensinou.
Já fui barco, fui navio,
Mas hoje sou escaler
Já fui menino, fui homem
Só me falta ser mulher.
Valha-me Nossa Senhora,
Mãe de Deus de Nazaré!
(NOSSA SENHORA ENTRA)
ENCOURADO: Lá vem a compadecida! Mulher em que tudo se mete!
COMPADECIDA: E para que você me chamou, João?
JOÃO GRILO: É que esse filho de chocadeira quer levar a gente para o inferno. Eu só poderia me apegar com a senhora mesmo.
ENCOURADO: As acusações são graves.
COMPADECIDA: Ei sei das acusações.
ENCOURADO: E então?
COMPADECIDA: (volta-se para manoel) Interceda por esses pobres que não tem ninguém por eles, meu filho. Não s condene.
MANOEL: Todos eles tem pecados graves.
COMPADECIDA: Sei que não são dos melhores. Mas sei que eles fizeram isso por medo.
ENCOURADO: Medo? Medo de quê?
PADRE: Medo do sofrimento.
SACRISTÃO: Medo da fome.
PADEIRO: Medo da solidão.
MULHER: Medo dos obstáculos.
SEVERINO: Medo de Ter medo
MANOEL: Mas esse dois? Você sabe o que o padeiro e a mulher faziam com João..
JOÃO GRILO: Se é por mim, eu já me esqueci.
MANOEL: Pode alegar alguma coisa em favor deles?
COMPADECIDA: O perdão que o marido deu à mulher na hora da morte, morreram juntos.
MANUEL: Isso a favor dele, mas e ela?
ENCOURADO: Enganava o marido com todo mundo.
MULHER: E você não se meta...
PADEIRO: A Prece que fiz a ela antes de morre, deve Ter alguma validade.
COMPADECIDA: Eu alego em favor dos dois.
MANOEL: Está recebida a alegação. Pode sair por ali.
COMPADECIDA: Quanto ao severino e o cabra dele
MANOEL: Os dois estão salvos. Saiam por ali.
ENCOURADO: É um absurdo contra qual eu...
MANOEL: Protesto negado.
PADRE: E nós?
ENCOURADO: E eles? Qual a sentença?
MANOEL: Espere...
JOÃO GRILO: Posso falar senhor?
MANOEL: Fale João!
JOÃO GRILO: os dois ultimos lugares do purgatório estão desocupados?
MANOEL: Estão.
JOÃO GRILO: então mande esses dois para lá
COMPADECIDA: Eu ficaria muito satisfeita
MANOEL: Está concedido. Podem ir vocês dois. E você João Grilo?
JOÃO GRILO: Eu acho que meu caso é salvação direta.
ENCOURADO: E as suas trapaças?
MANOEL: É João isso foi grave...
COMPADECIDA: Ó meu filho, ele já sofreu como nós, não o condene, deixe o João ir para o purgatório.
JOÃO GRILO: Purgatório não... eu quero ir pro céu...
COMPADECIDA: Deixa comigo.. Peço-lhe então, muito simplesmente, que não condene o João
MANOEL: O caso é duro. Acho que não posso salvá-lo.
COMPADECIDA: Então de-lhe outra oportunidade.
MANUEL: Você se dá por satisfeito.
JOÃO GRILO: demais. Quem deve estar danado é o filho de chocadeira. (o encorado se aproxima de João a compadecida entra na frente e o encourado da um grito furioso e sai de cena)
JOÃO GRILO: Que foi que deu nele meu Deus!
COMPADECIDA: Se mordeu de raiva.
JOÃO GRILO: então deixa eu ir que está ficando tarde.
MANOEL: Você só volta se conseguir fazer uma pergunta que eu não souber responder.
JOÃO GRILO: Deixa eu ver, humm... quando vai ser sua próxima ida ao mundo?
MANOEL: Ah João, isso é um mistério...
JOÃO GRILO: Quer dizer que posso voltar
MANOEL: Pode joão.Vá com Deus.
JOÃO GRILO: Deus e Nossa Senhora
(João grilo sai)
MANOEL (Saindo de cena de braços dados com a mãe) SE a senhora continuar a interceder desse jeito por todos, o inferno vai terminar sem ninguém, feito repartição pública, que existe mas não funciona.









Comentarios

Guilherme  - 27/07/2019

O texto é péssimo da um tom ridículo a uma das grandes obras de Ariano Suassuna, deveriam manter o texto original!

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