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Cartas-->O TIGER -- 13/09/2011 - 18:16 (Marcelino Rodriguez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
PRÓLOGO
Durante minha carreira, algumas pessoas de minhas relações sugeriram que eu escrevesse minha autobiografia. Sempre relutei, porque em livros e textos anteriores já há muito daminha subjetividade e alguns fatos vividos, desde "O Observador de Pardais" e, além disso, muita coisa que vivi de ruim e não foram poucas, prefiro deixar no esquecimento eterno. Uma noite de anos atrás, porém, tive um sonho que alguma obra minha e minha vida estavam passando num filme. Então, juntei a superstição do que me falaram, com mais o sonho e as experiências extremas de afetividade e espiritualidade que passei no ano de 2006, com meu envolvimento com Sara e o aprendizado com Miguel, que assim como Cíntia e Flávio tiveram os nomes trocados e fiz aqui alguns apontamentos dignos de serem filmados, caso fosse um roteiro esse livro. . Posso imaginar cada cena, cada quadro, cada diálogo como uma cena. Há também conhecimentos valiosos ao longo do livro, que se bem lidos, podem surpreender as pessoas mais profundas e perspicazes. O fato de chamar-se "O Tigre de Deus Em SeuJardim" é mais uma licença poética. Um Tigre não é bom por ser, mas é belo e natural. Muitas vezes, nossa vida é como o Tigre. A questão do Jardim é que os fatos narrados e vividos foram possíveis porque vivenciados pela singularidade de uma alma e aquilo que ela rega: literatura, estética e conhecimento. Se um dia quiserem filmar algo sobre mim, como no sonho , podem usar esse livro. Quem sabe não fiz, nesses tempos antiliterários, um romance ? Se os leitores sentirem vontade de conhecer a Oração Centrante ou os Quatro Pensamentos que transformam a mente do Budismo Tibetano, já terá valido a pena. E Sara, se um dia velhinha, sorrir num pedaço de sol ou de sombra da memória ao lembrar de uma de minhas declarações shakespereanas , dar-me-ei por feliz, esteja onde estiver.
Agosto, 2011. Zona da Mata, Minas.

Os seios dela eram pequenos, porém lindos, com seus dois botões de rosas como que fechados. Acordei há pouco de um sonho com Sara, quando já fazem uns cinco anos que não tenho mais notícias dela. No sonho, ela havia sido encontrada morta na piscina de sua casa, sem a parte de cima do biquíni e eu via sua imagem na água , apenas com a parte de baixo, ainda viva, nadando, enquanto alguns parentes meus que ignoro completamente por pura antipatia davam noticias de que ela havia morrido. Não entendi o enredo disso, mas acordei melancólico , porque essa deve ser a terceira ou quarta vez que sonho com ela nua da cintura para cima e sempre tem mais gente que participa dessa beleza e dessa visão ou que pode participar, o que causa-me ciúmes e angústia. Como tenho dons proféticos, tenho medo que o sonho tenha algo de real. Não consigo, misteriosamente, , conviver com a idéia de perdê-la para sempre. Lembro que quando ela dizia que ia morrer um dia , eu ralhava com ela.
> -- Para com isso!
-- Ué, mas um dia não vou ter que deixar esse corpo? -- Ela dizia, como se deixar de existir fosse algo assim como jogar um cotonete na lata do lixo. Na ocasião, eu era seu namorado, e aquela simples idéia de perdê-la era bastante perturbadora. Agora, uma madrugada fria anos depois, não sei se influenciado por estar escrevendo parte de nossa história, volto a sonhar com ela desnuda em parte e sempre linda. E, novamente, sinto angústia e inquietação. Sara talvez seja parte da minha alma feminina, com suas deusas infernais, e tenho que aceitá-la assim cruél, bela e imperfeita, sem tentar consertá-la ou amoldá-la a meu racionalismo.

O mito da minha vida começa quando meu pai pegou o navio na terra do Dom Quixote e singrou os mares em busca de sorte e aventura. Minha mãe veio da Bahia De Todos os Santos, Brasil, onde é comum a visagem de lobisomens, mulas sem cabeça, sacis, deusas do mar! O país da minha mãe tem de tudo, porém encontrar um homem elegantemente letrado é tão raro quanto ver um calango no Polo Norte Dos Gelos.

Eu estava numa das elevações que havia numa das ruas que cortavam os conjuntos habitacionais da Cohab, em Senador Camara. Era carnaval. Um bloco barulhento passava com carrascos, piratas, clovis, piranhas, palhaços, pierrots, colombinas e mais o que houvesse de fantasioso e de uma gente mascarada. Formando um todo que parecia uma orquestra mágica. Uma música tocava muito alta de um dos prédios.
>>
>> "Macunaima, indío branco catimbeiro
>>Negro sonso feiticeiro
>> Mata a cobre e dá um nó"
>> Ali , eu percebi pela primeira vez que estava sozinho e que a vida na terra seria para mim uma espécie de exílio. Senti que os mascarados do carnaval vinham de outro mundo e aqueles que ali estavam eram como sombras da realidade maior. Ali, naquele alto de monte, tive meu primeiro sentimento do mundo feiticeiro e bebi o gosto do infinito.

Dois fatos atormentavam o menino louro de beleza clássica que fui: a bronquite e as assombrações. A bronquite levou-me as catarradas dramáticas e a conhecer a pobreza e o sofrimento do povo nos hospitais públicos, onde pouco se incomodam de dar qualidade de vida à vida. Minha mãe costureira, pobrecita, sofria comigo levando-me muitas madrugadas aos postos de saúde, onde eu pensava a cada vez que iria sucumbir a tanto sofrimento. As vizinhas confabulavam as mais estranhas simpatias para curar-me. O que eu tomei de beberagem foi uma coisa de cinema. Lembro que até puseram debaixo do meu travesseiro calcinhas de três moças virgens das três raças da terra: negra, branca e índia. O caso é que um dia, após sair de uma clínica de nebulização, senti que nunca mais voltaria a ter bronquite.Internamente, tive essa certeza na alma porque via uma luz branca em tudo, como se fossem asas de anjos em estado de ar. Com relação as entidades, minha mãe levava-me a longínquos centros de umbanda, onde as pretas velhas tratavam-me as cachimbadas. Num desses centros, que acredito era de Oxalá, pois era todo azul e branco e tinha uma estrela de seis pontas, como a dos judeus no centro da parede, atrás das velhas e das diversas entidades de gesso que formava o altar. Subitamente, a fumaça do cachimbo foi me causando um tremor nas pernas, numa sedução que queria levar-me a outros mundos desconhecidos. Consegui, porém, manter-me na terra. No entanto, percebi que eu tinha um outra parte em mim abissal, profunda e infinita que desconhecia. Passei muitos anos disputando a noite meus brinquedos com as entidades e fantasmas nas noites compridas e procurei esquecer a experiência do tremor. Numa dessas noites de terror infinito, acordei gritando e sobressaltado, com o coração a sair pela boca. Foi quando minha mãe ensinou-me a rezar o credo e de repente a noite se encheu de paz e os anjos levaram-me a dormir. Havia descoberto a oração.

Costumava ficar fascinado diante das bancas de revistas e mesmo ainda sem saber ler, pedia que minha mãe comprasse-me gibis. O que ocorria ,porém, eram fatos raros nas minhas relações com as palavras e imagens. Com a ajuda de um familiar aqui, uma colega de infância acolá e da fada da noite que me dava seu seio direito para sugar enquanto ia explicando-me os segredos do alfabeto, aprendi a ler de modo sobrenatural, praticamente sozinho.Porque eu não apenas lia como entendia o sentido. Já disse que o país da minha mãe, ainda hoje, quinhentos anos após a colonização, não é alfabetizado nas letras republicanas e lendárias que formam damas e cavaleiros de valor. As pessoas sabem que as letras existem, mas não é ensinado a elas que as mesmas tem que ser estudadas e obedecidas e que possuem princípio, meio e fim, desenho e sons. Assim, a população funciona de modo aleatória e as mortes simbólicas acontecem diariamente, pois a população nada sabe da Odisséia.

Aos poucos, minhas leituras iam mudando das cidades da Disneylândia, como Patópolis, para a Atenas de Platão. Houve um tempo em que eu estudava num colégio para professores e era o único varão da sala e o solitário freqüentador da biblioteca, onde eu viajava ao passado e ao futuro, na companhia somente das teias de aranha do telhado, da poeira e dos personagens dos volumes que lia.No país da minha mãe os nativos acham que podem ser interessantes sem cultura e sem leitura, o que não deixa de ser inacreditável. Tornei-me uma celebridade e uma ilha, porque somente eu conhecia os contos de fadas e meus versos começaram a correr o país abrindo e fechando espetáculos os mais inusitados. Passei a não entender o mundo morno e estúpido dos iletrados e subletrados, nem como o povo consegue viver com a faca nos dentes nas relações pessoais do dia a dia, nem porque as coisas não funcionam direito no país, nem porque não existe preocupação alguma que as coisas não apenas sejam, mas que sejam feitas belas e da melhor maneira. A minha solidão e meu abandono entre as gentes do país da minha mãe começou a dar-me saudades da Europa que corre no meu sangue elegante como um cavalo de hipismo.

Os anoezinhos macabros e corruptos do país nunca facilitaram minha vida e vivi entre os nativos as aventuras mais pitorescas e bizarras enfrentando o dia a dia no país muito além que qualquer realidade concebida ou inconcebida do mundo. Aqui , na versão das bananeiras, se come os ovos de ouro sem alimentar a galinha.

FINAL DOS ANOS OITENTA, DÉCADA DE 90
Em parte, influenciado pela literatura de Fernando Pessoa, comecei cedo meus estudos da verdade conhecendo os rosacruzes, em 1988. Uma década após, num desses ritos de passagem de um grau para o outro, conheci Dora, uma morena bela e alta qque pertencia a outro dos templos da Ordem, na Zona Sul do rio de Janeiro. Estávamos na cantina, conversando umas idéias. Dela emanava uma força quase "vísivel",o que é uma das prerrogativas dos esotéricos que verdadeiramente trabalham seu interior. Ela trazia uma cruz egípcia, a Ansata, ao pescoço. Os cabelos pendiam preenchendo os ombros e parte do pescoço, enquanto ela comia um lanche elegantemente.Estávamos felizes pela beleza do ritual que vivenciáramos. A humanidade deveria procurar mais experiências como essa que passamos hoje, você não acha? --- Perguntei-lhe.
__ O ser humano não é feliz porque é mesquinho. Aprenda isso,
>Irmão, -- disse ela, limpando a boca com o guardanapo. .Hoje ainda, quase cotidianamente, dou de frente com a verdade dita por Dora naquela noite iluminada e já distante no tempo, em quase todas as esquinas que passo, aqui e além.


BIBLIOTECA NACIONAL, RIO DE JANEIRO
Saio da Biblioteca Nacional com uma verdadeira vertigem, após a leitura das Flores do Mal de Baudelaire. Depois de lê-lo, o mundo havia se transformado a meus olhos completamente. "Tende Piedade Satã, de nossa longa miséria, longa miséria!", ecoava em minha mente os versos do frances, enquanto automóveis e pessoas pareciam sonâmbulos de um pesadêlo. Para Charles, a salvação humana só pode dar-se se o demônio libertar a humanidade do seu jugo, uma vez que segundo ele as almas humanas são débeis para a disciplina. "È o demônio que nos move e até nos manipula" . Ninguém fica indiferete, após ler esse livro, de sentir um arrepio de verdade sobre o império do mal que a humanidade profana obedece cegamente. Os verdadeiros cristãos são cruzados que se rebelam contra o demônio, buscando subjulgar sua nanureza decaída com a disciplina do combate espiritual e, embora vez ou outra, possam sucumbir ao erro e ao pecado, perdendo algumas batalhas, ao fim acabam pela bravura e pela graça, alcançando a redenção. São aqueles que o Messias falou serem "nascidos do espírito". Lembro-me que sai da Biblioteca pela Avenida Rio Branco hipersensível, percebendo que tinha pisado em um universo paralelo. Era capaz de ver os perversos hum tempo futuro sendo levados >> as profundezas do inferno pelos demônios alados e escamosos que os acompanham como dragões; era capaz de ver isso com nítidez num crepúsculo infinitamente melancólico, hollyhodiano.

PETRÓPOLIS, CARNAVAL DE 1998
A Luz da Ásia,Buda, chegou em minha vida através de uma mulher jovem, Padma,criatura linda e de puro amor a quem devo minha iniciação. Americana de vinte e cinco anos, ela ensinava vestida de monja em Santa Tereza na casa de uma de suas alunas, quando a conheci. Fui com um irmão da Ordem Martinista, a seu convite, assistir a uma de suas palestras. Já estávamos todos a espera,quando entra Padma sorridente,falando um portugês quase perfeito,com sotaque; descalça, os longos cabelos presos num rabo de cavalo. Quando ela sentou-se, percebia-se que ela não raspava o >> sentou-se, percebia-se que ela não raspava o sovaco. Tinham umas quinze pessoas na casa. Ela explanou primeiro sobre as quatro nobres verdades do Budismo, que são a base de toda doutrina:sofrimento, impermanência, causalidade e o darma, que é a maneira de se libertar a mente das ilusões e do sofrimento. Disse que seu mestre na pratica era um chinês e que a linhagem da qual ela fazia parte, Nyngma,estava agora passando um ensinamento mais veloz de libertação, que era "Sentar Em plena Atenção", e todos passamos a praticar em silêncio. Depois, teve uma jovem discutindo em voz alta com a Monja sobre determinado assunto da doutrina e fui intervir para conciliar e ela , Padma,virou-se para mim brava e irônica,perguntando se eu era responsável pela paz mundial. Durante quase toda nossa relação, ela surpreendia-me com intervenções incisivas que criticavam o que ela dizia ser superficialidade na minha visão espiritual. Tinha vindo também com ela dos Estados Unidos um jovem,John, que também estava na casa dos vinte e tantos anos e a ajudava nas praticas e na organização. Ela disse que faria um retiro no carnaval e convidou a quem quisesse ir, onde disse ainda que daria o ensinamento completo. Resolvi na hora participar. Pressentira que aquela jovem americana era uma preciosidade. No dia marcado, arrumei minhas coisas para quatro dias e parti para a Serra.
Fui o último a chegar. A casa ficava na parte alta do bairro central de Petrópolis, de frente para as montanhas e com um jardim variado. Lá estavam Padma, que veio atender-me na porta rindo, porque segundo ela um garotinho chamou-a de bruxa por conta de sua vestimenta, e mais Jonh, uma jovem que depois descobri chamar-se Emília e uma senhora de seus sessenta e cinco anos que falava pelos cotovelos. Padma disse que a partir daquele momento, estávamos em retiro, cada qual trataria de sua roupa, comida especial para desintoxicar e muita meditação. O clima, o silêncio e as praticas começaram em vinte e quatro horas a trazer-me experiências muito intensa e surpreendentes. A maior dela, um contato direto com a mente do Buda, o que levou-me em determinados momentos a estar no "mesmo espaço" mental de Padma. Num desses momentos, em que meditávamos, uma borboleta linda pousou em cima do meu punho direito.
--- Padma, por que acontece isso comigo?
--- Continua praticando para aumentar seu mérito -- disse-me com os
olhos lindos e arregalados ao contemplar a enorme boroboleta azul com detalhes em amarelo e preto nas asas como se fossem dois olhos, um olho em cada asa. Minhas emoções tomavam formas sagradas e parecia que eu fazia viagens por séculos de sabedoria. Também surpreendi-me com ciúmes de Padma e Jonh numa tarde em que eles tocavam uma música de Symon e Garfunkel, America, em Inglês. Chamaram-me sorrindo para participar, mas eu estava cheio de inveja e me queimando por dentro de sentir aquilo. Houve momentos de grande beleza poética naqueles três dias e meio, com as tempestades e os raios noturnos que caiam, iluminando a escuridão das montanhas e o interior da casa.
-- Por que será que o universo está respondendo a vida desse jeito? --
Padma perguntou a nós, que estávamos em silêncio tomando chá de gengibre. Particularmente a mim, agrada-me a idéia que a natureza ponha um dia as coisas em seus lugares, pois a humanidade corrompe o planeta de um modo imperdoável. Com tudo que ia acontecendo, as meditações, os chás e o clima, fiquei com a mente pura, limpa e alerta, com a sensação de que poderia viajar sobre as nuvens e universos, como se o mundo inteiro fosse como a canção "O Delfin Azul" e eu um boto iluminado que podia nadar na imensidão do espaço como nos mares. Um dia antes de vir-me embora, padma mostrava seu álbum de fotografias a Emilia, a jovem que estava conosco no retiro e eu a observava comovido o quanto ela ficava feliz, mostrando as viagens que fizera a China, Butão, Indonésia. Para Padma, a próxima vez que Buda vir a manifestar-se será como mulher; no altar dela, existia a imagem dessa Buda do futuro, em bronze, junto com incensários e outras relíquias do budismo tibetano, além de uma vela queimando permanentemente. Uma hora houve que começou um pequeno incêndio, pois com o vento, a chama chamuscara parte do papel de parede descascado que estava atrás do altar, sem que ela tivesse percebido, pois estava na cozinha com a senhora e Emilia. Alertei-a, apontando com os percebido, pois estava na cozinha com a senhora e Emilia. Alertei-a, apontando com os dedos a chama que subia.
--- E por que você não apagou, seu revolucionista? Obrigado.
O sotaque dela as vezes criavam palavras engraçadas, como essa "revolucionista". Mas falava muito bem para o pouco tempo que estava no país. Fiquei calado.
Na despedida, ela ariu a porta, sempre com a roupa de monja e não permitiu que eu a beijasse no rosto. Eu agora voltava pela Serra pensativo e transformado. Nunca mais seria o mesmo. A semente do Buda estava plantada em mim. O que faria agora que sabia dessa minha natureza secreta? Como conciliar a vida sagrada dos Budas com os negócios cotidianos e sobreviver? Olhava as montanhas e tinha a impressão que elas me respondiam que eu iria saber.


ANO DE 2003, INÍCIO DO VERÃO
Talvez pelo fato de ter mãe baiana, acabei cruzando na vida com uma personagem que Jorge Amado adoraria criar: mãe Nancy. Era uma morena típica dos subúrbios cariocas, cabelos encaracolados, quadris largos e sinuosos, desses que fazem um homem virar a cabeça. Fumava como uma e exalava sensualidade. Vivia em crise com o marido, que costumava tomar cerveja comigo. Ele tinha uma amante na Vila Mimosa, que é uma tradicional zona do Rio de Janeiro. Nesse dia que apresentou-me-la seu marido, estávamos num bar onde se apresentava um grupo de pagode.
-- Nancy, esse aqui é aquele amigo meu que é escritor.
-- Bom - disse ela me olhando bem o rosto como se quisesse fazer dele
uma leitura.
--- A senhora é a moça que joga búzios né?
--- Moça ou senhora? Decidi ai , rapaz.
-- Ah, tá, desculpa. È que penso as mães de santas mais velhas. Eu vi
o cartaz na sua casa na vila. Quem sabe a senhora pode me ajudar.
Estou com um problema sério de negócios.
--- Vai lá em casa na quarta que te atendo, se quiser. È o dia da gratuidade.
Ficamos conversando sobre religiões, candomblé, orixas. Ao falar
disso, os olhos dela brilhavam.
--- Os crentes pensam que os candoblecistas tem algo contra Jesus e como sou uma mulher de sorte tem uma crente bem ao lado da minha casa. Vive em pé de guerra comigo. Ela põe o CD cristão a toda altura, ai eu me enfezo e ponho meus pontos de macumba. Não deixo por menos --- Falava rindo, como se gostasse daquela intriga com a vizinha. Conversamos ainda um pouco sobre astrologia e logo ela foi embora com o marido e ficou acertado que eu a veria quarta-feira.
Cheguei na hora marcada e ela atendeu-me, tomando café.
-- Quer?
-- Aceito sim. Obrigado.
Acendeu um cigarro e disse que iria se preparar para jogar para mim. Voltou do aposento que entrara, uma porta protegida por uma cortina de trininhas plásticas vermelhas e brancas e voltou com um véu na cabeça. Sentou-se na mesa e pediu para ver minhas mãos, mandando-me sentar a sua frente. Na mesa entre nós, havia varios cordões desse que usam os africanistas.
--- Você é de Ogum com Iemanja. Tem um espírito antigo e muito batalhador. È sofrido e já passou muita dificuldade. Isso eu vi ontem pela numerologia e to confirmando aqui com seu espiritual disponível. Você é uma espécie de campo de guerra onde brigam espíritos desse e de outros mundo. Tem que cuidar desse espiritual.
--- Mas fala, meu filho, o que te trouxe?
--- Bem, eu tenho um pequeno comércio e meu fornecedor está me prejudicando muito, sabotando meus clientes, atrasando minhas entregas, me tratando friamente, sem amizade.
--- Outra coisa, filho. Você é invejado.
--- Com a vida que tenho?
--- As pessoas invejam só dinheiro não, filho. Talento, alegria, sinceridade, isso causa inveja também. Você quer que a mãe dê um jeito no seu fornecedor? Me dê o nome dele.
-- Durval menezes.
-- Deixa ele com a mãe.
-- O que a senhora vai fazer? Veja lá, hein, eu por mim só quero que ele pare de me atrapalhar, pois estou tendo muito prejuízo.
-- È só uma lição.
Ela já tinha jogado os búzios e disse também que eu sairia do país em breve, ia "correr mundo" . No momento achei inviável, pois estava preso em relacionamento e negócios. Isso era em Fevereiro de 2003. Em janeiro do ano seguinte, eu iria para a Argentina, coisa que nunca havia pensando. Ela tornou a pegar minhas mãos e começou a rezar em Yoruba. Ainda revelou-me coisas do mundo espiritual, disse que até encontrar a mulher certa eu passaria por relacionamentos variados, mas que não me preocupasse porque eu era uma ponte de luz para os espíritos e eles sempre olhariam por mim. Desde esse dia, ficamos muito amigos e tinhamos o hábito de emprestar dinheiro um ao outro. Eu sempre levava-lhe cigarros. Na segunda feira seguinte, eu fui ao meu fornecedor, pois estava com meus despachos comerciais em atraso. Ao contrário das outras vezes, Durval atendeu-me todo humilde.
-- Entra, rapaz. Você não tem idéia de como está isso aqui.
-- O que houve?
-- Nada funciona direito. Nem os computadores, nem as máquinas.
Ele falava isso desorientado, mexendo nos botões e arrumando uma pilha de papéis.
--- Mas o que aconteceu? - Eu perguntei quase rindo da situação.
-- Não sei; o técnico tá vindo ai. Desde que cheguei que é isso que vocẽtá vendo. Já vou tomar uma dura dos clientes que não vou poder fechar a tempo, desculpa ai, sei que tou em atraso contigo também, mas o seu trabalho a gente faz rápido, assim que as coisas voltarem a funcionar. Volta amanha, meu caro. Isso aqui hoje pode crer que vai ser manutenção o dia inteiro. Sai da empresa pensando como a vida é engraçada. Mãe Nancy que não tinha lá grandes recursos, uma quase desacreditada, fez parar a tinha lá grandes recursos, uma quase desacreditada, fez parar a arrogância daquele homem que ganhava pilhas de dinheiro todo dia e de suas máquinas infalíveis. Parei num bar para tomar um chopp com muito orgulho da minha amiga espiritual. E ele deve ter merecido, pois eu não pedi que ela fizesse nada. Mãe Nancy, porém, mostrou-me o poder que vem dos tambores da África ao vivo e a cores. Isso fez-me lembrar o verso de JonhKeats que resume tudo: "a beleza é a verdade, a verdade é a beleza." A mãe África ama também seus filhos brancos.

CÓRDOBA, ARGENTINA, JANEIRO A MARÇO DE 2004Apesar da intervenção de Mãe Nancy, acabei viajando para Córdoba, Argentina, em Janeiro de2004, falido e solitário. Um amigo meu Rolles, que era de lá e comprou minha biblioteca, pois era livreiro, disse que eu procurasse lá seu irmão José, que tinha um comércio de verduras. Preveniu-me que o irmão era viciado em jogo de todo tipo, de cassino a corrida de baratas. Porém, se eu conseguisse fazer dele um amigo, ele era capaz de assaltar para me dar-me de comer. de comer. Falava isso comigo, enquanto lia o Tao Te King, na feira do livro da Cinelândia. Vendi o que pude e dei o resto e ainda com cem dólares que me dera um amigo comunista por amizade e peguei o confortável ônibus de dois andares em praticamente três dias de viajem. Na alfândega, entrei com o passaporte espanhol que tirara tempos antes. Estava decidido a não mais voltar. Sentia-me traído de fazer, fazer e não encontrar retorno razoável. Se pudesse, mudava até a alma. Iria vender verduras e mandar a literatura para os quintos dos infernos, se pudesse. Lá chegando, depois de pegar outro ônibus em Pousadas, irritado de ainda ouvir Roberto Carlos em espanhol na madrugada da estação, vi logo do taxia ainda, ao chegar no bairro , com um homem barbado com cara de pistoleiro mexicano, banguelo e sujo. Era o José, sentado no caixa da verduraria deserta aquela hora, cerca de dez da manhã. Cheguei com a mala azul que o próprio Rolles dera-me e mais duas bolsas. Eram toda minha riqueza na vida. Além do bilhete em mãos escrito como recomendação pelo meu amigo livreiro “"excelente escritor e um amigo de grandes idéias. Ajuda-o ai. Abraços. Rolles". --- Queda-te – Falou José sem pensar muito, perguntando ainda se eu bebia cerveja. --- Sim. Chamou um rapaz de nome Ivan e mandou que ele pegasse três Quilmes geladas. Prevenido contra sua compulsão por jogo, espalhei meus dólares, cerca de oitocentos ao todo, por meias, livros e nos dois passaportes. Disse-me que eu ficasse a vontade e dormisse no quarto com a Celina, que fora mulher do Rolles e era feia como um demônio e sua sobrinha , Rosângela, filha de Celina e Rolles, que tinha uns vinte e seis anos e , ao contrário de Celina, era bonita e nas palavras de Rolles, que eu tinha que ter cuidado para que a filha dele não me matasse na cama. Rolles me disse, abrindo uma cerveja que a partir agora eu era da família. Não havia nem televisão nem geladeira na casa. O banheiro não tinha porta. Logo na primeira noite, chamou-me para conhecer o Cassino da cidade que ficava a duas horas de Táxi. Não vi Rosângela, que era minha expectativa, o dia inteiro. Acabei partindo com José para o Cassino que pareceu-me uma espécie de Titânic de outros tempos, com europeus falidos. Vi-me andando num tapete verde entre crupies, drinks, roletas, barallhos, fumaça de cigarro e máquinas dignas de Lãs Vegas. Tudo como num filme. Cansado da viagem, adormecia com meu copo de uísque nas mãos, quando fui despertado pela voz de José:-- Perdi tudo, louco. Vou matar-me. Tou destruído. Toca você meu negócio e casa com minha sobrinha. Vou matar-me louco. Eu agora tinha certeza absoluta que tinha entrado num hospício. O dia amanhecia e em toda viagem de volta José ia amaldiçoando a vida e o que perdera;chegando na verduraria, ele pagou o táxi de pediu que eu aguardasse que ele ia abrir o portão por dentro. Quando ele voltou, entrei e após pegar um cacho de uvas vermelhas fui direto para o quarto. Celina, “o demônio”, dormia como uma pedra em sua cama de inválida. Na cama de casal, porém, onde estava combinado que eu ficaria , havia uma mulher de cabelos negros e longos, bonita, cheia e com os fartos seios de fora, só com uma calcinha rosa quase transparente. Não consegui pregar o olho, com o coração palpitando e mil devassidões passando na minha cabeça. Horas intermináveis depois, vencido pelo cansaço e pelas emoções extremas de todo tipo, acabei caindo no sono; porém, o descanso durou pouco. Por volta de duas da tarde, com um sol infernal que estava batendo em meu rosto, dei com Rosângela tomando banho, lavando os cabelos, completamente nua. Novamente imaginei ter entrado no paraíso. Não demorou muito, porém, descobri que a casa de Jose era mais um paraíso de fogo. Ele havia pego, provavelmente no dia que voltamos do Cassino, cerca de quatrocentos dólares de uma de minhas meias. No mesmo dia que descobri isso, Celina, a ex mulher brasileira invalida de Rolles com sua cabeça de Fred Flinstone e sua perna de elefantíase, bradava levantando a bengala no ar que Jose "pusera um homem estranho dentro de casa, um safado igual ao Rolles para dormir com sua filha". Passei a tarde infernizando Jose, para que devolvesse meus dólares, enquanto ele vendia verduras com a calça caindo no meio da bunda peluda, o que causava risos sem disfarces nos clientes e até na minha ira, porque nenhum artista de cinema era capaz de uma cena tão espetacular quanto aquela; a cara suja e dura de Jose com o cigarro na boca caindo cinzas e ele enrolando as verduras no jornal. Logo passamos a noite como dois pistoleiros mexicanos nos ameaçando de morte, com ele dizendo para eu ficar quieto senão ele ia partir-me a cabeça e eu dizendo a ele que não se atrevesse porque eu não era apenas lutador de rua e sim praticante de quatro artes marciais diferentes e falava isso comendo as uvas da verduraria que era o que tinha de mais caro. No raiar do dia, estava certo de que ele ia arrumar um quarto para eu "deixar ele e a família dele em paz". No dia seguinte, fiquei hospedado na casa de uma senhora que era rezadeira e peronista fanática, com um quadro do ex presidente e da Evita no centro da mesa de Jantar. "no tempo de Perón" era uma frase que saia de sua boca de cinco em cinco minutos. No quarto amplo que fiquei, lia a história Argentina em fascículos finos de uma coleção e lia jornais da internet", que segundo a velha peronista, era coisa de gente ignorante. Eu vivia na LanHouse em um grupo liderado de intelectuais e tradutores, liderado por uma conhecida escritora e radialista da Espanha, Rubia , que me defendia quando ironizavam meu espanhol galego-português; ainda fiquei uma semana na verduraria ajudando o Jose, até que ele decidiu que meu salário seria de dez pesos diários, o que era o que eu gastava de comida todo dia; então,. deixei ele sozinho para que o Ivan roubasse o caixa dele vontade. Ivan também costumava vender trouxinhas de maconha dentro da verduraria e quando o vi fazendo isso, pensando no absurdo e violento tráfico do Rio de Janeiro, ele me devolveu sorrindo:--- Tenho que sobreviver, louco.Passei a investir que ele devolvesse meu dinheiro, pois queria ir a Buenos Aires. Em onze de Março a velha peronista, logo pela manha, disse-me que havia explodido uma bomba na Espanha e achei que era coisa de exagero, mas quando entrei na LanHouse recebi a notícia em tempo real. Na mas quando entrei na LanHouse recebi a notícia em tempo real. Na mesma hora, num impulso de desespero impotente, escrevi um texto "Bom Dia, Espanha" que correu o mundo via internet e recebi centenas de emails de varias partes do mundo, o que me confortou um pouco as lágrimas grossas que caiam pelo teclado. Acabei, porém, ficando deprimido, e resolvi que consultaria um astrólogo Mexicano que eu vinha conversando pela Rede e estava em Córdoba a uns dez anos, radicado. Era Jesus Menendez. Marcamos em sua casa, que ficava em uma das avenidas principais do centro de Córdoba. Toquei a campanhia, depois de subir de elevador para o terceiro andar de um prédio antigo, porém limpo e elegante. Ele abriu o olho mágico que era de madeira e não tinha vidro; então, pude ver dois olhos minúsculos, longínquos, por trás dos olhos fundo de garrafa. Quando ele abriu a porta, quase não pude conter o riso ao ver a barba mais compŕida da minha vida indo até a altura do umbigo, uma barba preta, branca, amarelada, que parecia já ter nascido com Jesus. Não pude deixar de dizer: -- Que barba é essa homem? -- Foi uma promessa que fiz para Santa Tereza Davila. Minha mulher foi curada de Câncer tem uns dez anos. Jesus pegou um licor verde, pois em dois copos e levou- me da sala para o escritório. O computador estava ligado com imagens de estrelas e da galáxia. --- O que você está vendo aqui? Disse-me, apontando um globo. -- A terra. --- Não, meu caro. A terra está aqui e mostrou-me com os dedos uma minúscula estrela. -- È aqui que a humanidade se debate como insetos!Estamos num planeta dos mais atrasados, meu caro. Se acostuma com isso. Fiquei realmente surpreso ao ver a pequenez da terra diante do universo, Imagina eu, ali sozinho em Córdoba que tamanho tinha, sem nem saber para onde iria. -- Estive olhando seu mapa já e vejo que seu Júpiter está na quarta casa, em Câncer. O que mostra que ninguém nunca vai saber quem você é, a não ser que você mostre. Seu pai foi muito sábio ao dar seu nome, pois ele tem o dom de se perpetuar na história. Vi aqui que a alegria e a criatividade serão suas armas secretas e, nesse momento, melhor é para você voltar ao Brasil e levar a arte e a luz dos anjos para esse povo misturado e carente de ordem. Seu Júpiter diz que vocẽ tem tesouros a descobrir e extrair do Brasil-- seja sereno, pois você com esse mapa é um artista inspirado. Nesse momento, a volta te favorece, segundo os trânsitos atuais.Passei alguns dias melancólico, sentindo-me um cigano, e numa dessas tomava sozinho uma cerveja na Rua Valparaíso, que era a mesma da Verduraria, quando se aproximaram de mim duas jovens, uma de seus vinte e poucos anos e outra que devia ter uns dezoito. Perguntaram se podiam sentar e de onde eu era. A mais velha era bastante saída e articulada, enquanto a mais nova ficava olhando-me calada, tomando seu guarana enquanto a mais velha bebia comigo. Quando dei por mim, havia já três litros de cerveja na mesa e eu estava beijando a mais velha, que chamava Conchita. Era uma mulher de cabelos pretos curtos, estilo chileno, um tanto cheinha, mas nada que justificasse o que, vim a saber depois, era o apelido dela. Mandou que a irmã fosse para casa e dei um jeito de levá-la para o quintal de Jose, que era aberto na parte de trás e só tinha mato. Celina, o demônio, havia me visto passar, assim como o Ivan, e tenho certeza que se ela andasse iria querer atrapalhar. Ali, num apertado entre a parede do quarto onde eu dormia o muro do quintal, pude ao menos sanar minhas carẽncias imediatas com Conchita dizendo "dale", "dale`. Depois disso, Ivan encarregou-se de espalhar entre os conhecidos que me conheciam de cerveja, como o Turco, o bicicleteiro e mais alguns rapazes que eu tinha casado com "a gorda", que ela era "virgem", se eu usara "camisinha"; enfim, meu romance argentino virou um tango de fim de comédia. Celina sempre que podia fitava-me com ódio e dizia desaforos para mim e Rolles. Rosangêla só o chamava de puto, ao pai. Eu era "o desaforos para Rolles. Rosangê-la só o chamava de puto. Eu era "o porta voz" daquela revolta da ex família de meu amigo no Brasil. Em meados de Março, estava indo para a rodoviária, de volta ao Brasil e encontrei no ônibus um simpático ladrãozinho do bairro que certa vez dissera-me , oferendo-me sua pizza, que seu eu precisasse de alguma coisa que ele roubaria para mim.
--- Então, como vai?
--- Estou indo embora.
--- Não achou nada por aqui, não?
--- Não.
--- Não há nada aqui, não há nada lá. Não a nada em parte alguma. A vida é uma merda. Boa viagem para ti, amigo.
Percebi ali a grandeza daquele Dimas Argentino.
No segundo andar do ônibus eu vinha, eu havia pedido aquela janela. Retornava ao país da minha mãe, sem saber o que faria, nem com quem. Ainda não era hora de mandar a literatura para os quintos dos infernos. Bom Dia, Espanha! viajava comigo como um filho no ventre da mãe.


PARANA, SUL DO BRASIL, 2005
Decidi fazer uma investigação sobre o Inri Cristo, que diz ser a encarnação do mesmo Jesus de dois mil anos atrás, depois de vê-lo algumas vezes na imprensa e viajei para Curitiba.Depois dos contatos preliminares em que disse que tinha interesse em fazer uma reportagem independente, acertamos que eu passaria uns dias lá, entre seus discípulos e discípulas. Fiquei alojado num quarto que ,segundo Inri Cristo, era uma réplica perfeita de um trem europeu, onde havia um boliche, uma pequena tv, um rádio, fitas e livros sobre a vida e idéias dele. Passei logo na primeira noite um dos maiores frios da minha vida e dormi com uns cinco edredons, pois tive que pegar também o da cama vazia de cima para suportar o tempo do sul. Suas discípulas, bastante graciosas, se vestem os discípulos, de marrom. A igreja dele, a Soust, tem uma doutrina própria que não aprofundei-me, uma vez que Inri nega a santidade de Maria e nós, gnósticos e cavaleiros, a reverenciamos. E o que importa nesses relatos são a busca pessoal do autor e suas experiências reais com o Espírito Santo e Deus e não com doutrinas especulativas que pretendem medir a sabedoria divina. Tivemos eu e Inri, uma relação amistosa bastante humana, diria até demasiadamente humana. Naquele tempo, politicamente eu era um vermelho ainda e Inri me ironizava, chamando-me de comuna. Surpreendeu-me bastante o liberalismo econômico dele Seu gosto de jogar sinuca e ficamos de jogar uma partida, mas avisei-o de pronto que se ele perdesse para mim eu jamais ia acreditar ser ele o Messias. Mandava ele rezar-me, pois às vezes ele esquecia. Na hora do almoço trazia-me a comida a menos graciosa das díscipulas, o que deixou-me desapontado. Entendi que eu podia ser um tentador ou uma tentação para a comunidade. Um dia estávamos conversando no terraço, onde ficava meu aposento e Inri temeroso disse que devíamos sair dali, pois ele já fora apedrejado e fiquei comovido, pensando na perversidade humana capaz de tacar pedras num personagem que não deixa de ser bastante poético, assim como o Gentileza.

SEGUNDO SEMESTRE, 2005 – MOSTEIRO FRANCISCANO.
Uma intensa melancolia levava-me ao abrigo dos franciscanos, uma dor única eu sentia. Toda formação minha alma, na parte mais profunda, era Bíblica. A leitura do Novo Testamento na juventude pusera Jesus como ponto central da minha vida. Com Jesus eu aprendera a exercitar a solidariedade, a viver pensando também na vida futura, além de não fazer questão também de coisas menores. A literatura também estragara-me. Era um homem nobre e pagara um preço caro por dar-me ao luxo de cultivar-me e viver entre incautos, gente bárbara que detesta cultos e cultura. A frase de Nieztsche em Zaratustra levava-me ao mosteiro: “ Tivesse Cristo vivido mais alguns anos, teria mudado sua doutrina”. Essa era a verdade que sentia agora e doer-lme a alma. Não concordava com o Deus que Cria. Tinha trinta e cinco anos e um desprezo silencioso pela humanidade. Nos últimos dois anos então, a despeito de minhas boas intenções e qualidades, não achava nada. Nem amores, nem amigos, nem trabalhos. Não na proporção que tornasse-me menos triste. Ainda por cima, tinha a pobreza como uma carga, o que tornava-me mais vulnerável e nu as gentes. Já tinha sofrido todo tipo de maldade de meus próprios parentes. Lembrava o olhar de desprezo de uma tia ao olhar -me. Que tinha feito? E a rispidez humana? Qual era a finalidade? E a falta de interesse e amor ao criador? A covardia? Olhava as pessoas jogadas no > chão e perguntava-me: quem é o responsável? Odiava a brutalidade. Tremia a cada ato de deselegância. Da mais grosseira a mais sutil, > sobre tudo a deselegância incomodava-me. È feia a raça humana, concluía. Chegava a sentir laivos de desprezo por Deus, por criar tal massa de famintos. Era um Deus mesmo que criava tudo? > Com esses pensamentos íntimos, bati a grande porta do mosteiro. Um jovem Franciscano veio atender-me.
´´ Pois não, Senhor”
“Procuro o Igor, o líder de Vocês.”
“Ah, sim. Pode entrar. Aproveita que estamos comemorando o aniversario de um dos internos. Tomé.”
Entrei e vi os franciscanos completamente misturados ao pobres, mendigos, aleijados. Fiquei impressionado com o número de mutilados que vi: uns vinte. Todos homens. Um deles, arrastando a cadeira, veio perguntar-me se queria uma fatia de bolo. Aquilo comoveu-me um pouco. Ao mesmo tempo, fiquei chocado com tanta pobreza. Os banheiros eram coletivos e abertos. Fui vendo com Igor outros internos. Havia em quase todos internos uma ferida, uma chaga aberta. Muitos fumavam. Pensei o que estaria aprendendo ali, naquele lugar.
“Igor, se importa de conversar comigo um pouco?”
“Não, claro”.
“ Bem. Ouvi falar do trabalho de Vocês , achei bonito, nobre, mas ando com um questionamento profundo, uma angústia grande em relação a minha fé. “
“Como assim?”
“ Creio em Jesus. Mas não creio que o homem deva ser salvo. Os homens são ruins. Não acho boa coisa salvar a humanidade. Acho inútil. ”
Igor olhou-me de modo estranho...
“ Você não tem amor?
”“Tenho. Esse é o problema. Não me falta amor. E aqui estou, cheio de amor e sem nada, nem ninguém. Não aproveitaram meu amor. “
“Como dizia Francisco: o amor não é amado", disse Igor.
“Por que voce faz esse trabalho?”
“Vocação, acho”
“Pois é. Teve um tempo que até pensei em ser padre, depois monge. Mas o mundo desviou-me. Hoje creio ainda na mensagem, que Jesus é o Messias, mas não creio na salvação dos homens. Eu Igor, posso te pedir uma coisa? “
“Sim”.
“Posso dormir aqui?”
Igor olhou em volta, pensou.
“ Você não tem onde dormir?”
“Tenho. Mas não estou bem. Quero sentir essa experiência.
“ Pensei, na hesitação de Igor, que até um mosteiro tem sua porção de má-vontade. Será que ele vai mandar-me embora agora, alta noite? “Lá em cima tem um saco de dormir sobrando. Boa noite." Dirigi-me a parte superior do mosteiro, enquanto via as luzes de baixo, - onde ficava a maioria dos pobres e mutilados - se apagando. Ali estava eu, sem nada. Pedindo asilo aos pobres. Pensei , abandonado entre as cobertas, se Deus não seria ou não queria apenas aquele abandono, aquela pureza, aquela entrega ao nada infinito. Na manhã seguinte, olhei do parapeito do segundo andar e vi os monges vestidos de Francisco misturados com os pobres, compondo um cenário digno de idade média. Perguntei-me em que tempo sentia-me. Ou estava. Dirigi-me ao refeitório, onde os cinco jovens monges de não mais de dezoito anos distribuíam-se nas tarefas. Igor já havia saído. Não era santo nem pobre o suficiente para ficar. Levei dois monges ao ponto, paguei a passagem de um deles e vinha olhando o mundo dos homens pela janela. “Que tipo de soldado sem causa sou?” – ia pensando, enquanto as paisagens sucediam-se entre prédios de concreto e fumaça negra.

Nessa busca de encontrar um caminho que fosse puro, que levasse-me de verdade a manifestações do puro espírito de Deus, ingressei em várias outras instituições e doutrinas na esperança de formar uma síntese iluminada e "O caminho" achar no caminho. Meus estudos e investigações levaram-me a descobrir uma corrente tradicional que não pode ser maculada nem corrompido pelo elemento humano, pois é toda Guiada pelo espírito santo e pelos sinais divinos; porém, como não tem sede não é nada fácil sequer encontrar um membro da Tradição e fiquei buscando durante anos um contato, além de pedir a Deus em minhas preces para encontrar meus irmãos,que são somente aquelas criaturas feitas de amor. Anos de buscas após, vi pelo google uma pessoa ligada ao movimento Comunhão e Libertação da Igreja Católica disposta a dar informações sobre o lado secreto e místico dos templários. Chamava-se Miguel, da cidade de São josé dos Campos, em São Paulo. Era professor de Cabala e palestrante. Deixava um email de contato e assim começamos a conversar.

Inicialmente, eu e Sara saíamos como amigos íntimos, falávamos até três vez ao dia por telefone, que ela ligava sempre, três vezes ao dia as vezes, todos os dias. Nos conhecemos através de uma rede social na qual eu usava um codinome de anjo e não havia foto minha, apenas a do Anjo Roxo que dizia se alimentar de prana. Ela estava na comunidade "vivendo de luz" e era, aparentemente, uma menina grande e desengonçada, com um sorriso muito simpático, porém, e resolvi convidá-la para estar na minha página do Anjo que tinha a função de pesquisar determinados assuntos espirituais. E passou , nitidamente, quando vi sua foto, um pensamento estranho na minha mente de que "essa nunca teria chance comigo". Paguei caro por esse pensamento. Pessoalmente, foi a mulher mais linda que já tive e amei, com seus imensos cabelos castanhos, seus um metro e setenta e quatro de um corpo absolutamente perfeito e róseo que conheci e beijei cada centímetro, perdendo totalmente o controle de mim como nunca antes. Quando dei por mim, dias após conhecê-la estava completamente apaixonado e com o ser seriamente comprometido e já não bastava nossa relação de "amiguinhos". Pedi então numa noite, após ter refletido com angústia um dia inteiro que ela não me procurasse mais, nem por telefone. E, nessa mesma noite, tive um pesadelo estranho, sem imagens, sentindo todo meu corpo sendo sacudido. Começou então todo mistério e estranheza que cercaram nossa relação. No dia seguinte, perdi completamente o apetite, sem atentar no motivo. Parei misteriosamente de comer dois dias, três dias, ela continuava ligando. Demorei a perceber que havia alguma coisa errada. Apesar do meu pedido resoluto, ela continuava ligando. Quando dei por mim, não estava conseguindo sair da cama e aceitiei a ajuda dela.
-- Quem mandou pedir divórcio? -- ela falou, rindo.
Ela veio em minha casa com iogurte e frutas. Percebi que tinha que aceitar minha ligação com ela e , dias depois, começamos a namorar e tivemos de ínicio aquela felicidade inevitável. Ficamos três dias fechados sem sair da cama fazendo amor, dvds, pipoca, banho juntos a convite dela que dizia que marido e mulher tinham que ter intimidade, massagem, plano de casamento, madrugadas em claro ao telefone, beijo romântico no ponto de ônibus, à despedida. Ela garantia ter certeza de que ficaríamos muito tempo juntos. Evidente que aquela idéia era muito feliz para mim, pois a amava mais que minha vida e fiz dela meu pedacinho de Deus crendo de verdade que tinha achado meu tesouro na terra. Porém, logo começaram as chamas do inferno entre nós...

(Ela ainda foi, dois dias antes de socorrer-me em casa, apesar da minha proibição, na fraternidade onde eu desenvolvia meus dons mediúnicos e ficava lá de jaleco branco ajudando no funcionamento da casa. Ela foi com toda infantilidade feminina, fingindo que só queria tomar passes e não falamos. Eu a olhava de rabo de olho os longos cabelos castanhos, ela mexendo na bolsa e com o coração cheio de ternura adivinhava”Acho que não vou conseguir me livrar dessa menina”.)

A primeira tarefa que Miguel mandara-me fazer era liderar um grupo de estudos esotéricos e indicou-me para o grupo , Flavio, um jovem de vinte e e cinco anos que vivia metido com markentigmultiniveil e seus produtos; estava sempre metido num terno preto e com a pasta 007. Morava na Gávea e Cíntia, uma mulher de dezenove anos, a quem Miguel dizia ter um grande potencial paranormal e ironicamente dizia para eu não tentar fazer ela da marmita literária. Com Flavio, tive uma aproximação fácil e imediata. Passara a vir em minha casa todas as quinta-feiras, as sete da noite, onde abríamos os trabalhos da seguinte forma: Fazíamos uma prece , acendíamos uma vela que ficava o tempo todo acesa até o encerramento, relaxamento com música clásssica e new age, leitura e meditação sobre o evangelho de São João e leitura e partilha do livro "Meditações Sobre Os Arcanos Maiores do Tarô". Ao final, fazíamos outro relaxamento, a prece de encerramento, apagávamos a vela e eu anotava tudo numa ata. Após esse trabalho ritualístico, tomávamos coca-cola e conversávamos sobre negócios, ocultismo e mulheres; eu dava-lhe passes e jogávamos cartas um para o outro. Dias depois, Miguel pediu-me para não dar passes, pois que eu não era Chico Xavier e devia deixar os espíritos em paz. Fiquei um tanto decepcionado com Flavio por ter falado sobre os passes, uma vez que isso era após o encerramento da disciplina. Cresci muito com essas praticas, todavia. Uma das coisas que aprendi é que o conhecimento da verdade é por natureza fechado a imensa maioria dos homens do mundo, não porque seja privilégio de alguns, mas simplesmente porque só pode saber quem ama. "O Espírito da Verdade" o mundo não pode conhecer porque não são cheias de amor as pessoas do mundo. Os homens querem mostrar-se inteligentes, sabedores, poderosos. Algumas vezes fiquei de intermediário de alguns candidatos que queriam ingressar nos estudos dos cavaleiros, porém, o que eles buscavam não eram com certeza o que eu teria a oferecer. Eles começavam a explicar o universo e ai eu deixava eles nas trevas exteriores. Somente aqueles que estiverem dispostos a tornarem-se criancinhas no caminho do conhecimento e fazer natural a vida do amor em si pode conhecer a verdade; somente depois dessa purificação, a Dama do Lago começa a aparecer. Só quem ama, conhece.
Na primeira vez que ficamos juntos como homem e mulher, Sara chegou em minha casa numa sexta-feira a noite, com um vestido longo branco; por telefone já tínhamos praticamente combinado que tentaríamos o romance para entender nossa relação. Ela me ligou ao celular para que eu fosse buscá-la lá embaixo, como era costume. Fui com meu terço no punho mesmo, pois estava rezando na hora que ela ligou. Vinha queixando-se do trânsito da linha vermelha e dizia que não gostava do astral do Rio de Janeiro, enquanto subia as escadas, que não se habituava. Entramos e ela pediu-me para ir ao banheiro. "Deixa eu descansar um pouco aqui no sofá", disse ao voltar deitando-se e fechou os olhos com a mão direita sobre a barriga e a esquerda apoiando a cabeça. Alisei-a mão e a barriga lentamente e num impulso deflorando-me a timidez, beijei-a ternamente, longamente, interminavelmente, e podia sentir anjos e mais anjos sendo libertados nas cidades celestes, eu com o gosto da língua dela, felicidade infinita que eu ia sugando e ela me dava, entregue e submissa. Após, seus olhos brilhavam e era estranho ver a menininha no corpo daquele mulherão de um metro e setenta e tantos. Quantos tons tem o azul? São vários e vários, incontáveis. Nossas peças intimas, porém, eram exatamente do mesmo tom de azul, como se tivéssemos comprados juntos, combinadamente em alguma loja do céu, como apaixonados gêmeos do amor. E houve aquela hora em que deitados e nus fizemos o mesmo gesto, ao mesmo tempo, como num espelho sagrado e ambos coramos, desconcertados e mais nus ainda,na alma. "Ah não, não acredito, não pode ser", dizia ela ruborizada. Até o domingo a noite, quando ela foi embora, estivemos mergulhados na descoberta de que podíamos ser tudo na vida um do outro, menos um acaso. "Alguém nos energizou para ficarmos juntos", falou-me enquanto se vestia agora sim para ir para casa, ciente nós dois de que estávamos vivendo no mundo dos dogmas e dos arquétipos universais.

Morei durante longo tempo perto da Quinta da Boa Vista, onde ia pouco durante o ano. Porém, com o tempo, reparei que sempre que ia lá e sentava-me perto de um dos lagos, um pássaro branco seguia-me. Isso ocorreu quase uma dezena de vezes, quando eu levava moças para passear comigo. Percebi que era um padrão mágico da minha vida. Numa das primeiras vezes que foi lá em casa, eu convidei-o a ir ao parque comigo, pois queria fazer determinadas práticas da Tradição dos magos brancos com ele. Foi a primeira pessoa que contei sobre minha relação mágica com o pássaro, pois negava até para mim mesmo que o fato acontecia. Era extraordinário demais. Como, porém, nossa relação era pautada no código dos cavaleiros místicos de Perfeito Amor e Perfeita Confiança, abri um pouco do meu coração secreto para ele. Quando chegamos ao lago, ele perguntou-me;
-- E ai, será que seu amigo vem hoje? Estávamos sentados na grama, em posição de meditação.
-- Ele não coscuma falhar, não. Vamos ver. Flavio, faz o seguinte para mim. Fecha os olhos, respira fundo. Prende durante um minuto a respiração. Solta depois, lentamente. Faça isso dez vezes por favor, conta com os dedos.
Quando ele fechou os olhos, depois de sua terceira respiração ritmada, vindo dos países mágicos cheio de estilo, o majestoso pássaro branco pousa na beira do lago, praticamente em nossa frente. Minha alma ficou extasiada. Não disse nada, enquanto Flavio prosseguia sua pŕatica. Quando ele abriu os olhos, porém, foi a primeira imagem que ele viu; o pássaro parado na borda do lago, em nossa frente, sereno e hierático. Ele arregalou os olhos.
-- Cara, não acredito. Tu é muito Jedi. Meu Deus, que coisa linda! Muito maneiro mesmo. Tu é o Ioda, cara.
--- Não pode ser o Luke, não? O Ioda é muito feio. Ou melhor ainda, disse rindo, aquele mercenário que ficou ao final com a princesa Léia.
Passado o assombro do milagre, ensinei-lhe a pratica da oração silenciosa por três pessoas. Muito simples. Você escolhe três pessoas , pessoas a quem você quer bem, ou mesmo inimigos para purificar-se, faz uma prece para cada uma delas durante cinco minutos. Não é preciso nem se deve contar as pessoas. Essa pratica, além de energizar-nos, ajuda-nos a deixar o egoísmo de lado. Flavio fez. -- Então, como está se sentindo? -- Bem, Leve. -- Exatamente. Às vezes as pessoas esquecem que Jesus veio ensinar-nos a servir as pessoas e não servir-se delas. E essa pratica nos harmoniza também porque nos esquecemos de nós mesmos, o que é muito saudável de tempos em tempos. Depois desse dia, Flavio, Cíntia e Miguel passaram a chamar-me de Jedi.

Eu a chamava de minha "predadora vegetal", pois ela era vegetariana. Ela todatinha uma pureza de perfume na pele e nas partes que parecia ser reflexo de sua alimentação,porém sensualista. Nossas refeições eram diferentes e singulares.
-- Sua geladeira cheira a alho --- dizia enquanto desembrulhava sua comida do papel laminado que a mãe preparava-lhe para toda semana. Eram verduras variadas geralmente cobertas com maionese ou creme de leite. Eu a observava enquanto fritava meu carré com fritas. Numa semana que ela teve que viajar para Além Paraíba, onde morava seus pais, trouxe-me suas marmitas de vegetais.
--- Come que vai te fazer bem.
Não é preciso dizer que comi tudo com gosto. Eu era galáxias de amor. Meditávamos juntos e ensinei-lhe uma pratica do budismo tibetano "Dos Quatro Pensamentos Que Transformam a Mente", com ela de olhos fechados na cama, eu a ia guiando aos segredos dos monges Tibetanos.
--- Vai, Neném, fecha os olhos. Agora pensa no sofrimento universal que tudo permeia, use a imaginação e veja como tudo vai dar em sofrimento, como a mãe dá a luz ao filho e logo um verá o outro morrer, se não morrerem juntos. Veja como é a vida na carne e no sangue, como todas criaturas sofrem. Medita profundamente nisso. Agora abre os olhos. Fecha de novo, agora pensa na impermanência, como tudo passa e nada permanece, como tudo é efêmero, fugaz e veja a inconsistência das experiência terrestres. Agora abre os olhos e observe ao seu redor. Agora medita na lei de causa e efeito, como nossos atos e pensamentos e os de terceiros afetam as vidas nossas e de outros, eu ia falando alisando de leve suas costas, pois sabia o quanto essa pratica é forte e pode causar profundas reações emocionais ao jogar o sonho de felicidade permanente que as pessoas procuram das pessoas na lixeira. Agora abre os olhos, observa. Tinha por ela uma compaixão absoluta.
“Agora medita na pratica dessa doutrina, do darma que liberta a mente, na profundasabedoria do Buda ao ensinar-mos isso. Veja como é bom que ao termos o nascimento humano podemos nos libertar do sofrimento através da pratica, Medita nisso. Agoraabre os olhos, observa.”Meditar para ela era naturaL, pois ela seguia um guru indiano e pertencia a uma organização espiritualista. Mas nada sabia sobre o comprometimento espiritual dos budistas com a realidade. Eu queria tirar-lhe um pouco dos vícios mentais do sensualismo, da agressividade e da vaidade excessiva com as coisas do mundo. Para mim, esses momentos espirituais com ela eram um verdadeiro paraíso pois permitia-me mostrar meu ser secreto. Pensava em deixá-la num certo estágio de iluminação que tinha certeza daria a ela um equilíbrio e uma felicidade maior. A alegria das pessoas que possuem conhecimento de verdade é, quando isso é possível, passá-lo. Não consegui, porém, deixá-la no ponto que eu achava ideal. Ela deixou-me antes e essa foia maior de todas as frustrações que jogaram-me na escuridão e na elegia do mundo. Ela sabia que eu tinha conhecimentos valiosos, mas não os tomava como sagrados.Ou melhor, até podia tomá-los como sagrados, mas o senso de sacralidade dela era tão fundo quanto um pires.
A maneira como Sara era despudorada chegava a ser cândida. Deitada, com os dedos na vagina ia mostrando-me com um grande sorriso sua intimidade, como se eu nunca houvesse visto um órgão feminino antes, nem em desenho. Ia ela "pequenos lábios, grandes lábios" e eu pensando comigo num misto de ternura e compaixão, enquanto a olhava, onde tinha entrado com a alma. Ela parecia não dar em conta que não era minha primeira mulher. De certa maneira, sabíamos ambos por intuição que estávamos diante de um fato novo tanto um quanto o outro. Pegava minha mão, dizendo que queria ver se tinha lembrança de alguma encarnação passada. Ela especulava sobre isso e eu ia me deixando ir, fazendo-lhe todas as vontades , pois era exatamente vê-la feliz o que me fazia fêliz. Ujm dia ela sussurrou-me na cama, aos meus ouvidos, "solta o tigrinho". Essa expressão causou-me, com aquela voz dela que saia as vezes como um expressão causou-me, com aquela voz dela que saia as vezes como um mistério aveludado, um impacto na alma, porque não entendi o que ela queria dizer, na ocasião e fiquei sentindo-me uma criança de colo desmamada e desamparada, com minha alma dando reviravoltas de trezentos e sessenta graus com a vida que vinha dela para mim. Eu, mais velho quinze anos, parecia a virgem da situação qque ia sendo pouco a pouco deflorada, uma flor aberta que ela comia vorazmente com fome, impiedosamente, e eu entregava-me ao sacrifício dolorido mais feliz.

Algumas coisas que Miguell pedia-me para fazer eu não entendia. Penso que ele tinha seus motivos secretos, buscando sinais. Pediu-me que lesse o livro de Tobias, da Bíblia católica. Outra vez, que eu fosse na Igreja em dia de Reis para rezar por ele, pois "queria entender como usar certas ferramentas que estava recebendo dos céus". Insinuava que eu era conhecido do círculo interno dos Cavaleiros e que era observado pelo círculo interno. Havia algumas vezes em que entravamos os quatro no nomessenger, eu , Miguel, Flavio e Cíntia, o que distraia-me de pensar que minha editora estava falindo e que começava a ter brigas freqüentes com Sara. Lembro-me que numa dessas vezes eu estava bastante triste e eles entraram online festejando meu "bom humor" que Flavio havia dito que eu tinha. Numa dessas vezes resolvi ocultar meu mal secreto, brincando com eles, com uma tristeza mortal na alma. Devo a esses três não ter perdido a razão completamente e ter podido viver e ser de modo autêntico, uma vez que estamos num mundo de mascarados e temos que andar a todo momento psicologicamente armados, dissimulados, miseráveis. Somente entre iguais vivemos realmente. Eles recuperaram em mim a graça da atenção verdadeira e com isso pude voltar-me, apesar de tudo, a minha cruzada para a terrra santa da alma, que é a única verdadeiramente santa.

Um dia Sara do nada, no meio da semana, disse que queria falar comigo e indo lá em casa, subitamente, disse que estava “vazando”, que estávamos discutindo muito e que era melhor a gente terminar. Que eu podia ligar a hora que quisesse. Cai em prantos, completamente desconcertado com a superficialidade dos modos dela. Ainda fui com ela ao ponto, chorando e humilhado e após beber, liguei mal entrei em casa.
--- Alo?
--- Piranha!
--- Ah, é você?
--- Piranha, piranhora.
-- Isso, pode xingar. Desabafa. Desabafa. Sei o que você ta sentindo.
Eu cheio de ódio,impotência, cerveja e desilusão ia misturando ódio e amor, desespero e destempero. Ficamos assim uma meia hora discutindo, falando coisa com coisa, até que exausto me cansei e bati o telefone. Entrara no inferno do caos feminino e estava desorientado. A separação mergulhou-me numa melancolia e num caos profundo. Comecei a ter problemas na fraternidade porque deprimido como estava não tinha paciência para suportar aquela hipócrita espiritualidade onde as pessoas estavam mais preocupadas com formalismos e regulamentos que com a real necessidade dos irmãos que se encontrava em dificuldade. São assim os humanos, incapazes de viver o o amor essencial vão ficando nas trevas eenganosas das opiniões, regras, regulamentos e tudo o mais que se pode fazer para oprimir e dificultar a troca fraterna real.Se antes tinha uma paciência de santo para aturar aquelas pessoas subaculturadas que hierarquicamente estavam acima de mim, agora não tinha mais. Quando me davam uma ordem por puro autoritarismo fazia-me de surdo e não obedecia. No país, o que mais existe é uma gente sem cultura que se acham donos de uma cultura interplanetária porque conhecem, geralmente mal, um ou dois temas. Um dia fui a secretaria e, depois de três anos, comuniquei meu afastamento.

-- O irmão tem certeza?
-- Sim, tenho.
Esse primeiro rompimento durou mais de um mêsE fez-me escrever textos em que tentava me manter lúcido, sem estar lúcido.

" Uma amiga diz que está mandando-me "Rosas de Shalom". Digo-lhe que nunca recebi rosas e ela diz ficar emocionada. Verdade. Nunca recebi rosas. Fui eu que fiquei só na noite mais fria, sem ter rcebido o mínimo investimento, abandonado por tão pouco, por tão menos, por tão nada. Fui eu que quando mais precisei fiquei com a tristeza mais pura, tropeçando sem jeito na terra por ter acreditado em palavras vãs. Fui eu que fui ouvir Jackson Five somente para lembrar que fui menino um dia e a maldade não me atingia tanto. Fui eu que fiquei sem jeito. Fui eu quem carregou toda dor, toda desilusão pesando por dois mil anos. Fui eu, fui eu, fui eu. Eu que preocupei a meus amigos com a tristeza crescente. Eu que matei a primavera. De tudo, eu tive as lágrimas. Mas só eu possuo a chave, a glória dessa dor. Eu amei o difícil. Lutei pelo impossível. Lutei contra mim. Todo valor foi desprezado. Os sonhos despedaçados, choraram. E o vale de dores se abriu, infinito. E caminhei e caminho, dia e noite, sabendo quase tudo de tudo. Sempre soube que me chamava Daniel e que estava na cova dos leões."

“Sei que estou morrendo te falando todos os dias palavras doces, lutando ainda com a força que me resta. Sei que acharás ridículos três quilos perdidos em três dias, a casa quebrada, o dinheiro jogado nos bares, os compromissos adiados, as lágrimas oceânicas. Mas eles, os anjos, estão aqui. Não podem fazer nada, mas choram comigo. Sabem que não tenho como defender-me desse amor sobre- humano.Sim, eu cometerei atos ridículos. Falarei bobagens. Palavrões. Andarei como um louco, as vezes ainda com seu chinelo, apenas para te sentir. Todos sentem sem que eu fale a magoa nos meus olhos. Não esperes nada inteligente. Nada premeditado, nada sutil. Sou apenas um homem lutando para sobreviver. Com o amor não se brinca. Ele é sagrado, puro. Pede cuidados. Esse que anda inseguro não sou eu apenas, mas aquele espírito que nos guiava: eu, você e ele. Por que tentar partir? Eres comigo. Sou contigo. Poderei viver sem rezar sobre seu corpo? Ou sem trocarmos as farpas diárias? Ou sem vê-la de certo modo? Meu imenso amor é pouco, se é tudo? Não, não fujas. Creio, infelizmente, que não podes. Desculpa incomodar. Não é que eu queira. Sou apenas uma frase de Deus na sua vida. Poderia me salvar sozinho. Conheço esse milagre. Mas preciso te salvar também. Por isso te amo, para te salvar. Só que também preciso ser salvo, senão morreremos os dois. Essa é a senha do amor. Os anjos são sempre um desastre. Volta e me cuida. Minhas asinhas estão feridas. Eu apenas quero vê-la, mesmo magrinho como o Joazinho da floresta. Viver sozinho dentro de mim está ficando dramático. Será que perdemos o sorriso? As canções? Não me culpes apenas. Nem as máquinas funcionam mais na casa. Como você vê, gostaria de deixa-la partir em paz, mas o amor tem a pureza dos Nenéns. E esses dão trabalho. Desculpa tudo, mas minuto a minuto tenho que fazer algo para suportar a dor. Eu ainda estou aqui. Bob”.
"Sentimento ilhado, morto e amordaçado, volta a incomodar"." A voz de Fagner joga- me em funda melancolia, revolve coisas... Bóias solitárias de coisas não vividas e não ditas, enganos irremediáveis.... Tudo no mar dentro da alma, tudo nas profundezas de mim... Em vão pensar um um gesto, não dá mais. A gente passa a vida toda lutando para ser claro, para ser correto, para buscar ser límpido e tudo temos que passar e ouvir... Aquele adeus que não se teve, aquela palavra que não se pode dizer e a própria explicação que não podemos mais dar. Horas há que cansamos e melhor fora que deixássemos a canção falar sozinha e chegar a noite com seu véu. Mas a melodia desperta o desejo de quem sabe vir um milagre em que a própria dor transforme-se em comunicabilidade. Por que sofremos de não sermos entendidos. Bem, alguém que já quiz dizer mil coisas e não pode, alguém que já quis se explicar e não conseguia mais, alguém que em algum momento sentiu na pele a dor da fragilidade humana quando há os choques de pensamentos, de sentimentos e de atitudes, não pode deixar de sangrar o coração ao ouvir esses sentimentos ilhados que levamos dentro de nós e brotam as vezes do nada , numa manha inadvertida, numa tarde melancólica ou na noite profunda. "Sentimento ilhado, morto, amordaçado.". Sim, eu sei o que é isso.

Magoado ao extremo, nem tentava reatar , embora a amasse. Tinha ímpetos suicidas, homicidas. Estava destroçado. Às vezes, chorava dentro de um ônibus, ou entre conhecidos no clube que freqüentava, A pessoa que mais amara na vida , ao aquela entreguei-me sem reservas, deixara-me, simplesmente. Eu tentara até engravidá-la no meud desespero, para não separar-me. Eu que havia evitado sempre filhos por opiniãofilosófica em alguns relacionamentos. Meu cotidiano nesses dias era solitário esombrio, mergulhado na internet pesquisando sobre o Graal, Templários, Códigos Sagrados, Aparições da Virgem e conversa no messenger com algumas amigas e amigos de estudo. Quando cansava, ia beber cerveja. Tão distante estava das pessoas que não conseguia ouví-las nos seus papos mesquinhos quase sempre, mais quecinco minutos. Aprendi no fogo que a vida afetiva é o que mais transforma e afeta nossa existência. Estava ali sabendo que era provavelmente um escolhido de Deuse nem isso fazia-me deixar de me sentir miserável. No entanto, não a procurava,embora não conseguisse ver futuro bom sem ela. Um dia, comecei sentir uma dorpsicológica que parecia vir de dentro da alma.Procurei meditar, mas a dor continuava. Passei assim agoniado todo um dia, sem saber o que fizesse. No segundo dia, tomei um ansiolítico que pedi a uma amiga que sofria de depressão. No quarto dia, essa dor chegou a um paroxismo. Desorientado ligue ipara Lucia, uma amiga minha que além de psicóloga era terapeuta
--- Lucia, como vai?
--- Oi, vou bem e você?
---- Olha, não estou muito bem não.
--- O que houve?
--- Não sei. O caso é que estou sentindo uma dor, uma angústiaque não sei nem o que é nem de onde vem.
--- Hum, sei como é, uma dor né?
--- Isso.
--- E a menina, voltou?
--- Não. Também não a procurei mais.
--- Vai ao médico. Acho que você precisa.
--- Tá. Vou ver.

Terminei a conversa com Lucia e sai para beber a cerveja, ver semelhorava. Isso era porvolta de umas sete e meia da noite. Fiquei no bar até terminar aterceira cerveja.Paguei e sai sozinho pelas ruas escuras do bairro sentindo a vida comoumamaldiçãoe uma condenação. Estava chegando ao desespero. Sem ter mais recursospróprios de defender-me, num impulso completamente misterioso para mimaté hoje,liguei para Sara.
-- Alô. Quem é? --- Era a voz dela do outro lado da linha que fez meu coração bater como um tambor africano.
--- Sou eu. – Respondi, num fio de voz.
--- Oi, como você está? Quero te ver -- disse ela agitada, parecendo aflita,o que surpreendeu-me, pois eu esperava receber indiferença.
- Agora?
-- Sim.
--- São dez horas da noite.
-- Eu pego o taxi. Tou precisando falar com você. Eu te magoei, né? --ela estava chorando.
--- O que você tem?
-- Não sei. Ando estranha. Minha coluna está doendo. Fiz até acunpuntura.Olha, vou tomar um banho e estou já chegando ai. Eu te ligo e você me pega ai embaixo.Fiquei intrigado com a agitação interior dela, o que preocupou-me aodesligar o telefone.Fui tomar banho e percebi, debaixo do chuveiro, que não tinha mais dor.Fazia mais de um mês que não a via, nem lhe falava outro tanto tempo.Eu havia sofrido tanto, passado por tantos estados de alma diferentes depois de tanto desencontro eu achava completamente impossível quevoltássemos a ter um romance novamente. Pensava tudo isso, deixando a águamolhar-me o corpo e os pensamentos. Pus meu terço enrolado no punho direitocomo de costume, pois estava praticando, por ordem de Miguel a Lectio Divina.Agora era esperar o telefone tocar e ir buscá-la, como era uma tradição nossa.Liguei a internet para tentar afastar a ansiedade e fiquei a espera.Vi que Flavio e Cíntiaestavam online com estatus de ocupado.
O telefone tocou. Era ela. Fui a janela e a vi, com uma calça comprida branca e de casaco azul com uma bolsa a tiracolo e outra na mão direita.Desliguei o computador e fui descendo lentamente para rua, com uma sensação deinadequação, pois não sabia como recebê-la. Decidi deixar de lado as elocubraçõespiscológicase fui ao seu encontro. Havia em cada passo meu um tensão, uma atmosfera soleneno ar, qualquer coisa de sagrado e eterno. Sem falar nada via, com asorelhas cheias de pequenos esparadrapos em pequenos pedaços. Apenas nos abraçamos em silêncio.Apenas um "oi" sem jeito de ambas as partes e fomos subindo o prédio.Quando chegamos, ela foi me dizendo que estava com conlitos, que não conseguia se acertar com ninguém, que tinha a mente cheia de dúvidas e eu ouvia tudo tentando fazer da minha mágoa um sacrifício espiritual.Alguns minutos de conversa depois e estávamos nos beijandoe na cama, novamente. Sem darmos conta já éramos novamente o neném um do outronum passe de mágica. Era como se nunca houvesse tido separaçãoe estarmos juntos era a única coisa que fazia sentido. Logo ela estavarindo comigo e dizendo que estávamos fazendo "sexoterapia". Ficamos assim, amantes.e pus ,como na primeira vez, o CD de Lorena Macnuty que ela tinha gravado para mim. Foi através delaque chegou-me essa cantora. Logo estávamos novamente tomando banho juntos.Ela se secava, enquanto me olhava com os olhos interrogativos.
-- Por que você está com seu pé desse jeito?
--- A água tá fria.
Eu estava na ponta dos pés, evitando pisar na água os calcanhares.
-- Meu Deus, o que minhas amigas falariam de mim, se soubesse queestou aqui contigono seu banheiro?
--- O que meus amigos diriam de mim, se soubessem que estou contigoaqui? Provavelmente que sou corno manso. Melhor deixar isso quieto.

Ela morava com duas outras amigase em nossas brigas instruia elas a não dizerem que ela estava. Alémdisse, eu sempre ficava parecendo o chato apaixonado da situação. Epor ser mais velho, era injustamentemarginalizado. No dia seguinte, ela foi para o mestrado e disse que anoite iria veros pais. Não ficou nada formalizado se tínhamos voltados, se estavamos juntos.Quando ela foi embora, fiquei pensando no tanto que sofrera, nosabismos que entrara,porém com um certo alívio de pensar que ela também gostava de mim eque eu não era assimtão descartável, porém ela tinha dificuldades de assumir isso. Pensohoje que nossa verdadeira relação vinha de um nível muito maisprofundo do que eu ou ela pudesse ter plena consciência.Era, além de nossa vontade, um encontro marcado por Deus na eternidade.

Passava horas com Miguel no messenger, falando bobagens, trocando emotions, elemandando-me fotos de castelos templários e blogs dos estudostradicionais, enquantoeu buscava , subrepticiamente, fazer com que ele merevelasse mais sobre os segredosda Ordem.
-- Vamos, Miguel, conta ai. Onde está o graal?
-- Você na verdade bebe dele todos os dias , meu caro, a cada nascer e por do sol ele passa por você,. generosamente. Beba-o. Hoje em dia, penso ter uma intuição sobre as pistas do sagrado e quando estamos perto das mãose das faces de Deus em nossos caminhos diários. Dentro de nós correm dois tipos de energia:uma pura, outra contaminada. Assim também nos outros.Grandes segredos Jesus falou sobre isso e João revela no seu evangelho.Quando buscamos dar o melhorde nós, nosso esforço e suor cheira a vinho ecomungamos. O esforço correto é sempre doador. A energia contaminada são sempre os impulsos de vaidade, egoísmoe mentira. As pessoas verdadeiras do mundo estão unidas por um laço indissolúvelde amor. Para obter a sabedoriapura da fonte, é preciso oilhar o mundo todos os diascomo uma criança queo estivesse vendo pela primeira vez.

Durante todo nosso treinamento espiritual, Miguel não me ligou mais do que duas vezes. Nossos contatos eram todos via messenger, email ou pelas redes sociais ou quando eu ligava. Num desses dias que ele ligou-me, o tempo e o espaço ficaram sublimes devido a sublimidade do momento. Ele mandou-me, mal eu dissse alô no aparelho a entrar online no messenger e desligou assim que eu o fiz..
--- Por que você quer seguir esse caminho medieval, meu caro?
Fui pego completamente de surpresa e fiquei sem saber o que dizer.
--- Vamos, me diga, por que você quer ser um cruzado?
Eu lia sua pergunta na tela do computador, sem saber o que dizer. Nisso, comecei a ficar tonto e um pensamento parecia vir de outra parte de mim, na verdade Eu lia sua pergunta na tela do computador, sem saber o que dizer. Nisso, comecei a ficar tonto e um pensamento parecia vir de outra parte de mim, na verdade um pensamento imagem bastante obsessivo na Virgem Maria começou tomar-me a alma, de modo que atordoado eu quase ia caindo em cima da tela. Sentia-me angustiado demais, pois além dos tormentos que passava com a ausência de Sara, ainda tinha que passar por esses testes e desafios de Miguel, que eram periódicos. Não sei quanto tempo durou essa tensão, o fato é que me dei conta que aquele "pensamento" invasor era a única coisa que me ocorria para responder a pergunta inesperada.
--- A Virgem Maria, --- respondi, finalmente, num misto de resposta e pergunta, como
se minha resposta fosse também uma interrogação.
--- Humm, pode ser um sinal ,meu caro, mas existem outros. Estou até desconfiado que tem coelho nessa toca, mas ainda tem muito ego ai. Volte à sua simplicidade, garoto. Lembre-se de seus melhores sentimentos, de sua aurora espiritual, volte a sua infância. --- Foi um sinal, Miguel?
-- Não sei. Pode ter sido. Mais existem outros. Vamos investigar.
No fundo, eu sabia o que acontecera. A Virgem se manifestara.

Um dia, em fins de novembro de 2006, depois de mais uma vez que ela terminara comigo, e dessa vez não haveria mais volta, bebi o suficiente para perder a consciência da noite. Engraçado que ao relembrar isso, tenho a sensação de que algo em mim morreu ali, claramente. Compreendi que estava latente a minha destruição. Contudo, consegui chegar em casa e dormir. Acordar, porém , foi difícil. Assim que levantei-me comecei passar muito mal. A cabeça doía muito e sem saber o que fazer, liguei.
– Alo.
– Sara… quando tentei falar, comecei vomitar.
– Alo, alo, o que ta acontecendo?
– braaaaaaaaaaaaaaaaaarghhhhhhhhhhh
– Você ta vomitando é?
– É… vomitei tudo aqui, me ajuda.
– Eu vou ai, espera.
Deitei novamente no quarto escuro, sujo, sombrio, com a alma num umbral de horrores, depois de limpar porcamente o vomito. Uma hora depois ela chegou e me lembro perfeitamente da calça comprida rosa. Deu-me uma nelzaldina e me deu, eu deitado na cama e ela sentada na minha cadeira do computador, com o livro do Iogananda, “Autobiografia de um Iogue” na mão esquerda, porque a direita dela eu segurava e me amparava. Ainda tentava brincar para disfarçar minha derrota.
– Me dá um beijinho ai.
– Até que pensei nisso, mas você ta fedido.
– Me dá essa bundinha pra mim.
– Fica quieto, moço, você ta quebrado.
Essa era a cena na penumbra do quarto; ela sentada e eu segurando-lhe a mão direita ora com uma das minhas mãos, ora com as duas, enquanto ela lia, as vezes esboçando um sorriso com a leitura.
– Só um pouco de bundinha.
– Sossega.
De vez em quando ela comentava uma passagem comigo.
– Conheço o livro, meu bem.
E ficamos assim de mãos dadas, até que ela disse que tinha que ir. Eu agradeci ela ter vindo e com o resto de forças levei-a na porta; depois, pela janela ia vendo ela se perder na distancia, que quanto mais ela se distanciava, mais crescia meu desalento e percebi que não conseguia alcançá-la mais. Depois ela cortou completamente a comunicação comigo e tive que tentar sobreviver ao abalo. Até encontrá-la, eu pensava saber o que era o tempo, o espaço, a mente, os sentimentos, a filosofia, o sexo, a dignidade, o destino. Era um gato que pensava ser um tigre. Foi com ela, porém, que nasceu o Tigre. Batizado pela experiência, pela fatalidade, pela beleza, pelo inusitado. O amor, que contém todas as coisas e fazia com que um homem chamasse uma mulher quinze anos mais nova –, que corava de modo encantador, — de mamãe.

Depois que Sara deixou-me de vez, alguns dias depois mergulhei numa espécie de estado vegetativo. Comecei novamente o distúrbio alimentar e entrei em comunidades de meninas anoréxicas. Conseqüentemente a não me alimentar, perdi o resto do equilíbrio. De repente chorava na rua, dentro de ônibus, do nada. O mundo ficou opaco, distante, amorfo. Atormentava-me as lembranças eróticas. Fumava e bebia mais que o distante, amorfo. Atormentava-me as lembranças eróticas. Fumava e bebia mais que o razoável e minhas costelas começavam a aparecer vergonhosamente. O rosto fundo, cavado. Tinha pressentimentos de morte. Tomava muito lexotan, que pedia a uma amiga para comprar. Não via, nem queria mais graça na vida. Um dia, fui surpreendido com uma ligação de Miguel.
--- Alô?
--- Quem você ta pensando que é, meu caro, com suas criações de demônios artificiais? Ta me dando pesadelos aqui velhinho, Se você continuar essa autopiedade logo logo você vai ver um demônio de verdade e posso te garantir que você não vai se divertir nem um pouco, ok?
-- Como assim?
-- Pega seu caderno e anota uma ordem que vou te dar, anda que tenho que ir dar minha aula de inglês.
--- Perai...
--- Pegou?
--- Sim.
--- A partir de hoje quero que você anote suas vinte e quatro horas do dia, tudo que estiver fazendo, timtim por timtim, escreva no caderno e me mande a cópia por email. Se não fizer, tiro seu nome do meu círculo de amigos e corto qualquer possibilidade de você ser ordenado cavaleiro. Não estou brincando. Espero o email amanha.

Desligou.
Tanto fiquei comovido quanto surpreso de como ele pode saber, em São José Dos Campos, o que estava acontecendo comigo, já que eu não comentava minha dor com ninguém; era tudo dentro da minha alma e em minha casa solitária. Eu mal falava com quem quer que fosse nesse período. Como, porém, tinha-lhe muito respeito espiritual e humano, resolvi obedecer sem questionamentos. Durante quase um mês , meus emails e anotações eram desse tipo “Acordei, tomei um copo de leite, um lexotan e voltei a dormir”; “Acordei, lavei a louça, comi um pedaço de pão e voltei a dormir”; “Acordei e sai para tomar cerveja”; “Acordei e fui pagar a luz e o gás, tomei cerveja e dormi”, etc. Ele não comentava nada. Escrever-lhe e anotar no caderno essas coisas que eu fazia, e eram só essas mesmo, pois estava com a atenção e a vontade comprometidas. Após uns quinze dias, começou uma reação maior na vontade “Acordei, lavei a louça, tomei um caldo de feijão, li um pouco da Bíblia”; “Acordei, pratiquei a oração centrante, fui no mercado. Entrei num site de estudantes medievais. Dormi”; até que aos poucos meus dias foram, embora com uma tristeza e um luto que em parte trago até hoje, voltando a ter vinte e quatro horas. Tenho certeza que Miguel salvou-me a vida. Meu último contato com ele foi mandar relatório do que experimentei no Dia de Reis, missa que fora assistir por ordem dele. Depois disso, nunca mais respondeu nem email, nem achei-o por telefone e saiu da minha rede, menos, curiosamente, do messenger. Resolvi respeitar seu silêncio, mas antes mandei-lhe um email malcriado “Vai se foder, seu cruzado de merda. Ta muito metido pra meu gosto.” . Imagino que ele deva ter rido. Hoje, compreendo que ele foi para mim como o Anjo para Tobias. Seu último sinal foi salvar-me a vida e abandonar-me após a missa de Reis. Creio que esse irmão de alma, por hora, deixou-me aos cuidados tradicionais da Santa Madre Igreja.


LIVRARIA DA OUVIDOR, RIO DE JANEIRO, MARÇO DE 2007
Com Cíntia, eu vivia de conversas no messenger e ao telefone. Era umamulher com aparência de contos de fadas na flor de seus dezoito anos.Muito branca e com os cabelos e olhos muito negros e os lábios grossose vermelhos. Era Wiccana e a maioria de suas fotos eram todas com elade negro. Na sua página na Web haviam fotos de corcéis, diamantes,feiticeiros, druidas e luas de todos os quadrantes. Ela tinha um modode falar poético, tais como que "gostada de ver as estrelascadentes", "meu namorado não tem atitude de romance". Ajudou-me muitoquandoSarafoi embora de vez e eu fiquei sem atenção nem afeto. Um dia marcamosencontro na Livraria Saraiva, da Rua do Ouvidor, na parte dalanchonete. Eu a esperava tomando uma água com gás e capuchino elendo "O Informe de Brodie", de Jorge Luis Borges. Ela chegou com quasemeia hora de atraso e pensei que na Tradição que eu estava estudando , ela teria problemas. Veio com um vestido preto longo, brincos depentagrama e cadernos onde estavam os estudos da faculdade e os estudosque ela fazia com o Miguel mais tempo que eu ainda.
-- Ola, seu Jedi. --- Disse-me logo que avistei-a, assim que entrou na lanchonete. Levantei-me para beijar-lhe a mão e o rosto.
-- Que prazer , menina? Mas não repita esse atraso comigo, hein?
-- Ah, desculpa. Meu pai me prendeu no telefone com seus problemas. E vocẽ, como está?
--- Bem, acho que sobrevivi. Pelo menos parece.
--- Ela nunca mais nem telefonou?
--- Nem respondeu meus emails. Quanto mais telefonar.
--- Uma pena. Você a amava, né?
--- Sim. Foi como perder minha própria alma. Mas o que me preocupa mesmo é a situação espiritual dela.
--- Como assim?
--- Você é boa de interpretar sonhos?
Cíntia deu-me uma olhada estranha e pediu a uma das atendentes um chocolate quente.
--- Conta.
-- Noite dessas, sonhei que ia beijá-la e do corpo dela saiam vermes
negros.
--- Nossa!
--- Pois é.
--- Humm - Olha, acho que esse sonho quer dizer que você não deve mais
tê-la como amante. Para mim isso está bem claro. No máximo, como amiga.
--- Como amigos acho que não dá não. Nós fomos muito fundo um no outro.
--- Mas me conta, Cíntia, como é o Miguel?
--- Ah, ele é um amor de pessoa. Muito sereno, bem humorado. Para mim,ele é um gênio.
Eu morro de dar risadas com ele, igual como você nos seus bons dias.
--- Pois é. Ele salvou minha vida. O respeito que tenho por ele,melhor dizendo. Eu cai prostado depois de tudo e lá de São Paulo elefoi a única pessoa a perceber o que estava acontecendo comigo, sem comer inclusive. O cara é bom né?
--- Sim. Ele sabe muito.
Depois começamos a falar de nossos ensinamentos e de nossos processos deaprendizado com o Miguel.
--- Vamos mostrar nossos cadernos? -- Disse já me estendendo o dela,que tinha a capa preta e logo se via que ali só estavam coisas didáticas e históricas da Wicca. --- Você esconde o jogo, hein menina?
Ela riu-.
--- Ah, deixa eu ler isso aqui, Jedi. Muito bom. E começou a ler um trecho do meu caderno. "Os homens são animais caçadores e gostam de regras sobretudo sepuderem com elas oprimir seus semelhantes. Eles gostam de perseguir,julgar e escravizar. Possuem quase uma incapacidade de amar seussemelhantes. Com cultura, ainda se melhora um pouco a espécie, que emgeral é precária".
--- Meu professor de filosofia assinaria isso, pode crer.
--- Como você vê, garota, não sou muito otimista.
Contou-me do irmão que tinha síndrome de Daw, que segundo ela viviana "poética do silêncio infinito". Conversamos por cerca de uma hora emeia e depois de dois cafés expressos fui levá-la as barcas da PraçaQuinze pois ela iria para Niterói em seguida, na casa de uma tia.Fiquei olhando ela embarcar e percebi claramente que ela era uma personagem completamente diferente daquela multidão que atravessava as roletas das barcas. Era como se só ela existisse de fato para mim, feita da minha própria pele.

SEIS DE JANEIRO DE 2007, MISSA DE DIA DE REIS
Miguel havia praticamente me obrigado a ir a Igreja para participar da missa no Dia de Reis e rezar por ele. Achei aquilo absurdo, mais um absurdo a mais já era coisa de nada em minha vida. Aproveitei para reafirmar uma promessa com Santa Rita de Cassia. Sentei-me, como nas vezes habituais na terceira fila de bancos, nunca nos dois primeiros para seguir a disciplina de humildade diante de Deus e dos homens. Para mim, e isso deve ser falado com a máxima honestidade biográfica, falar com Deus é mais fácil que com os outros uma imensa maioria das vezes. Porém, nesse dia aconteceu algo completamente diferente e anotei no mesmo dia o fato milagroso na época " De repente olhei para uma das imagens da Virgem com o menino Jesus no colo, uma imagem vinda da Italia ao que sei, e vi um estranho brilho em seus olhos, pareciam vivos, com alma. Pensei que devia ser um defeito da tinta, porém logo vi ao lado a imagem de São Januário com o mesmo brilho, assim como a Virgem do alto da Capela e fui percebendo brilho em todas as imagens que havia: Santa Mônica, Santa Rita, São José. Os olhos de todas elas estavam brilhando e fiquei meio tonto por minutos sem conta. Meu Deus, estou virando uma espécie de Stephen King as avessas, aterrorizado pela luz. Não acredito que esteja passando por isso. Será que estou enlouquecendo? Discretamente olhei para os anjos que eram feitos de outro material para ver se tinha o mesmo brilho. E de repente, a luz não estava apenas nos olhos dos santos, mas em toda Igreja. Era a mesma luz que estava nos olhos dos santos e em mim. A mesma luz que estava nos olhos do Frei Pedro quando cruzei por ele. Era tudo um milagre dentro de outro milagre. Eu era parte dele. Outras coisas ocorreram que confirmaram o carisma sobrenatural dessa missa, mas essas outras coisas pertence a Igreja Secreta. Como Dizia Saint Martin, mestre dos cavaleiros martinistas, tem certas verdades que não se contam a ninguém. A cada dia parece que vou sendo levado a sentir a luz divina, onde percebo milhões de universos paralelos e iluminados. Meu Deus, misericórdia de nós! Existem milhões de realidades que ainda que estejamos de olhos abertos não conseguimos ver.

Madrugada dessas, o dia amanhecendo, eu estudando o Tyger de William Blake pelo smartphone, para em parte justificar o título desses relatos. Quando dei por mim que, naquele mesmo momento terroristas, patifes, psicopatas, endemoniados e toda mais uma malta de demônios humanos estariam também despertando para seus crimes e mais coisas hediondas; não pude deixar de sentir uma ternura pela minha pessoa, tantas vezes ignorada nas suas melhores intenções que acabei optando por uma vida semi-reclusa, no próprio jardim de minha alma, que é de onde vem os melhores perfumes. Não tenho razão? Quem mais, nessa planeta macabro, estaria com tal preocupação? Estudar Blake? Onde estão meus irmãos? No atual estágio do mundo, a coisa mais misteriosa de se encontrar é uma boa pessoa. Eu me esforço meu tanto para ser; insistir em escrever num mundo onde cada vez se lê menos e onde a burrice é incentivada ajuda-me a lembrar que não preciso fazer parte da manada, que vive sem pé nem cabeça sobretudo em países medíocres que não ensinam seus jovens o hábito de ler cedo. Porque o homem é reflexo de sua capacidade ou não de perceber a estética do mundo. Para um homem comum, um tigre é apenas um tigre. Para um homem com sensibilidade educada, um tigre é um espetáculo de estética, simetria, força, beleza, esplendor, arte, exibicionismo, matemática e sobretudo poesia, da melhor e mais selvagem poesia. Quem poderia duvidar que somente um ser divino poderia criar um Tigre?

Querido Deus, estou aqui na espera de resolver meus trâmites burocráticos para poder ficar nas montanhas perto do arco-íris e das tempestades, estudando as diferentes qualidades de anjos. A cidade dos homens, com sua fumaça e ferocidade,atrapalha minhas observações e o crescimento normal de minhas asas. O Senhor sabe que meu sonho foi sempre voar como Peter Pan ou osJetsons. A terra andapesada e as pessoas caminham sem perceber pisando em diamantes. Será que sejogarmos a primeira edição de Camões irão perceber? Nada. Nem sequer reparamos nos anjos incrustados nas paredes das igrejas ou na pomba observadora. Quero ficar, rico, Senhor, o bastante para ficar semanas vendo filmes de vampiros no telão do meu notebook. Hoje vim pelo ônibus lembrando quando eu acreditava no amor das mulheres e minha alma tentava achar as portas dos universos paralelos. Claro que agora sou quase um sábio, depois de quebrado escudo e espada. Aprendi lutar de mãos vazias. Jogaste duro comigo, deixando-me vulnerável; porém, hoje, vejo melhor que poucos espíritos estão acesos na escuridão. Poucos aprenderam dizer sim.Quase ninguém a amar. E como mente essa gente. Deveriam ler Garcia Marques. Sei,Senhor, que como poeta a extinção me ameaça. Daqui a pouco vão querer-me em museus. Então, protejei-me Senhor, e acalmai meu coração que não entende como em terra tão farta e tão bela a estupidez não consegue enxergar que a riqueza está apenas em sorrir, amar,agradecer e caminhar. E que nada é sólido, fora o amor. Está ruim de convencer essa gente, senhor. Portanto, vos peço que guardai na terra aquilo que me deste e dai-me logo a absolvição. Gosto de ver a árvore do céu crescendo.Entristece ver a multidão de olhos abertos sem enxergar.


www.marcelinorodriguez.wordpress.com










Bibliografia
Escritor hispano-brasileiro, autor de:
“O Observador de Pardais”, 1996;
“O Espião de Jesus Cristo”, 1999;
“Juvenília”, 2000;
“A Ilha”, 2001;
“Café Brasil”, 2001;
“Boneco de Deus”, 2002;
“Mar Romântico, Mar”, 2002;
” Bom Dia, Espanha!”, 2005
“Anjo da Tarde”, 2008 Somente na WEB.“Sol da Meia Noite”, 2009. Somente na WEB.“Vinte Poemas, 2010”, pela Web.
Prêmio Pérgula Literária Internacional, Medalha Ação Cultural Troféu Dez Mais Taba Cultural Editora.
Em 2004, o autor viveu em Córdoba, Argentina, entre Janeiro e Março. Em maio de 2005 sai Bom Dia, Espanha!, livro que relata essa experiência. Em 2010, o autor troca o Rio de Janeiro pela Zona da Mata em Minas Gerais, onde reside no momento com seus cães. O autor tem textos publicados em português e espanhol em sites, antologias e revistas do Brasil, Argentina, Itália e Espanha, em português e castelhano. Atualmente o Autor ministra cursos de espiritualidade pelo país e participa de Blogs e Revistas literárias em várias partes do mundo.
Blog do autor www.marcelinorodriguez.wordpress.com
www.marcelinorodriguez.blogspot.com
Contato: marcelinoescritor@gmail.com
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