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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->25. NOITE BEM DORMIDA -- 17/06/2002 - 05:54 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Passou pela mente de Fernando convidar a esposa para enlace mais íntimo. Mas nem ele mesmo estava desejoso disso. Bastava-lhe ficar abraçado a ela. Queria sentir-lhe os pensamentos, as emoções sentimentais. Não conseguiu. A quietude da mulher parecia-lhe a expressão de algum temor. Desconfiaria dele?

Voltou-se para o outro lado. Dolores não se mexeu. Sabia que não estava dormindo. Apertou-lhe o sono. Quis orar por Jeremias. Como estaria o amigo nessa hora? Teria despertado no etéreo? Recordou-se da leitura de Kardec e dos interrogatórios a que submetia os espíritos evocados. Houve um que foi chamado logo que faleceu. Um espírito categorizado como feliz. Do grupo de estudos e trabalhos do Codificador.

Em lugar de orar as costumeiras preces, Fernando acabou adormecendo com a idéia de que deveria visitar o plano espiritual durante o sono. Queria conversar com os protetores. Queria ver em que estado se encontrava o amigo. E as demais pessoas. Vagamente, lembrava-se de que não ingerira bebidas alcoólicas, contrariando o hábito. Teria isso influência extracorpórea?

Ao passar a sono mais profundo, sentiu-se transportar. Reconheceu os amigos da espiritualidade. Estivera outras vezes com eles. Roque era o mais chegado. Tia Ana cumprimentou-o efusivamente:

— Você tem-se saído muito bem. Apesar de não se lembrar de nada, ficou-lhe na mente profunda a tendência à aceitação da vida após a morte tal qual a entendemos aqui. Vamos conduzi-lo até onde está Jeremias. Não estranhe, contudo, pois não irá conseguir ver-nos. Você irá perceber-lhe a disposição psíquica. Mas fique absolutamente isento de provocá-lo. Poderia causar-lhe algum transtorno, já que não se encontra muito bem.

Tomado pelo pulso, Fernando foi levado sem pressa até a sala em que jazia o corpo do amigo. Encontrou o espírito ao lado do cadáver. Lamentava a vida perdida. Compenetrara-se de que morrera em conseqüência de complicações por falta de imunidade contra os microorganismos. A consciência apontava para falhas conceituais em relação à existência. Pedia perdão a Deus, solicitando-lhe ajuda para o difícil transe.

Fernando recebia as vibrações indiretamente, filtradas pelas freqüências dos amigos presentes. Assim, interpretava corretamente as reações daquele espírito amigo.

Quis saber qual seria a preocupação dele em relação aos familiares.

Recebeu telepaticamente a resposta:

— Jeremias não está em condições de refletir a respeito das conseqüências da doença sobre os familiares. Recebeu o influxo da proteção dos benfeitores, no sentido de não exacerbar as reações dolorosas. Teve méritos para esse ponderável auxílio, principalmente porque foi um homem bom, honrado, honesto e trabalhador. Deu conta da educação dos filhos. Não fora a despreocupação com a esposa (fato, aliás, apreendido quase inconscientemente pelos usos e costumes estruturados na sociedade) e teria tido outro fim. Certamente, estaria com saúde, o que significa que encurtou a existência na carne. Isso lhe refletirá na consciência como suicídio. Haverá, todavia, tempo certo para redimir-se. Pelo que nos passaram os protetores, irá ter de permanecer na crosta, auxiliando os familiares, até que se alterem os dispositivos sentimentais deles em função de outros relacionamentos. Tudo dependerá, no entanto, de como reaja às obrigações. Não está preservado de descair no Umbral, bastando, para isso, que se revolte. Nesse sentido, ser-lhe-ão de grande proveito os trabalhos e leituras realizados nos últimos tempos, quando assimilou em parte os conhecimentos espiríticos. Talvez as dúvidas possam atrapalhar seu desempenho, mas a turma do resguardo das aflições está preparada para amainar as conseqüências do ceticismo. Enfim, há que se dar tempo ao tempo. Por enquanto, as fortes vibrações das pessoas não lhe permitem manter a mente equilibrada. Vamos ver como se portará quando a família receber a notícia da AIDS.

Fernando agradeceu as informações. Não se recordava de ter tido outros esclarecimentos durante o sono. Quis saber dos efeitos das bebidas alcoólicas.

— O torpor produzido na mente física favorece a aproximação de seres de baixa categoria. São vampiros poderosos. O perispírito, ou seja, esse corpo etéreo que você está usando, permanece imantado pelos eflúvios alienantes. O domínio sobre as reações orgânicas se perde em ambos os planos. Não há como estar lúcido na espiritualidade, em estado de embriaguez corpórea.

— Terei lembrança destas respostas?

— De certa forma, pois a preocupação manifestada durante a vigília poderá frutificar em desenvolvimentos racionais. Caso atine com estas razões, lhe será facultado pensar de acordo com as informações recebidas. Por outro lado, nada lhe obstará o desejo de achar bibliografia adequada entre os textos espíritas. Tudo dependerá do crescimento de seu interesse pelos temas doutrinais.

— Como sentirei esta tertúlia, assim que despertar?

— Você irá sonhar com esta “viagem astral”. Pessoas treinadas conseguem recordações quase integrais. É necessário saber que muitos conhecimentos poderão ser considerados absurdos, quando colocados à luz da cultura dos encarnados. Que protetores seríamos nós, se prejudicássemos os assistidos? Não é verdade que a misericórdia divina nos muniu de precauções, para que ajamos prudentemente?

— Como deverei proceder daqui por diante, especificamente, durante o enterro, quando serei coagido a enfrentar situações religiosamente comprometedoras, pois temo que o Padre Timóteo possa estar querendo desforrar-se do “carão” que lhe passei?

— Aja o mais naturalmente possível. A verdade, às vezes, pode machucar, porém, reinará soberana através da eternidade. Não cabem recomendações que lhe adulterem a personalidade. A essa questão só você mesmo terá condições de responder. E não adianta querer encontrar-se com o espírito do litigante. Suas freqüências vibratórias, se estivessem calibradas pelo mesmo diapasão, não indicariam para o entrechoque de opiniões, ou para as antipatias.

Fernando observou que fora longe. Se pudesse, testaria as informações colhidas na obra kardeciana.

— Quando estiver lendo, interrompa para reflexões. Abra o canal mediúnico, para receber o influxo intuitivo que se está desenvolvendo rapidamente. O destino lhe aponta para a mediunidade. É serviço legítimo que se presta ao plano espiritual. Muitos deixam desaparecer essa tendência, que todos levam para a carne, e, quando regressam, têm de lamentar considerável atraso evolutivo. As suas visões se condensarão, durante o trabalho mediúnico. Não vá pensar que vão degenerar-se. Ao contrário, se aperfeiçoarão com o treinamento, com a prática. Contudo, há que calar o poder, aproveitando-o na ajuda aos necessitados, aos carentes de esclarecimentos morais e evangélicos. Nada de se engrandecer com a natureza do fenômeno, que se enquadra perfeitamente dentre as leis cósmicas, universais. Se se dedicar com afinco, não se transformará num Chico Xavier, mas será excelente servidor, com que poderão contar os benfeitores.

Fernando já não conseguia seguir direito os raciocínios. Embebera-se pela facilidade expositiva dos amigos (não sabia bem quem é que lhe passava as informações telepáticas) e não absorvera tudo. Sentia-se imaturo e começava a acreditar-se incapacitado para missão tão importante.

Imediatamente, o perispírito se reintegrou ao corpo físico. Mexeu-se na cama. Começou a sonhar.

Pela sua mente, passaram algumas correrias. Via-se num local com muitos esquifes. Alguns com janelinhas de vidro. Quis olhar para saber quem estava ali. Estavam vazios. Transportou-se para um hospital. Sentia-se arrastado. Fazia força para chamar o amigo Jeremias, que fazia de conta que não o ouvia. Soluçava. Tinha morrido, é claro. Fernando olhava através das paredes transparentes. Mas não tinha medo de nada. Alguns médicos e enfermeiros, de ambos os sexos, flutuavam pelos corredores. Havia forte luminosidade neles. E conversavam entre si. Falavam de exames de sangue. De AIDS. Diziam que era perigoso libertar o Jeremias. Poderia contaminar a família. Maria estava em um canto da sala. Ajoelhada. Rezando. Parecia a Fernando que iria sucumbir à dor. Sentia forte pressão moral para ir consolá-la. Dolores aparecia e dizia que não. Que ela não precisava de apoio de homem algum. Que era forte para enfrentar a vida e a morte. De repente, Fernando se sentiu transportado para um local de delícias espirituais. Desejava ser um espírito feliz. Queria ser argüido por Kardec. Mas, em lugar de responder, só perguntava. A figura, que identificou com o retrato que vira na secretaria do Centro “Jesus de Nazaré”, explicava-lhe todas as perquirições. Com toda a clareza. Fernando se sentia com um livro nas mãos. O ambiente era o seu escritório da loja.

A aproximação dos devaneios com a realidade fê-lo acordar. Lembrava-se bem do sonho. Mas os temas discutidos ficaram vedados à recordação. Confundiam-se com as dissertações do livro. Imaginava-se conversando com Kardec, quando o rádio se ligou. Eram cinco horas. Precisava levantar. Dolores voltou-se para o seu lado.

— Bom dia, querido. Dormiu bem?

— Como uma pedra. E você?

— Sonhei com a Maria, o tempo todo. Você também estava lá. Queria consolá-la, mas eu fiquei enciumada. Veja se tem cabimento. É porque enviuvou. Que Deus me perdoe!

Fernando desconfiou que parte do sonho poderia ter sido verdadeiro encontro no etéreo. Não fora isso que solicitara ao adormecer? Resguardou-se de comentar. Não queria provocar falsas conclusões. Havia um corpo insepulto e uma luta moral a travar. Que papel exerceria ele nessa conjuntura? Fosse qual fosse, tudo procuraria fazer com muito discernimento. A dor dos semelhantes começava a incomodá-lo.

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